Bendita semana em que tivera que madrugar e trabalhar em um horário mais cedo que o de costume. Bendita a cafeteria próxima a sua nova casa. É, ele havia mudado para aquele bairro havia o que? Três meses. Sim, pouco tempo, mas já se sentia acomodado e sua casa, era um lar.

Naquela manhã há exatamente 56 dias, ele se lembrava muito bem. Estava tomando seu café em uma mesa do canto, quando ergueu seus olhos e viu aquela mulher entrar. Parecia até mesmo que ela andava em slow motion, seus cabelos castanhos se mexiam enquanto ela se movia em direção ao balcão de pedidos. Ele sentia uma familiaridade não natural, uma sedução automática...

Será que amar sozinho
vai ser a minha sina
já conheço você,
bem mais do que imagina.

A partir deste dia, todos os dias naquela semana que ele foi obrigado a ir mais cedo ao trabalho, ele cruzava com aquela mulher misteriosa, que o encantava ao passar. Sim, ele podia ir lá e tentar se apresentar a ela, convidá-la para tomar o café ali, com ele, mas a cada dia que passava aquilo se tornava mais difícil. Imaginar a personalidade dela se tornava um jogo perigoso que ele se envolvia cada vez mais.

Será que ela tinha namorado? Não, não usava aliança. Será que morava ali perto? Era possível pela frequência religiosa, inclusive em fins de semana, em que ela comparecia a cafeteria. Algumas outras características que ele podia notar naqueles rápidos encontros eram como ela mexia no cabelo enquanto escolhia seu café todas as manhãs, como em algumas ocasiões ela parecia carregar um mundo de preocupações em sua feição e em outras sorrir com facilidade para o atendente ou alguém que passasse por perto.

Com o tempo, só as coisas que via não era suficiente, ele queria mais... Saber o nome de seus pais e irmãos, se é que tivesse. Qual é seu filme favorito, seu signo, aniversário... Queria fazer parte da vida daquela mulher que tanto o encantava de longe.

Sua cor preferida é o verde,
seu aniversário é dia 3,
adora mexer no cabelo,
curti rock, fala inglês.
Odeia filme de terror,
canta e toca violão,
tem ciúmes dos amigos,
tem medo de escuridão...

Ele tinha consciência de que aquilo se tornara muito perigoso, principalmente quando começou a sonhar com ela. O seu dia se tornava mais alegre ao vê-la, e isso se tornou um vício, uma dependência. Queria saber seus medos, desejos, sonhos. Tudo o encantava, seu jeito de andar, seus olhos castanhos, suas roupas, suas longas pernas que ficavam lindas naquelas saias que ela usava. Tudo naquela mulher era quase um mito, platônico, longe de ser alcançado.

Ele queria ela... era engraçado dizer que sem conhece-la, ele poderia amá-la? Aquela mistura de mistério e beleza era muito intenso, traduzindo em um sentimento de paixão e vontade.

Ahhh, eu amo você.
Teus segredos,
vou aprender a decifrar.
Teus desejos,
me ensina a realizar.

Estava decidido, no dia seguinte ele iria falar com ela. Podiam ser amigos, ser amantes, namorados... qualquer coisa, mas ele tinha que saber como ela era.

Será que todos os seus pensamentos, hipóteses e suposições eram verdadeiras? Tudo aquilo que imaginara se tornaria real ou era apenas um sonho? A mulher de sua vida, uma amiga ou apenas uma conhecida? Ou ela apenas iria rechaça-lo e ele nunca poderia conhecer o que idealizava tanto.

Só uma coisa podia lhe trazer a inteira verdade... e essa coisa era ter a coragem de falar com ela.

Tudo o que sentia era um nervoso sem fim, uma corrente de calafrios passando por todo o seu corpo, um frio na barriga, borboletas flutuavam em sua mente, barriga e coração. Ele a tinha estudado há quase 2 meses, ele não poderia esperar mais, tinha que saber a verdade.

Eu te estudo,
te admiro, te espero.
Será que um dia vai me amar?

- Bom dia! – disse ele sorrindo incerto.

- Bom dia! – disse ela virando o rosto com curiosidade e abrindo um sorriso sincero.

Aquele era um bom dia, e iria tornar muitas outras manhãs melhores.