Entre Este e o Outro Mundo escrita por Pineappleribbon


Capítulo 1
One Shot




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            A cidade está iluminada por enfeites de natal, trazendo um caloroso sentimento de alegria. Flocos de neve estão caindo levemente sobre uma multidão que mostra entusiasmo com as festas. Embora duas pessoas sejam exceção no meio dela: uma delas, uma menina com lágrimas escorrendo pelo seu rosto, e as limpando com o punho.
            _Então tá, eu não esperava muito mesmo.
As palavras saltaram de sua boca num tom de indignação. Ela não queria dizer isso. Principalmente após quem ela amava ter dito que não gosta dela, após ter se declarado.
Ela jogou a sacola enfeitada com uma fita em forma de laço no chão e foi embora correndo, para que ele não visse suas lágrimas. Não olhou para trás, mas sabia que ele ainda estava lá.
A menina de cabelo cor caramelo doce estava em pé esperando o metrô, com o rosto vermelho e tentando ao máximo não chorar. Ela não queria ser a única pessoa triste de lá.
Miku não devia ter se dado áquele trabalho, não era disso. Mas pensava que o menino valia a pena, ainda mais sendo supostamente seu amigo. Na caixa havia um cachecol que ela mesma fez. Ideia de seus amigos. Aliás, esses também não eram lá os melhores que alguém pode ter, pelo que já havia passado.
O vento estava fazendo seu rosto que estava molhado, ficar frio. E enquanto o cobria com o braço, notou que o trem da linha em que estava esperando estava absurdamente atrasado. Desde que chegou lá, fazia uns quarenta minutos. Olhou a sua volta, e muita gente também estava estranhando.

Finalmente o trem chegou, e o vento gelado que estava passando desapareceu com o ambiente quente, por causa do vagão super lotado. Ela olhou o outro vagão, e estava quase que completamente vazio, com somente três pessoas. Pensou um pouco e resolveu ir. Era estranho que ninguém que estava no vagão lotado teve essa ideia.
Ela se sentou e olhou em volta: no banco da frente estava um menino lendo um mangá de esportes, no outro banco estava uma menina com a mesma idade, com muitas sacolas de compras em volta. E no mesmo banco em que estava sentada havia uma menina que supostamente teria uns doze anos, vestindo uma roupa extravagante. Ela segurava uma varinha com uma estrela na ponta, vestia um vestido rosa e azul bebê como de uma boneca, usava marias-chiquinhas  altas, e um cabelo castanho claro, com um laço e estrelas pendurados.
“Deve ter vindo de Harajuku, essa criança.”
Miku estava pensando no que aconteceu, e tudo o que passava pela sua cabeça é de que o papel de idiota que fez não valeu de nada. Ela sentia que era capaz de tudo por ele, então fez o que os amigos disseram, que era o que sempre considerou a coisa mais ridícula. Ela se dedicou a fazer presentinhos e tentar ser romântica, o que mais detestava. Também chegou a conclusão de que nenhum homem valeria a pena para isso, e que nunca mais faria algo assim para mais ninguém.
            _Você está com uma cara bem acabada.
A menina disse isso á ela, o que a fez ficar surpresa.
            _Dá para ver tanto assim?Bem, é isso o que acontece quando se apaixona.
            _Pelo que eu sei, o que acontece quando nos apaixonamos é totalmente o contrário.
“Há, ela não sabe pelo que vai passar quando crescer.”
            _Eu já sou crescida tá?!
Ela se assustou com a resposta da menina ao seu lado.
            _E-Eu não disse nada.
            _Mas pensou!
“Lógico que ela deduziu que eu pensei nela como uma criança. Deve ser freqüente.”
_Saiba que eu já tenho 24 anos tá?!
            _E eu vou fingir que acredito.
“24 anos?Ela deveria mentir no máximo uns 14.”
            _Mas eu gosto mais de 24 do que 14, já os aproveitei.
            _Tá, agora você está me assustando.
Ela falou surpresa, mas a tristeza na sua voz continuava a mesma.
            _Você não deveria pensar essas coisas dos outros, é como falar deles pelas costas.
            _E como você leu meus pensamentos?
Isso estava ficando bem estranho, mas não o suficiente para ela mudar seu tom de voz.
            _Eu sou uma bruxa que veio do passado, há há.
            _Ahn...Vou me sentar ali do outro lado, com licença.
            _Não!Espera!
A criança levantou e a puxou pelo braço.
            _Tem gente aí, não está vendo?
Enquanto a maior foi puxada de volta ao assento, disse:
            _Não. E você é meio louquinha né?
            _Sério?Isso é meio estranho...
A menor balançou o bastão colorido em frente a menina, e cobriu seus olhos com um tipo de pó brilhante. Miku poderia jurar que ficou louca também, já que olhou em sua volta, e viu os lugares que antes estavam vazios, ocupados por... Seres estranhos. Seres de estranhas aparências e cores e que, definitivamente, não eram humanos.
            _O-O que são eles?!
Ela gritou, e logo depois teve sua boca tapada pela mão da menor.
            _Ei!Não fale assim, eles estão ouvindo!
            _Uau, acho que o choque de hoje foi demais para mim.
Alguns os chamariam de monstros, mas eram espíritos, e que se pareciam muito com os do folclore japonês. Isso é, se não fossem mesmo.
Esses espíritos estavam organizadamente sentados, cada um respeitando o espaço do outro. Havia uns lendo jornais, outros ouvindo música, e outros simplesmente sentados, esperando o seu ponto.
            _Posso perguntar uma coisa?
A menina com o bastão colorido estava encarando Miku.
            _Já estamos nessa situação totalmente estranha, pode fazer o que quiser.
Ela lhe respondeu, sem tirar o seu olhar de espanto dos espíritos. E a outra lhe olhou com um olhar malicioso.
            _Tome cuidado com o que fala com os outros.
A outra parou por um segundo para entender o que ela quis dizer.
            _Você é uma menina muito estranha!
            _Miku-san... Você acredita em algo?
O rosto da menor imediatamente ficou com uma expressão séria.
“Por que ela está me perguntando isso?”
            _O que você quer dizer?
            _Bem, você acredita nesses seres?
            _O que eu acredito é que o choque pelo que eu passei hoje foi demais e eu estou começando a ter visões.
            _O choque de perder alguém amado?
A frase dita, ou melhor, as palavras que foram usadas, deixaram Miku confusa, refletindo em seu rosto.
            _Você não o amava não é?
            _Não! Quer dizer, acho que o amava sim!
            _Exatamente.
“Quê? Do que ela está falando?”
            _Você por acaso... Daria sua vida por ele? Aquele que te faz feliz?
Os olhos de Miku se abriram mais, sendo que antes estavam cobertos por lágrimas.
             _Você NÃO o amava, nunca amou.
E os sentimentos da garota mudaram para raiva, raiva daquela que questionava seus sentimentos e esforços.
            _Como pode dizer isso?! Eu fiz de tudo para me declarar! Fiz de tudo para que ele me notasse! Coisas que nunca passaram pela minha cabeça em fazer!
Nesse momento outra voz se pronunciou.
            _Ei, você não fez tudo o que podia, e também não foi por ele.
Ela olhou para o lado, e viu que essa voz era de um dos espíritos. Ele usava uma gravata, um chapéu e estava tranquilamente lendo seu jornal.
            _C-Como assim?
            _Você poderia muito bem ter ficado lá e insistido mais, já que o amava tanto assim.E... Bem, deixo o resto pra mocinha ao seu lado.
            _Exatamente. E você fez tudo isso por você mesma. Ele não tinha seus sentimentos, ele foi somente uma pessoa aleatória que você escolheu.
A raiva e confusão de Miku ficaram ainda maiores.
            _Eu não entendo como vocês podem falar tudo isso, vocês nem me conhecem!
Ignorando o que ela acabou de dizer, a menor continuou a falar.
            _Pense bem, ele não era tão especial assim. Aposto que o que está vindo á sua mente não é o rosto dele, e sim pensamentos de dúvida quanto ao que poderia ter dado errado.
Ela deu uma pausa, e Miku estava olhando fixamente para o chão com a boca ligeiramente aberta, tentando entender o que a menina lhe havia dito.
_Miku-chan...
Dessa vez ela mudou o modo como chamava a outra, tentando fazê-la se acalmar.
            _Você nunca se apaixonou. Não acredita nesse sentimento, não é?
A outra ainda não conseguia fazer com que palavras saíssem de sua boca. As duas pararam por alguns minutos. O silêncio normal do trem havia voltado, e Miku levantou a cabeça. Conseguiu se acalmar para pensar em tudo aquilo.
Ela realmente nunca havia se apaixonado. E percebeu que sempre soube que o que sentia pelo amigo não era paixão, e muito menos amor. Ele era somente alguém que supostamente era muito próximo dela. Todos viviam lhe falando que ela deveria se abrir mais para o amor, e pelo menos considerar as declarações que recebia de vez em quando.
Olhou para os lados, inclusive para os outros dois humanos que também estavam lá. Isso é, se a menina colorida, cheia de estrelas e coisas fofas também fosse uma.
            _Eu nunca me apaixonei. 
Após dizer isso, Miku começou a rir. Ela ria por causa de sua burrice. Só conseguia pensar no quanto sua atitude todo esse tempo foi burrice. Uma completa burrice e perda de tempo. Ela ria também pela sensação de alívio que lhe invadiu. Não precisava mais chorar, afinal, não havia perdido nada. Principalmente porque descobriu que nem seu amigo aquele garoto era.
A menor sorriu e começou a rir junto dela.
            _Mas o que aconteceu não foi perda de tempo.
“Lá vem ela lendo minha mente de novo.”
            _Eu sei, eu aprendi algo muito, muito óbvio com tudo isso.
            _Não, não foi só por causa disso.
Enquanto limpava o rosto que antes estava coberto por lágrimas, Miku perguntou:
            _Ahn? Mas por que mais seria?
Agora a menina falava com uma expressão alegre.
            _Já ouviu falar em destino? Ou... Já sei! Linha da vida!
            _O quê?
            _Tudo acontece por um motivo, e a linha da vida de cada pessoa que você encontra se entrelaça á sua. Encontros e eventos não acontecem á toa...
Miku estava prestando atenção á cada palavra que a menor dizia.
            _Inclusive você ter estado aqui, nesse trem de espíritos.
            _Mas... O que os espíritos têm haver mesmo?
            _Bem, agora você acredita neles, não é?
            _Acho que sim... Quer dizer, acredito. Realmente existem coisas que parecem improváveis de acontecer...
Ela agora pensava nesse assunto, mas não teve tempo o suficiente, pois a garota continuou o que estava falando.
            _Você acredita nos seus sentimentos?
            _Nos meus sentimentos... Sim, bem confusos, mas eu os entendo agora. Só não sei bem se acredito nisso de destino, ou até mesmo no amor. Isso. E eu não tenho muita certeza de que isso irá mudar algum dia.
Disse olhando para o teto com uma expressão serena, tentando se conformar.
A menor deu uma gargalhada, dizendo:
            _Bem, agora eu farei você acreditar!
Ela sacudiu o bastão, o que Miku não sabia se era preciso, ou somente para dar um efeito dramático. E nesse mesmo segundo,  o trem começou a balançar violentamente e as luzes ligavam e desligavam sem parar.
Miku se desesperou, segurando no apoio de metal do trem, se perguntando o que estava acontecendo, assim como os outros dois que estavam no vagão. Estava balançando muito, fazendo com que alguns pertences voassem para longe.
Mas o estranho é que os espíritos que estavam lá continuaram tranqüilos e quietos.

As luzes se apagaram e o trem parou violentamente. Deu para ouvir os gritos dos três que estavam lá, e a menina de Harajuku havia desaparecido, junto com os espíritos.
Agora se ouvia a voz dos auto-falantes, indicando a estação em que estava. E que, misteriosamente, não era a de nenhum dos três. No entanto eles resolveram sair daquele trem estranho.
Os dois outros saíram do trem, e Miku ficou lá por mais uns segundos, tentando assimilar o que aconteceu. Mas quando olhou para o chão, encontrou um caderno com a mesma capa que o seu tem. Ela olhou dentro de sua bolsa, e ele não estava lá, logo pôde concluir que era seu.
Quando saiu do trem, a menina que também estava lá lhe parou.
            _Ah... Isso... É seu?
Ela olhou, e era o mesmo caderno que havia encontrado.
            _Não... O meu está aqui.
Ela abriu o caderno, e percebeu que não era o seu, estando escrito outro nome, e coisas diferentes do seu. Pegou o que a garota estava segurando, e viu que esse realmente era o que lhe pertencia.
            _Puxa... É o meu sim!
            _É... Você gosta de muitas bandas que eu, pelo que eu notei no caderno! Eu não sou de falar com estranhos do nada, mas se não for incomodar, poderíamos nos encontrar outras vezes!
A menina que estava segurando suas várias sacolas falou hesitante, esperando que a outra não se assustasse.
Miku pensou no que aprendeu hoje, de se fechar para algumas coisas, e aceitou o convite da outra. Elas trocaram os números dos celulares e sorriram.
            _Além do mais, foi bem estranho isso que aconteceu no trem...
            _Com certeza... Bem, nos encontramos depois!
Miku disse, e depois as duas se despediram. Cada uma tinha acabado de arranjar uma amizade verdadeira.

Ela resolveu sair da estação, mesmo não sendo o ponto que queria. Dar uma volta depois de tudo isso seria refrescante. Enquanto andava, resolveu olhar o caderno que encontrou, e passou ao lado de um menino. Era o que estava no mesmo trem em que aconteceram todas aquelas coisas estranhas. E no mesmo momento, os dois sentiram um calafrio.
O garoto continuou andando, e percebeu que o caderno que a garota que passou ao seu lado segurava, parecia muito com o seu. Ele deu meia volta, andando em sua direção, e a cutucou.
            _Bem... Eu não sei se estou certo, mas eu perdi um caderno igual a esse que você está segurando... Eu poderia dar uma olhada?
Ele dizia á garota, com uma das mãos coçando a cabeça por trás, um pouco sem jeito.
Miku levou um susto, mas logo assimilou a situação. E nesse momento, os dois começaram a sentir algo estranho.
            _Ah! Eu encontrei esse caderno no trem, eu pensei que era o meu, mas a minha letra é um pouco pior.
Os dois riram, enquanto ela entregava o caderno ao garoto.
            _É esse mesmo, obrigado! Mas... Você também estava naquele trem que deu um terremoto estranho, ou sei lá?
            _Estava. Felizmente e, estranhamente, eu estava.
Ela sorriu, e o garoto teve uma ideia.
_Ei! Quer tomar um café? Eu... Aprendi umas coisas naquele trem...
O coração de Miku, que já estava em um ritmo diferente, acelerou.
            _C-Claro! É uma boa ideia!
O garoto sorriu para Miku e, naquela noite de natal, ela passou a acreditar menos ainda em destino, que as linhas da vida das pessoas estavam entrelaçadas, e que tudo tem um significado.
Agora ela sabia.


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