Novos Começos escrita por Tenteitudo


Capítulo 4
Velorio


Notas iniciais do capítulo

Procurei inspiração em minha escritora favorita e aparentemente encontrei... Então inicio o capitulo com um quote dela:

"O amor entre duas mulheres é um refúgio e uma fuga para a harmonia. No amor entre homem e mulher existe resistência e conflito. Duas mulheres não se julgam, não se violentam, nem encontram algo para ridicularizar. Elas se entregam ao sentimento, a compreensão mútua, ao romantismo. Tal amor é a morte, admito." Anaïs Nin.



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Silencio. A viagem inteira, não, as ultimas 15 horas haviam sido passadas em silencio. Quinn simplesmente não conseguia fazer com que as palavras se manifestassem. Ela sentia tantas coisas ao mesmo tempo, que não sabia exatamente o que dizer, ou como dizer, e se ela realmente falasse, provavelmente não seria capaz de raciocinar sobre o que havia sido dito. Então ela ficou em silencio, seu olhar fixo em pontos aleatórios e ocasionalmente, lagrimas transbordavam e escorriam por sua face.

Santana ficou ao seu lado o tempo inteiro, segurou sua mão durante toda a viagem até o apartamento de Rachel, depois até Kurt e Dave, explicou a situação para os dois e pediu se eles poderiam cuidar de Jessie. Brittany havia insistido em voltar para Lima com elas, mas a latina manteve-se firme e Quinn não queria mobilizar todos os seus amigos por causa disso, não depois do que eles já haviam feito por ela quando Michael fez o que fez.

Elas haviam chegado a Lima de madrugada e Gonzalo Lopez, irmão da latina, as esperava no aeroporto, usando um casaco preto sobre pijamas de flanela. Ele abraçou sua irmã carinhosamente e murmurou seus sentimentos no ouvido da loira, envolvendo-a em um abraço igualmente fraterno. Quinn respondeu com um aceno de cabeça e se deixou guiar até o carro.

A casa dos Lopez era e não era familiar ao mesmo tempo. Fazia anos que ela não visitava e muitas coisas estavam diferentes, mas ainda assim, as recordações que o lugar trazia eram reconfortantes. Ela não conseguiu evitar mais lagrimas quando as lembranças de sua infância trouxeram a imagem de sua mãe a tona. Pequenos momentos em que Judy havia sido particularmente afetiva e carinhosa, momentos antes de dormir, histórias contadas e um beijo na testa. Coisas tão simples e que a faziam sentir tão segura. A ideia de que isso nunca mais iria acontecer causava uma dor profunda em seu peito.

Santana pegou sua mão e a levou para o quarto, sentando-se na beira da cama e tirando os sapatos enquanto a loira checava seu celular. As diversas chamadas perdidas de Rachel só fizeram seu estado piorar. Naquela noite, ela não dormiu, esperou acordada até que o horário fosse aceitável o suficiente para que ela pudesse ir até a igreja perto de sua antiga casa, aonde o velório acontecia.

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Eram oito da manhã do dia 12 quando Rachel aterrissou em Lima e foi recebida por uma leve garoa. Natasha, uma de suas novas assistentes, havia providenciado um carro que já a esperava e ela encostou a cabeça contra o vidro gelado da janela durante todo o percurso até o hotel. Ela não havia dormido absolutamente nada, mas sentia-se estranhamente cheia de energia. Em nenhum momento ela havia pensado em avisar os seus pais sobre sua chegada, a diva não se sentia exatamente confortável em conversar com eles no momento. Ela sabia que sua visita exigiria explicações e a morena definitivamente não estava preparada para se abrir totalmente para os Senhores Berry. Por mais receptivos que eles pudessem ser, ela não podia deixar de pensar que seria um grande desapontamento para eles saber sobre sua sexualidade.

Nenhum fotografo parecia ter seguido-a até o aeroporto em Huston, mas fotos do abraço que havia trocado com Noah já estavam circulando na internet. Uma pequena parte dentro dela se perguntava o que as pessoas diriam quando soubessem que ela havia praticamente fugido da turnê de audições para ir ao velório da mãe de uma 'amiga'.

A morena suspirou, embaçando o vidro e desviando os olhos para as próprias mãos, que repousavam em seu colo. Como ela deveria reagir a Quinn? Ela não fazia a mínima ideia do que iria sentir quando finalmente visse a loira. Rachel ainda estava um pouco magoada por não ter sido avisada sobre o acontecido, mas por outro lado, quem era ela para julgar? O que ela teria feito nessa situação?

A porta do carro se abre e ela percebe que eles estavam estacionados em frente ao hotel. O motorista leva sua bagagem de mão para dentro e ela faz o check-in rapidamente. Subindo para o quarto e deixando-se cair na cama. O motorista fora contratado para ficar a sua disposição durante os dois dias que ela pretendia passar na cidade, mas a cantora sentiu vontade de dispensá-lo e ir a pé até a igreja. Ela precisava pensar e exercício era a melhor forma de clarear suas idéias.

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Quinn respirou fundo quando sentiu o aperto de Santana em sua mão. A latina lhe lançou um sorriso triste, como se perguntasse: 'está pronta?' A loira assentiu minimamente e elas caminharam juntas, subindo os degraus que levavam até a igreja. Uma musica triste e instrumentada tocava no fundo e podia-se ouvir o murmúrio de orações que vinha de um grupo de senhoras que Quinn reconheceu como as 'amigas da igreja'. Elas levantaram a cabeça quando escutaram o eco de seus passos e acenaram em sua direção.

Uma mulher chamada Agnes se afastou das demais e lhe deu um abraço, desejando condolências. Quinn não sentiu conforto nos braços da senhora que a havia visto crescer, na verdade, ela sentiu um calafrio percorrer sua espinha. Quantas das pessoas ali presentes realmente conheciam e amavam sua mãe? Não Judy Fabray, esposa de Russel e católica fervorosa, mas Judy, mãe de Quinn e Olivia. A mulher que chorou em sua formatura e ligou em todas as datas importantes, tentando manter um vinculo apesar da distancia.

Por que isso não funcionou? Por que eu me mantive cada vez mais distante? Pensou a loira, em uma onda de remorso quando seus olhos caíram sobre o caixão e a foto que repousavam no altar. Então ela viu Russel e as perguntas em sua cabeça cessaram. Foi por causa dele. Ele a manteve distante.

Seus pulsos se cerraram com força e Santana largou de sua mão, apertando seu ombro em preocupação. Ao lado de Russel, uma mulher alta, elegante, de cabelos castanhos claros e pele pálida brincava com os próprios dedos, como se não soubesse o que fazer com as próprias mãos. Seu olhar estava focado no chão, mas Quinn sabia que seus olhos eram azuis.

"Quinn..." Murmurou a mulher ao levantar os olhos. A semelhança entre as duas era gritante, apesar da diferença no tom de cabelo e na cor dos olhos.

"Olivia." A loira se adiantou para o altar e as duas irmãs se abraçaram com força. Quinn relaxou um pouco, encontrando o conforto que tanto precisava nos braços de sua irmã. "Liv..."

Lagrimas irromperam pelos olhos de ambas e a mais alta depositou um beijo contra seus cabelos. "Irmãzinha..."

A loira se agarrou ao casaco escuro de Olivia, ela não podia largar, se largasse, seria forçada a cumprimentar Russel e olhar para o caixão de sua mãe. Olivia pareceu entender o que ela sentia e repousou o queixo contra o ombro da assistente social, deixando-se abraçar. Elas nunca haviam se dado bem enquanto moraram juntas, mas depois que Quinn foi para a faculdade, de alguma forma, elas se aproximaram. Era como se elas não pudessem ser irmãs enquanto vivessem sob o mesmo teto, mas a distancia fortificou seus laços. Dentro da mansão Fabray, elas agiam como inimigas, constantemente competindo pela atenção de seus pais, fazendo qualquer coisa para deixá-los orgulhosos.

Sem a pressão que a família exercia, elas se descobriram grandes amigas.

Russel lhe ofereceu um meio abraço desajeitado e não conseguiu olhá-la nos olhos, de certa forma, Quinn sentiu-se grata por isso. Sua avó Mary estava sentada bem próxima ao corpo de Judy, seus dedos descansavam nas beiradas do caixão, seus tios e tias conversavam distraidamente, como se o funeral fosse mais uma reunião chata de família e mal pudessem esperar para voltar as suas vidas normais.

Santana cumprimentou Olivia e sentou-se em um dos bancos vazios da igreja, apoiando as mãos sobre a barriga e observando sua melhor amiga lidar com os monstros de seu passado. Os Collins, por parte de mãe, não eram muito diferentes dos Fabray e nenhum de seus tios e tias se preocupou em cumprimentá-la, ou sequer olhar para ela. Desde o nascimento de Beth ela era tratada como estranha pelo resto de ambas as famílias.

A latina sentiu uma vontade enorme de bater em todas aquelas pessoas ricas e conservadoras e que não faziam a menor ideia do que significava felicidade. Ela trincou os dentes e viu Quinn se encaminhar para perto do caixão e olhar para Judy pela primeira vez em anos. Os olhos da loira se encheram de lagrimas e seu lábio tremeu da forma que sempre tremia quando ela estava realmente triste. Santana percebeu que inconscientemente, estava imitando os gestos de sua amiga e secou algumas das lagrimas que haviam escorrido por seu rosto.

Quinn levou uma mão aos lábios e a outra aos cabelos loiros de sua mãe, perfeitamente penteados. Ela sentiu a pele gelada com a ponta dos dedos e retraiu-se imediatamente. Uma mão segurou seu cotovelo e deu um leve puxão, chamando sua atenção. A loira se virou para encontrar um par de olhos dourados exatamente iguais aos seus em uma mulher noventa anos. "Quinnie?" Mary fez um sinal com a cabeça para que ela senta-se ao seu lado e Quinn obedeceu. A mão de sua avó encontrou a sua e segurou firmemente. "Eu sinto muito..." Ela murmurou.

Quinn sabia que sua avó falava sobre o falecimento de sua mãe, mas percebeu que não era só sobre isso que Mary sentia muito. "Eu também vó..." Respondeu ela, se reclinando no sofazinho e descansando a cabeça contra o ombro da mulher mais velha.

"Ela te amava muito, sabia? Mesmo que tenha falhado em demonstrar na maioria das vezes." Mary acariciou a pele de sua neta com o polegar, sem desgrudar os olhos da madeira escura do caixão de Judy.

"Eu a amava também..." A assistente social morde o lábio. "Eu sempre vou amá-la..."

"Você cometeu muitos erros Quinn." Ela sabia que Mary falava especificamente de Beth, mas resolveu não interferir. "E você pagou por eles, muito mais do que deveria." Ela faz uma pausa e respira fundo, apertando a mão de Quinn dentro da sua. "Mas o mais importante, você cresceu sozinha e se tornou uma mulher maravilhosa. Sua mãe sentiu muito orgulho de você no final." A essa altura, mais lagrimas desciam pelo rosto de ambas. "Eu queria que ela pudesse ter te falado isso pessoalmente..."

Quinn não respondeu, apenas enterrou o rosto contra o ombro de sua avó, que passou um braço em volta dela em um meio abraço, virando o rosto para beijar sua testa, um pouco hesitante. Ela nunca havia sido muito afetiva, mas em um momento da vida, as pessoas percebem que dar um pouco de carinho não faz mal algum, principalmente para uma neta que acabara de perder a mãe.

"Obrigada..." Murmura a loira, seus olhos se desfocam do caixão e procuram por Santana nos bancos a frente, ela encontra a latina e uma pequena morena com grandes olhos castanhos preocupados ao lado dela. Seu coração acelera e para ao mesmo tempo.

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Rachel chegou na igreja um pouco depois das nove, ela acabou mantendo o motorista, de forma a evitar tumultos, ela queria ver Quinn, mas o resto do mundo não precisava saber disso. A casa não estava cheia e o padre iria chegar no começo da tarde para a missa antes do enterro. Seus olhos percorreram os grupos de pessoas antes de se focarem nos poucos em cima do altar, ela viu Russel e a mulher que ela supunha ser Olivia a direita e um grupo desconhecido a esquerda. Quinn estava sentada no sofá ao lado do caixão, abraçando uma senhora que parecia realmente idosa.

A morena andou pelo corredor, sem tirar os olhos de sua namorada e parou ao lado de Santana, apoiando uma mão em seu ombro. A latina olhou para ela com um olhar questionador, mas não verbalizou nenhuma pergunta. Ela sabia que Rachel precisava estar ali. Quinn precisava de Rachel.

Seus olhos finalmente se encontraram e todo o ar em volta delas pareceu crepitar com a intensidade daquele momento. Olivia levantou o rosto e observou as duas amigas de sua irmã, mordendo o lábio.

"Rachel? O que você está fazendo?" A voz de Santana parecia um pouco mais distante do que deveria estar e a diva percebeu que havia dado alguns passos para a frente, em direção a Quinn, como se estivesse em um transe.

"Eu vim por ela e eu não vou ir embora Santana." Ela fala em voz baixa, virando o rosto para o lado e prendendo algumas mechas castanhas atrás da orelha.

"Eu não estou pedindo para você ir embora Berry, mas esse é um momento da família..." Começa a latina, temendo que Rachel pudesse fazer alguma coisa inapropriada.

"Ela é minha família agora." Murmura a diva, virando-se completamente para a médica. "Eu vou segura-la e confortá-la e estar ao seu lado, como a parte dela que eu sei que sou." Ela sente os olhos arderem, mas consegue evitar o choro. "Ela precisa de mim..."

"Eu sei..." Responde a latina, percebendo nesse momento, que ela realmente confia em Rachel, e sabe que a cantora jamais faria qualquer coisa para prejudicar Quinn.

"Eu vou ir até lá agora."

"Está bem." Santana assente com a cabeça e Rachel se encaminha para o altar. Ela pode perceber que algumas das pessoas presentes ali já a haviam reconhecido pelos comerciais do American Idol e ela fez questão de sorrir para todos eles, inclusive Russel Fabray, que lhe lançou um olhar curioso.

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"É uma amiga sua?" A voz de Mary pareceu quebrar o transe no qual Quinn se encontrava e a loira olha para sua avó sem saber o que dizer.

"Minha melhor amiga." Ela acaba murmurando. "Eu-eu já volto..." Ela se levanta e caminha em direção a Rachel, elas se encontram nos degraus do altar, trocando um olhar incrivelmente intenso antes de se abraçarem com uma força quase violenta. Quinn sentiu-se sem ar e os braços da morena em volta de si pareciam fazer toda a dor ir embora. Ela enterra o rosto nos cabelos castanhos e deixa que as lágrimas fluam livremente enquanto a diva a envolve e acaricia suas costas.

Elas se afastam depois do que parecem horas e Rachel leva sua mão ao rosto de Quinn, coletando algumas lagrimas com o polegar. Ela fica na ponta dos pés e pressiona seus lábios contra a face da loira. "Eu te amo." Ela sussurra em seu ouvido e a assistente social a abraça novamente, percebendo o quanto realmente precisava da diva naquele momento.

"Obrigada por estar aqui Rachel..." Ela encontra a mão da morena e entrelaça seus dedos.

"Eu sempre vou estar aqui." A cantora leva suas mãos unidas para o peito antes de se espichar mais uma vez para beijar sua bochecha. Quinn leva a mão livre para o rosto de Rachel e a segura ali, a centímetros de distancia, seus olhos parecem transbordar milhões de coisas ao mesmo tempo, mas principalmente necessidade por algo que a diva não consegue identificar. Elas se encontram novamente dentro de uma bolha, à parte de todo o resto do mundo e para a loira, a única coisa que importa é isso, Rachel, a certeza de que finalmente ela tem alguém de verdade e para sempre.

"Obrigada." Sussurra Quinn, se inclinando e unindo seus lábios delicadamente.

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