Introdução escrita por Bardo Maldito


Capítulo 1
Introdução - Os Desbravadores


Notas iniciais do capítulo

Espero que gostem.



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Sora.

O reino de Lin-Wu,o Deus-Dragão do povo humano nativo de Tamu-ra.

O fresco vento da manhã atinge todos os seus habitantes,que festejam despreocupadamente rente às árvores de sakura.Suas pétalas rosadas seguem o vento,caindo em uma chuva de beleza,que comove a todos e a cada um em particular de meios diferentes.

Fora dos campos de cerejeira,o tengu engana uma pequena criança,de no máximo oito anos,que caminha desamparada pra junto de numerosos oni famintos.

Os oni atacam-na,ansiosos para devorar sua tenra carne,ouvir seus gritos de dor,seu choro infantil chamando pela mãe.Porém,a um metro de distância,um por um os onis param,e bizarramente sentem que não há necessidade de atacá-la.

Em seu interior,cada um deles se pergunta que idiotice é essa que lhes ocorria.Por que não atacá-la?Ela veio até ali,enganada pelo tengu.Era a presa deles!Que motivo havia para eles não a atacarem?

Eles notam que suas vestimentas não são normais de um morador de Sora.É um vestido azul e branco,simples,que não se assemelha nem um pouco aos quimonos que as crianças de Lin-Wu usam.

A criança olha pra um dos oni,e diz docemente:

-Você se machucou?

O oni não sabe o que fazer.Ele quer atacá-la,matá-la,devorá-la.Mas...ele contempla sua inocência,e soa como um erro terrível atacar tal criatura.

A criança anda até o oni,que tem vontade de correr,mas se sente imobilizado no lugar.A criança toma-lhe a mão,gentilmente faz com que abaixe e lhe dá um beijo no rosto.

Milagrosamente,o ferimento imenso em seu peito fechou.Fora causado dias atrás pela lâmina de um samurai,durante uma fuga,e a lâmina possuía tal mágica que o ferimento estava fechando à uma velocidade de tartaruga.

Todos a olham imobilizados.Porém,ela apenas sorri e diz:

-Estou procurando a Fortaleza Takayama.Algum de vocês sabe me dizer aonde é?

Eles a olham surpresos.A Fortaleza Takayama,o centro absoluto do reino de Sora,palácio do deus Lin-Wu.O que poderia uma criancinha querer com tal lugar?

O oni que a criança curou aponta uma direção.A criança sorri.

-Obrigada.

Mas o oni não consegue tirar os olhos da criança.Apenas a mira,deslumbrado,no que é seguido os por todos a seu redor.

Então,o oni pisca,já com os olhos cheios d'água.Porém,quando os abre,já não há mais criança alguma.Apenas enxerga todos os seus companheiros oni.E se sente aturdido.

A Fortaleza Takayama se erguia,imponente,em cima do pico mais alto da mais alta montanha de Sora.Hengeyoukais,espíritos na forma de lobos,macacos e ursos panda,andam patrulhando pelos jardins belíssimos.Em seu interior,centenas de samurais e monges patrulham,de cabeça erguida,imponentes como o lugar que protegem.Geishas andam timidamente,à maneira de Tamu-ra,servindo os maiores servos do Deus-Dragão.

O espírito urso panda percorre o caminho dos jardins,calmamente,quando sente um cheiro diferente,uma certa perturbação.Inicialmente,pensa se tratar de algum oni,porém,logo descarta essa possibilidade.Nenhum oni tem uma presença tão paralisante,e ao mesmo tempo tão pura e tranquilizante.

Então,um vulto vem chegando perto.Andando calmamente,surge uma menina de cabelos azuis,admirando os belos jardins da Fortaleza,acompanhando com os olhos um bando de garças passarem pelo céu limpo,azul e belo.Ela olha para o urso panda,e sorri.

O urso panda,também,arreganha os dentes em algo que poderia ser um sorriso,se ursos panda pudessem sorrir.Em seguida,ele se curva e diz:

-Bem-vinda à Fortaleza Takayama,doce Lena.

Lin-Wu está em uma sala tranquila.Dispensara todas as geisha que costumam lhe servir comida,saquê e dedilhar instrumentos musicais com maestria impecável.Está ajoelhado diante da mesa,e sobre sua superfície está uma pequena garrafa de saquê e uma pequena chaleira,com um chá de cheiro adocicado e suave.Também há dois copos finamente decorados,um pequeno copo de porcelana,tão raso que lembra um pires,e,por alguma razão,um pequeno pote cheio de balinhas doces.

De repente,um samurai entra no recinto e anuncia:

-Grande Lin-Wu,sua digna irmã Lena vem.

Então,a pequena menina entra no recinto.Trocara seu vestido ocidental,estranho naquelas terras,e agora estava usando um belíssimo quimono com desenhos de carpas,tão finamente feito que apenas se comparava ao quimono do próprio Lin-Wu,igualmente belo e bem-feito.Uma veste digna de uma deusa,que faria a mais bela e esmerada vestimenta da mais vaidosa e exigente rainha parecer os trapos de uma mendiga.

Ela sorri para o irmão,que se levanta e inclina a cabeça respeitosamente.Lena faz o mesmo,embora sua vontade fosse correr e abraçar seu irmão.Sabia do código de honra severo que Lin-Wu impunha a todos os seus servos,e principalmente a si mesmo.Sua expressão do rosto não se mexeu nem um pouco,mas Lena sabia que ele estava feliz por vê-la.

Lena se ajoelha diante da mesa.

-Gostaria de chá?

-Sim,por favor,onii-chan.

Lin-Wu se permite um pequeno sorriso.Onii-chan,no idioma de Tamu-ra,significava irmão mais velho,dito de uma forma carinhosa por um irmão ou irmã menor.Embora Lena adotasse a forma de uma criança,eles dois e todos os seus dezoito outros irmãos nasceram ao mesmo tempo,quando o Nada e o Vazio os geraram.Não haviam irmãos mais velhos ou mais novos.Porém,Lena o chamava assim quando queria deliberadamente agradá-lo,embora não o fizesse por interesse ou querendo manipulá-lo,mesmo porque era impossível.

-Aliás,onii-chan,obrigada pelo vestido.É lindo.

Lin-Wu acenou com a cabeça,em silêncio.Mandara as suas melhores artesãs fazerem esse vestido para a irmã.Não em uma tentativa de suborno disfarçado,como um observador desatento poderia imaginar.Lin-Wu nunca recorreria a meios tão baixos e,mesmo que recorresse,seria impossível se manipular uma deusa desse jeito.Lin-Wu apenas fizera isso para agradar a irmã,e permitir que ela usasse algo mais condizente com o reino aonde se encontrara,pois realmente ela era uma figura estranha,usando um vestido ocidental no meio de todos esses tamuranianos.

Mas Lena não viera até ali apenas para ver Lin-Wu.

Lena sabia sobre o que conversariam,e sabia que não seria uma conversa fácil.Teria de dizer não a seu querido irmão,o que era sempre algo que ela fazia com a maior dificuldade da existência.Mesmo que tivesse que recusar algo a um irmão ou irmã cujas ações Lena não aprovava,como Ragnar,o grotesco goblinoide e Deus da Morte que chacinava elfos e qualquer um que ficasse em seu caminho,ou Tenebra,que negava a vida aos seres,mas tampouco lhes dava o descanso da morte,fazendo com que permanecessem em uma semi-vida amaldiçoada,uma não-existência de mortos-vivos.Essa talvez seja a irmã que Lena menos goste.

Mesmo assim,é sempre difícil para Lena recusar algo a seus irmãos.Ama a todos igualmente,e os aceita como são,sem julgá-los.

Mas tudo era ainda mais complicado quando o pedido vinha de Lin-Wu,um irmão que nunca se opôs a ela,e raramente tomou quaisquer atitudes que ela desaprovasse ou rejeitasse.

-Você demorou.Houve algum problema no caminho?-pergunta Lin-Wu,enquanto serve o chá cuidadosamente nos dois copos

-Eu me perdi.-disse Lena,com simplicidade-Acabei me distraindo com uma lagoa cheia daqueles peixinhos coloridos,e me desorientei.Quando fui pedir informações,o espírito com quem eu falei me enganou,e me mandou para junto de um bando daqueles...como é mesmo o nome dos demônios daqui?

-Oni.

-Isso,um bando de oni.Mas,então,um deles foi gentil e me indicou a direção certa.Me desculpe pelo atraso,onii-chan,não vai acontecer de novo.

“Ela está fazendo de novo.” pensa Lin-Wu,sorrindo por dentro.Ela sempre conseguia derreter o coração do mais bruto guerreiro.Ela não precisa da aura de paz que Marah emana,Lena é simplesmente uma encarnação tão sólida da pureza e bondade,que é quase impossível sequer cogitar se fazer algum mal a ela.

Lin-Wu coloca o chá à frente de Lena,que pega uma das balinhas doces e joga dentro do chá.Sorri para o irmão,que se lembrara de como ela mais gostava de apreciar o chá,e providenciara para que aproveitasse a bebida doce e quente do jeito que gostava.

-Lena...você sabe porque eu pedi que viesse.

Lena baixa os olhos para o chá.A bala mal começara a se liquefazer,então era um pouco cedo para se levar o chá à boca,o que serviria para distraí-la e ajudá-la a pensar em uma resposta adequada a Lin-Wu.

Por fim,apenas diz,com suavidade:

-Sim.

-Pensou a respeito antes de vir me dar sua resposta?

-Sim.

Lena volta os olhos novamente para o chá.Uma parte da bala já se liquefizera,então Lena tomou um longo gole da bebida quente.

-Me diga sua resposta,Lena.

Lena suspira,baixa o chá,olha nos olhos amendoados de Lin-Wu e diz:

-Não.Infelizmente,tenho que lhe dizer não,Lin-Wu.Eu sinto muito.

Lin-Wu esperava essa resposta de Lena.Como Deusa da Vida e da Cura,Lena era totalmente avessa a qualquer ideia de morte ou sofrimento.E esse pedido traria ambos.

-Entendo.Você pensou bem no que eu lhe disse anteriormente?

-Pensei.E,não importa como eu olhe,só consigo ver dor e sofrimento.Sei que é por uma boa causa,e que você nunca me pediria isso se não fosse realmente importante.Mas,mesmo sabendo disso,eu não posso.Sinto muito,Lin-Wu.

Lin-Wu abaixa os olhos para seu chá,que ainda nem provara.Porém,muda de ideia.Pega a garrafa de saquê e serve um pequeno bocado no copo raso de porcelana.

-Onii-chan...eu sinto muito,muito mesmo!Mas você não pode pedir a outro?Khalmyr,Azgher,Tanna-toh,Thyatis?Qualquer um deles entenderia sua causa,e o ajudaria.

-É impossível,Lena.É impossível destruir o Pecado sem se corromper,a não ser que a pureza seja absoluta.E,certamente,não queremos Khalmyr,Azgher,Tanna-toh ou Thyatis corrompidos.

-E quanto a mim?Estaria tudo bem se eu fosse corrompida?

-Marah cortará a cabeça de Keenn a golpes de machado,e Khalmyr dançará nu no palácio de Nimb antes que você seja corrompida.

Lin-Wu disse isso com a maior seriedade do mundo.Embora fosse um assunto muito sério,por um segundo Lena imaginou Khalmyr dançando nu no palácio de Nimb,e teve que se conter para não rolar em gargalhadas.Lin-Wu levou o copo de saquê aos lábios,e bebeu um pouco antes de continuar.

-O pecado está em Arton.Com o pecado,chegam as mortes e a desonra.Eu a ajudarei,Lena,e juntos poderemos cuidar de nossos protegidos.

-Mas a esse custo,Lin-Wu?Quantas pessoas irão morrer antes que esse objetivo seja alcançado?

-É uma morte que ajudará a prevenir muitas outras,Lena.Eu falhei em proteger meu povo da tempestade.Por favor,me ajude a impedir que isso aconteça com outros povos.

Isso comove Lena.Ela sempre se entristecia quando Lin-Wu falava sobre a Tormenta que destruíra seus protegidos.Algo tão irreal,fruto de uma loucura,de uma ambição e poder em medidas completamente surreais.E que espalhava a morte além da morte,o horror além do horror.Nunca Lena sequer imaginara que iria encontrar tamanho horror.

E que surgira com seu consentimento!Lembrava-se como se fosse ontem,aquela tarde no Tribunal de Khalmyr,quando Hyninn enganara os dois,além de Marah,Wynna,Nimb,Tauron e até o próprio Khalmyr,fazendo com que ambos pensassem que a tempestade seria uma benção.

Lena sente as lágrimas escorrerem por seu rosto.É necessário,ela sabe que é.Mas seria tão doloroso!Tanto sofrimento teria que ocorrer,antes que o fim chegasse...

Lena passa as costas da mão pelo rosto.Se envergonha de se descontrolar assim na presença de Lin-Wu,que exige sempre o autocontrole em quaisquer situações.Então,olha diretamente para seu irmão.

-Está bem,onii-chan.Eu aceito.

Lena sabe que isso sela tudo.Trair um acordo de honra feito com Lin-Wu é o maior crime do mundo,dado que ele é o deus que representa a honra como o maior tesouro do mundo,maior até do que a vida.Quando ainda fazia parte do Panteão,nem sequer Sszzaas,Deus da Traição,se atrevera a descumprir um acordo feito com Lin-Wu.Pelo menos nenhum que eles soubessem...

Lin-Wu também se aguenta para não se descontrolar.Sabe o sofrimento que está infligindo em Lena,e sente um grande aperto dentro de si por estar fazendo isso com a mais doce entre todos os seus irmãos e irmãs.Mas ele sabe que será necessário.Se fosse possível para ele confiar em Khalmyr,Azgher ou Tanna-toh,nessa situação,é isso que ele faria.Mas Lena é a única.

-Então,assim será.

“Gomenasai,Lena.”


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Notas finais do capítulo

Bom,taí.Espero que tenham gostado.