- Kamijo, assim não dá! - gritou Teru, histérico, entrando na sala como um revolucionário. Nas mãos, algumas dúzias de folhas rabiscadas e uma caneta atrás da orelha.

Hizaki, sentado de qualquer jeito no sofá, suspirou profundamente.

"Essa não... lá vem ele de novo..."

- O que não dá, Teru?

- Precisamos fazer algumas mudanças aqui!

- Mas o que...

- Temos que fazer roupas novas!

- Teru, nós acabamos de adotar outro estilo, e...

- Hizaki é homem demais para continuar no papel de princesa da banda!

Uma pesada almofada fora atirada na cabeça do guitarrista, que caiu no chão.

- Estão vendo? Ele é muito bruto!

Os outros começaram a rir. Hizaki mantinha o olhar fixo na TV, que exibia um documentário qualquer sobre a vida animal.

"Vai começar."

- Fiz uns desenhos legais - balançou as folhas que trazia nas mãos, entregando-as aos amigos. - Vejam aí.

- Essa aqui ficaria muito boa no Hizaki - disse Yuki, observando com atenção um dos esboços.

- Eu sabia que concordariam! Olha o jeito que esse cara está sentado. Parece meu pai depois de comer um porco no almoço, só falta arrotar pra ficar igualzinho! Quando é que uma princesa faz isso?

Mais risos. Novamente, o loiro suspirou. Não havia motivo para perder a cabeça, aquilo era bem próprio de Teru: a chatice. E Hizaki, em tantos anos de convivência, já estava mais do que acostumado. Ele logo pararia...

- Olhem esse aqui. Com um pouco menos de maquiagem e um penteado diferente, ninguém mais vai achar que Hii-chan é uma princesa. Nós sabemos que ele esconde uma arma dentro do vestido. E que arma, não é, Hii-chan?

O controle remoto foi atirado na direção de Teru, que conseguiu abaixar-se a tempo. O objeto atingiu a parede, partindo-se e perdendo as pilhas.

- Ai, seu violento!

- Quem é que usava aquele alice bow¹ gigante na cabeça nos tempos de HGP², hein?

- Ah, Hii-chan! Dava dó te deixar se vestir de mulher sozinho!

- Cala a boca, vai.

- Hii-chan maria-macho.

Hizaki levantou-se e saiu da sala, bufando. Ouviu-se o som da porta da frente batendo, e um urro de ódio vir do lado de fora.

- Teru... acho que dessa vez você passou dos limites - Kamijo comentou, parecendo assustado. - Hizaki nunca fica desse jeito. Só quando é acordado antes das seis...

- É estranho mesmo... vou lá falar com ele!

- Leve um colete à prova de balas. - brincou Masashi, arrancando novos risos de todos.

O guitarrista ia cruzar a porta quando fora chamado por Yuki, que o encarava de lábios torcidos num bico de desapontamento.

- Teru...

- Hai?

O baterista ergueu um dos desenhos.

- Por que essa roupa do Hizaki é mais bonita que a minha?

- Baka! - Riu mais uma vez, desaparecendo no corredor em seguida.

Sentado na varanda, Hizaki olhava o movimento na rua, pensando no que estaria acontecendo. Que Teru adorava tirá-lo do sério, era verdade, mas nos últimos dias aquilo estava se tornando insuportável. Qualquer coisa gerava uma brincadeira ou um comentário sem graça. No fundo, estava começando a ficar com ódio daquela mania de Teru em ficar pentelhando seu modo de se vestir. Tudo bem, há quanto tempo se conheciam? Há quanto tempo eram melhores amigos e faziam piadas um com o outro? Há quanto tempo Teru tinha se dado tanta liberdade para acabar ferindo os sentimentos de Hizaki...? Fechou os olhos, sentindo a franja ser bagunçada pelo vento que passava pelo local. Refletiu... decidiu-se. Se o outro viesse fazer mais um comentário idiota, levaria um soco.

- Mas que droga, Teru! - esmurrou a grama, revoltado. Assustou-se ao sentir um toque em seu ombro. Olhou para trás, era Teru.

- Hii-chan...

- Veio me encher o saco de novo?

Nervoso, o loiro chegou a se levantar e dar alguns passos, mas fora segurado pelo pulso.

- Me solta.

- Hii-chan, só vim conversar com você.

- Não quero conversar com você. Você é um porre!

- Desculpa.

- Não, isso já me estressou! Teru, já cansei de você e dessa mania de me provocar a todo minuto. Simplesmente cansei! Por que não faz isso com Yuki, Kamijo ou Masashi? Por que é só comigo? O que foi que eu fiz pra você?

- Com eles, não tem tanta graça.

- Acha graça em me ver bravo? Pff, isso é ridículo.

- Não, não... Acho bonitinho até.

- Pare de dizer tanta besteira e me solta logo. Quando você parar de ser infantil, pode ir lá falar comigo.

- Dizem que os homens, quando se apaixonam, começam a irritar a garota só para conseguir atenção.

"É por isso? Você se apaixonou? Está eufórico, é isso? Babaca!"

- Vá fazer isso com ela! Com certeza ela vai detestar!

Um sorriso singelo tomou forma nos lábios róseos de Teru. A mão direita fora levada à face do outro, acariciando-a brevemente com o dorso dos dedos.

- Só vai ficar mais bonita do que já está.

A face esquentou instantaneamente. As palavras travaram na garganta, e a raiva simplesmente evaporou. Então ele...?

"Não. De jeito nenhum."

- ...?

- Achou que eu estava falando de quem?

- Desculpe, não sou uma garota!

- Pode ser que não. Mas pra mim sempre será a princesa de Versailles. A minha princesa.

- Mas você disse que...

- O que eu acabei de dizer sobre tentar chamar a atenção?

- Teru...

- Eu te amo, Hii-chan.

Sequer teve tempo de fechar os olhos. Os lábios foram tomados de assalto por seus semelhantes. Fora rápido, mas tão bom...

- Tee-chan...

- Desculpa.

- Cala a boca e me beija de novo.

Teru quis rir, mas dessa vez, foi ele que não tivera tempo. Abraçou a cintura do loiro apressado, enquanto movia os lábios sobre os dele de forma delicada, entreabrindo-os para dar passagem à língua curiosa que não se aguentava na vontade de descobrir que gosto tinha a saliva alheia. As mãos de Hizaki apertavam-lhe o corpo num abraço necessitado de contato, de calor, acariciando-lhe as costas cobertas pela camisa de seda branca. Da janela, os outros três observavam a cena.

- Eu sabia! - comentou Kamijo, numa explosão vigorosa. - Masashi, pague-me o dinheiro que me deve!

- Nunca mais aposto nada com você, Kamijo! - resmungou Masashi, retirando a contragosto algumas notas do bolso da calça.

Lá fora, os outros dois pareciam alheios a tudo. Ao som dos carros, ao latido dos cães, aos risos das crianças que brincavam nas varandas de suas casas. Para Teru, só existia o beijo de Hizaki e, para Hizaki, só existia Teru...

Ele era, sim, homem demais para ser a princesa da banda. Porém, não importava mais. Ele só precisava ser a princesa de Teru para se sentir completo.

"Se for assim, Tee-chan... pode me irritar mais vezes..."