O Pianista escrita por raics


Capítulo 1
Só restaram lembranças




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Já era noite quando ele acordou. O relógio marcava 02:35. Edward calçou o chinelo e devagar, abriu a porta, os olhos denunciavam o temor de acordar o pai que certamente não iria gostar nem um pouco. Passo a passo ele desce a escada e vai à cozinha tomar água. O silêncio era tamanho a ponto do som da água entrando em seu corpo ser perceptível. Pela janela Edward vê um gato branco passar lentamente, cena essa que chama a sua atenção e o leva a continuar vendo.

            - A mamãe adorava gatos, falou o jovem que com os olhos cheios de lágrimas parecia estar flutuando.

            Como se estivesse enfeitiçado, ele abre a porta e sai. As ruas escuras e tranqüilas da pequena cidade de Florence naquele dia estavam ainda mais sóbrias. Edward não conseguia entender porque o pai se mudou de Mason City, metrópole onde “tudo acontece” para um lugar interiorano e tão pacato. Ele não entendia, mas aceitava numa boa, é que diferente dos outros jovens na faixa dos dezessete anos, ele adorava o silêncio, a solidão e até mesmo o frio que tanto reclamava o pai, Heitor, homem na faixa dos quarenta anos, vivia a reclamar pelos quatro cantos da casa do excesso de morbidez da cidade. Edward seguia o gato que parecia chamá-lo, convidá-lo a continuar seguindo-o. O jovem vai parar numa rua sem saída, de frente pro gato não diz uma só palavra e olhando no seu olho vem em mente as mais remotas lembranças de quando ele ainda era pequeno e recebia carinho e aconchego de Virgínia, sua mãe, que habita o seu imaginário e seus mais profundos sonhos. O momento mágico que naquela hora ele vivia termina com uma pedrada na cabeça. Três jovens alcoolizados atacam o jovem e o xingam de “princesinha” e “garoto esquisito”.

            Edward chega em casa com a cabeça sangrando e é “recepcionado” pelo pai:

            - Quantas vezes eu vou ter que repetir que eu não quero você vagando por essa cidade à noite, é perigoso garoto! –Esbravejava Heitor, que olhando para as mãos de Edward enxerga o sangue e corre pra ajudá-lo perguntando o que aconteceu.

            - Não foi nada pai, vamos dormir, já é tarde, eu estou bem.

            Heitor pega Edward pelo braço e começa a jogar água gelada na cabeça dele alegando que vai melhorar, não para de reclamar um só minuto.

            - Mas que espécie de homem você acha que é? Deixa que eu respondo: Fraco! Covarde! Só é eu dar as costas pra você apanhar do primeiro filho-da-puta que aparece. Cada vez eu tenho mais certeza de que você não é meu filho, de que nós não temos o mesmo sangue.

E são com essas frases, esbravejadas por Heitor, que Edward vai dormir, para logo no dia seguinte acordar cedo e ir à escola. No café da manhã eles estavam à mesa, sem que nenhum deles rompesse o clima de silêncio que estava instalado. Heitor pergunta o que ele fazia na rua a noite. Edward sabia que se contasse a verdade iria se expor ao ridículo e mente dizendo que estava sufocado e saiu para tomar um ar, “agora eu preciso ir, ou vou me atrasar pra pegar o ônibus”.

Já era tarde demais, o ônibus tinha acabado de passar e ele, desesperado, correndo pelas ruas, gritava quase que implorando para que o motorista parasse. Da janela, alguns rapazes metidos a gostosos só porque jogavam no time de basquete da escola, faziam chacota do jovem.

Na escola, assim que chega à sala de aula, ele dá de cara com Francine, a garota dos seus sonhos, loira dos olhos azuis cor do céu em dia ensolarado, corpo bem definido e lábios de mel. Ela tinha namorado, mas mesmo que não tivesse nada iria mudar, tímido do jeito que é, as chances de Edward declarar-se para ela eram quase nulas. Em duplas, a professora de biologia fazia um trabalho usando o corpo humano. Só restava a ele sentar-se com Daília, a menina mais estranha do colégio, mas como ele não era de observar muito aparência, levou isso como uma boa. Uns caras desenhavam corações e insinuavam para toda a turma o romance entre eles. Todos riam da situação e Daília adorava aquilo tudo, Edward não.

O único amigo de Edward na escola era Tarso, descendente de japonês, ele era motivo de piada por todos. Naquele dia, no fim da aula, quando Edward estava indo em direção ao ponto de ônibus, encontra o amigo no centro de vários rapazes que o empurravam e o cuspiam. Indignado com a cena que deparou, ele não pensa duas vezes antes de ir à luta para proteger o amigo. Com gás total, ele chega e dá um soco na cara de um deles impressionando a todos que não esperavam essa reação. Aproveitando a imobilidade dos caras que ainda estavam surpresos, ele pega na mão de Tarso e os dois saem correndo rumo ao ônibus que estava prestes a sair. Eram perseguidos pela gangue que tinha sede deles. Edward e Tarso conseguiram chegar a tempo e escapar de uma surra que estavam prestes a levar.

Em casa, Edward estava deitado no chão do quarto ouvindo clássicos de Beethoven e fazendo desenhos aleatórios, do planeta, de pessoas, animais. Cada desenho que fazia, amassava e jogava fora. Na sala o pai tomava cerveja enquanto assistia a um jogo de futebol. Falava palavrões e reclamava cada vez que o time pelo qual torcia errava algum passe ou tomava um gol.

- Edward! Edward vem cá! Edward! Gritava Heitor que sobe as escadas e vai até o quarto do garoto. – Quantas vezes eu tenho que te chamar seu alienado! Louco! Vive trancado nesse quarto ouvindo essas músicas ridículas!

- Me deixa em paz pai! Por favor, sai. Sai agora.

- Eu só vim aqui te chamar pra fazer companhia a mim, fazer um programa de homem, assistir jogo de futebol e tomar cerveja. Você sabe o que é isso, não sabe?

- Sim pai, eu sei, mas prefiro ficar aqui. Obrigado pelo convite.

- Ta! Fica aí vai! Ouve essas músicas de bicha e continua fazendo as drogas desses desenhos, agora tenta pelo menos disfarças essas manias estranhas pra depois meus amigos não ficarem por aí comentado que eu to criando um... Ah, deixa pra lá. Eu vou indo.

Aquela tarde Edward passou como todas as outras de sua vida, alternava leitura com desenhos, escutava música e pensava na vida. Nos mistérios da vida, o que acontecia depois da morte, se estamos realmente sós no mundo, porque pessoas boas vão embora tão cedo. São assuntos para se pensar. Eis que a ultima pergunta despertou em Edward uma curiosidade e ele desce para saber do pai o que realmente aconteceu com sua mãe. Heitor prefere não falar no assunto, Edward insiste mas é ignorado. Irritado, Heitor sai de casa reclamando do filho que só pensa na mãe. Sozinho em casa ele liga a TV para assistir. O telefone toca e ele atende.

- Alô, Edward?

- Sim, sou eu, quem fala?

- Que bom que você está. É a Francine, a sua colega de sala. Você sabe quem eu sou, não sabe?

Naquele momento Edward tremeu as pernas, o coração começou a bater forte e as mãos logo começaram a suar. São esses os sintomas de quem é refém de uma paixão e dá de cara com o seu grande amor. Mas o jovem não estava nem um pouco perto de sua amada mas já delirava e sonhava em poder tocá-la. Gaguejando, ele responde que a conhece sim e a conversa continua.

- É que eu estou com dificuldade em matemática, você sabe, geometria analítica é realmente bem difícil e estou com medo de tirar nota baixa na próxima prova, então eu queria saber se... Se de repente você podia me ajudar.

- Nossa, seria um prazer. Claro. Eu te ajudo sim. Mas quem te disse que eu sou bom nessa matéria.

Francine fica apreensiva, mas responde depois de um tempo:

- Ué, nós somos colegas e eu não pude deixar de reparar seu bom desempenho em matemática. Mas então, você topa mesmo?

- Sim, a que horas e em qual lugar?

- Eu te espero na praça dos leões para podermos ir juntos, é que concerteza você não sabe onde fica minha casa. Às sete da noite ta bom pra você?

- Sim, às sete da noite nos encontramos.

A conversa termina com Francine mandando um beijo para Edward, a felicidade finalmente havia batido na sua porta. Finalmente ele iria sentir a sensação de dar um beijo, de poder sentir uma menina, ainda mais a garota dos seus sonhos. Era tudo bom demais para ser verdade e logo ele ficou em dúvida se não estava sendo vítima de um plano, e o pior, ficou com medo da reação do namorado da jovem, mas como eles apenas iriam estudar, Edward não viu nenhum mal nisso.

Apesar dos receios que tinha, estava mais que disposto a ir, era o seu sonho começando a se realizar. Só restava a Edward esperar o tão sonhado momento acontecer e ver no que tudo iria dar.


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Notas finais do capítulo

Galera, desde já agredeço a quem leu e peço desculpas caso tenha cometido alguns erros ortográficos.
Continuem acompanhando, ainda há muito por vir.



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