Takashima Kouyou estava concentrado conectando alguns fios num amplificador que tinha dado problema naquela manhã quando Uke Yutaka entrou com uma revista nas mãos.

            -- Já tá terminando aí, Uru?

            -- Ainda não – Kouyou continuou olhando para os fios.

            -- Você leu isso? – Yutaka mostrou a revista.

            -- O que é isso? – Kouyou perguntou, sem olhar o que Yutaka lhe mostrava.

            -- A entrevista do Aoi. Você leu?

            -- Qual entrevista do Aoi¹? – Kouyou riu.

            -- Essa aqui na minha mão. Olha quando eu to falando com você, né, Uruha? – Yutaka disse impaciente.

            Kouyou ergueu a cabeça e olhou poucos segundos pra capa, voltando a se concentrar no amplificador em seguida.

            -- Não, não li.

            -- É melhor ler então! – Yutaka disse sério.

            -- Tá bom. Deixa aí que eu leio...

            -- Não, Uru, não – Yutaka voltou a ficar impaciente. – Você tem que ler agora!

            -- Por quê? Ele disse alguma coisa sobre mim? – Kouyou encarou a expressão séria de Yutaka com diversão.

            -- Leia – Yutaka colocou a revista nas mãos de Kouyou e saiu, deixando o guitarrista preocupado.

            -- O que será que o Yuu disse que deixou Yutaka tão preocupado? – Kouyou encostou-se ao amplificador que arrumava e procurou a entrevista de Yuu.

            Perguntaram a ele sobre amizade, amor, família, como ele tinha começado a tocar guitarra... Até que Kouyou encontrou a parte que Yuu falou sobre a banda. Então entendeu o que preocupou Yutaka:

“Por alguma razão, Uruha está meio distante de mim ultimamente. Eu não sei se é porque eu sou mais velho ou se é porque nós dois tocamos guitarra, ou o quê”.

            Kouyou levantou-se no mesmo instante e foi até a sala de som onde Yuu estava.

            -- Isso aqui é sério? – ele vociferou, fechando a porta e Yuu se virou.

            -- O quê? – Yuu perguntou, confuso, desviando a atenção dos diagramas que preenchia no computador e viu a revista na mão de Kouyou. – Por que estava lendo isso?

            -- Kai disse que eu precisava ler e se ele não me dissesse eu não saberia, né? Então, é realmente o que você acha ou só falou isso pra vender revista? – Kouyou não estava gritando, mas seu tom de voz era ríspido e seco.

            -- Eu não quero discutir isso agora, tá, Uru? – Yuu se virou e ia voltar ao seu trabalho, mas Kouyou virou sua cadeira com força e jogou a revista em seu colo.

            -- Não vem com essa, Aoi. Você sempre dá um jeito de fugir, tá vendo? – Kouyou sentou-se diante do outro guitarrista.

            -- Acho que não sou eu que ando fugindo, Uruha! – o tom de voz de Yuu tornou-se ríspido também.

            -- Que história é essa de ficar nervoso antes de me mostrar uma música nova? Eu tenho medo de você!

            -- E por que você teria medo? – Yuu perguntou com desdém.

            -- Porque você intimida as pessoas! – Kouyou estourou.

            -- Eu?!

            -- É! Você e esse seu perfeccionismo! Seu jeito metódico e sistemático de fazer tudo no último nível possível! E possível apenas pra você!

            -- Faço isso pra você não me criticar! Pra que não chegue à conclusão de que eu sou completamente descartável!

            -- Ah, não faz drama, Yuu!

            -- Viu?! Por isso disse que está me afastando!

            -- E não passou pela sua cabeça que eu estou fazendo isso pra pararem os boatos que atrapalham tanto nossa vida? Pra pararem de supor que somos um “casal”?

            -- Não, porque eu achei que, se fosse isso que você estava fazendo, você me diria!

            -- Ai, seu babaca! Você sempre foi mais velho que eu, nós já somos guitarristas na mesma banda há muito tempo! Foi só isso que esse seu cérebro conseguiu supor?

            -- Eu to pra fazer 30 anos, Uruha, é esse o ponto que eu pensei! – eles estavam quase gritando.

            -- Ai... Crise de meia idade... Pelo amor de Deus, né, Yuu! Poupe-me!

            -- Vê se não enche – Yuu deu as costas ao amigo.

            -- Se não é crise de meia idade o que é então? – Kouyou perguntou, a voz carregada de sarcasmo.

            Yuu não se virou.

            -- Talvez eu não me encaixe mais no perfil da banda...

            -- É, um velho “trintão” numa banda de “adolescente” – Kouyou zombou e deu um tapa na cabeça do amigo pra que ele se virasse. – Você é um babaca mesmo! Já percebeu que, se olharmos o conceito original da banda, nenhum de nós mais se encaixa no seu perfil? Já nos tornamos cinco “tios”! Mas, se as meninas ainda gostam...

            Yuu ainda olhava feio pra Kouyou pelo tapa que este lhe dera. O mais novo revirou os olhos e balançou a cabeça.

            -- Quem vê, pensa que eu sou o mais velho de nós dois...

            -- Você não se afastaria de caso tão pensado assim – Yuu acusou.

            -- Eu não me afastei de caso pensado! Mas também não é porque não aguento mais você aqui! E obrigado por insinuar que eu sou desatento...

            -- Você é desatento, Uru, não foi insinuação – Yuu começou a rir, mas a conversa ainda estava tensa.

            -- Viu porque as fãs acham que somos um casal? Você fica emburrado e me força a vir “discutir a relação”!

            -- Você não foi forçado a nada – Yuu deu as costas novamente a Kouyou. – Podia ter ignorado o que eu disse.

            -- Pra você jogar na minha cara que estava certo? Não, obrigado!

            -- Já terminou o que veio fazer aqui?

            -- Acho que não, né? Vai Aoi, deixa de bobagem...

            -- Tudo bem. Você não está me afastando. Já entendi.

            -- Por que tudo com você tem que ser tão difícil?

            -- Não estou dificultando nada. Mas eu ainda tenho muita coisa pra fazer aqui – ele respondeu rispidamente.

            Kouyou apoiou os cotovelos nos joelhos e pressionou as têmporas com força, de olhos fechados.

            -- Kami-sama, me dá paciência...

            -- Não se ofenda, Uru, mas você está mesmo me atrapalhando.

            -- Insensível— Kouyou forçou uma voz esganiçada. – Eu venho aqui acertar as coisas e você me manda embora? Cavalo²! – nenhum dos dois aguentou e ambos riram. – É sério, Yuu, as coisas estão numa boa³ entre a gente?

            -- Estão sim.

            Kouyou deu um tapinha no joelho do outro guitarrista e depois de um tempo em silêncio, deu um sorriso diabólico.

            -- O que foi? – Yuu perguntou desconfiado.

            -- Quer ir almoçar? – ele soltou uma gargalhada e Yuu sacudiu a cabeça encabulado antes de saírem juntos pra almoçar.