Já é tarde da noite. Não sei ao certo que horas são, pois o velho despertador sobre o criado-mudo está sem pilhas a alguns dias. Em meu quarto, reina o silêncio, reina a angústia e a melancolia. Encontro-me sentada no parapeito da janela, que está virada para a imensa cidade, que apesar de ter o céu poluído pela fumaça dos carros e das fábricas, ainda deixa visível a bela lua branca, que brilha timidamente escondida atrás de uma nuvem.

Bela lua branca. Seu brilho hipnotiza-me assim como o reflexo de Narciso hipnotizou a ele próprio. A lua trama para mim a mesma armadilha que o reflexo tramou para Narciso. Sinto-me quase que enamorada por aquele brilho, mas então, o som de passos pela casa faz meus olhos desprenderem-se daquela armadilha e voltarem-se para a porta do quarto, que observo atentamente, sem fazer nenhum movimento. Logo, o silêncio volta a reinar. Abraço minhas pernas e sinto meu coração apertar dentro do peito, apertar de uma maneira que jamais acontecera antes. Eu tento não chorar, apesar de meus olhos estarem a beira de transbordar. Sinto como se meu coração estivesse sangrando, meu peito parece gritar de desespero e meus olhos não resistem e deixam que as lágrimas escorram.

"Algum dia...Quem sabe algum dia eu possa finalmente dizer que eu te amo? O mundo dá tantas voltas, mas...Por enquanto, eu não posso de um tempo para pensar nos seus sentimentos e para pensar se estou pronto para ter sentimentos de novo. Me desculpe por isso...E não chore.". Essas palavras suaves mas ao mesmo tempo dolorosas fizeram meu coração chorar e desde aquele momento até agora, sinto como se ainda não pudesse dizer que meu coração está forte como era antes. Eu sinto como se estivesse desmoronando, te observo distante mas sei que não posso abraçá-lo. Você é como se fosse o próprio reflexo de Narciso e eu sou o verdadeiro Narciso, que observa, obcecado, sua bela imagem nas águas de um riacho. Você é este reflexo, você é uma ilusão que desejo possuir como se fosse real, eu desejo tocá-lo, mas sinto que minhas mão não podem prender-te, elas deslizam, deslizam pois não podem capturar uma ilusão. Apesar de estar ciente disso, continuo persistindo e insistindo, aguardando até o momento em que finalmente meu pequeno desejo egoísta de possuí-lo apenas para mim possa se realizar. Meu coração inseguro e solitário busca por um consolo, sinto que meus dias estão perdendo os sentido e que estou morrendo aos poucos. Meu coração triste e amargurado tenta se esconder atrás da rotina, mas não sou mais capaz de aguentar esse profundo vazio que me contagia. Não importa mais nada, não importa mais a escola, o trabalho, os amigos, nada mais me importa. Eu só preciso de você agora!