Pequena Criança escrita por Yokichan


Capítulo 1
Único.


Notas iniciais do capítulo

Há momentos em que precisamos desabafar, não é?



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Por quê?

            Ela tinha medo da pergunta. Tinha medo das respostas. Tinha medo de lembrar.

            Mas era inevitável – insuportável. Não havia como esquecer, nem mesmo tendo consciência de que ele era o maior mau que lhe acontecera, nem mesmo sabendo que ele não a amava como ela o amava, e que se preciso, a machucaria outra vez. Porque ele era tão frio quanto o vento do inverno, e assim como este parecia cortar o rosto debaixo do cachecol, ele havia cortado seu coração que nunca mais foi o mesmo.

            Por quê?

            Por que eles se conheceram? Por que se apaixonaram? Por que disseram eu te amo um ao outro? Por que ele a fez sentir e conhecer a dor? Por que ele a fez chorar? Por que ela foi tão burra ao ponto de deixá-lo partir? Por que ela teve que fazer uma escolha, e justamente a errada? Por que eles sempre estiveram tão longe? Por que a felicidade não veio para eles? Por que tudo o que restou foi o escuro e a tristeza?

            Por quê? Ela apenas queria saber, mesmo que fosse impossível.

            E agora, não havia mais nada. Acabara, para sempre. Ele não voltaria, ela não queria que ele voltasse – mas suas esperanças não morriam. Tudo o que ela era, tudo o que deixara para trás, tudo o que conseguira, era mérito dele. Apenas dele, aquele que lhe abriu os olhos, aquele que lhe colocou no caminho da verdade e a empurrou para a dor. Porque a verdade é apenas a dor. A dor de saber que não estamos mais brincando, a dor de saber que não há mais volta, a dor de saber que estamos por nós mesmos, a dor de descobrir que nem tudo pode ser corrigido. E por isso, ela lhe devia tanto... Ele a havia tirado do escuro da ignorância, e sem ele, ela nunca teria chegado tão longe.

            Mas ele era o amor e o ódio, ele era todos os sonhos fracassados que ela um dia teve. Ele lhe dissera coisas que ela jamais esqueceria, coisas que ainda doíam, coisas que a faziam querer desistir. Coisas que a faziam odiar a si própria, principalmente. Odiar-se mais do que odiá-lo, por desmoronar à mínima lembrança dele. Porque ela era fraca – talvez ele a tivesse feito assim – e não era capaz de ser fria e controlada como ele. Controlar os próprios sentimentos, agir pela razão, evitar a dor, não chorar, não sentir, não se deixar dominar. Como ele conseguia? Como ele era capaz de ser tão frio consigo e com ela? E tudo o que ela mais queria, era poder ser como ele.

            Agora, só agora, ela tinha certeza de algumas coisas. Odiava-o, sincera e profundamente, porque ele desistiu daquilo que um dia eles quiseram juntos. Amava-o, irracionalmente e para sempre, porque ele fora o único que a tocou onde ninguém foi capaz de tocar. Porque ele fez dela uma pessoa melhor, ainda que atormentada por aquele fantasma que jamais iria embora. Não queria mais vê-lo, não queria mais ouvi-lo, não queria que ele voltasse nunca mais. Alimentar esperanças doía como nada pode doer, e ela resolvera jogar as suas fora. Mas por que algumas ainda insistiam em permanecer ali, no fundo daquele coração destroçado?

            Lembranças, aquilo bastava para movê-la dali por diante – sozinha. Apenas saber que um dia ele esteve ali, que um dia ela esperou ansiosa para encontrá-lo, que existiram sonhos bonitos enquanto ambos puderam suportar, era o suficiente para mantê-la de pé. Mas...

            Por quê?

            Por que mesmo tendo prometido que o arrancaria de dentro de si algum dia, mesmo tendo jurado que nunca mais derramaria uma lágrima por ele – por eles –, ela ainda sentia tanta falta do que jamais voltaria? Talvez, fosse como ele havia dito. “Eu te vejo como uma pequena criança”.

            Ela olhou uma última vez para o céu escuro e estrelado, depois levantou-se da calçada fria e tomou o caminho de casa. Ele era a noite, ele estava a abraçando naquele momento. Um abraço frio e doloroso, porque ele gostava de vê-la sofrer. E envolvida por ele, pelo escuro, ela exibiu seu sorriso triste mais convincente. Quem precisa da felicidade, quando se tem um motivo como aquele para continuar sobrevivendo? Ela não o esqueceria, nunca.

            Sua pequena criança. Sua garota imatura e inocente.

            Ela jamais amaria outra vez.

            Porque ele não deixara espaço para mais ninguém. E ela estava bem assim.


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Notas finais do capítulo

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