Sem Rumo escrita por Mandy-Jam, ray_diangelo


Capítulo 3
Careta demais


Notas iniciais do capítulo

Uma pequena demora, não é? Mas eu e a Ray sentimos muito!
Aqui vai o novo...



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/162929/chapter/3

Eu cheguei em casa pronta para correr para o meu quarto novo e tocar violão até cansar, mas assim que pisei na sala me surpreendi.

Sentados no sofá estavam uns 8 velhinhos, mais o senhor e a senhora Ness. Eles estavam tomando chá e comendo biscoitos delicados, acredite ou não. Todos eles vestiam roupas ao estilo dos anos 50, mas não aquelas que os jovens usavam, mas que homens e mulheres da alta sociedade usavam.

Seus olhares pararam em mim, e eu me senti a única diferente dali. Imaginei por um curto momento que eles talvez estivessem me chamando de careta mentalmente.

- Ah, olá Abigail. – Sorriu a senhora Ness – Como foi o seu dia na escola?

- Ah... O de sempre, sabe? Escola é escola, não importa onde fique. – Dei de ombros naturalmente, e pude notar que eles não sabiam identificar se isso era bom ou ruim.

- Bem... Acho que depois do dever de casa você pode descansar um pouco. – Disse o senhor Ness.

- Ou antes dele. – Comentei sem querer, e os velhinhos me encararam de modo repreensivo – Ahm... Há! Há! Eu estava brincando? Não foi engraçado?

Eles não riram. Por esse e outro motivos eu quis deixar aqueles velhinhos supimpas para trás e subir correndo para o meu quarto.

Assim que abri a porta e meus olhos azuis encontraram meu violão, eu sorri feliz. Não importava o que acontecia, desde que eu tivesse ele por perto. Se o tivesse, estava tudo bem por uns três minutos, o tempo necessário para tocar uma música.

E quando esses três minutos passassem, eu poderia tocar mais uma de três minutos.

- Aí está você... – Sorri segurando-o e jogando a mochila na cama sem ligar para os livros ou o material. Comecei a tocar “School’s out” do Alice Cooper.

Eu me empolgava á cada música que passava. Depois dessa toquei “Another brick in the wall”. Outras músicas foram vindo e eu não parava de tocar.

Eu nunca parava. Até mesmo quando sentia que meus dedos não agüentavam mais, eu começava o solo de “Sweet child of mine” e passava para outras. Era como se eu ficasse em um mundo só meu quando estava tocando violão.

Perdia completamente a noção da hora, mas para mim não fazia diferença nenhuma. Nada era melhor do que tocar mesmo, então eu não ligava para outras tarefas.

Aposto que foi exatamente aquilo que aconteceu, pois só me toquei que estava tocando demais quando o senhor Ness apareceu na porta do meu quarto. Parei meus dedos e abafei as cordas, parando o som imediatamente.

Parado ali na porta ele parecia muito mais autoritário do que eu pensava que fosse, e pude notar que ele cerrava os punhos com o intuito de manter a calma.

- Abigail... – Disse ele tentando se controlar – Nós estamos lá embaixo tentando descansar. Eu já pedi para parar com esse som.

- Não pediu não. – Franzi o cenho.

- Pedi sim. – Confirmou ele, mas eu mantive minha cara de dúvida – Você poderia ter escutado se não tocasse essa porcaria tão alto.

- Então a primeira vez não conta, já que eu não ouvi. – Rebati naturalmente. Ele trincou os dentes de raiva.

- Escute. Não me interessa se eu estou falando para você pela milésima vez... – Disse ele andando em minha direção e tentando transmitir superioridade, mas também calma – Eu quero que pare, e gostaria que parasse agora.

- Certo... Vou tocar mais baixo. – Disse sem saber o que falar mais.

Ele fechou os olhos controlando-se novamente. Acho que ele tinha sérios problemas de ataques de raiva, e aquele fechar de olhos e a respiração repetitiva deveria ser resultado de vários anos de terapia para aprender a se controlar.

- Eu quis dizer para parar, e não para tocar mais baixo. – Falou pesadamente, e com um pouco menos de paciência.

- Parar? Mas... Eu não tenho mais nada para fazer. – Disse incrédula. Acho que eu devia aprender a me controlar também, pois acabei falando demais – Bem, eu podia ir conversar com o povo supimpa lá embaixo, mas acho que sou careta demais para isso.

Ele não gostou. O senhor Ness pegou rapidamente o violão das minhas mãos, e me fuzilou com um olhar de raiva.

- A última coisa que eu quero na minha casa é uma garota rebelde e desrespeitosa que fica tocando músicas impróprias. – Reclamou ele liberando sua raiva – AC/DC? Guns and Roses? Pink Floyd? Isso é lixo! Lixo, eu digo!

Com um movimento irritado ele jogou o violão no chão com força e eu quase chorei de desespero ao vê-lo quebrar em milhões de pedaços de madeira. Meu queixo caiu e eu fiquei completamente sem ar e movimento.

Senhor Ness olhou para mim ainda severo e irritado, mas dessa vez nós éramos dois. Olhei para ele do mesmo modo, e depois apontei para o violão.

- Você... Como você pôde fazer isso? – Perguntei incrédulo – Seu monstro.

- Não ouse faltar ao respeito comigo, menina! – Exclamou ele.

- Não ouse quebrar o meu violão, seu...! – Parte de mim queria parar a briga, mas outra parte não agüentou e teve que continuar – Seu pecador!

- Basta! Você não vai ter mais jantar! Vai ficar trancada aqui até aprender a ter educação! – Exclamou ele furioso, mas eu estava ainda mais do que ele.

-Μείνετε κουφός!! – Gritei sem perceber.

Aquilo foi muito estranho.

Aquela frase. Aquela simples frase esquisita foi o começo de todos os problemas que eu viria a ter, e que nem mesmo passavam pela minha mente. Eu esperava ser expulsa de uma escola, ou se fosse para sofrer um acidente, talvez eu fosse atropelada ou coisa do tipo, mas nunca imaginaria nem mesmo um milésimo das coisas que apareceriam no meu caminho.

Do mesmo modo que não imaginava que eu sabia como falar “Fique surdo!” em grego. Não sabia nem mesmo que eu conseguia falar grego. E muito menos que aquela frase fosse funcionar como algum tipo de feitiço.

Eu senti medo da cena que vi. Na minha frente, o senhor Ness parou de andar. Ele estava te costas para mim, mas pude ver claramente seu corpo tremer como se estivesse em um terremoto, e suas mãos correrem para seu ouvido.

Um grito. Não... O maior e mais assustador grito de agonia que eu já ouvira escapou de seus lábios, e me fez sentir uma parte de sua dor.

- Aaah! Não! Aaa-argh! – Ele gritava, e gemia ao mesmo tempo, como se algo estivesse praticamente perfurando seus ouvidos com enorme força. Por fim, ele deixou seu corpo desabar no chão.

Eu fiquei boquiaberta, sem saber o que fazer. Eu recebi um grande choque de adrenalina quando ouvi múrmuros vindos do andar debaixo, acerca do grito que tinham ouvido.

Meu corpo se mexeu sozinho. Eu peguei a minha mochila que ainda estava com todas as minhas poucas roupas, abri a janela do quarto, e pulei. Aquele era o terceiro ou segundo andar, mas eu consegui cair perfeitamente no chão, e não me machuquei muito. Rolei para o lado, e pude notar pela janela da sala que todos os velhinhos estavam correndo escada acima.

Eu corri também, mas para uma direção completamente diferente. Eu corri para o primeiro lado que vi, mesmo não sabendo ao certo para onde iria.

Mas de uma coisa eu tinha certeza. Eu não voltaria mais para aquele lugar.

- Mais uma mão de tinta, e vai ficar bom... – Disse Perséfone analisando a parte de fora da casa. Deméter assentiu.

- Está quase pronta. – Comentou orgulhosa do trabalho que tinha feito, mas seu sorriso de felicidade sumiu assim que notou Hades sentado no chão da varanda – Não graças á ele, mas...

- Eu estou morrendo aqui, será que não ganho um desconto?! – Reclamou ele. Hades estava suando demais, enquanto se enchia de água vinda de um cantil, e se abanava com um jornal. Ele franziu o cenho – Estamos no fim do mundo, mas mesmo assim ainda recebemos jornal na porta? Esse lugar é esquisito demais para mim.

- Esquisito é você, que vem para uma casa de campo vestido como se fosse para o Deserto do Saara. – Rebateu Deméter apontando para ele, e nenhum dos dois, nem Perséfone nem o próprio Hades, podiam negar que aquilo era verdade.

- Não tem Sol no Mundo Inferior, ou você não se tocou disso?! – Exclamou ele com raiva – Se eu ficar com roupas fresquinhas, vou acabar completamente queimado!

- Amor... – Disse Perséfone – É só por um tempinho. Só enquanto você nos ajuda á pintar o que falta.

- Aaaah, Perséfone! Qual é a graça de pintar tudo á mão?! Estala os dedos, bate palmas, ou qualquer coisa do tipo, que tudo fica pronto! – Pediu Hades como se fosse criança.

- Viu? É um vagabundo. Eu sempre te disse isso. Não agüenta nem mesmo levantar essa bunda da varanda e pintar umas paredes. – Comentou Deméter para Perséfone – Se você ficasse com qualquer outro Deus... Qualquer outro, estava tudo bem, mas não. Tinha que ser ele. Tinha que ser a romã dele. Tinha que ser!

- Mamãe, já chega, ok? Eu sei muito bem que Hades não consegue ficar no Sol, e não vou força ele á isso! – Retrucou ela.

- É. Tem razão. Acho que ele é fraco demais para isso. – Zombou Deméter fingindo estar séria – Por que não chamamos Zeus ou Poseidon para dar conta do trabalho? Acho que Deuses de verdade vão ser mais úteis.

Nesse momento a terra tremeu. Deméter olhou para Hades, que se levantou trincando os dentes. Odiava ser comparado aos irmãos, e ela sabia disso.

- Deuses de verdade?! Eu sou um Deus de verdade. Eu sou o senhor dos mortos, Hades, um dos três grandes! Como ousa me tratar como um inútil?! – Reclamou ele – Eu sou capaz de matar um exército inteiro com um simples movimento do meu dedo mindinho! Você acha que eu não sou capaz de pintar uma parede?!

Deméter deu um passo para frente. As plantas do chão começaram a crescer e se enroscar nas pilastras de madeira da varanda.

- É. Eu acho. – Respondeu ela bem devagar e de modo desafiador.

Hades marchou em direção dela com raiva, e suas roupas mudaram. Ele vestia uma bermuda preta, com ma camisa sem mangas branca com o desenho de uma caveira. Com força e irritação ele tomou o rolo de tinta das mãos da Deusa, que sorriu tentando não rir.

- Essa eu quero ver. – Disse.

- Cala essa boca. – Resmungou ele – Cadê essa tinta?!

Eles passaram Deméter e Perséfone entraram na casa para ajeitarem o piso, e limparem tudo, enquanto Hades pintava a parte de fora. As duas levaram mais ou menos umas 3 horas para poderem deixar a casa perfeitamente limpa e decorada, e assim que terminaram resolverem ver como Hades estava se saindo.

Perséfone abriu a porta.

- Hades? Onde você...? Hades! – Exclamou ela espantada ao vê-lo.

O Deus dos mortos tinha acabado de pintar tudo, mas parecia que não tinha sido só as paredes que tinham tido as cores alteradas. A pele de Hades estava completamente vermelha, o que mostrava claramente uma insolação.

- Ah... – Gemeu ele movendo-se com o máximo de cuidado para nada encostar contra sua pele queimada. Perséfone estava com os olhos arregalados, mas Deméter avaliava a tinta da parede – Isso... Não foi bom.

- Calma. Calma, amor... Olha... – Perséfone foi para perto dele, mas se deteve ao notar que estava prestes a tocá-lo – Nós... Você... Você pode tomar um banho gelado. Isso vai ajudar a hidratar a sua pele e...

- Ahmmmm...! Gelado não...! – Gemeu ele debilmente.

- Hades, nós temos que fazer alguma coisa, senão sua pele nunca vai ficar melhor! – Exclamou ela preocupada. Hades ia dizer alguma coisa, quando teve que fechar a boca prendendo um grito de dor.

Deméter tocou com a ponta do dedo indicador no braço dele. Um movimento sutil e inofensivo, mas que provocou uma enorme dor.

- Acho que você esqueceu uma parte. – Comentou ela.

Hades olhou para ela com ódio, suspendeu o rolo de tinta e pintou o rosto da Deusa de azul com um movimento só.

- Pronto. Resolvido. – Respondeu ele marchando para dentro, enquanto Deméter praguejava em grego tentando limpar a tinta de seu rosto.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

O que vai ser desses três convivendo durante a temporada de plantação da Deméter?
Tenso, não?
A Abby fugiu! Será que ela consegue achar um lugar seguro, ou... Um novo violão?
Vamos ver no que isso tudo vai dar. Até o próximo capítulo! Beijos e nós esperamos os reviews!