Eu ainda me lembro muito bem daquele dia. A brisa gelada fazia meus cabelos balançarem e, apesar da roupa quente envolvendo meu corpo, eu trepidava levemente de frio.

A paisagem a minha volta estava completamente branca, repleta de neve. As árvores que dias atrás apresentavam belas folhagens e cores vivas, agora estavam acompanhando o cenário neutro.

Eu fazia o caminho até sua casa. Você havia me ligado logo cedo, entusiasmado por ter descoberto uma nova técnica e afoito por mostra-la logo para alguém.

 Após alguns minutos chego e toco a campainha. Porém, ao invés de alguém atender a porta, ouço um grito abafado:

– Entra Goenji! A porta está aberta!

Estranho o fato de sua mãe não ir me receber, como sempre fazia com todos os convidados de seu filho. Subo as escadas e bato levemente na porta do quarto antes de entrar:

– Oi Endo.

Você levantou-se rapidamente para me cumprimentar, com um característico sorriso nos lábios.

– Oi Goenji. Senta aí na cama.

Sentei-me e logo você fez o mesmo, sentando ao meu lado.

– Endo, você não me chamou aqui para mostrar a nova técnica que descobriu?

– Sim, mas minha mãe saiu para ir ao mercado e falou pra eu esperar ela voltar. Mas não se preocupe, ela não vai demorar não.

Depois disso passamos a conversar. Nada de importante na verdade, apenas trivialidades. Porém o tempo estava passando e sua mãe tardava a voltar.

– Nossa, como sua mãe está demorando..

– Realmente.

Ele levantou-se e foi em direção à janela, tentando ver se a mãe estava por perto. Levantei e me juntei a ele. Ficamos durante longos minutos observando a paisagem branca lá fora.

Eu não sei precisar como, nem quando. Mas em determinado momento eu virei meu rosto para olha-lo. E você também virou o seu. Ficamos os dois se encarando. Estávamos tão próximos que eu podia sentir sua respiração quente bater levemente em meu rosto.

Então eu imaginei, como já havia feito antes, o que aconteceria se eu me aproximasse mais. Se eu tentasse algo mais. Porém você logo virou de costas e se afastou, mas eu pude ver o quanto estava corado. E talvez tenha sido isso que me deu coragem para concluir meu intento.

Enquanto você ainda estava de costas, andando na direção da parede mais próxima, eu me aproximei sorrateiramente. E assim que você virou te prensei contra ela.

– Goenji, o que está fazendo?

Seus olhos estavam arregalados e você aparentava até certo medo. Mas a coloração avermelhada em suas bochechas ainda estava presente, o que me levou a crer que o que eu tinha em mente havia pelo menos passado pela sua cabeça.

– Na verdade, nem mesmo eu sei Endo.

Levei um dos meus braços até sua cintura, e aproximei nossos corpos. E assim fui aproximando levemente meu rosto do seu. Logo eu podia sentir novamente a sua respiração se misturando com a minha.

Parei por um breve momento e observei você durante alguns segundos. Estava ainda mais corado do que antes e tinha a boca ligeiramente aberta. Seus olhos estavam fixos na minha boca. Não consegui conter um sorriso. Você era lindo.

Voltei logo a me aproximar e não me detive desta vez. Colei nossos lábios ainda com os olhos abertos, mas assim que você fechou os seus, eu também fechei os meus. Pedi passagem para adentrar sua boca e você logo a concedeu.

Nossas línguas mexiam-se em total sincronia. Nosso beijo, antes calmo e receoso, agora transformava-se em algo urgente. Você puxava-me para mais perto, agarrando-me pela nuca e bagunçando meus cabelos. Eu pressionava nossos corpos contra a parede, segurando firme em sua cintura.

Lembro que nos separamos rapidamente ao ouvir os passos da sua mãe na escada, o que indicava que ela finalmente havia chegado. O que me irritou profundamente. Justo naquela hora?

Ela entrou no quarto e me cumprimentou, para logo depois sair. Ficamos um longo tempo sem falar nada, apenas nos encarando. E por fim eu simplesmente acenei com a cabeça e fui embora.

Lembro até hoje das confusões que ocorreram depois daquele dia. E naquela época eu me arrependi muito de ter ido à sua casa e de ter te beijado.

Mas agora eu olhava para você dormindo ao meu lado, na nossa cama, na nossa casa. Fazia dois anos que morávamos juntos. E sinceramente? Eu não poderia estar mais satisfeito.

E hoje eu sei que se eu pudesse voltar àquele dia, eu faria tudo de novo. Pois foi o que eu fiz naquele dia gelado, que me permitiu ser feliz.