Nadeshiko passou um dos braços pelo pescoço de Tadase, apoiando-se nele, enquanto o garoto a segurava pela cintura, e a ajudou a ir até a enfermaria, mesmo que mancando.
Chegando lá...

- Nossa, que corte feio temos aqui... como conseguiu se machucar desse jeito, Nadeshiko-san?! - perguntou a enfermeira, examinando o ferimento da garota
- Hum... foi... um acidente - mentiu Nadeshiko
- "Acidente", sei - repetiu a enfermeira cética - Se não quer me contar, tudo bem, mas terá que reportar isso ao diretor mais tarde, ouviu bem, mocinha? - falou a enfermeira, enquanto passava um remédio para estancar o sangramento do pé ferido da garota - O que foi que causou esses machucados? Com o que você se feriu?
- Humm... com pregos - respondeu a Rainha
- Pregos, é? Suas vacinas estão em dia? - perguntou a enfermeira, enquanto enfaixava o pé da garota
- Sim...
- Mesmo assim, terá que tomar uma vacina antitetânica, só pra prevenir - avisou a enfermeira - Eu posso aplicar, se quiser, ou você prefere ir a algum outro hospital?
- Não... pode aplicar, sensei...
- Certo, vou preparar a seringa então, espere um minuto - falou a enfermeira, com um sorriso meigo, e foi para a outra sala preparar a vacina.
- Desculpe por isso, Fujisaki-san... você vai ter que tomar a vacina de novo - murmurou Tadase, sorrindo sem graça
- Não tem problema. Depois de ter a sola do pé toda perfurada por pregos de construção, uma vacina não é nada - respondeu a Rainha, forçando um sorriso.

Ok, isso era pra ser uma piada, mas por alguma razão, só havia deixado Tadase mais triste ainda. Pelo jeito ele ainda se culpava pelo que acontecera com a garota.

- Eu... sinto muito mesmo pelo que aconteceu... vou entender se você estiver com raiva de mim agora - murmurou o Rei sem encará-la
- Hotori-kun, me escute - falou Nadeshiko meio impaciente, segurando o rosto dele com uma das mãos e forçando-o a encará-la - Eu não te culpo pelo que aconteceu, nem um pouquinho. Pelo contrário, se você não tivesse chegado naquela hora, sabe Deus o que teria acontecido comigo. Não é sua culpa ter um bando de loucas psicopatas apaixonadas por você - falou Nadeshiko séria. E ela tinha mesmo uma certa razão sobre isso, afinal, ela era uma dessas loucas psicopatas... bom, pelo menos quando estava no Chara Change.
- Humm... certo - concordou Tadase, sorrindo sem graça - E... e-elas não fizeram mais nada com você, fizeram??
- Não, foram só os pregos mesmo... elas também queriam cortar meu cabelo, e roubar minhas roupas, mas você chegou antes que o pior acontecesse - contou Nadeshiko, enquanto voltava a amarrar seus cabelos em um alto rabo-de-cavalo - Mas não se preocupe, já estou acostumada com esse tipo de trotes... só que o de hoje foi demais
- Trotes? E-Então isso acontece com frequência?? - perguntou Tadase surpreso
- Ahh... m-mais ou menos. Mas geralmente são coisas bobas, sabe, tipo, normalmente só escondem minhas coisas, ou colocam cola na minha carteira, estragam meus cadernos... - contou Nadeshiko, percebendo tarde demais que havia falado mais do que devia - M-Mas não é nada demais, normalmente resolvo isso sozinha, sério! Só que hoje... foi um pouco mais do que o normal...

Tadase estava completamente aparvalhado com a revelação da Rainha, pra não dizer horrorizado. Ele não podia acreditar que a amiga realmente havia passado por tudo aquilo, sabe Deus quantas vezes, e por quanto tempo ela suportou esse sofrimento calada e sozinha... e tudo por causa dele.

- Não posso acreditar... que realmente a fizeram sofrer tanto, e por minha causa... POR QUE você não me contou isso antes??? - exclamou Tadase indignado
- Bem, eu... n-não queria te incomodar com isso, nem te deixar preocupado...
 Não diga bobagens, se estavam te maltratando por minha causa, eu tinha mais do que o direito de saber!! Não entendo como puderam fazer tais atrocidades com alguém tão gentil e delicada como você!! - exclamou o Rei chocado
- B-Bem, é porque... você sabe, eu sou a Rainha, então... a-as pessoas tendem a achar que eu... digo, que nós... t-temos um caso secreto, ou coisa assim... m-mas isso não importa, por que sempre consigo me safar no último instante, usando o Chara Change - respondeu Nadeshiko um tanto corada - Até mesmo hoje, usei o Chara Change sem querer pra me livrar dos ratos...
- Ratos?
- Ah sim, antes dos pregos, elas jogaram uns ratos nojentos em cima de mim, foi horrível... mas acabei entrando no Chara Change e acabei com eles - respondeu Nadeshiko, tentando fazer parecer que isso não era nada de mais - Mas, pensando bem, acho que não devia ter feito isso... eu disse coisas horríveis pra elas quando estava no Chara Change
- Está preocupada com isso?! Acredite, Fujisaki-san, seja lá o que você tenha dito, elas com certeza mereceram ouvir cada palavra - sentenciou Tadase
- Sim, mas o problema não é esse... é que eu... entenda, eu fui criada pra ser delicada e graciosa, uma mulher perfeita, digamos assim... e quando entro no Chara Change, eu fico tão... bem, completamente o oposto do que geralmente sou... e eu as xinguei de tantas coisas horríveis, não acredito que falei aquelas coisas pra elas.

De repente Tadase segura a mão da amiga e, lhe dando um doce sorriso, ele fala:

- Né, Fujisaki-san... não importa o tipo de criação que você tenha tido, ou o quão delicada e refinada seja, você continua sendo um ser humano, e nenhum humano é perfeito. Todos temos nossos defeitos, por menores que sejam, então você não devia se preocupar tanto assim com isso. Além do mais, não importa o quão terríveis tenham sido as coisas que você disse praquelas garotas, ou o quanto você fique descontrolada com o Chara Change... pra mim você sempre continuará sendo a minha Yamato Nadeshiko*.

Era incrível como Tadase conseguia arrancar um sorriso da Rainha mesmo depois de ela ter passado por uma situação tão perigosa e assustadora há pouquíssimos minutos atrás. Apenas o Rei conseguia confortá-la e fazê-la sentir-se bem daquele jeito, apenas ele conseguia fazer com que ela sorrise de verdade, e não apenas esboçar aqueles sorrisos falsos que ela geralmente dava apenas por educação.
Mas espere um pouco... ele disse "minha Yamato Nadeshiko"? Como assim "minha"?! Tadase estava dizendo que Nadeshiko era dele?! Mas era dele em que sentido??? Nadeshiko não pôde evitar de ter esses pensamentos... absurdos, digamos assim, bem como não pôde evitar de perguntar o sentido daquela frase.

- H-Hotori-kun... c-como assim eu sou "sua Yamato Nadeshiko"?? - perguntou a Rainha um tanto corada, com medo da resposta
- O quê?! - exclamou Tadase, corando também. Pelo jeito, só agora ele havia se dado conta da besteira que falou - Hãn... é que... v-você sabe, Yamato Nadeshiko é... a mulher perfeita, segundo a lenda,e... s-seu primeiro nome é Nadeshiko, então...
- Eu sei o que significa Yamato Nadeshiko, por que acha que recebi esse nome?! - interrompeu a Rainha - Estou perguntando porque você disse que eu sou... "sua"
- Err... é por que... b-bom, você é a Rainha, então... já que eu sou o Rei, você... é a minha Rainha... eu acho - concluiu Tadase, parecendo um pimentão de tão vermelho, mas ainda assim encarnado a "amiga".

Nadeshiko não conseguia acreditar no que ouvira. Ela estava tão chocada que se esquecera até de corar, estava completamente boquiaberta. Depois que absorveu a informação, ela tentou responder alguma, mas por sorte (ou azar, depende do ponto de vista), a enfermeira voltou para lhe aplicar a vacina. Ela retirou o paletó preto que Nadeshiko usava, suspendeu a manga da blusa branca que ela usava por baixo e aplicou a vacina na garota, que ainda estava tão perdida em pensamentos sobre o que o Rei acabara de falar, que nem sentiu a enorme agulha perfurando seu braço.

- Prontinho, Nadeshiko-san, terminamos - falou a enfermeira gentilmente - Agora escute, você não vai poder andar por alguns dias, e precisa de repouso absoluto, ouviu bem? E provavelmente não vai poder ir pra casa sozinha... tem alguém que possa te levar? Seu irmão, talvez?
- Não, o Nagi tinha um jogo de basquete hoje, ele já foi embora - respondeu a Rainha preocupada. De tantos dias que o irmão poderia jogar basquete, tinha que ser justo hoje?!
- Eu a levarei pra casa, sensei - falou Tadase de repente
- O que?! H-Hotori-kun, não precisa fazer isso, não quero te incomdoar...
- Não é incômodo algum - respondeu Tadase sorrindo
- Ok, então ajude-a e cuide dela direitinho, Hotori-san - falou a enfermeira sorrido - Qualquer coisa, é só me procurar. Estimo melhoras, Nadeshiko-san
- C-Certo... até logo sensei, e obrigada por tudo - agradeceu Nadeshiko, ainda um tanto contrariada.

Então ela vestiu o paletó do uniforme de novo e voltou a apoiar o braço em Tadase, e tentou ir andando com um pé só, mas era realmente incômodo ir pulando e mancando apenas com seu pé bom, sem falar que estavam demorando muito, levaram quase quinze minutos apenas pra chegar até o portão da escola. Quando estavam cruzando os portões do colégio, Nadeshiko falou:

- Hotori-kun, não precisa mesmo me levar, do jeito que estou, vai demorar uma eternidade até chegarmos na minha casa...
- Vai demorar mesmo né...? Ah, já sei! Segure-se.

E sem mais aviso, Tadase puxou a garota para cima de suas costas, segurando-a pelas dobras dos joelhos.

- H-Hotori-kun, o que está fazendo?! - exclamou a Rainha corada
- Viu, desse jeito é mais rápido - sorriu Tadase, recomeçando a andar
- N-Não mesmo, me coloque no chão! Eu devo ser muito pesada, me solte! - protestou a Rainha
- Não seja boba, não há como você ser pesada, não tem problema algum. Segure-se bem, Fujisaki-san - respondeu Tadase, ainda sorrindo.

Nadeshiko se deu por vencida, e passou os braços ao redor do pescoço dele, abraçando-o. Realmente, embora ela fosse alguns centímetros mais alta do que Tadase, não era pesada, devia ter quase o mesmo peso que ele. O Rei podia sentir o corpo da garota pressionado contra o seu, cada vez com mais precisão, pois ela parecia apertar o abraço a cada passo que ele dava. Ele podia sentir a respiração quente da garota em seu pescoço,bem como sentia perfeitamente as formas do corpo dela, pressionada em suas costas, e agradeceu intimamente por ela não poder ver seu rosto agora, pois estava mais vermelho do que um tomate.
Não que Nadeshiko não estivesse vermelha também. Agora, tão próxima do Rei, ela podia sentir o cheiro vindo de seus cabelos dourados e macios... o cabelo dele tinha cheiro de framboesa. Era diferente do cheiro do shampoo que seu irmão usava, era um cheiro mais delicado, mais suave... combinava perfeitamente com o Rei, ela pensou.
Os dois seguiram em silêncio, até que chegaram até a casa da Família Fujisaki poucos minutos depois, e o Rei desceu a amiga de suas costas, ainda segurando-a pelas mãos, para que a garota não caísse, pois não conseguia apoiar o pé machucado no chão.

- Bem... aqui estamos - falou Tadase meio sem graça
- Sim... obrigada por me trazer, Hotori-kun - agradeceu a Rainha, também um tanto embaraçada
- Imagine. Escute, você acha... que vai conseguir ir à escola amanhã? - perguntou o Rei
- Provavelmente não. Devo ficar alguns dias ausente... droga, não vou poder dançar por algum tempo também, minha mãe vai ter um ataque - comentou Nadeshiko preocupada
- Bem, o importante é você se recuperar logo - tentou consolar o Rei
- Sim... né Hotori-kun... muito obrigada por hoje... obrigada mesmo - murmurou Nadeshiko sem graça, trazendo as mãos do garoto para mais perto de si. Ele a encarava, sério e envergonhado ao mesmo tempo.
Porém, antes que se aproximassem demais, se é que vocês me entendem, a porta da casa se abriu de repente com um estrondo, assustando os dois.

- Ah, finalmente você chegou, Naddy! - exclamou Nagihiko de repente - Entra logo, a mamãe está te esperan... ué, Hotori? Eu interrompi alguma coisa...?
- NÃO!!! - gritaram o Rei e a Rainha juntos
- Não, né, sei - falou o Valete descrente - O que houve com você, Naddy? Está toda machucada
- Humm... outro bullying - respondeu a Rainha, sem encarar o irmão
- Uau, a coisa foi feia dessa vez hein... não consegue nem andar, né? - comentou Nagihiko, quase que despreocupadamente. Pelo jeito o garoto já sabia dos constantes "trotes" que a irmã sofria - Vem cá, eu te levo pra dentro... quer entrar também, Hotori?
- N-Não precisa, eu já vou andando... só vim trazê-la até em casa mesmo - respondeu Tadase
- Tem certeza? Pode entrar se quiser, talvez levar a Naddy pro quarto você mesmo, colocá-la na cama... - caçoou o Valete
- Nagi, pára com isso, não tem graça!! - exclamou a Rainha, ruborizando
- E-Eu realmente preciso ir. Então, até logo, Fujisaki-san... espero que melhore logo - disse o Rei, sorrindo sem graça para a amiga
- Obrigada... e também, obrigada por me trazer - respondeu Nadeshiko, também um tanto embaraçada, custando a soltar a mão de Tadase, que ainda a segurava para lhe dar apoio, embora Nagihiko estivesse segurando o outro braço dela
- Tem certeza de que não quer levá-la pro quarto você mesmo, Hotori?? - voltou a perguntar o Valete num tom de deboche
- J-Já disse que não, pare de fazer insinuações desse tipo, Fujisaki-kun!! - exclamou Tadase, corando mais ainda
- Não né, sei, imagina se quisesse... droga, se soubesse que você estava com a Naddy não teria vindo abrir a porta, quem sabe dessa vez vocês tivessem tido algum progresso... - resmungou Nagihiko para si mesmo
- Por isso eu disse pra você esperar mais um pouco, mas você foi todo apressado abrir a porta, viu só no que deu?! - exclamou Rhythm
- Nagi, mais uma palavra e eu faço o Chara Change e acabo com você mesmo machucada hein!! - ameaçou Nadeshiko
- Bom, já que pediu com tanta "delicadeza" - ironizou o Valete
- O-Olha, acho que vou andando... então até logo.

Tadase finalmente soltou a mão da garota e foi embora junto com Kiseki.

*Yamato Nadeshiko  se refere a uma mulher com atributos que são considerados tradicionalmente desejáveis na perspectiva dos homens da sociedade;  Uma figura de linguagem para a beleza das mulheres japonesas que são elegantes e asseadas. Suas virtudes incluem: lealdade, habilidade doméstica, humildade, e sabedoria.

*** Próximo Capítulo: Um Novo Rival Aparece! ***