Caminhava pelos extensos corredores daquele enorme hospital. Via e ouvia as pessoas comentarem sobre si. 2 anos. Fazia 2 anos desde que estivera a última vez ali, sentado, esperando noticias. Das quais, não o agradaram muito. Continuou andando, ignorando tais comentários.

Caminhou só mais um pouco, para logo depois parar a frente de uma porta branca com pequenos enfeites. Ouviu um 'entre' calmo e o fez, caminhando até a pequena cama no enorme cômodo. Cumprimentou o médico com um aceno de cabeça. Virou-se e mirou um garoto de no máximo 17 anos, de porte pequeno pra idade, os fitando sem entender.

Fechou os olhos por um breve momento. Deixando sua mente ser inundada por lembranças. Lembranças quais, a muito queria esquecer. Abriu os olhos e começou a conversar com o médico, sentindo o par de olhos castanhos do garoto nunca deixando de seguí-lo.

"_Entendo. Deixo o Senhor Tsunayoshi aos seus cuidados, Spanner-kun." - Sorriu com solidariedade, deixando os a sós.

Ficaram se encarando por longos minutos.

"_Q-quem é v-você?" - A pequeno garoto perguntou, tímido e meio vacilante. Sorriu um pouco. Ele não mudara nada.

"_Melhor se trocar Tsuna. Nós temos um longo dia. A propósito, respondendo sua pergunta, sou Spanner." - Disse, antes de sair do quarto.

Alguns minutos depois, o mesmo garoto, chamado Tsunayoshi, saia do quarto. Agora, trajando roupas normais para a época. Enormes casacos para deixá-lo quente. Afinal, era inverno. Começaram a caminhar lado a lado.

"_Uh... Sem querer parecer rude Senhor Spanner, mas quem é você na minha vida? O médico só me disse que eu tenho muitos amigos e pessoas maravilhosas ao meu lado." - Comentou, fora do hospital. O loiro parou. Ou melhor, travou no lugar.

"_Eu sou só... Seu amigo... Um amigo íntimo..." - Claro, eu sou seu namorado, como não poderia ser íntimo? Terminou em pensamento, rindo sem humor. "E não me chame de Senhor. Tenho 20 anos."

"_Entendo." - O pequeno sorriu. E logo recomeçaram a andar, conversando. Quero dizer, Tsuna falando e Spanner hora ou outra comentando.

Depois de alguns poucos minutos andando, começou a nevar. Caia bem pouco, o que não os incomodou. Porém, Tsuna parou, mirando o céu e deixando os pequenos flocos caírem em seu rosto e em suas mãos, cobertas pela luva.

"_É neve." - Comentou Spanner, vendo o garoto se divertir ao sentir os pequenos flocos frios tocaram sua pele quente, logo derretendo e se transformando em água, escorrendo por sua face.

"_Neve... Nós nos conhecemos assim... Né, Spanner?" - O garoto comentou vagamente, como tentasse se lembrar. Novamente, Spanner travou.

"_Pensei que tivesse perdido todas as suas memórias..." - Sussurrou, mas alto o bastante para ele ouvir.

"_E eu perdi." - Balançou a cabeça, sentindo ela começar a doer. "Tudo é um branco. Um vazio. Um nada. Mas as vezes, imagens desconexas aparecem em minha mente." - O fitou, dando o sorriso, que foi correspondido por um sorriso de Spanner.

Caminharam mais um pouco, até entrarem em uma loja de doces, a pedido do menor, que começou a andar pelo meio dos doces, curioso. Spanner sentou numa das pequenas mesas no meio da loja, o observando. Ele ria que nem uma criança que acabara de ganhar um presente. Seus olhos brilhavam.

Sorriu, vendo-o acenar, enquanto conversava com a atendente. Deixou sua mente vagar por entre as lembranças de 2 anos atrás.

Ambos discutiam. O moreno parecia magoado, e o loiro tentava explicar a situação. Era armação, ele argumentava. Porém, o menor, com os olhos lacrimejantes, custava a acreditar.

Nenhum dos pareceu perceber que um caminhão vinha na direção de ambos.

Tudo muito rápido. Um flash branco. Barulhos altos. Gritos de socorro. Barulho de sirenes. E uma única palavra, todavia, nunca dita: Desculpe.

Acordou com o chamado do garoto, que agora, estava a sua frente, comendo um doce de morango.

"_No que estava pensando?" - Perguntou, curioso.

"_Em... Nada." - Respondeu, enquanto tentava engolir o bolo que se formara em sua garganta.

Spanner continuou observando-o comer o doce. Riu. Ele parecia uma criança comendo seu primeiro chocolate.

"_Você se sujou." - Disse, antes de pegar um guardanapo e limpar o canto da boca do castanho. Que corou.

"_Ah... Bem... Eu já terminei... Vamos indo?" - Levantou-se, apressado, corado e tenso, correndo para o caixa. O mais velho riu um pouco e o seguiu, pagando o doce. Não importava se Tsuna perdesse a memória, sempre seria o Tsuna que ele conhecia.

Saíram. Vendo a neve que caia estava um pouco mais forte que antes. Começaram a seguir em direção ao parque. Spanner sabia que Tsuna gostaria de ver aquele local. Era seu local favorito antes... Bem...

"_É lindo." - Murmurou o pequeno, encantado.

O parque definitivamente era bonito. Ainda mais no inverno, pensaram ambos. A água do lago estava congelado, a fonte estava desligada, o ar noturno e de frio deixava o local ainda mais belo. As árvores, com poucas folhas, acumuluvam neve em cima de suas copas e na terra, em volta de seu tronco. Os pequenos animais, mesmo com frio, caminhavam pela grama, com um pouco de neve e água.

O moreno começou a caminhar em volta da fonte, vendo alguns passáros, e o loiro não deixava de acompanhá-lo com os olhos. Sentou-se num banco, continuando a observá-lo. Dessa vez, não deixou as memórias virem a mente. Tinha que deixar isso de lado.

"_Spanner?" - Indagou o pequeno, com a face a milimetros da sua, trazendo-o de volta para a Terra. Sem se conter, o que não queria, se aproximou mais um pouco, até seus lábios se tocarem. Só um roçar. Nada de mais. No entanto, isso deixou Tsuna paralisado. "Spa-" - Fora cortado quando viu o maior se levantar e caminhar em direção a saída, com passos apressados.

Spanner não sabia o que tinha lhe dado. Ele não tem memórias de nada, pensou, nervosamente, não vai se lembrar de nada, não somos nada, não mais, continuou em pensamento, não se perdoaria se o machucasse novamente. O melhor, pensava ele, era se afastar.

Só parou quando sentiu um de seus braços ser segurado e dois orbes castanhos o mirarem confusos e com mágoa. Uma pergunta muda: Por que?

"_Estou cansado de mentir." - Começou a desabafar, mais para si mesmo do que para o menor, que parecia atento a cada palavra. "Antes, você me perguntou no que eu estava pensando, eu estava pensando no dia, 2 anos atrás, quando nós dois sofremos um acidente." - Mesmo que tivesse vontade chorar, não o fez, continuando a narrativa. "Estávamos discutindo. Uma garota tinha me beijado e você achou que eu estava te traindo. Estava num carro, indo pra casa, ou melhor dizendo, levando você pra casa. Não percebemos quando o caminhão desgovernado com motorista bêbado apareceu na nossa frente. Batemos. Eu não fui muito machucado, mas você batera a cabeça forte. Provavelmente tinha perdido a memória e entrado em coma." - Falou tudo num fôlego só. Não aguentava mais aquilo presso na garganta.

Tsuna continuava a olhar para ele, dessa vez, surpreso. Não tinha memórias disso. Só via um flash, uma luz branca e um vazia, ouvia gritos e sirenes, além de uma pequena palavra, sussurrada em sua mente...

"_Desculpe." - Ouviu o loiro dizer, antes de tentar se soltar para ir embora. Porém, não permitiu. O segurando mais forte. Viu Spanner o mirá-lo, confuso. Não ligou. Se colocou na ponta dos pés e tocou os seus lábios com o do mais velho. Vendo-o arregalar os olhos, mas não se afastou. O mais velho, ao ver isso, não pode ficar parado. Segurou ele pela cintura, aprofundando o beijo.

Se separam quando a falta de ar falou mais alto. Tsuna colocou todo o pé no chão, ainda sentindo os braços circundarem sua cintura. Estava com vergonha, entretanto, isso não o impediu de olhar Spanner e falar:

"_Então, essa é a nossa segunda chance, não?" - Indagou, sorrindo. "Vamos esquecer o passado. Porque todos tem o direito de recomeçar."

"_É. Você está certo. Essa é a nossa segunda chance." - Sorriu de volta, colando os lábios novamente, num novo beijo.

Aquela era a segunda chance de ambos e eles a fariam valer a pena.