O Barco escrita por Irwin


Capítulo 15
Tormenta


Notas iniciais do capítulo

Ponto de vista: Adel



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Abri os olhos. Não sei quanto tempo se passou, porque nem sabia se existia o tempo naquele mundo. Tanto faz. Se estivesse no mundo real, eu também não ia saber que horas eram desde quando tinha começado a beber.

Mas o fato é que acordei, ainda meio entorpecido e com alguns sentidos falhando, ao lado de onde tínhamos deixado o barco. Irwin estava retirando algumas pedras e arbustos que a correnteza havia arrastado até lá, mas deixou isso de lado quando me viu acordado.

— ... Imperatriz? — eu perguntei depois de ouvir o que ele tinha a dizer.

— Sim. Segundo aquelas pessoas, o Barqueiro deveria procurar essa fulana pra obter pistas de onde fica a tal Utopia.

Como fiquei calado, ele voltou a insistir:

— O que vai fazer?

— Não sei... talvez seja mesmo o melhor... já decido isso, deixa só me livrar dessa maldita ressaca, auhsauhsaushah

Como sempre, ele ficou sério, mas concordou. Como era raro ver Irwin interessado em alguma coisa, ignorei ao máximo a sensação de instabilidade que a bebedeira ainda me causava e o procurei dizendo que concordava em ir ver essa Imperatriz Lucidia, no continente. Ajudei a tirar um último resto de entulho que tinha invadido o barco e partimos para o próximo destino. Não conseguíamos avistar nenhum rastro da próxima ilha, e, segundo meu mapa, o continente, onde ficaria o castelo, ainda estava um pouco distante. O mar estava tranquilo, o que tornava a viagem ainda mais monótona.

Já que a viagem seria longa, e já tava me sentindo melhor, eu disse o que já devia ter dito:

— Obrigado por ontem.

— Do que está falando? — perguntou Irwin, sentado na outra ponta.

— Por ter me ajudado quando tava meio chapado.

— Não foi nada de mais.

— Mas eu lembro que me sentia muito mal... e acho que lembro de você me levando de volta até o barco e dizendo que tudo ia ficar bem.

— Devia estar alucinando — ele disse, remando com mais força. — Tudo que fiz foi te impedir de cair no meio da areia, só isso.

Eu ri:

— Não foi só isso não. Você agiu como um bom amig...

— Escuta aqui! — agora ele gritou, me interrompendo. — Já disse que está imaginando coisas, e pare de repetir isso!

— Mas...

— Eu falei na taverna, e parece que ainda não ficou claro. Não somos amigos, e nunca seremos. O fato de estar aqui nesse barco estúpido é porque é o único jeito de chegar à terra firme, onde eu poderei me mandar, entendeu?

— Mas por que você fala essas coisas? Numa situação como essa... pow, não acha que tudo seria mais tranquilo se a gente tentasse se entender?

— Ouça-me Adel, eu agradeço muito por sua ajuda naquela vez, pela internet, mas não tô interessado no que está dizendo agora. Sei como essas coisas terminam. Amigos são desnecessários.

Eu não tinha percebido, mas, como que acompanhando sua mudança de humor, o oceano foi se agitando pouco a pouco, e até algumas nuvens negras começavam a surgir no horizonte. Não podia ser um bom sinal, mas tava mais preocupado com outra coisa, na hora:

— Cara, eu entendo muito bem o que você tá dizendo. Eu também já pensei as...

— Pare de dizer que entende! Isso é uma coisa que ninguém conseguiria entender! Eu sei disso porque às vezes nem eu mesmo sinto que entendo.

Era impressionante como ele tinha se alterado. Parecia que a menor menção a esse assunto o deixava quase que fora de si. E pra piorar a situação, acho que não reagi dum jeito que ele gostaria.

— Você é igualzinho a mim — comentei rindo.

— Já pedi pra parar com isso! — ele esbravejou, parando de remar e atirando o remo com força dentro do barco.

Ao que tudo indicava, outra briga já ia começar, mas antes que eu me desse conta de que o meio do nada cercado de água ao redor não era o lugar mais indicado pra isso, outra coisa chamou minha atenção. O barco continuava velejando rapidamente, e agora nenhum de nós dois estava sequer remando. Não demorei a descobrir por que: as ondas do mar estavam noS carregando. Um princípio de tempestade havia se formando ao nosso redor.

Quando aquelas nuvens se aproximaram tão depressa? Eu tava distraído assim que nem tinha notado?!

— Cara, cuidado!

— Era só o que faltava... um temporal bem aqui! — ele praguejou.

O que eu devia fazer? Milhares de pensamentos diferentes vagaram pela minha mente num décimo de segundo. Tentei até mesmo me lembrar de qualquer coisa que meu irmão já pudesse ter comentado comigo sobre como agir em tempestades em alto mar. Ele entendia um pouco disso, mas o afobamento não me permitiria recordar. Sem falar que não era hora pra pensar muito.

— AH!

— Adel!

Com alguma dificuldade, ele me puxou de volta num momento em que o barco relativamente pequeno quase virou e eu escorreguei. Eu estava a salvo, mas era cedo pra sentir qualquer alívio. Sem que tivesse tempo de prevení-lo, uma nova onda veio na sua direção oposta, de frente para mim, e chocou-se contra nós com força suficiente para derrubá-lo na água.

— AAAHHH!

— Irwin! Irwin!

Bastou que respingasse em mim para que me lembrasse de algo terrível. A água... eu tinha esquecido que a maldita água causava dor. Assim como da outra vez, bastou um pequeno contato pra me fazer recuar, mas o Irwin... ele tinha caído de corpo inteiro.

— Droga... isso não pode... IRWIN!

As ondas estavam altas. Eu não fazia ideia da vastidão daquele oceano negro, mas tomei a única atitude que minha cabeça indicava.

Mergulhei, sem pensar em mais nada.


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