De Nova York ao Brasil escrita por Babyi


Capítulo 1
Miranda




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Era isso. Troquei Manhattan pelo Rio de Janeiro. É meio sem comparação, sei que eu sou daqui, mas é irritante o fato que troquei de escola, de casa, de país, de língua, de tudo com o Rio. Mas essa é minha vida.

Eu sou Miranda Tine, uma brasileirinha de 12 anos que no primeiro ano de vida foi arrancada do país natal(pelos pais) e levada a paris, com a desculpa que seus pais arranjaram uma oportunidade de trabalho imperdível. E que então 6 anos depois foi levada a Nova York, Manhattan, e então retorna infeliz ao Brasil por causa de outra oportunidade melhor ainda. Isso é ruim.

Eu sei falar português numa boa, até porque com meus pais eu só troco palavras em português. Eu fui criada em um sistema Bilíngue: Com meus pais e meu irmão - sim, eu tenho um irmão- eu falo português, e no resto eu falo Inglês ou Francês, depende do caso. Mas oque eu vou fazer com meu parle voux france? Ou com meu Yes, i speak inglish? Eu demorei 12 anos para aprender essas línguas, e não quero jogar todo esse esforço fora!

Era isso: Eu definitivamente estava trocando Nova York – e o melhor pais do mundo- pelo Rio de Janeiro.

 

Eu olhei pela janela do avião. Estávamos em cima do mar, que confesso; era até que bem bonito e limpo,em comparação com o que banhava Nova York. Até porque se você ver o Rio East ou o Rio Hudson, você vai ver todo o tipo de lixo e esgoto nadando nele. Mergulhar neles então... é como pedir para ter um terceiro olho ou virar mutante! O mesmo serve para a água da baia.

O avião estava descendo, e eu só via água! Só faltava o avião ser um aeroplano e aterrissar na praia.

—Miranda- disse meu irmão, Jack Tine - o aeroporto é uma ilha!

“Claro, porque não?”pensei. “Um aeroporto como ilha, porque não?”

Eu olhei pela janela e confirmei. O aeroporto era sim uma ilha! E como sempre a água por baixo do avião apresentava um repuxo especial, gostoso, a água da baia de Nova York e as águas que banham a França mexiam assim. Pelo menos isso era como em casa.

—O aeroporto se chama Santos Drummond.- disse minha mãe- Você leu sobre isso na escola, não leu? Mir.- Mir, é estranho mas eu gostava quando minha mãe me chama de Mir. Só minha mãe tem esse direito.

Estávamos já quase parados na pista. O avião seguia devagar, e eu que não tinha medo de quase nada alem de animais venenosos, estava me derretendo por dentro porque eu tinha medo do avião não parar e todos presentes morrerem afogados. É mais ou menos oque você sente quando está em uma montanha russa: Você morre de medo de cair e tudo mais, mas você sabe que as provabilidades disso acontecer são menores de você ganhar na loteria.

Minha mãe e meu pai sentaram separados, mais ou menos, da ordem da janela para o corredor: Eu, Jack, mamãe e do outro lado do corredor papai. Ele não se incomodava em ir sozinho no outro lado do corredor, só queria ficar longe da janela. Ele morre de medo, a ponto de querer vir em um cruzeiro para cá(o que não seria má ideia), mas mamãe disse que chegaríamos mais rápido aqui de avião... etc.

Eles me tiraram da escola no meio das férias escolares, no dia 13 de fevereiro então eu quando entrar na escola devo estar meio perdida na matéria, até porque eu não sei oque eles estudam em nenhuma matéria porque aqui é o Brasil: País do pior escritor que eu já li. É interessante que o único escritor brasileiro que é lido no Estados Unidos é um tal de Paulo Coelho. Caramba, o cara é péssimo!

O avião pousou e eu rezei em agradecimento a todos os supremos que eu conheço. E quando a porta se abriu eu praticamente disparei em direção à porta e quase cai da escada, se o Jack não tivesse me segurado- valeu Jack !- eu não sei onde estaria agora. Mas isso foi apenas um erro provocado pela falta de informação. Eu estou acostumada com aviões, já viajei os EUA inteiro à passeio e sempre que eu descia tinha um túnel que levava até o aeroporto, não escadas!

—Mãe, pai.- eu disse- podemos, pelo amor de deus, buscar minha mala e sair logo daqui?

Eles se entreolharam.

—Bom se é isso que você quer...

—Ótimo. Onde é que a gente pega as malas?- perguntou Jack. Eu acho que ele sentiu a mesma vontade de sair de lá que eu.

Estava muito sol, eu usava uma calça jeans, uma blusa dolce e galbana e um casaco super pesado- Não é culpa minha se eu não estava interessada no clima internacional quando sai de casa- então assim que eu pisei fora da sombra senti como se estivesse em um forno em temperatura alta. Alem de parecer deslocada na imagem.

Pegamos um micronibus até o aeroporto, mas eu preferia ir a pé, alem de eu estar vermelha de tão quente, no micro-ônibus não faltava calor humano e eu não sabia que a velocidade que carros e ônibus no estacionamento de aviões não podia passar de 1 km por hora. E depois de uma eternidade entramos no aeroporto.

Graças a deus! Pelo menos o aeroporto tinha ar-condicionado. Eu andei alguns metros para a sombra e quase ia adentrando no aeroporto quando meu pai disse para eu parar e esperar o Jack.

—Papai, eu não sou mais criança...

—Não é isso, Jack quer mostrar a você seu carro novo.

—Ca...ca ... ca ...carro novo?- eu disse. Eu gaguejei porque um carro novo era tudo oque eu precisava para ir ao colégio em alto estilo. Jack dirigia desde que fez 16 anos, mas desde lá ele só dirigia uma Brasília, como chamam aqui. De qualquer forma é um carro muito velho, e fora de moda, por isso eu preferia pegar o ônibus à andar naquele carro caindo aos pedaços.- Vamos!

—Não quer pegar as malas primeiro?- disse minha mãe.

—Vocês me fazem esse favor?

Antes que eles pudessem responder, eu sai andando, puxando Jack comigo. Ele passou a mão por volta do meu ombro, e isso foi meio estranho porque eu tenho 13 e ele tem 21. mas afinal ele era meu irmão e tudo mais.

Algumas garotas olhavam enciumadas para mim, e depois sorriam para o meu irmão, que reagia as ignorando. Eu retornava com um olhar de superioridade, que as fazia perguntar entre si se eu era irmã dele, amiga ou namorada.

O aeroporto parecia enorme para mim, mas o Jack andava com tanta confiança por ali que eu me senti com uns 5 anos de idade.

—Jack, como você conhece todo esse aeroporto? - eu disse

—Antes de você nascer, eu tinha uns 6 anos de idade quando eu me perdi aqui. E eu achava que sabia tudo e comecei a andar procurando papai e mamãe.

—Oh deuses,- disse- Deve ter sido ridículo ver um menininho andando sozinho no aeroporto, agindo como adulto.- eu falei isso brincando, e tenho certeza que ele entendeu o recado, mesmo assim ele tirou a mão do meu ombro e me deu uma cotovelada.

É impressionante como o aeroporto em que eu estava era tão diferente do que fui em Nova York: tinha tantas lojas! A maioria era era uma cópia das Americanas, mas no resto fiquei impressionada com as roupas, e com os perfumes, mas oque eu mais gostei foi o cheiro das lojas de pão de queijo. Era delicioso.

Depois que passamos pelo corredor vi uma porta transparente que do outro lado estava sombra, mas aquela sombra com sol. Você entendeu, certo? E por ali fomos.

Em comparação com o estacionamento do Empire State , ou do Crisler era pequeno, então se você coloca- lo do lado do Nova York Port Center, vai ver que ele era minúsculo.

— Qual         desses é, jack?

—Aquele ali na frente.- disse ele apontando – Gostou?

Eu espremi a vista, estava tanto calor que dava vertigem. Mas eu consegui ver um Mazerati Spyder conversível amarelo. Só faltava eu babar, esse carro era o carro que eu queria ter! Era o meu carro!Mas até que chegar, com ele na escola, de motorista não seria má ideia.

—Se gostei? Eu amei. Adorei. Idolatrei! É tão... tão...- Nos nos aproximamos do carro.- É tão... Ual!

Eu abracei o capô do carro, me esquecendo que como estava quente todo o metal do carro estaria fervendo e então soltei um gemido.

—Não se importaria de me levar para a escola algumas vezes, né?- perguntei.

Ele         soltou um risinho, que considerei como sim.

Eu entrei no carro, e mudei para o banco do passageiro. Olhei tudo. Os painéis, o vidro, o câmbio, os bancos. Tudo era tão incrível!

— Vamos?- disse a Jack. Eu abri a janela, e ele tirou o casaco e jogou dentro do carro, então se pôs de pé como um farol, olhando para um ponto fixo. A tatuagem de dragão dele reluziu diante do sol.

—Não está se esquecendo de nada?- ele disse. Eu segui seu olhar. Ele estava apontado para um casal que colocava as malas no carro. Só para constar: o casal não era meus pais.

—Malas, pais...- desesperei-me.

Jack         riu.

—Calma caçulinha, você está com o celular ai, certo?

Até tinha me esquecido que estava com uma bolsa. Coloquei a mão lá dentro e tateei; encontrei um monte de balas de menta ainda não abertas, a caneta do meu laptop e enfim o celular. E o desbloqueei . No mesmo instante, depois de passar uma fração de segundo eterno, recebi a notificação de 13 novas mensagens, deveriam ser dos meus amigos de Nova York, mas não as li porque o celular começou a vibrar.

—Alô?- disse

—Oi filha. Aqui é a mamãe.- mas ouviu- se ao fundo alguma coisa como “E papai também!”- estamos no estacionamento, chegando ai. Já dá para te ver!

Então         desligou o celular.

Já dava para ver a BMW dos meus pais. Eles seguidos por um guincho de reboque porque Jack ainda não tinha nacionalizado sua licença de motorista.

—E então gostou do carro?- perguntou meu pai.

—Esse é o carro dos meus sonhos!- disse- o único problema é que não é meu!

—Te dou um desconto.- disse Jack piscando para mim.

—         Vamos?- disse minha mãe.

Subi no banco de trás da BMW, colocando o celular na bolsa. Jack se pôs ao meu lado, só que da janela. Era difícil ver a família Tina junta, sem que o carro explodisse!

—É o seguinte:- disse meu pai - Suas aulas, Miranda, começam amanhã. No colégio Bandeirantes. Tia Valda irá comprar o uniforme, e botamos você no período matinal. Quanto a você Jack, terá suas aulas no período noturno, na faculdade de biomedicina e veterinária Santa Rosa. E vocês dois vão ficar na casa da tia Valda enquanto toda a mudança não estiver completa. Perguntas? Não? Então já posso começar a contar minhas piadas sem graça.

 

Logo que cheguei a casa da tia Valda me senti mal, tive que me esforçar para as lágrimas não pularem dos meus olhos. Era uma casa na zona sul do rio. Me lembrava as mansões que eu via em Hollywood. As malas pareciam querer arrancar meus braços, e nessa, nem Jack para me ajudar.

—Oi querida.- disse tia Valda assim que saltei do carro- Como vai minha Nova York?

“Minha Nova York”era assim que eu nomeava a minha antiga cidade. Eu quase cai em prantos. Mas respondi.

—Sinto falta dela!- eu me virei para ver o carro em que estavam Jack, papai e mamãe sumir na poeira do horizonte. Eles tinham muito oque fazer, alguma coisa do tipo nacionalizar os documentos.

—Sei disso querida.- disse ela me abraçando- deixe que eu pegue essas malas. Deve estar cansada. Mas eu fiz uns biscoitinhos e...

—Tia Valda. Eu quero dar uma volta, conhecer a região. Se importa de me acompanhar?

Tia Valda fez uma expressão de surpresa.

—Bom... se é isso que você quer... sinta-se em casa!

Ela pegou minhas malas, e nós duas subimos para o meu quarto. Ela deixou minhas roupas no armário e foi para a cozinha pegar os biscoitos. Eu abri minha mala, e fui tirando todo o seu conteúdo e pendurando nos cabides que pendiam no armário.

Eu pendurei meu casaco e troquei de roupa, para um shorts e uma blusa regata branca. Mas quando eu terminei de esvaziar a mala, cheguei ao fundo e vi um porta-retratos que eu esqueci de embrulhar em plástico bolha, com uma foto de Charlie Bekendorf . Ele era meu melhor amigo, só que eu queria ser mais do que amiga dele, mas ele começou um intercâmbio não sei para onde. Eu comecei a chorar, todas as chances que eu tinha, com ele ou com qualquer gato de Nova York estavam completamente encerradas.

“Esqueça ele, Miranda”pensei “desencana, segue em frente, esquece ele. Talvez você ainda tenha chance com algum mané da região!!”. Eu entrei em crise. Comecei a andar pelo quarto e sempre que virava em direção à janela eu encontrava com os olhos aquele porta retrato quebrado, e a foto que estava nele. Após algumas voltas eu sentei junto a foto, e me enchi de raiva e desespero. “preciso de você, Charlie!” pensei, e joguei a foto no fundo da lata de lixo, do lado da porta. E enxuguei as lágrimas.

A tia valda me chamava, os biscoitos cheiravam à casa toda. Desci com gosto a escada. E encontrei a cozinha vazia. Olhei na sala também, mas nada!

—Tia Valda!- gritei para o nada.

— aqui         Miranda, na garagem!- recebi em resposta.

Corri a cozinha, e meti um biscoito na boca. Eram realmente deliciosos! Mas eu cheguei à garagem, aonde Tia Valda segurava uma bicicleta.

—Gostou do biscoito?- perguntou ela.

Fiz um sim com a cabeça. Tia valda estava meio estranha com aquela roupa esportiva. Sabe, ela tem uns trinta e cinco anos, mas aparenta ser um pouco mais velha. Tem cabelos ruivos e curtos, os olhos verdes que eu puxei do meu pai, e o mesmo nariz arrebitado que eu vi em uma foto do casamento da minha avó.

— Vamos dar uma volta de bicicleta, o Rio tem um bom complexo de ciclovias. Você pode usar a bicicleta do seu primo.

Eu me lembrei que tinha um primo, naquela hora. Ele foi para Harvad no outono e provavelmente não vai voltar tão cedo. A última notícia dele que tive foi que estava vivo. É que ele passou por uma experiência meio, digamos que chata: ele foi mantido em cativeiro por dois dias. Não sei de mais detalhes sobre o caso, mas poderia ser pior.

Eu subi na bicicleta, e me acomodei. Tia valda apertou o botão que abre a garagem e saiu. Eu fui logo atrás dela. O dia já começava a entardecer, e como o céu estava claro e sem nuvens, era uma bela aurora. Eu apreciava o passeio. Nós atravessamos a rua e viramos em uma ciclovia que torneava uma lagoa. Eu sabia que era a lagoa Rodrigo de Freitas por que eu li em algum lugar. Era tão bom aquela sensação de calma, você estar tão a parte de tudo. Eu podia passar horas e horas andando assim.

—É ali.- Tia Valda apontou para um certo quarteirão, onde só tinha um prédio grande e amarelo. - é ali o colégio Bandeirantes. Sua nova escola.

— Que         animador!-murmurei.

 

Depois de uma volta inteira, paramos aonde nós atravessamos e refizemos o caminho de volta para a casa.

Até deitar na cama eu não percebi o quanto estava cansada. Mas foi só encostar a cabeça no travesseiro que eu peguei no sono. Eu estava com um sono leve, tanto que senti quando Jack chegou, e foi ver TV. Deviam ser umas 10 da noite, ele estava assistindo Glee tão alto que eu acordei e gritei para ele abaixar o volume mas eu acho que nesse meio tempo ele pegou no sono. Eu desci a escada e desliguei a TV depois acordei-o e mandei ele subir para a cama.

Então eu me deitei de novo, e dessa vez eu peguei no sono de vez.

Eram umas seis da manhã. Estava um cheiro bom de café. Jack começou a me balançar, como sempre fazia para eu pular da cama e não perder a carona.

—Bom dia, bela adormecida.- disse ele.

—Me deixa dormir.- respondi em tom cansado.

—E deixar você perder a minha carona. Não !

Eu me sentei. Ele riu. Meu cabelo devia estar parecendo um monte embolado de algas.

Jack saiu do quarto me deixando sozinha no meu quarto escuro. Eu me levantei e cumpri todo aquele ritual de pentear o cabelo, lavar o rosto e descer para tomar café.

Quando fui trocar de roupa, percebi que ainda não tinha uniforme. Então coloquei uma calça jeans escura, uma blusa branca e uma jaqueta de couro preta. Eu abri a janela, e vi Jack já dando partida no Mazda então eu corri para alcançá-lo.

—Achei que não viria.- disse ele- vamos, já está atrasada.

Eu escorreguei para dentro do carro. Era tudo tão legal. Eu sempre quis andar em um desses pelas ruas de Manhattan. Mas pelo jeito, não aconteceu como eu esperava.

— Com saudades?- perguntou Jack.

—Me sinto como uma estranha aqui. Como se estivesse em outro planeta e tudo mais. Tudo mudou tão rápido!

—Mas eu sempre vou estar aqui, com você.- disse ele pegando minha mão. Se minha mãe visse aquela cena, tenho certeza que diria “que lindo o amor fraternal”, e afinal isso era verdade. Jack e eu sempre nos demos muito bem. Ele sempre me entendeu, me protegeu, essas coisas, alem de ser sempre um bom ouvinte.

Jack soltou minha mão, e acelerou o mazda. Ele virou uma esquina, e pegou uma rua rente a lagoa. A rua estava totalmente vazia. Eu me sentia como em uma propaganda dos carros ingleses.

Sinto tanta falta de Charlie, da Stella- minha melhor amiga- e da Tina- minha vizinha.

—Chegamos.- disse Jack.

—Tão rápido?

—Você está em um conversível, é óbvio que é rápido.

Eu saltei do carro, e o vi arrancar pela rua até sumir na poeira. Então me virei para ver a escola. Era um prédio amarelo, com cara de velho e vazio. Andei alguns passos e me identifiquei na portaria. O senhor cujo no crachá estava escrito Danilo disse que já me esperavam na sala da diretora, e que para chegar lá era só subir dois lances de escada e entrar na segunda porta à direita. Não tem como errar.

Eu fiz passo a passo oque o Danilo me disse. E quando entrei na sala aonde estava escrito DIRETORIA em letras tamanho jumbo, vi uma senhora sentada em uma cadeira, atrás de uma mesa, vendo uma TV de 14 polegadas com antena.

—Você deve ser a Miranda- ela disse ao me ver. - Prazer eu sou a diretora Emma. Você está atrasada, mas eu a desculpo. Deve ser por causa do fuso horário.

Assenti com a cabeça. Ela se levantou da cadeira e desligou a TV. Então pude perceber que ela usava um Tailer azul, com brincos de madrepérola. Imaginei que quando mais nova, devia ser muito bonita. Ela passou a mão pelo meu ombro e me guiou pelo corredor, até a sala 10. e praticamente me empurrou lá dentro.

—Está é a nova aluna Miranda. Ela vem de Nova York.- ao terminar ela fechou a porta.

Examinei um pouco a minha nova sala à procura de um lugar vazio, mas tinham várias opções então eu lancei um olhar de dúvida para a professora, uma pessoa jovem e bonita.

—Hi- disse ela em sotaque britânico- I´m Lia. Teacher of inglish. How are you Miranda?

—Eu vou bem, obrigado. - Respondi em português- eu sei falar português. E francês.

A classe toda me encarou como se eu fosse mutante ou coisa parecida. Eu não tive a menor vergonha de devolver o olhar, e analisar o ambiente. Era uma classe que tinha uns três garotos loiros com olhos azuis, sentados na frente, em carteiras intercaladas com as de garotas que pareciam ser cinco anos mais velhas do que deviam ser por causa da maquiagem que cobria-lhes o rosto. Mais para o fundo tinha um garoto alto e grande que cobria a última carteira. E um com colar de surfista. Todos usavam um uniforme comum, onde tinha escrito bandeirantes em letras que lembram quando você faz jackpoint nos jogos eletrônicos.

—Cinco minutos de perguntas, para Miranda, pessoal- disse a teacher.

“ah,         claro. Porque não interrogar a estrangeira?”pensei.

Um dos alunos levantou a mão. A professora fez um gesto para que prosseguisse com a pergunta.

—Qual é seu nome?

—Miranda Tine.

—Oque você é?- Uma garota com o rosto todo maquiado com cores fortes que fez a pergunta, mas ao ver a cara de desaprovação fez uma cara emburrada e corrigiu o erro.- Quer dizer... dá onde você vem?

—De Manhattan, Nova York. - eu olhei para ela ao responder, e ela me lançou um olhar de superioridade que a fez parecer uma coruja com dependência de maquiagem.

— Você         nasceu lá?- perguntou um dos garotos loiros

—Eu nasci em São Paulo,mas quando tinha mais ou menos um ano e meio meus pais me arrancaram daqui e me levaram para Paris e depois de uns sete anos me levaram para Nova York.

A professora me olhou como se eu fosse um assunto interessante a ser conversado, e esse olhar me assustou.

—Qual é seu livro preferido? Algum livro que você não possa viver sem.

Eu pensei por um segundo, e então me encostei na mesa da professora. Eu não era exatamente fã da leitura, mas de vez em quando eu lia Meg Cabot e seus delírios de princesa. Foi quando eu disse:

—Este. - peguei o dicionário que estava em cima da mesa.- Não vivo sem ele.- oque particularmente não é uma mentira: eu ainda erro na gramática e na acentuação.

—Se lembra de mim?- disse alguém atrás do grandão do fundo. A professora se assustou com a pergunta e ficou mais perplexa ainda quando fiz uma cara de que conhecia aquela voz. Era uma voz muito familiar e conhecida, era a voz do Chales.

—Char...Char...Charles Bekendorf?

Uma das corujas com dependência de maquiagem repetiu o meu gaguejo em falsete, e estava aparentemente com muita raiva.

E de trás da carteira, no meio de um corredor um garoto loiro, de olhos azuis, e um sorriso sincero e bonito se levantou. Sim, era Charles Bekendorf. Não sei oque foi mais forte, se foi aquela sensação de algo familiar, se foi aquele friozinho na barriga que eu sinto quando estou perto dele.

—Você por aqui? - peguntei em um tom de desaprovação.

—Em pele e osso.

Eu sorri de alegria de ver alguém especialmente familiar, e ele me respondeu a alegria com o brilho naqueles olhos azuis, lindos. Era impossível ficar bonito em um uniforme com a camisa azul marinho e gola cinza mas Charles conseguia. “Não demonstre alegria” pensei, mas era impossível não sorrir naquela sorte.

Eu achei que já era hora de sentar e assistir a aula, então caminhei até uma carteira na fileira ao lado da de Charles. Em um lugar onde eu podia apreciar livremente aquele olhar lindo, sem ser percebida.

Quando a primeira aula acabou, alguns colegas vieram ao meu redor continuar o interrogatório da aula de português. Eu peguei minha garrafinha e comecei a beber água desesperadamente, tudo parte de um truque para não ter que responder aos amigos paparazzi. Mas quando já estava na metade da garrafinha ouviu-se um grito bravo e feminino da frente da sala.

—Oque é isso ai? Pensam que aqui é a casa da mãe Joana?- disse a voz. Devia ser a próxima professora, mas quando se abriu uma fresta entre os meus colegas de classe espiei uma mulher alta e loira, vestida com um shorts azul bebê e uma jaqueta esportiva da mesma cor. Só podia ser a professora de Educação Física.

—Temos uma novata hoje. Quem é?- disse ela.

— Eu! -         disse do meu lugar. Ouvi uns murmurinhos dizendo para eu me         levantar, e então eu obedeci como se em um regime militar.

—Qual é o seu nome?

—Miranda. Miranda Tine.- eu respondi como eu ouvia os cadetes da academia militar falarem. Ela pegou uma caneta azul e anotou em um caderno que estava escrito SPFC em um brasão que tinha vermelho, branco e preto que um anjo segurava. Olhei para os meus colegas, eles faziam caretas para o desenho. Devia ser símbolo de alguma associação de professores ou qualquer coisa do gênero. Mas pensando bem, não consegui encontrar nada que combinasse com a sigla.

—Hoje vai ser vôlei.- disse ela- Oque estão esperando? Desçam para a quadra.

Eu me aprecei para acompanhar a turma, que seguia em uma procissão corrida pelo corredor. Todos estavam espremidos diante da correria, eu nem via mais Charles. Aquela classe de uns quarenta alunos parecia ter se multiplicado, então eu comecei a andar um pouco mais devagar para fugir da procissão e a tática funcionou. Eu fiquei um pouco mais para trás onde estavam apenas Charles e um garoto com o colar da prancha de surf. Nós chegamos a uma escada, um pouco atrás da multidão, que de fora não parecia tão grande.

—Que sigla é aquela do caderno da professora?- perguntei.

—Significa federação paulista de futbol. Um time paulista.

—Eu sou de São Paulo. Mas... como assim de futbol? Que nem o Chelsea?

Ele assentiu com a cabeça.

—Seu cadarço está desamarrado.- observou Charles. Mas já era tarde demais, eu já havia tropeçado no cadarço e rolava sem parar pela escada, até que então eu bati a cabeça na parede e tudo escureceu.

 


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