L'arc En Ciel escrita por KAlexander


Capítulo 1
LArc en Ciel




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NA LONGÍNQUA SUPERFÍCIE ESPELHADA, a sublime luz, se difundindo em tons de vermelho, rosa e amarelo, acariciava a água como uma amante. Era um espetáculo místico, e a beleza que emanava dele era tamanha que se tornava quase angustiante...

Ao tocar o mar, no horizonte, os raios do Sol sangravam em suas ondas plácidas. Ele se machucava... Estava sendo ferido, punido por sua união súbita. Aquele era o preço da união de gigantes pares... A dor, sempre presente aos seus espíritos.

Contudo, havia o alento, o motivo...

A luz rósea, como um rubor em faces de anjo, se misturava numa dança de cores, esbanjando este motivo. O amor que a estrela suprema compartilhava com sua imutável pungencia.

A solitária melodia eternal do oceano pedia num lamento seu único anseio... “Me ilumine” . A enorme esfera se aprofundava em seus braços gélidos, esperançosos de sua invasão, se inclinando a seu pedido... Derramando no espelho d’água suas gotas de ouro liquefeito, ele cobria seu companheiro com o deleite final, o ultimato da hora que se arrastava um dia mais. E assim se repetiria, assim acontecera, desde o início... Assim aconteceria...

...Até o final.

E, nos olhos de meia-noite do pequeno rapaz no meio da praia, aquele mesmo evento se refletia. Os sapatos nas mãos e a echarpe rosa, longa demais, esvoaçando de acordo com as vontades egoístas do vento que assoviava. A espuma nívea cobria seus pés antes que a maré a levasse novamente, retrocedendo em seu caminho contínuo, sem jamais avançar daquele ponto, mas também sem nunca se afastar por completo. O ar salgado era de um aroma agradável aos seus sentidos razoavelmente letárgicos.

A vista de Kazunari Ninomiya estava embaçada. E, embora as lágrimas cristalinas transbordassem por seus olhos, não havia nada além de uma máscara de apatia em seu semblante. 

O jovem se mantivera ali, sentado na areia, as pernas encolhidas, desde o início do pôr-do-sol. Caminhando pela orla da praia ele se esquecera da hora; tentando encontrar uma solução para seus problemas, ele se perdera propositalmente. Não queria a companhia dos amigos. Não àquela tarde. Almejava pela solidão de seus pensamentos, envolvendo sua mente com mãos frias e racionais. Ao menos uma vez em sua vida a razão era essencial. E, ao abandonar o hotel sem avisos prévios, estava decidido a usá-la.

Contudo, ali estava ele, experimentando o calor das lágrimas que manchavam seu rosto, unido aos mornos raios esmaecentes de Sol que atravessavam sua pele, num afago confortador... Talvez ele compreendesse suas dúvidas... Talvez, e apenas talvez, ele soubesse o quão necessitado de respostas seu coração estava. E aquele vácuo, aquela ausência de resoluções o corroia lentamente, como veneno escorrendo por um corte em suas veias, impregnando, abatendo suas forças cruelmente... E como aquilo o feria... Como aquelas pontadas agudas ardiam...

Ah, já estava escurecendo... Os outros deveriam estar aflitos sem notícias suas àquela hora.  E, por outro lado, não poderia continuar a fitar a escuridão azul pelo resto da noite.  E, com este pensamento, Nino se levantou e, sem pressa, pôs-se a andar; a água brincava com seus pés enquanto ele varria o lugar com os olhos. Realmente, estava longe do hotel. Sua vista pousou nas casas de madeira após a rua deserta, silenciosa, livre de edifícios ou hotéis. Apenas as residências simples enfeitavam a paisagem natural.

Austrália... Era um belo lugar. Em pouco menos de dois dias o Arashi se apresentaria num concerto naquele país exótico. Deveria estar feliz, não? Então, este seria o papel a interpretar, refletiu ele amargamente. O semblante da felicidade.

Quando finalmente avistou o hotel, a luz abandonara o dia quase completamente; o céu ganhara um colorido cianótico, crepuscular. Suspirou pesadamente, observando o majestoso edifício a certa distância. Estava decidido... Sabia que seu ensejo poderia ser denegado, era um fato... Entretanto, ele arriscaria... Pela última vez.

***

O quarto estava quieto. Quieto e escuro demais. A Lua adquirira um extravagante matiz áureo, e sua luz era a única convidada naquele espaço destituído de vida. Entretanto, apesar da aparência abandonada que o quarto de hotel ostentava, havia alguém ocupando aquele recinto taciturno. Sentado no chão na pequena sacada, as pernas dobradas e as costas deitadas na parede fria, Ohno Satoshi não despregava os olhos das nuvens que passeavam no alto. Era ironicamente cômico que seus pensamentos estivessem no mesmo estado lastimável daquela vista: densamente enevoados.

Suspirou, abraçou os joelhos e trouxe-os para mais perto do corpo. Sentia a culpa pesando em suas costas, assim como em sua consciência esgotada. E, lhe perseguindo em seus sonhos com a culpa, estava aquela flagelante troca de palavras... Desejava que aquilo nunca houvesse acontecido... Assim, não teria de se preocupar em absorver a consternação alojada no rosto do pequeno rapaz, aquele que há tanto se tornara uma parte vital de seus dias... Assim, não teria de se recolher em seu santuário de silêncio.

– Ohno...

Estava se preparando para ir embora, a bolsa jogada sobre os ombros quando a voz hesitante e tão característica chamou-o do interior do camarim. Satoshi estacou no meio do aposento antes de olhar a pequena silhueta de Nino, recortada pela luz rosa - alaranjada de fim de tarde.

Surpreso, ele piscou. O caçula terminara suas atividades mais cedo que os outros membros naquele dia na empresa, portanto ele era a última pessoa que Ohno esperaria encontrar ali aquela hora. Contudo, esqueceu-se destas trivialidades assim que captou a expressão inquieta de Ninomiya. O garoto parecia alarmado e, acima de tudo, nitidamente temeroso. Seus olhos corriam pela sala de um lado ao outro sem pausas; mordia os lábios; subitamente o zíper de seu moletom se tornara muito atraente aos seus dedos irrequietos.

– Nino?  - Indagou ele lentamente, dando alguns passos em direção ao pequeno. – O que houve?

Como o outro parecia se recusar a encará-lo, Satoshi se aproximou e, amavelmente, ergueu o queixo do rapaz. Os olhos de Kazunari se alargaram ao encontrar a figura do outro tão próxima. Seus lábios tremerem levemente e, a pouca distância, Ohno notou que a pele macilenta do caçula estava luminosa com o suor que brotara recentemente.

– Nino, o que está acontecendo? Está me assustando... – Riu ele baixinho, ansioso com aquelas reações exageradas.

– Eu... Eu... – Titubeou Nino, engolindo em seco. Sua respiração se acelerou momentaneamente e uma ruga surgiu entre suas sobrancelhas. – Eu...

– Você? – Sorriu Satoshi pacientemente, incentivando-o.

Kazunary emudeceu. Com a boca apertada numa linha rígida e as pálpebras apertadas, ele puxou uma boa quantidade de ar, ruidosamente, antes de abrir os olhos. Havia determinação em seu semblante agora. Determinação esta que o fez dizer com firmeza e em alta voz as suas palavras seguintes...

– Eu te amo Ohno. Eu te amo há mais tempo do que posso imaginar.

Satoshi estava pronto para ouvir muitas coisas. Contudo, todas elas se encaixavam em eventos notoriamente triviais. Um acidente de trabalho, um show cancelado... Qualquer coisa... Menos aquilo. Desse modo, a única reação que ele teve foi piscar aparvalhadamente para Nino, que continuou falando, ignorando o pasmo em seus olhos como se a qualquer momento a coragem fosse se esvair junto com sua voz.

– Não quero perder nossa amizade, mas não me importo se for o que acontecer. Eu precisava dizer... Tem muito tempo... Talvez eu tenha me enganado com suas atitudes... Mas eu sinto que é recíproco...

E, ao findar seu discurso, os olhos de Kazunari se encheram de um sentimento que retirou Satoshi de seu torpor. Ah... Tanta esperança naqueles orbes acesos... A vida dos olhos de Nino... As sensações que eles emanavam eram tão especiais... Havia mágica naquele espírito radiante, que se manifestou no sorriso fulgurante que ele exibiu ao encontrar a expressão compreensiva de Satoshi... Entretanto, Satoshi não a manteve ali por muito tempo. Sua única frase antes de dar as costas ao caçula foi clara e extremamente breve. Desprovida de qualquer emoção... A frase que apagou a chama do sorriso do pequeno rapaz.

– Me desculpe Nino, mas... você se enganou. Eu não posso retribuir nenhum sentimento além da amizade... Não vou arriscar sua carreira e, mesmo a minha e dos outros, por algo que não terá futuro. Não em nossas realidades.

E, sem encarar o outro, ele foi em direção a porta com passos firmes. Parou na soleira antes de murmurar por sobre o ombro:

– Eu sinto muito.

A luz havia deixado os olhos de Ninomiya desde aquela tarde. Ele se recusava a conversar com os outros membros do Arashi. Nem mesmo Aiba fora capaz de retirar uma tênue palavra de seus lábios.

A infelicidade de suas ações eram evidentes. Ele não se dignava a encobrir a dor de seu rosto abatido a cada vez que seus olhos encontravam os de Ohno. Este, por sua vez, adotava uma postura brutalmente oposta. Sua indolência era perceptível à distância, o que, sabia ele, somente feria mais o caçula... E como ver a dor naquele pequeno o afligia... Mas era necessário. Mais do que necessário, era essencial. Nino, assim como ele, não poderia se render a uma paixão como aquela. Era absurdo. Inaceitável.

Estava machucado... Tão ou mais do que Kazunari. Porém, era preciso. Trancafiaria aquele sentimento equívoco no baú de memórias obscurecidas de seu coração... Doeria... O corte que ele próprio estava provocando ainda sangraria por anos... Seria insuportável... Mas não para sempre. E, embora ele ainda soubesse que a cicatriz permaneceria ali, cravada em sua alma a fogo, um dia não mais doeria. E, esperava ele, isso se repetisse em Nino... Talvez um dia Nino o perdoasse...

Neste almejado dia, talvez ele encontrasse a remissão nos olhos daquele que era a melhor coisa em si...

Então alguém bateu a porta. Batidas leves, hesitantes.

Não queria ver ninguém. Mas podia ser a camareira. Então, suspirando, Ohno se arrastou de seu canto até o outro lado do quarto escuro. Girou a chave e abriu a porta...

Seu peito apertou como se cordas houvessem se amarado em seus pulmões quando encontrou o rosto de Ninomiya na soleira. Queria mandá-lo embora... Teve ímpetos de expulsá-lo para não causar ainda mais sofrimento àquele pequeno que tanto adorava... Mas, para sua surpresa, o caçula estava tranqüilo. Uma máscara da placidez. Quando falou, sua voz saiu pausada e controladamente baixa.

– Desculpe incomodar a essa hora. – Os cantos dos lábios finos se arquearam num sorriso de desculpas, mas os olhos negros permaneciam contidos. – Mas... eu precisava vir. Tenho um pedido.

Ohno piscou, desconfiado, antes de franzir o cenho.

– Que tipo de pedido? – Quis saber ele, tentando encontrar uma brecha naquelas faces claras.

– Você pode recusar, é claro, não se preocupe. – Defendeu-se Nino com um risinho, ao notar o receio de Satoshi.  Então, após alguns segundos, voltou a sua antiga serenidade, apenas para revelar o que o levara até ali: - Venha ao meu quarto esta noite. Somente esta noite... Você já me deu sua resposta. Eu aceito. Somos adultos afinal. Mas significaria muito para mim se você o fizesse...

A boca de Satoshi se abriu para protestar quando Nino o interpelou, prevendo suas palavras.

– Estarei esperando...

Então deu às costas e sumiu na extensão do corredor, deixando para trás um atônito Satoshi.

***

Aquela porta... Por que estava com medo de uma estúpida porta?

Como se ele pudesse enganar sua consciência... O interior, o que ela de fato encerrava provia as batidas irregulares em seu coração. Era assim que os condenados a forca sentiam-se? Era aquele o sentimento que experimentavam? De saber que após enrolar o cordame em sua garganta não haveria mais retorno?

Era realmente provável...

O sangue pulsava sob toda a extensão de sua pele, fervilhante e simultaneamente gélida. O suor frio brotava em sua nuca; as mãos estavam trepidantes e úmidas. O ar teimava em não entrar de forma adequada em seus pulmões. Não havia oxigênio o suficiente naquele maldito corredor... Passou os dedos pelos cabelos com força, antes de soltar o ar pela boca ressequida.

Não podia continuar naquele impasse absurdo. Afinal, se estava diante daquele portal havia tomado sua decisão. Ou não, a julgar pelo movimento desordenado de seus pés ao seguir pelos corredores até o quarto do caçula. Mas já estava tão tarde... Muito além da meia-noite. O silêncio era tão bruto que poderia ser cortado com uma faca.

Talvez Nino já houvesse desistido de esperar...

Não importava... Tinha de tentar... Enfrentaria de uma vez por todas aquela situação incoerente. E, torcendo para que seus medos não se confirmassem, Satoshi ergueu a mão vacilante em direção à maçaneta. Fechou os olhos, inerte, antes de girá-la com demasiada lentidão...

Com um estalo rígido, a porta se abriu.

Satoshi estava certo de que as palpitações do órgão desesperado em seu peito poderiam ser ouvidas a um oceano de distância, como uma sinfonia desordenada de tambores quando transpôs o portal. Abandonando a luminosidade acolhedora do corredor, ele ingressou na escuridão desconhecida daquele quarto soturno. Uma brisa deslizou como mãos inconvenientes em sua nuca quando ele fechou a porta e girou a chave.

Olhou ao redor. A cama estava feita. Os objetos, intocados. Não havia sinais que alguma ocupação em todo o ambiente, a não ser pena cortina que flutuava, translúcida, deixando transparecer a nesga de oceano à distância. O aroma potente da maresia era sedativo. Delicioso...

– Que bom que veio.

A voz incorpórea veio de algum lugar à sua esquerda. Nas sombras, ele pôde, aos poucos, distinguir os contornos de Nino. Quando seus olhos se acostumaram a falta de luz, Satoshi viu o rapaz envolto num quimono de tons azuis. O tecido vaporoso luzia conforme os movimentos suaves do caçula ao se aproximar.

Quando estacou defronte um narcotizado Satoshi, Nino apenas sussurrou calmamente, com segurança, os cílios batendo delicadamente:

– Será como se nada houvesse acontecido pela manhã. Eu prometo.

Ohno apenas assentiu, tenso, quando as mãos tenras e gentis de Ninomiya deslizaram por sua nuca, o puxando de encontro aos seus lábios...

***

O ar estava inteiramente úmido. Contudo, o Sol se mantinha majestoso aquela manhã. Chovera pela madrugada... O mundo desabara em forma de gotas grossas e pesadas de água. Entretanto, o único vestígio de sua passagem pela baía era aquele resplandecente arco multicolorido, diáfano, ornamentando o céu de um azul extraordinário...

Não se lembrava a última vez em que havia presenciado tal espetáculo. Era como se fosse a primeira vez que seus olhos encontravam tamanha graça... Na sacada no quarto, Satoshi se voltou para observar outro encanto que prendia sua atenção com a mesma magnitude...

Encoberto por um lençol branco, Nino ressonava, os cabelos esparramados sobre o travesseiro. A respiração era profunda, como a de um recém-nascido, que apenas se preocupa com o calor de sua cama.

Satoshi sorriu... Sua pequena peste, pensou ele sacudindo a cabeça em negativa.

Não estava sendo como se nada houvesse acontecido... E, receava ele, jamais seria.


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Notas finais do capítulo

Oneshote dedicada à Josiane Veiga. ^^



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