-Você não está ouvindo essa música?

-Não.

-Você é louco? Ela é tão bonita...

-A gente ta num hospício, então acho que somos loucos mesmo...

Ele concluiu olhando para a parede estofada do minúsculo quarto branco e a garota deu um suspiro pesado.

-É, eu esqueci... Somos loucos mesmo...

Durante alguns minutos eles ficaram calados.

Era sempre assim dês de que foram parar ali.

Ele parecia já estar morto e ela estava sempre a escutar músicas, que só ela ouvia.

Já estavam conformados com a loucura.

Quando chegaram lá, talvez nem fossem tão loucos assim, mas agora, como acontece com todos que pra lá vão, eles se conformaram em ser loucos, foram induzidos a loucura daquele lugar.

-Esse silêncio me incomoda.

Ele diz, agora olhando pro teto, também estofado branco.

-Incomoda a mim também.

-Vamos dançar?

Ele disse se pondo de pé, alegre e sorrindo para a garota.

-Tá bom!

Ela concordou também alegre.

-Ouve a música e dê o ritmo, vou te acompanhar e te guiar.

-Tá bom.

E lá estavam eles, dançando, como em um belo baile de gala, em um belo castelo.

Mas era só na imaginação deles.

Não havia musica alguma.

Eles sempre se lembravam como foram parar lá quando dançavam.

Eram jovens, ainda são. Ela foi parar lá depois de jurar que alguém a esperava em algum lugar, um grande amor. Tinha 17 anos, era bonita, cabelos pretos e longos e pele pálida. Seus pais achavam que ela havia enlouquecido e a internaram lá.

Ele, também jovem, de 19 anos, sentia a mesma coisa que ela, e a mesma coisa aconteceu à ele. Ele tinha os cabelos vermelho cereja, a pele também pálida e os olhos verdes profundos.

Quando chegaram lá, um viu o outro e eles perceberam.

-É ela. Ele disse

-É ele. Ela falou

Dês desse dia os dois estavam sempre juntos, aprontavam juntos, iam pro castigo juntos. E vendo isto, vendo o amor e cumplicidade dos dois, as enfermeiras resolveram deixar os dois no mesmo quarto.

Era a cena mais normal vê-los dançando. Às vezes o silêncio predominava, mais o amor era visível.

Ela se sentia uma princesa ao lado dele. E ele se sentia um príncipe, com a mais bela das damas.

Eles dançavam e dançavam, alegres e sorrindo um para o outro.


-Esses dois são realmente loucos.

Uma enfermeira disse para a outra, ambas parada em frente a porta e vendo-os dançar pela pequena janela da porta.

-É bonito a loucura deles. É feliz vê-los assim, vivendo um conto de fadas.

E as duas se foram, mas eles ainda dançavam animadamente e eram assim todos os dias.

Foram esquecidos naquele lugar, mas acharam um ao outro, e eram felizes com sua loucura, a sanidade era desnecessária a eles...