Filosofias de Uma Palmeira escrita por camila-nona


Capítulo 5
Capítulo 5




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No dia seguinte, Daya acordou cedo e, ao invés de ir para o piano, como era de costume, pegou o livro de Sr. Antony e pôs-se a ler. Notou que na bordas de todas as páginas tinham anotações com uma caligrafia diferente da do autor, e supôs ser do Sr. Antony. Leu-as mais vorazmente do que ao próprio livro, e resolveu copiá-las, pois apresentavam reflexões maravilhosas e profundas, o que exibia o verdadeiro caráter de quem as escreveu. Numa passagem, o livro dizia assim:

Eu, que observo os seres humanos constantemente, concluí que são a pior e a melhor raça já existente. Uns procuram-me querendo cortar-me, outros me vêem como uma fonte de inspiração para suas poesias.

No que Antony havia comentado o seguinte:

Perco-me nos teus ramos, palmeira, e acredito que tu e tuas companheiras sois as essências de toda a vida humana. Aproveito para dizer-lhe que tu me inspiras sim, e se depender de ti, eu continuarei a escrever minhas poesias para que eu possa, um dia, recitar à minha amada.

Daya não pode deixar de rir. O Sr. Antony era louco! Estava respondendo a um personagem de um livro, e ainda por cima uma palmeira! Apesar disso, gostou muito de seu romantismo, e imaginou o quão maravilhoso seria conviver com ele todos os dias, quando se casasse com seu irmão.

-Posso saber no que pensa, Daya? –seus devaneios foram interrompidos por Jane, que se debruçava sobre ela para enxergar as páginas do livro.

-Estava pensando em como seria bom casar-me com o Sr. Lucas.

-Ora, mas a que se deve essa mudança repentina de opinião?

-Talvez pelo fato de poder conviver com pessoas que compartilham os mesmos sentimentos que o meu. Aqui eu só tenho você, minha irmã, que logo irá me abandonar. Lá eu terei o meu marido e o Sr. Antony, que é um homem cativante.

-Vejo um brilho diferente nos seus olhos, Daya. Seria algo que o Sr. Lucas fez ou disse?

-Na realidade não. Nada lhe passa despercebido, não é, Jane? Pois bem. Leia isso e diga se não é a coisa mais linda que já ouviu.

Ela então lhe mostrou uma outra anotação da margem:

Não me importa nada além do que sentes por mim. Se me tem como amante e irmão, é o que basta. Não quero saber sua vida passada. Interessa-me a sua vida futura: a que criaremos juntos através da união de nossos corações.

-Nossa –suspirou Jane –Não sabia que o Sr. Lucas era tão romântico assim.

-Ele não o é –respondeu-lhe Daya –Quem escreveu isso foi o Sr. Antony.

Jane então a compreendeu. Olhou bem nos seus olhos e disse:

-Eu sinto muito. Não poderia ter ocorrido pior fato.

-Eu não sei bem o que sinto pelo Sr. Antony, Jane. Acho que o tenho um grande afeto. Espero sinceramente que não seja amor, pois se for... Prefiro morrer ao vê-lo todos os dias e chama-lo de “meu irmão”.

-Espero que assim não o seja, querida. –ela pousou a mão em seu ombro, mas viu que a irmã precisava de um momento só para ela -Deixarei você à sós para que possa pensar um pouco. Aproveitarei para ajudar a mamãe com os preparativos do casamento, afinal, os dias passam depressa.

-Vá, Jane. E não ouse se preocupar com os meus problemas, pois você já os tem de sobra.

Jane sorriu em concordância e se foi, deixando Daya com sua mente confusa, triste e amargurada. Quando a última se viu sozinha, começou a chorar silenciosamente e imaginar como seria bom poder escolher o seu próprio marido.

A Sra. Foster já estava à espera de Jane para que pudessem arranjar os preparativos do casório. Ansiosamente, disse:

-Está atrasada, minha filha! Como espera tornar-se uma boa noiva se não comparece pontualmente na preparação?

-Desculpe-me, mamãe. Tentarei ser mais pontual.

-Espero sinceramente que se dedique a isso e que não chegue atrasada em seu casamento amanhã.

Jane, conduzida até um tabladinho improvisado, teve os últimos ajustes no seu vestido de noiva. Ela estava deslumbrante, descontando-se o fato de que não estava feliz com seu cruel destino.

O dia foi todo dedicado aos preparativos para a festa que sucederia a cerimônia. A mansão dos Foster já estava repleta de enfeites e a mobília estava sendo ajustada, ao passo que sobraria bastante espaço para os casais dançantes e os outros convidados. Após a festa do matrimônio, Jane seria levada à casa do Sr. Harris, onde passaria o resto de sua vida na função de sua esposa. Ela surpreendia-se pensando nisso a cada instante, em como seria ser a esposa do Sr. Harris e em como ele a trataria.

Jane foi dormir mais cedo, ainda perturbada pelos seus pensamentos matrimoniais. Contudo, adormeceu rápido, e teve um sono tranqüilo, sem pesadelos.

No dia seguinte, logo após o café, Daya acompanhou sua irmã até a sala de tecelagem, onde os vestidos já as aguardavam. O casamento seria realizado naquela mesma manhã.

Daya usava um vestido roxo, um pouco mais escuro do que os tons que costumava usar, como se estivesse de luto pela infelicidade de sua irmã. A Sra. Foster, percebendo o tom triste que a menina trazia, tratou logo de perguntar à Jane:

-Você acha que esse vestido caiu bem em Daya?

-Sim, mamãe. Ele está perfeito.

-Eu o acho um pouco escuro para uma data tão alegre. Por que resolveu usá-lo, Daya?

-Esta é uma bela vestidura, e as outras já são conhecidas por todos.

-Preferia que usasses o cor-de-rosa.

-O deixarei para a festa, mamãe.

Satisfeita com a resposta, a Sra. Foster calou-se e se pôs a admirar a elegância de suas filhas, que estavam realmente muito formosas, porém, preocupadas. Já era de se esperar que a Sra. Foster não notasse a inquietação e essa preocupação que se apoderava delas, visto que só tinha olhos para o dinheiro que ambas passariam a dispor.

Jane, cobrindo o rosto com o véu, tinha em seus olhos lágrimas formadas, prontas para serem derramadas. “Pare com isso, sua boba”, ela pensava. “Não pode ser tão ruim. Você irá se casar, e isso não é o fim do mundo. Talvez o Sr. Harris não seja tão mal quanto pensa afinal, você nem o conhece direito para julgá-lo”. Com todos esses pensamentos, Jane nem percebeu o quanto estava bonita vestida de noiva, e não se via dessa forma, posto que tinham tais nuvens circundando sua mente.

Naquele momento, o Sr. Foster meteu as ventas na porta e perguntou:

-Já está pronta, Jane?

-Sim, papai.

Ele também ficara admirado em vê-la tão bela, e não escondeu isso. Desatou a chorar como um maricas.

-É tão bom vê-la casando –ele suspirou –E poder levá-la ao altar!

-Deixe de bobeiras, homem –reprimiu a Sra. Foster –E é melhor irmos logo, pois já estamos atrasados.

Assim foi feito. A mãe com os seus filhos, exceto Jane, seguiram na carruagem mais distinta da família. Jane e o pai foram numa alugada especialmente para a ocasião, e não poderia haver mais magnífica. Os passageiros da primeira logo pararam em frente à Igreja, e entraram. Logo em seguida o Sr. Foster desceu e ajudou Jane.

-Não tem mais jeito –foi seu último lamento –Espero que eu seja feliz.

Enxugou as lágrimas, ergueu a cabeça e entrou na Igreja, embalada pelo som do piano e violinos do coral. A primeira pessoa para qual olhou foi o seu noivo. Ele estava realmente muito belo, mais parecia um rei, e ganhava suspiro das moças invejosas ali presentes. Jane também notou sua família: o rosto infeliz de Daya e o semblante alegre de sua mãe. Os seus vizinhos e conhecidos também estavam presentes, inclusive os Srs. de Fadyen. Da parte do Sr. Harris, porém, ela só notou a irmã e outra mulher, já idosa.

Enfim, seu pai a entregou ao noivo que, pela primeira vez, tocou em sua mão. Ela sentiu um tremor percorrendo o seu corpo e arriscou-lhe uma espreitada. Ele não a olhou nos olhos.

O padre então começou a cerimônia. Fez um longo discurso, do qual Jane não ouviu nenhuma parte. Ele então os mandou dizer alguma coisa, o que o Sr. Harris fez friamente. Por fim, era costume de que o noivo lesse um discurso feito especialmente para a amada. Indiferente, o cônjuge tirou seu papel do bolso e começou:

-Sra. Harris – Fez uma pausa enquanto olhava para Jane, que estava bem interessada nessa parte –Espero poder suprir todos os seus desejos, transformar seus sonhos em realidade e faze-la feliz. Espero desempenhar corretamente o meu papel de marido e não desaponta-la em nenhum quesito. Espero, acima de tudo, que você se orgulhe de seu nome, e eu então me orgulharei de tê-la como esposa.

As palavras foram bonitas, porém sem nenhum traço de sentimento, e nada relacionado ao amor. Jane logo percebeu isso e foi tomada por uma intensa onda de infelicidade, mas tentou não demonstra-la. Sorrindo como se estivesse contente, saiu de mãos dadas com o seu marido, agora já não sendo mais a Srta. Foster.

Após a cerimônia, todos foram para a mansão dos Foster participar da festa de casamento. Todos os presentes conversavam animados sobre assuntos variados, e pareciam não se importar nem um pouco com o real motivo daquela festa.

Jane logo subiu para o seu quarto, a fim de trocar seu vestido, e Daya, vendo-a subir, a seguiu.

-Onde pensa que vai, Daya? –perguntou a Sra. Foster - Trate de ficar aqui fazendo companhia para o seu noivo.

-Mas mamãe –replicou a jovem –Eu pretendo ajudar minha irmã para que ela esteja perfeita quando descer.

-Ah. Sendo assim tudo bem. Mas não demore. Não quero que o seu noivo a troque por uma dessas raparigas aqui presentes.

-Mamãe, essas moças não são raparigas, são amigas de Jane e nossas vizinhas.

-Não me importo. De qualquer forma, seja breve.

Assentindo, a moça subiu as escadas apressada e entrou no quarto de sua irmã.

-Daya, é tão bom vê-la neste momento tão difícil. – disse Jane, correndo para abraçá-la.

-Sim, imagino o quanto deve estar sofrendo com esta situação.

-Creio que não há imaginação que se compare ao meu sofrimento, minha irmã. Tenho tanto medo!

-Não fique assim! Vamos, não chore! Vai me deixar triste além de ficar horrível de olhos vermelhos.

-E se ele for muito mau comigo? –ela perguntou, ignorando os apelos de Daya – E se ele for indiferente ou faltar-me com a educação?

-Não sei, minha irmã. Mas o que importa é você seja a mesma Jane que sempre foi. Não mude nunca. Se ele tiver que gostar de você gostará pelo que você é.

-Sim. E espero que eu possa visitá-la sempre na sua nova casa e que você também visite a minha.

-Esse desejo certamente irá se realizar. E apesar das circunstancias, eu torço pela sua felicidade.

-Desejo o mesmo para você, querida. Desejo o mesmo para você e o senhor Lucas, ou qualquer outro que escolher. Eu sempre te apoiarei.

Elas se abraçaram ternamente.

-Vamos. –suspirou Daya -Você precisa terminar de se arrumar.

Daya ajudou Jane a se vestir. Prendeu seu cabelo num coque e, juntas, voltaram ao salão, onde a festa continuava. O S. Harris, ao avistar sua esposa, caminhou até ela, pegou sua mão, disse:

-Venha. Quero que conheça uma pessoa.

-Sim – respondeu-lhe Jane, obediente.

Eles caminharam até uma mesa em que estavam Emma e a senhora que avistara na celebração.

-Titia Agnes, essa é a minha esposa, Jane.

Jane prestou reverencia enquanto a mulher a olhava com frieza.

-Você é mais bonita de perto, minha jovem.

-Obrigada.

-Espero que o motivo desse casamento não tenha sido fútil. Varias moças já cobiçaram o meu sobrinho, ou melhor, o dinheiro dele. Será que você está a sua altura?

-É uma pergunta que eu não sei responder, senhora. –disse Jane, contendo-se para não gritar com aquela mulher estúpida -Mas não pretendo decepcioná-lo como esposa.

A mulher nada respondeu, e Jane lhe virou as costas e foi dar atenção aos outros convidados, do mesmo modo que seu marido.

A festa prosseguiu animada, com muita dança e risos. Todos pareciam estar se divertindo bastante e, ao término, os convidados agradeceram e se lamentaram de não poderem ficar mais. Jane se despediu de sua família e, em uma carruagem especial, o casal Harris, como todos os outros, seguiu para sua casa.

Boas horas se passaram até que os contornos da mansão fossem avistados. Jane estremeceu, mas tentou demonstrar tranqüilidade. A casa parecia ainda mais magnífica quando iluminada pela lua e as diversas luzes artificiais que enfeitavam o jardim.

O casal foi recebido pelo mordomo, que pareceu demonstrar felicidade quando avistou os rostos dos noivos. Uma moça de aparência simples foi apresentada como camareira da Sra. Harris.

-Senhora –ela disse –Vou te levar ao quarto.

Novamente Jane estremeceu, mas seguiu a moça até o local referido.

-Aqui está. O Sr. Harris tem reservado este quarto só para os dois. Nunca foi usado antes.

-Obrigada –respondeu Jane –Bem, você foi apresentada como minha camareira, mas pretendo que sejamos amigas. Qual o seu nome?

-Meu nome é Helena. É um conforto que me deseje como amiga, estava realmente preocupada –ela deu um risinho tímido –Bom, agora vou deixá-la a sós. Com licença.

Ela fechou a porta e Jane se sentou na beirada da cama, com um ar apreensivo. Olhou-se no espelho e suspirou. Pouco tempo depois, o Sr. Harris entrou no quarto. Ele a fitou ternamente e se ajoelhou à sua frente.

-Jane. Eu quero que saiba a primeira instância que meu nome é Rafael, assim não precisará se dirigir a mim como Sr. Harris. –ele pronunciava as palavras rapidamente, parecendo meio nervoso -Quero fazê-la feliz por mais que eu pareça sério demais para desejar a felicidade de alguém.

Ele então lhe beijou a mão. Ela estava quase derramando lágrimas de ansiedade diante daquela situação, mas ele continuou. Sentou-se ao seu lado e alisou seus cabelos. Depois desceu a mão e a pousou em seu colo.

-Está fria! Bem, eu acho que entendo. Longe de casa, em um lugar estranho e com um homem que viu poucas vezes na vida... Não é de se admirar que esteja nervosa. Espero que um dia, de fato, não se arrependa de ter se casado comigo. Eu não sou esse homem que pareço. –ele então abaixou a alça de seu vestido e beijou seu ombro, com lábios quentes e ternos.

Ela suspirou, e assim eles tiveram a sua primeira noite como casal Harris.


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