Bill

    Deixei o gosto amargo do cigarro tomar conta dos meus lábios. Debruçado sobre a varanda podia ver a rua abaixo de mim,as pessoas que passavam sem aparentes preocupações, ouvindo apenas o barulho dos carros e da cidade. Fiquei observando os pequenos desenhos feitos por aqueles pequenos fios de fumaça que saiam por meus lábios entre abertos. Fazia frio aquela noite,mas eu não me importava,queria que ele sentisse a sensação mais uma vez,estava torcendo pra que aquela ligação ainda existisse entre nós.
            Eu faria o que era certo.Deixaria de ouvir qualquer outro sentimento,apenas a razão. Sim, doía. Sentia meu coração apertar cada vez que olhava o relógio,faltavam poucas horas agora.Apenas duas.E seria o fim.Eu tinha desistido do meu próprio irmão,mas também de mim.Porque uma parte minha iria hoje com ele.Aquela parte responsável por me manter vivo.Passei sem pressa a mão no rosto,enxugando as lágrimas que haviam caído com as lembranças. Joguei o que havia sobrado do cigarro no chão e passei os dedos por entre os fios desarrumados na tentativa de parecer um pouco mais apresentável. Entrei e deixei meu olhar percorrer pelo apartamento ao qual não voltaria mais.

-Bill,to indo- Tom passou por mim,pegando as chaves do carro em cima da mesinha.
-Volta que horas?
-Não volto hoje.- e deu aquele sorriso que apenas o Tom sabe dar.

  E ele não voltou.Naquela mesma noite Tom sofreu um acidente a caminho da boate.Antes de me ligarem eu sabia que ele não estava bem.Coisa de gêmeos.Tom entrou em coma.Nos últimos seis meses,minha rotina se resume a ficar no hospital.A banda não podia continuar sem o seu guitarrista,e eu não podia continuar sem o meu irmão.Minha vida se resume ir até lá e ficar do seu lado,esperando ele acordar.Eu sei que ele só precisa de um tempo,mas os médicos acham que está na hora de por um fim nisso tudo.Essa noite,seria a sua última noite.