Do Próprio Inferno escrita por erikacriss


Capítulo 2
2. Maldita coragem e hormônios adolescentes




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Com o decorrer dos dias eu e Denys nos encontrávamos sempre. Contei a minha mãe que não o queria como meu marido, apenas como meu amigo. Minha mãe compreendeu como sempre e permitiu que eu o visitasse, e ele me visitasse, nos dias que quiséssemos. Porém ela não me enganava, eu sabia que ela tinha um objetivo por trás de nossa amizade, uma esperançinha crescia dentro dela de que a amizade se tornasse mais ‘colorida’. Eu não achava que isso seria possível.

― Duvido que ganha de mim em uma corrida até o salão. ― exclamou Denys Em um dia que fui visitá-lo.

Estávamos no jardim e correr até o salão da mansão era um grande exercício dado que era tão longe um lugar do outro. O pai e a mãe dele estavam viajando para Itália então tínhamos liberdade de gritar e brincar. É claro que havia os criados sempre de olho em nós dois. Eles não se incomodavam muito com a gritaria e Denys disse que eles não contariam aos seus pais. Isso me deixou aliviada.

― Acredita mesmo que pode me ganhar? ― perguntei zombeteira.

― Só há um jeito de saber. ― ele disse sombrio e depois deu meu sorriso preferido.

Levantei uma sobrancelha e sorri diabolicamente. Começamos a correr ao mesmo tempo, mas ele chegou primeiro.

― Não é justo! Você não tinha nada lhe apertando o pulmão e segurando o ar. Venceria fácil se não fosse esse espartilho! ― disse eu birrenta, mas ainda no tom brincalhão. E voltamos novamente ao assunto do espartilho! Incrível como eu me lembrava constantemente a forma que eu odiava aquele adereço desconfortável.

― Tudo bem eu acredito em você. ― ele disse sorridente, levantando as mãos no ar em rendimento. ― Sabe, você pode tirar o espartilho se quiser. Pegue um quarto e se troque. Quando for a hora de sua mãe vir te buscar troca novamente e ela não irá desconfiar. Então teremos uma revanche. O que me diz? ― ele levantou uma sobrancelha e sorriu. Sempre fazia isso quando perguntava algo, impressionante.

Fiquei tentada em aceitar sua oferta. Mas talvez não fosse muito direito fazer isso. Eu já tinha um corpo desenvolvido e tinha que admitir: O espartilho era excelente para segurar tudo no lugar e deixar tudo bonitinho. Eu não gostava, mas só agora entendia que precisava ― não havia sutiãs ainda, iriam ser inventados apenas alguns anos depois, no século XX; uma droga que só faltasse menos de um ano para tal feito e eu necessitasse deles naquele momento, mesmo não sabendo.

― Não acho que seja uma boa idéia, embora eu esteja tentada a aceitar. ― suspirei.

― Como queira. Mas caso mude de idéia temos muitos quartos e pode escolher qualquer um deles.

Assenti e ele sorriu me olhando de um jeito curioso e irresistível. E então eu senti uma vontade louca de beijá-lo ― Sim, do nada! Eu queria saber como era a sensação de beijar alguém, mas não podia ser com qualquer um, tinha que ser ele. Nós já nos encontrávamos e visitávamos um ao outro há uns três meses e isso deve ter influenciado meus hormônios adolescentes!

Encaramos-nos por algum tempo, um silêncio meio que constrangedor, ele parecia se debater interiormente, assim como eu debatia comigo mesma.

Vamos beije-o!’ ― dizia parte de mim.

Cala-te! Nem pense nisso!’ ― outra parte replicava.

‘Só um beijo! Não fará nenhum mau!’

‘Mas não quero me casar tão cedo!’

‘Quem falou em casar? É só um beijo inocente!’ ― Gritou a parte vencedora.

Olhei ao nosso redor e vi que uma criada nos observava.

― Me mostre um dos quartos, eu quero me trocar. ― disse vagamente.

Ele deu um suspiro aliviado que o silêncio havia sido quebrado em fim. Olhei novamente para olhar a criada enquanto subíamos as escadas de mármore até o corredor de quartos, ela desviou o olhar e pareceu se entreter com seus afazeres ― regar as plantas dos vasos. Dei de ombros. Subi a escadaria com Denys segurando minha mão, o que era normal.

Ele abriu a porta de um dos quartos e fez menção que eu entrasse e ficasse à vontade. Era um quarto incrivelmente grande e luxuoso, sua mobilha em tons de madeira e vermelho, algo verdadeiramente pitoresco e ao mesmo tempo glamoroso, ou pelo menos naquela época era.

Hesitei em puxá-lo para dentro do quarto também, perdendo a coragem que tinha me tomado anteriormente.

Vamos lá! Você é um homem ou um rato?!’ ― perguntou a parte encorajadora.

‘Tecnicamente, nem um nem outro. ’ ― a parte sóbria disse.

‘Entendeu o que eu quis dizer; não queria mudar o ditado. ’ ― replicou convencendo-me.

Eu puxei Denys para dentro rapidamente e antes de fechar a porta certifiquei-me de que ninguém havia visto isso, olhando de um lado a outro do corredor.

― O que houve Renata? ― Denys perguntou confuso.

Minha coragem se esvaiu novamente.

Não posso fazer isso!’ ― gritou o lado sóbrio. Digo sóbrio por que era o único racional no momento.

Covarde! Vamos faça duma vez!’ ― O embriagado teve sua vez e novamente foi ouvido e atendido. Enchendo-me de coragem.

Atirei meus braços para seu pescoço e o puxei. Nossos lábios colidiram com um choque, que não sei de onde veio, mas era bom. A melhor parte foi quando os lábios dele reagiram aos meus movendo-os com uma fome inexplicável. Então sua língua encontrou a minha, foi meio estranho no começo, mas depois percebi que a sensação era boa.

Só um beijo, né? Ta bom, como se fosse possível segurar os hormônios de adolescentes, principalmente adolescentes que tinham esses sentimentos sendo apresentados a eles naquele momento.

Logo seus lábios ficaram mais firmes e ele me aproximou mais, não querendo deixar nenhum espaço entre nós, ele me apertou em seu peito. O beijo se tornando mais urgente. Tão breve que nem me dei conta ele me jogou na cama e começou a beijar minha clavícula. Não o repreendi, eu queria aquilo. Oh! Hormônios descontrolados!

― Oh! Céus! ― gritou a voz de uma mulher.

‘Céus, digo eu!’

Rapidamente Denys saiu de cima de mim e eu agradeci mentalmente por não termos nos despido. A mulher escancarava a boca em um ‘O’ redondo de tanto espanto.

― Não é o que estas pensando! ― Disse Denys.

Ah! Sim! A boa e velha desculpa do ‘Não é o que você está pensando’. É mais antiga do que muitos pensam. Aliás, é meio sem lógica, afinal é impossível se saber o que alguém está pensando ― Quer dizer, existem algumas exceções, duas que eu conheço, na verdade, mas isso eu contarei mais tarde. Votemos a minha narrativa.

Estávamos naquela situação constrangedora. Eu mal sabia onde enfiar a cara, eu queria cavar um buraco e me enfiar nele e depois jogar terra em cima. ― Hoje morro de rir ao relembrar a cara da criada, foi cômica, embora eu estivesse envergonhada demais para rir.

― O senhor Peter Wilson vai ficar sabendo desses disparates! ― Bufou a mulher e marchou para fora do quarto.

Okay, okay, hora da tradução: ‘Disparate’ significa absurdo; hoje é claro ninguém mais fala assim e poucos sabem o que significa. Eu não quis alterar a fala da criada trocando por ‘absurdo’, eu sempre acho muito hilário quando me lembro dela pronunciando, seria como matar toda a graça!

― Essa não! ― me desesperei; Se fosse hoje eu usaria ‘ferrou!’.

E então Denys olhou para mim tão assustado quanto eu.

― Acho que vai haver um casamento... em breve. ― ele disse hesitando. E eu sabia que ele havia comido a palavra ‘forçado’ da frase.

Contei até dez mentalmente tentando me acalmar. Não funcionou. Eu continuava lá feito uma tonta olhando para o nada.

― Renata. ― Denys me sacudiu. ― Você está bem?

― Eu... Eu... ― tartamudeei ― Não posso me casar! Não tão cedo.

 ― Eu te entendo. ― ele sentou-se ao me lado e abraçou meus ombros.

 ― Mas não tem jeito, não é? ― eu pedi.

 ― Assim que Berta contar ao papai, estará acabado. Teremos que nos casar. ― Lamentou.

 Minutos de silencio e tensão. Uma idéia me atingiu feito um raio, era desesperada e brilhante!

― Mas e se ela não contar. ― um pequeno sorriso malicioso surgiu nos cantos dos meus lábios.

― Ela vai contar, Re. Eu conheço a Berta, é uma fofoqueira.

― Você não está entendendo o que eu disse? ― Denys me olhou com cara de ponto de interrogação. Suspirei notando que teria que explicar; lerdo ― Vamos matá-la, Denys. A solução dos nossos problemas!

Ele me olhou assustado e levantou-se da cama em um pulo, como se tivesse levado um choque. Eu o olhei como se acabasse de propor um passeio tranqüilo pelo jardim.

― Você ouviu o que acaba de dizer? ― Seus olhos cresceram, não entendi porque parecia uma idéia tão absurda para ele. ― Matá-la, Renata? Matá-la? És louca? Saiu de um hospício?

Revirei meus olhos.

― Tem medo de quê?

― Medo? ― Ele bufou. ― Acha que tenho medo?

― É o que parece. Covarde! ― desafiei.

― Eu não sou covarde por dar valor à vida das pessoas alheias, Renata. Isso que sugeriu é egoísmo, é desumano! ― Surtou.

Se ele soubesse o que sou hoje, não ficaria tão espantado.

Eu tinha que convencê-lo. Só a idéia de entrar de vestido branco em uma igreja já me dava calafrios.

― Mas é o plano perfeito, Denys! Pensa bem. ― ponderei. ― Sem Berta, sem fofoca, sem comentários e, o principal, sem casamento! Não percebe? Se nos casarmos agora, perderemos nossa vida, nossa liberdade!

― Não será tão ruim. ― falou ele, pouco convincente.

― Fala isso só porque não será você que terá de cuidar da casa e dos filhos enquanto o marido trabalha! ― Bufei. ― Será um inferno!

― Prometo que não será, meu bem. ― ele se aproximou de mim e pegou a minha mão entre as suas. ― Nunca lhe faltará nada e eu jamais deixarei você sozinha. Apenas tire essa idéia maluca da sua cabeça, você não é assim, sabe disso.

Coitado. Eu rio tanto com coisas como essa! Na época, claro, eu realmente não era assim, quer dizer, não era tanto.

― Tudo bem. ― falei. ― Só por que é com você.

Que romântico e que clichê! Beijamo-nos apaixonadamente.

― Que tal continuarmos o que estávamos fazendo? ― ele sugeriu em meu ouvido, cheio de malícia recém descoberta. ― Vamos ter que nos casar mesmo por causa daquele simples amasso, então que tal fazer valer a pena.

― Gosto do jeito que você pensa. ― secretei enquanto Denys foi voltar a fechar a porta.

Claro que eu preferia ter matado Berta de uma vez, mas Denys não me compreendia, aliás, ninguém me compreendia. Então o negócio era aproveitar calada, afinal não seria tão ruim assim, se fosse para casar então que fosse com ele mesmo.

Voltamos a nos beijar loucamente enquanto ele me ajudava a tirar o meu espartilho.


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Notas finais do capítulo

Por favor! Um Review! - É a cara da miséria implorar por comentários, mas eu não tenho escolha, no momento.



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