Filosofias de Uma Palmeira escrita por camila-nona
No dia seguinte, o Sr. Foster veio com a notícia de que a família fora convidada para jantar com os Fadyen.
-Mas que bom! –disse a Sra. Foster, em êxtase. –Daya, arrume-se bem. Sorte que algum vestido já ficou pronto. Coloque suas fitas, ande! Jane, depressa, vá ajudar a sua irmã!
-Eu disse que fomos convidados para o jantar –falou o Sr. Foster entediado–E não para o almoço.
-Levamos algum tempo até chegar a Fadyen, portanto essa preocupação é necessária.
-É melhor não a contrariarmos – riu Jane.
-Absolutamente – concordou Daya.
Eles partiram cedo. A propriedade de Fadyen ficava a duas horas de distância. A primeira coisa que avistaram foi o bosque com suas lindas tulipas e árvores, seguido da frondosa fonte. A mansão era realmente grandiosa, e Daya tentou imagina-la como sua.
Os Srs. de Fadyen foram recebê-los eles próprios, ao invés da governanta. Antony, sempre reservado, cumprimentou-os polidamente. Ele usava um fraque verde-musgo, que contrastava com seu tom de pele. Lucas vestia um conjunto bege e fraque marrom e, sempre gostando de sobressair-se, fez um discurso de como era bom recebê-los em seu humilde lar.
-Minha querida Daya –ele disse –Tão bela quanto essas flores que ornamentam o meu jardim! Espero que lhe agrade sua futura casa. Estarei à sua disposição para mostrar-lhe tudo o que quiser.
-Teremos muito tempo para isso, Sr. Lucas. No momento contento-me em ver o salão de música e a biblioteca.
-Como queira. Vocês nos acompanham?
Todos responderam que não, pois estavam muito cansados da viagem. Sr. Antony então os levou para uma sala, para que pudessem descansar, enquanto o Sr. Lucas conduzia Daya ao salão de música.
-Um belo piano o senhor tem. –ela comentou, passando os dedos pelas teclas.
-Agradeço-lhe. Espero que a senhorita me proporcione muita alegria tocando para mim todos os dias, quando formos casados.
Ele pegou em sua mão, e ela a retirou em seguida.
-Certamente. Poderíamos ver a biblioteca agora?
-Como queira.
Ele então a levou para onde queria. A quantidade de estantes e livros fascinou Daya. Eram tantos que mal podia mencionar. Isso também a fez encarar seu futuro marido de uma outra forma, como um homem culto e que gostava de ler.
-O quanto me encanta isso, Sr. Lucas. Vejo que tem o hábito da leitura.
Ele se confundiu com o elogio, e Daya acreditou que fosse por timidez, apesar disso não ser típico dele. Por fim, ele acabou concordando.
-Sim. Os livros me deslumbram. –fez uma pausa. –Se me der licença, senhorita, tem algumas coisas que preciso fazer. Sinta-se a vontade para pegar tudo o que quiser.
-Obrigada. Eu esperarei aqui.
Ele saiu do cômodo, e Daya explorou tudo o que podia. Os variados modelos, variados temas como medicina, direito, romance, contos e tudo o que se podia imaginar. Tudo era muito bem organizado, separado por data e autor. Havia um mundo inteiro para se olhar naquele lugar.
Quando enfim ouviu o ranger da porta, ela falou, sem ao menos tirar os olhos do volume que lia:
-Nem vi o tempo passar. O senhor tem uma incomparável coleção aqui nesta biblioteca.
-Obrigado, mas creio que se dirigia ao meu irmão.
Daya deu um pulo ao ouvir a voz do Sr. Antony, e derrubou o livro no chão.
-Perdoe-me se a assustei – ele disse, pegando o livro e devolvendo-o a ela – Não foi minha intenção.
-Não. Tudo bem. Eu é que estava distraída.
Ele sorriu.
-Não era para menos. Esses livros encantam qualquer um, menos o Lucas, é claro.
-Eles não encantam o seu irmão?
-Lucas detesta ler. Se não fosse por mim, essa casa não teria nem uma biblioteca, e eu não sei o que seria de uma casa sem o fascínio dos livros.
Daya ficou atônita, afinal, o Sr. Lucas não gostava de livros. Ele havia dito aquilo só para agradá-la.
-O meu irmão me pediu pra vir lhe buscar –continuou Antony –O jantar será servido.
-Tudo bem. –ela desviou os olhos dele -O Sr. Lucas disse-me que eu poderia pegar um livro. Tem algum problema?
-De modo algum. Qual foi sua escolha?
-“Filosofias de uma palmeira”. –ela mostro-lhe o exemplar -Apresenta uma linguagem agradável.
-A senhorita não podia ter escolhido melhor. A palmeira observa tudo o que acontece ao seu redor, e relata os fatos. Desde a exploração dos senhores até o amor dos pássaros em seus ninhos.
Daya ruborizou.
-Os pássaros também acham seus pares como folhas secas na ventania, Sr. Antony?
Ele se esqueceu de como respirava.
-Surpreendo-me que se lembre disso, Srta. Daya. Mas creio que a palmeira lhe responderá melhor do que eu. Agora me siga, por favor.
Daya o seguiu em silêncio, arrependendo-se de sua audácia.
O jantar transcorreu agradável. Todos conversavam sobre variados assuntos, exceto o Sr. Antony, que permaneceu calado. Depois, Daya saudou a todos com uma música no magnífico piano dos Fadyen.
-Sabia que o Sr. Harris tem uma propriedade vizinha a esta? –perguntou o Sr. Lucas à Sra. Foster, enquanto ouviam Daya, sentados num sofá de um canto da sala de música.
-Não sabia. –interessou-se a Sra. Foster -Ele vem sempre aqui?
-Não sempre. Se quiser podemos visitar a mansão. Ainda não é muito tarde, e o mordomo está sempre à disposição dos visitantes.
-Seria uma ótima idéia. –animou-se a mulher -Jane venha aqui!
-O que foi mamãe?
-Não sabes a maravilhosa notícia que acabo de receber do Sr. Lucas.
-Obviamente não.
-Iremos visitar a casa do seu futuro esposo. É um legado aqui perto, quer coisa melhor? Imagine só: você e Daya serão vizinhas! Pena que o Sr. Harris não vem muito aqui. Mas não tem importância! Conheceremos a mansão do mesmo jeito.
-Ah –suspirou Jane –Então o Sr. Harris não está aqui?
-Infelizmente não.
-Pelo menos isso.
-O que você disse Jane?
-Nada, mamãe. Nada.
Daya não gostava quando não prestavam atenção nela. Achou que fosse a canção, e por isso resolveu mudar de música. Procurou nas notas dos Srs. de Fadyen algo diferente, e finalmente encontrou. Era uma música de aparência suave, escrita numa caligrafia perfeita. Resolveu arriscar toca-la, mas na quarta nota foi repreendida pelas mãos frias do Sr. Antony em seus pulsos. Ela o encarou, sem entender o porquê de sua atitude. Todos da sala foram atraídos pela interrupção abrupta do som, e cessaram suas conversas.
-Essa música não. –ele pronunciou lentamente, enquanto soltava seus pulsos.
-Mas que ousadia é essa? –revoltou-se o Sr. Lucas – Antony, meu irmão, como ousa tocar na minha noiva de tal maneira?
-Perdoe-me, meu irmão. Perdoe-me, Srta. Daya. Essa música me traz lembranças que gostaria de esquecer. Não suporto ouvi-la.
Daya não queria saber as justificativas. Era uma garota sensível e ficara magoada pelo gesto do Sr. Antony. Sem deixar ele se explicar, saiu do salão com o rosto vermelho e olhos de lágrima, e foi à biblioteca, onde se jogou numa poltrona confortável.
Momentos depois, os Srs. de Fadyen entraram no cômodo, e Sr. Lucas falou:
-Não quero que os dois fiquem brigados, pois afinal, serão irmãos. Peço-lhes encarecidamente que façam as pazes.
-Não tenho culpa se o seu irmão é um homem grosseiro e não sabe tratar uma dama. –cuspiu Daya.
-Eu não sou grosseiro! –revidou Antony – A senhorita que é demasiada sensível e mimada.
-A discussão acabou! –disse Lucas, num tom alterado –Srta. Daya, peço-lhe que compreenda o meu irmão. Aquela melodia foi uma composição de nossa falecida mãe para ele. Antony era muito apegado a ela, e não suporta ouvir aquela canção.
Daya arrependeu-se amargamente de sua postura infantil. Se ao menos tivesse deixado o Sr. Antony explicar-se, não teria cometido tal equívoco. Porém, ainda não gostara de ser chamada de mimada.
-Eu é que lhe devo desculpas agora, Sr. Antony –ela falou envergonhada –Não devia ter-lhe chamado de grosseiro sem saber os seus motivos. E... Eu não sou mimada, só demasiada sensível como você mesmo disse.
-Perdoe-me. Eu também me envergonho de minha conduta, senhorita. Devia ter sido delicado e pedir que parasse de tocar, ao invés de simplesmente interrompe-la. E eu a chamei de mimada só para que ficasse irritada.
Ela sorriu.
-Muito bem –aliviou-se Lucas –Agora sim agem como irmãos. E por falar nisso Daya, sua irmã nos espera para que possamos visitar a casa do Sr. Harris.
-Ah, é claro. Jane em primeiro lugar. –ela sorriu e levantou-se depressa para que pudesse apoiar sua irmã em tal complicado momento.
Todos esperavam Daya e os Srs. de Fadyen em frente às carruagens. Quando os viram, eles entraram em seus respectivos cabriolés, e garota procurou afastar-se dos senhores. Sentando-se ao lado de sua irmã, disse para a mesma:
-Espero que seja forte e demonstre satisfação ao conhecer sua futura casa, Jane.
-Assim também espero. Rogo para que o Sr. Harris não esteja lá.
-Mas se acaso ele estiver, mostre-se assim, como a mulher digna que tu és. Faça com que ele te enxergue como uma futura boa esposa.
-Assim será.
As carruagens percorreram um caminho margeado por flores de ambos os lados, que compunham a beleza do lugar. A Sra. Foster tagarelava com o Sr. Lucas, enquanto a distância entre as duas propriedades diminuía.
Poucos minutos após a partida da casa dos Srs. de Fadyen, avistaram-se uma magnífica mansão.
-Veja! –falou o Sr. Lucas – Aquela é casa do Sr. Harris!
Os que estavam distraídos, de alguma maneira voltaram seus olhos para a casa. Era uma bela construção, rodeada por pilares e com inúmeras janelas. A Sra. Foster suspirou maravilhada:
-Oh, minha querida Jane! Quando a destinamos a casar com o Sr. Harris, não imaginamos que teria de viver como uma rainha!
-Sim –concordou o Sr. Foster –Vejo que será muito bem tratada aqui.
Jane assentiu vagarosamente, duvidando de que teria uma vida tão feliz quanto seus pais imaginavam.
O Sr. Lucas ajudou Daya a descer da carruagem, e quando todos já estavam no chão, foram recebidos pelo mordomo.
-Boa noite. Imagino que vieram visitar a casa do meu senhor.
-Sim, viemos com tal desígnio –respondeu-lhe Antony –Espero que o horário não lhe seja inconveniente.
-De forma alguma. Meu nome é Walter e estarei às suas disposições. Então... Guiarei vocês pela casa. Sigam-me, por favor.
O mordomo então passou pela pesada porta de entrada, sendo seguido pelos Fadyen e Foster. O saguão de recepção era longo e com estátuas de ambos os lados, tendo em seu fim três arcos que davam em diferentes salões principais. Desses três, seguiam-se os outros cômodos da casa.
Jane estava deslumbrada com a magnificência da mansão e, junto de Daya, distraiu-se observando a sala de desenhos, enquanto os outros continuaram a seguir Walter. Dali, ambas foram para uma sacada, da qual permitia-se avistar toda a propriedade. Daya então comentou com sua irmã, repentinamente:
-Jane, tu podes até não ter uma vida de esposa amante de seu marido, porém terá muitas distrações neste lugar.
-Sim. Estou tentando me conformar com este fato. Posso não ter conseguido o amor que eu desejava e, não que eu esperasse o contrário, mas, como disse a mamãe, terei uma vida de rainha. Por hora, isso já basta.
-Bem, espero que o Sr. Lucas também me trate como uma rainha, mesmo que sua formosa casa não seja tão magnífica quanto essa.
-Acaso está reclamando do fato de não poder desposar o Sr. Harris?
-De forma alguma, Jane! –assustou-se Daya -Como ousas pensar isso de mim? Ele é destinado a ti!
-Tudo bem. –ela suspirou -Desculpe-me. Acho que tive uma pequena extrapolação dos meus sentimentos. O Sr. Lucas será de fato um marido muito bom, muito mais agradável do que o Sr. Harris.
-Por favor, não julgue o que ainda não veio a acontecer. –disse a mais nova tentando confortar de alguma forma a irmã.
-Como queiras. Eu estava apenas analisando os fatos e precipitando-me em relação a eles. Mais uma vez, desculpe-me. Não consigo conter o desespero que me domina com a aproximação de meu casamento.
-Tudo bem, querida. Eu entendo o seu sofrimento.
Jane sorriu e olhou para o céu. Daya fez o mesmo.
-Meu Deus, a lua começou a despontar –disse então a segunda –Vamos. Não é correto que uma moça comprometida fique na residência de outro homem até essa hora!
Ambas andaram depressa pelos corredores, e subiram diversas escadarias. Atravessaram os salões pelos quais já haviam passado e chegaram ao pátio, onde se reuniam os demais. Quando as avistou, o Sr. Foster falou:
-Pensei que não viessem embora hoje ou houvessem se perdido! Mas, bem, isso não importa. Jane, eu espero que tenha apreciado sua futura casa.
-Perdoe-me a intromissão, senhor –interrompeu Walter –Mas... Será a sua filha que desposará o Sr. Harris?
-Sim, meu caro. Dentro de duas semanas.
-Fico encantado em conhecê-la, senhorita. –disse, dirigindo-se à Jane –Saiba que o Sr. Harris fala muito bem de suas prendas e, tal como o tenho como um filho, a terei como uma filha também.
Ainda confusa, Jane respondeu:
-Obrigada, senhor. Fico feliz em ser tão bem-vinda aqui.
-Saiba que também será muito bem-vinda na vida de meu senhor. Afinal, ele é um homem muito solitário e triste. Tirando minha senhorita Emma, ele não tem nenhuma companhia.
-Espero poder alegrá-lo então.
Jane estava realmente muito tocada pelas palavras do mordomo, afinal, ele mantinha pelo Sr. Harris um sentimento fraternal. Ela pensou em como ele poderia gostar daquele homem fechado e orgulhoso, que não despertava afeição em ninguém. Sua solidão também não a tocava. Ela a encarava como um inevitável, uma consequência do seu modo de ser.
Todos se despediram, e os Fadyen voltaram à sua mansão, enquanto os Foster partiram para a deles.
Quando Jane chegou em casa, a primeira coisa que fez foi vestir sua camisola e imaginar-se deitando com o Sr. Harris. Será que aquele homem lhe desejaria ao menos uma boa noite antes de dormir? Será que ele lhe beijaria e lhe diria coisas bonitas, ou a enxergaria apenas como uma mulher saudável para gerar-lhe filhos? Eram muitas as perguntas sem respostas que lhe atormentavam a mente, por isso resolveu deixa-las de lado e dormir, que era o melhor que podia fazer. Deu uma boa noite para sua família, e caiu numa longa sessão de sonhos e pesadelos.
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