1997 escrita por N_blackie


Capítulo 14
Adhara




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Atrás da longínqua alta torre de uma catedral gótica, o sol nascia melancólico. Os pés de Adhara estavam descobertos, e os dedos pálidos e gélidos roçavam na grama orvalhada de um dos morros da propriedade dos Black. A garota respirou fundo, e o cheiro da floresta lhe deu uma confortável sensação de familiaridade, antes de o peso do sétimo ano de Hogwarts lhe causar um breve arrepio.

Crispou os lábios numa risada contida, pensando nas inúmeras possibilidades que aquele ano traria, e amaldiçoou sua insônia por não estar completamente desperta para o primeiro dia de aula. Quis voltar para casa e comer alguma coisa, mas em vez disso simplesmente parou no meio de seu passeio, sentindo o vento arranhar suas pernas conforme lhe recordava de não vestir mais shorts para dormir.

Que diabo de verão é esse, resmungou para si mesma enquanto retornava a passos lentos para casa, cruzando os braços desnudos para se proteger do frio. Sentiu uma coceira na nuca quando chegou ao ladrilhado que dava nas celas inferiores da mansão, e quando ergueu o olhar, viu a sombra de seu pai na penumbra da janela mal iluminada, observando-a. Tentou sorrir, mas a expressão dele era de tensão.

Tensão. A palavra definia bem a atmosfera que rondava a casa nas últimas semanas, sempre rodeada de mistério, meias palavras idiotas e mais um monte de mentiras, ao gosto de qualquer Black que se prezasse. Adhara não costumava sentir raiva de seu pai, mas a atitude dele de isolá-la e deixa-la no escuro sobre o que o estava incomodando tanto a fazia nervosa e preocupada, pressentindo que, se continuasse assim, quando a bomba explodisse seria em seu colo.

Entrou vagarosamente na cozinha, e foi recebida com sorrisos e bom dias efusivos dos elfos que preparavam o café da manhã da família. Um deles se aproximou dela com uma xícara de café fumegante e duas fatias de bacon com ovos, e ela se sentou no balcão para comer. Depois de servi-la, os elfos simplesmente voltaram a fazer o que sempre faziam, e por um segundo lembrou-se de Hermione, protetora mor de todos eles, que ficara simplesmente indignada quando vira aquela cozinha. Mesmo depois de Marlene e Sirius lhe assegurarem que tratavam todos muito bem, e mesmo depois de os elfos confirmarem, ela ainda olhava desconfiada para todos sempre que os visitava,

Quando terminou, agradeceu ao elfo que lhe servira, e começou a refazer o caminho para seu quarto, passando por alguns quadros resmungões que reclamavam de suas roupas (“onde já se viu dormir nua assim! Vá por uma camisola, mocinha!”), e de seu cabelo (“Mas é um homem ou uma menina? Querida, faça um favor a si mesma e cresça essa juba, não vai arranjar marido nenhum desse jeito...”). Ignorou os comentários, e pensou em quanto poderia enrolar em sua cama até realmente precisar se vestir para pegar o trem, mas parou quando percebeu que Sirius a olhava novamente, só que parado numa poltrona da sala de estar.

Estava cansada e com frio, e sem energia para questioná-lo, então se limitou a ficar parada no lugar, olhando perdida para ele. Ficaram se encarando por algum tempo, e Adhara tentou ler no rosto do pai o que ele queria. Parecia desgastado, assim como todos os adultos que ela via ultimamente, mas um ar nostálgico ocupava seu olhar, como quando estava com saudades dela nos feriados em que voltava para casa. Só que não tinha motivo, ela passara os últimos três meses em casa.

“Pai, fala sério,” disse, fazendo menção de entrar no corredor, “me conta aí o que tá acontecendo, pai, por favor.”

Sirius se ergueu da poltrona, e por um instante Adhara pensou que fosse levar um bolo de novo. Contudo, dessa vez ele se aproximou, e sem dizer nada, a abraçou. “Pai, não tenta me dar a volta de novo...” sussurrou entre os braços de Sirius, e sentiu a risada profunda canina dele em seus cabelos. Aquilo a relaxou e irritou ao mesmo tempo.

“Pode confiar em mim, eu confio em você.” Se soltou dele, e Sirius baixou a cabeça. Demorou um pouco para ele responder, e quando o fez, foi num tom abafado.

“Eu confio, filhota. Não dormi hoje pensando em como te diria o que preciso.”

Adie olhou esperançosa para ele, e balançou a cabeça. “Abre a boca e diz, você e a mãe tão parecendo dois criminosos andando de futrica pela casa. Jack e Leo já repararam também. Me conta aí, eu posso tentar ajudar você, pai.”

“Você não pode dizer nada a seus irmãos sobre isso, Adhara.” A expressão carinhosa de Sirius endureceu, “é sério. Vou envolver você porque não tenho opção, mas não quero que Jacques ou Leonard fiquem sabendo. Se tudo der certo, vou resolver isso antes do natal, mas não quero que viaje para Hogwarts sem saber o que acontece. Fui claro?”

“Foi, foi, “Adhara pulou no sofá, dando tapinhas ansiosos a seu lado, mas Sirius não se sentou. Em vez disso, ajoelhou na frente dela, e balançou a cabeça dando uma risada fraca, “diga.”

“Primeiro, quero que entenda que ainda não tenho certeza até que ponto a situação está ruim, ok? O que eu sei é que tem alguma coisa oculta acontecendo, uma conspiração que provavelmente está sendo aprofundada nesse exato momento, enquanto eu exponho apenas as suspeitas de um grupo pequeno para você.”

“Metáfora, sério?”

“Sh, me deixa terminar. Adie, forças das trevas estão trabalhando para mudar o ministério, e Florian Fortescue é só o primeiro a desaparecer se eles conseguirem o seu intento. Eu e sua mãe lutamos na primeira guerra, nós sabemos farejar coisas assim, e posso te dizer que tem alguém manipulando os departamentos para acabar com a nossa raça. Os membros da Ordem da Fênix estão em perigo, e nós somos membros da Ordem.”

“Hum, James não é capitão de qualquer coisa dos aurores? Porque não diz pra ele?”

“Porque James também está sendo sabotado pelo ministério,” Sirius suspirou frustrado, “pode ser, pode ser que tenha outra guerra. O que eu quero é que você se cuide, e cuide dos seus irmãos. Bosta, eu não levo o menor jeito pra essas coisas, Adie. Cuida dos dois, e de você, tá legal? Se pegarem a sua mãe e eu, digo. Vocês são as três últimas pessoas decentes desse antro de cobras que é essa família decadente. Eu só não quero perder vocês, sabe.”

“Sei.” Adhara escorregou do sofá, sentando-se de frente para o pai no chão. Sirius se acalmou um pouco, e passou o polegar pelas bochechas dela.

“Você é tão parecida comigo, menina. Não vai fazer nada do que eu te pedi, vai sair atrás, vai querer se vingar... Se for fazer isso, é sério, tenta não fazer nada idiota. Não subestime os comensais. Além desse aviso meia-boca que estou te dando, quero te dar mais uma coisa para guardar.”

Adhara franziu a testa, e fixou os olhos nas mãos do pai, que começaram a tirar uma corrente que pendia de seu próprio pescoço. A jovem prestou atenção enquanto um pingente surgia de dentro da blusa do pai, uma bola pequena com um líquido preto esfumaçado dentro que se movimentava como vapor. Sirius olhou com firmeza para o amuleto antes de entregar a ela, olhando diretamente em seus olhos.

“Proteja isso, e se eu estiver longe, lembra que eu te amo, tá?”

“Eu vou lutar se precisar, hein.”

“Eu sei.” Sirius sorria, mas não tinha alegria nos seus olhos.


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