Saint Maria escrita por Tai Flores


Capítulo 1
Capítulo 1




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Ainda lembro como se fosse ontem... Minha família se mudara para uma cidade no sul do Brasil chamada de Saint Maria. Meu pai, Jhon, havia perdido o emprego e tivemos que voltar para sua cidade natal com o objetivo de retomar nossa vida. Tínhamos casa perto das médias montanhas entre a depressão central e o final do rebordo do planalto norte, e tudo que se via era verde e bonito por natureza. Além de ter essa paisagem muito bem formada e ser envolta delas, não era cidade rural, e sim urbana. Tinha característica de ser uma cidade universitária, pelas diversas faculdades e por apresentar uma alternativa de estudos para os jovens que residiam em municípios vizinhos, sem contar também que, muitas fábricas haviam sido abertas e necessitavam de mão-de-obra. Viemos quando tinha quatro anos de idade, e foi neste tempo que minha vida começou a mudar.

De tanto que o observava ao passar, o rapaz começou a fazer caretas para me assustar, reação típica de adultos com crianças. Ele sempre estava sentado em sua moto preta. Suas características físicas eram bastante estranhas. Usava sempre cor preta, por mais lindo que o dia fosse. Às vezes usava roupas curtas para deixar o sol bater em sua pele branca. Seus cabelos eram negros e espetados. Seus olhos tinham envolto preto e também tinha um piercing na sobrancelha. Verdadeiro andrógeno, assim chamava-o meu irmão. Essa sua aparência me dava certo medo, mas mesmo assim o olhava bem no fundo de seus olhos.
Tinha dias que suas caretas me assustavam e tinham dias que elas me faziam rir. Minha mãe sempre via esse garoto me olhar e sentia medo por causa disso. Ouvia sempre nos noticiários, crimes envolvendo seqüestro e pedofilia, e por isso me alertava sobre ele. Porém, eu não sentia certas intenções. Talvez ele quisesse me fazer rir, ou até mesmo chorar, não saberia explicar naquele momento. O mais estranho era que, ao passar dos dias, suas caretas e olhares misteriosos foram dando espaço a sorrisos e olhares mais curiosos. Mudança que me fez não sentir mais medo e sim entusiasmo para passar por eles e ver seu sorriso bonito em meio às roupas escuras.

Quando comecei a ir para o jardim de infância, todos os dias de manhã bem cedinho, minha mãe, San, levava-me para a escola, que se localizava a duas quadras abaixo de minha casa. Nós sempre passávamos por um grupo de meninos, muito mais velhos, aparentavam dezoito anos ou mais, que ficavam parados em uma esquina, mais ou menos na metade do caminho para a escola. Quando voltava para casa, já não estavam mais ali. Todos se vestiam muito bem, tinham motos, deveriam ter boas condições financeiras e tudo mais. Às vezes os via sentados na parte superior de um carro preto com listras brancas. Eram entre quatro jovens, mas um era muito diferente em relação aos outros. E foi esse que me chamou mais atenção. 

Foi por muito tempo assim, eu passava e eles sempre ali, parados e conversando com um copo de bebida e alguns deles com cigarro nos dedos. Ele, eu nunca tinha visto fazendo nenhuma dessas coisas, mas minha mãe dizia que nunca era pra eu chegar perto, pois seria perigoso.
Houve um dia que meu irmão Preto foi me levar para escola e viu que o garoto me olhava estranho, dava risadas e fazia as caretas. Ele ficou indignado com a ousadia do rapaz e acabou por tirar satisfações com ele e seus amigos. Eu fiquei bastante apreensiva com aquela situação, pois sabia que meu irmão era um pouco estourado. Preto deixou-me esperando no outro lado da rua e atravessou-a em direção dos garotos. Quando chegou lá, já foi logo perguntando o que o garoto do jeito esquisito queria comigo. Avisou-o também de nunca mais me olhar daquela maneira, pois se não iria sofrer as conseqüências. Eu não agüentando a confusão, eles já estavam a ponto de brigarem fisicamente, esperei um carro passar e atravessei a rua correndo e pedi para meu irmão parar com aquilo. Um dos amigos do garoto foi para cima de meu irmão, mas o meu amigo de distancia apartou o começo de uma briga sem sentido.

Comecei a chorar de tanto desespero. Não sabia se aquele grupo de rapazes era violento, ou se eram da paz. Fiquei com medo por meu irmão. O garoto do sorriso bonito olhou para mim e disse:
- Pare de chorar. Não se preocupe! Ninguém vai bater em ninguém. Não quero fazer mal a você. Muito pelo contrario, gosto de brincar com você. Não tenho nenhuma má intenção. Peço desculpas se fiz algo de errado.
- Espero que esteja falando a verdade. – disse meu irmão. – Não conhecemos vocês, por isso ficamos preocupados. Mas olhando mais de perto, você não é tão esquisito. Parece ser boa pessoa. Mas olhe, estou de olho.
- Pode ficar de olho. – respondeu um dos garotos. – aqui ninguém é tão louco de se meter com uma criança. Apesar de andarmos sempre nas ruas, não ousaríamos fazer algo contra uma criança, ou qualquer pessoa que for.
- Tudo bem. – respondeu Preto. – Desculpem pelo transtorno. Se o que dizem for verdade, não os insultarei novamente.
- Eles dizem a verdade! – exclamei limpando as lágrimas. – Eu gosto deles. Sempre me fazem rir.
Naquele momento, o rapaz de sobretudo preto me sorriu, e os outros só sabiam olhar para meu irmão, muito desconfiados. Preto pegou minha mão e seguimos para a escola. Ele me mandou não olhar para trás, mas desobedeci no momento em que ele cuidava os carros. Vi que o garoto estava colocando o capacete e subindo em sua moto, mas não olhava para frente. Senti que ele havia ficado chateado, mas não era para menos. Demorou até demais para alguém ir falar com os rapazes. Talvez se fosse minha mãe, seria bem pior. Mas isso não mudou em nada a sua atitude comigo. Toda vez que eu passava, ele me sorria ou me fazia caretas. 


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