Hermione saiu da Toca, um livro em mãos, seus olhos preocupados e estranhamente turvos,  o rosto contorcido numa agonia silenciosa que transmitia todo o seu desespero.

Não era assim que ela imaginara seu sétimo ano em Hogwarts, ao ver o castelo pela primeira vez. Ela se imaginava uma aluna brilhante; sem uma paixão secreta por Rony para te atrapalhar.  Não era amiga de Harry e achava Rony absolutamente imprestável, e, imaginava ela, que chegaria assim no seu último ano naquele castelo majestoso, encantador e maravilhoso.

Nada saíra do jeito que ela desejara. Logo, se tornara amiga de Harry Potter, e, consequentemente, Rony Weasley. Fora petrificada por um basilisco e ajudara um prisioneiro assassino (injustamente acusado) a fugir da cadeia. Beijara um jogador de quadribol famoso, mesmo prometendo a si mesma que beijo era uma coisa definitivamente nojenta... Criara uma organização ilegal dentro do próprio colégio—uma coisa que ela repudiava—e, no sexto ano, viu o amigo deliberadamente colar nos exames de poções silenciosamente, além de se morder de ciúmes do “imprestável” Rony Weasley. E ali, no que seria seu sétimo ano, ela não estava no colégio, e, sim, na casa de um amigo prestes à partir numa jornada da qual, provavelmente, ela não regressaria.

Suspirou.

_Porque nada foi do jeito que eu planejei? _ indagou ela, já distante da Toca, ajoelhada em meio a um pequeno lago deslizando as pontas de seus dedos na água suavemente.  _Porque tudo deu errado, porque eu simplesmente não pude ter uma vida normal?_

_Pelo simples fato de que não teria graça._ uma voz soou logo atrás dela, parecendo bastante séria.

Hermione se virou assustada, e deu de cara com Fred Weasley.  Como ela sabia que era Fred, a própria Hermione desconhecia. Mas sabia, e um fraco sorriso surgiu de seus lábios.

_Qual é a graça disso tudo, Fred?_ perguntou ela, enquanto ele se sentava ao seu lado. _Qual é graça de gente morrendo? Qual é a graça de ver tudo o que eu amo desmoronando, Fred? Qual é a graça?_

_A graça está exatamente no fato de que tudo é inesperado, Hermione. A vida não teria graça se saísse tudo nos planos!_

_A morte é algo realmente muito inesperado..._disse ela, com amargura. _Você não entende, Fred.  Nessa guerra, poucos de nós sobreviverão. E eu posso dizer que tenho medo de ser um deles. Muito._

_Bom, e você acha que eu não tenho medo também, Hermione? É o que eu mais sinto. Quando eu voltar para Hogsmeade, corro o risco de ser atacado por comensais, e, provavelmente, não sobreviver. E sabe? Eu não me preocupo mais. Minha meta é, e sempre foi, fazer as pessoas sorrirem. Eu, a começar por mim mesmo, tenho que dar o exemplo._ 

Ela sorriu fracamente, novamente.

_Hermione, você é brilhante, inteligente, o Rony te adora e o Harry te considera muito. Claro que a Gina vem na frente mas..._seu rosto ficou com uma careta desagradável. _ Enfim, você deveria tirar um pouco a cara desses livros e viver o que a vida te proporciona._

_E o que a vida me proporciona?_ perguntou ela, deixando o livro cair em seu colo e dedicando sua atenção unicamente para ele.

_Beijar muito... Curtir seus amigos... Se divertir... Se soltar...  Endoidar um pouco, não é mesmo? Todos nós temos o direito de ficar loucos às vezes não é mesmo? Chorar, rir alto, berrar, brigar..._

_Você realmente gosta de viver sua vida intensamente, não é? E fazer besteira... Beijar muito... Aham..._

_Hermione, você fala de beijo como algo repulsivo e tudo mais... Mas não fui eu que dei uns amassos no Vítor Krum..._

_Como você sabe?_perguntou ela, vermelha como o sol poente. _Eu não fiquei divulgando isso pra Deus e o mundo..._

_Gina contou. Sabe, não existem muitos segredos entre eu, George e Gina... Hermione, beijar não é crime, é exercício, emagrece, faz bem e é muito bom... Agora, só por curiosidade, há quantos anos você não beija?_

Ela ficou ainda mais vermelha, e não respondeu.

_Alguns, eu diria. E essa é uma das melhores coisas que a vida vai te proporcionar. Além de, claro, fazer algumas pessoas de idiota, mas isso fica á critério de cada um..._ele estava devaneando, e pareceu acordar. _O que eu estou tentando dizer, Hermione, é que você não precisa fazer essas coisas que eu falei, mas que você deve—é muito saudável—se soltar e se divertir. Senão, toda essa pressão vai acabar fazendo você explodir. Mas não se prive de beijar, é uma das melhores coisas que existe._

Dessa vez Hermione riu. Não um fraco sorriso, como os que ele via ultimamente, e sim uma gargalhada alta. O livro caiu no lago, e, silenciosamente afundou... Hermione parou por um minuto; olhou o livro, e, de repente, retornou ao riso. Fred parou, gozando do resultado de suas palavras. Afinal, conseguira realizar o favor que Rony lhe pedira: alegrar Hermione.

_Obrigada._disse ela, finalmente parando de rir. _Mas não tem muita gente pra beijar, aqui._

_Tem o Rony!_ sugeriu ele, animado.

_Quer ser azarado?_ ameaçou ela, muito vermelha, ainda.

_Que tal Bill?_

_Vai se casar daqui à poucos dias..._

_Você daria uma ótima despedida de solteiro, sinceramente..._

Ela deu-lhe um belo tapa no braço, ainda rindo.

_Charlie..._

_Eu poderia, mas acho que os dragões morreriam de ciúme._

_Harry?_

_Tenho amor à minha vida, Fred!_

_George?_

_Vai que explode uma bomba de bosta sem querer, e eu adoro meu perfume, obrigada._

_... Eu?_

Ela parou de rir e olhou-o, como se o analisasse.

_Temos três fatores impedindo nosso final feliz._ brincou ela.

_E quais seriam?_

_Angelina Johnson, Gemialidades Weasley, você é um bobo!_

Os dois começaram a rir juntos, como dois loucos, quando, de repente, Hermione abraçou Fred.

_Sei que Rony pediu pra você me alegrar Fred... Parabéns... Você conseguiu, Obrigada._

_Sempre que precisar, sabe-tudo._

Ela riu, e começou a se afastar, quando Fred puxou-a novamente e beijou-a.

Foi um beijo bom para os dois, mas estranho, principalmente pelo fato de que não era um beijo romântico. Era mais como se fosse um abraço, um gesto de afeto e o selar de um acordo. O que acontecera ali ficaria apenas entre os dois; aquilo fora só uma forma de garantir isso.

Quando se separaram, se encararam nos olhos e Fred sorriu. Hermione o acompanhou.

_Aproveite a vida enquanto ela existir Hermione.  Faça tudo o que puder fazer enquanto for possível. E se amanhã não houver mais chance? Não mora com remorsos, tudo bem? E, o que ocorreu aqui..._

_Fica aqui._ confirmou ela. _Além do mais, eu gosto de alguém. E você sabe muito bem de quem._

E encostando seus lábios nos dele como num singelo selinho, ela correu de volta para a Toca.

Fred fixou o livro que flutuava no lago e leu o título, curioso:

Felicidade e suas propriedades mágicas

Ele riu, e, pegando o livro, voltou para a Toca, sentindo-se leve como não se sentia à muito tempo...