Filosofias de Uma Palmeira escrita por camila-nona


Capítulo 10
Capítulo 10




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Saíram da casa e embarcaram na carruagem. Daya, inconsolável, abraçava Antony, inundando seu peito com as lágrimas que escorriam de seu rosto. Ela lembrava de suas noites na clareira e, principalmente, da última, em que se achavam sob o ícone do conhecimento de seu amor.

Jane e Rafael observavam a paisagem tentando enxergar qualquer sinal do Sr. Lucas pelos arredores.

Chegaram salvos à casa do casal Harris, prometendo que não sairiam da propriedade com o peso da duvida sobre a segurança de suas vidas.

Daya observou a barriga crescente de sua irmã e, emocionada, falou:

-Se eu não estivesse condenada a conviver com o amor clandestino, eu bem que gostaria de ter um filho. Mas por enquanto não tenho condições de oferecer-lhe uma vida digna.

-Minha irmã, você ainda é jovem. Quando a situação melhorar poderá ter um belo bebê, fruto do amor entre você e Antony.

-Se fosse uma menina iria se chamar Luisa, já se fosse menino, se chamaria Edmond.

Daya após ter dito isso se derramou em lágrimas, e logo foi acalmada pela irmã, que a abraçava carinhosamente. Podia-se ouvir uma melodia triste no piano no andar de cima e Jane se lembrou de que não havia contado a sua mãe sobre o filho que tinha a certeza que agora esperava.

Chegaram rapidamente à sala de música para poderem ouvir melhor, e se surpreenderam ao perceber que era Antony quem tocava. Daya logo reconheceu a canção, aquela que ele a impedira de tocar em sua casa, pois lhe trazia tristes lembranças.

-Meu bem, por que toca uma canção que tanto te entristece?

Sem tirar os olhos do piano, ele respondeu:

-Devido às mágoas que causei ao meu irmão e às desculpas que devo a minha falecida mãe por isso.

Jane, vendo que mentalmente o homem culpava seu amor por tudo de ruim que lhes estava acontecendo, disse:

-Vão começar a se culpar por desejarem um ao outro? Vão se culpar pelo que sentem? Não é justo que vivam tristes por apenas buscarem a felicidade! Quero que parem de se culpar! Se continuarem o fazendo, meu filho nascerá com aparência de corações partidos. Não quero ver tristeza na minha casa!

Os dois assentiram e prometeram não se entristecer mais.

Jane havia descoberto que conseguia desempenhar bem a tarefa de esculpir e, nas tardes que se seguiram, ela fez uma pequena estatueta, na qual representava sua irmã e Antony como um casal em segredo que se amava. Estavam de frente um para o outro, com aspecto terno e amável. O rapaz segurava a mão de Daya, enquanto esta observava o pequeno anel que ele possuía no dedo.

Foi interrompida por Rafael, que adentrou na sala e pôs-se a admirar o trabalho da mulher.

-Estive pensando –ele falou –Podemos ter interpretado mal o Sr. Lucas. Quem sabe ele só tenha ficado profundamente aborrecido, e não rancoroso?

-Você tem razão. Estamos tão alarmados, no entanto ele não fez nenhuma tentativa de se vingar. Talvez tenhamos nos precipitado.

Eles sorriram com essa possibilidade e se abraçaram.

-É tão bom ter você ao meu lado –ela suspirou –É tão bom que você não seja apenas meu marido, mas também meu amigo, e que me ajude em relação à minha irmã.

-Ela é minha irmã também –ele riu –Se é sua irmã, também é minha irmã. Se você a ama, eu também a amo, e se você a odiasse, eu também a odiaria.

-Ninguém nunca odiaria Daya. Não se pode odiar uma garota como ela.

-É bom que vocês sejam unidas assim. Bem, agora eu lhe deixarei esculpir. Importa-se que eu fique te olhando?

-De forma alguma –e assim Jane voltou ao trabalho.

Passou-se uma semana e eles não tiveram notícias do Sr. Lucas.

-Acho que podemos voltar a nossa vida normal –disse Daya –Que tal se nós passearmos no jardim, Antony?

-Eu adoraria. Estar com você já seria o bastante para me fazer o homem mais feliz do mundo.

-Antes disso –interrompeu Jane –Quero lhes mostrar uma coisa que eu fiz.

-Que coisa? –perguntou a sempre curiosa Daya.

-Surpresa. Sigam-me.

Ela os conduziu até um quarto todo vazio, exceto por uma estatueta, que se encontrava sobre um pedestal magnificamente ornado. Daya e Antony se aproximaram e ficaram encantados com o que viram.

-Somos nós! –surpreendeu-se a garota –Jane, você esculpe tão bem! –ela a abraçou –É tanta bondade sua! Veja como eu estou emocionada! Tem até lágrimas nos meus olhos!

-Não chore, minha irmã. Ela será de vocês e ficará na sua casa. E por falar nisso, já sabem onde vão morar?

-Numa casa que meu pai deixou para mim –respondeu Antony –Ela fica um pouco longe daqui, mas prometemos vir visitá-la sempre.

-Acho bom mesmo –ela riu –Vocês irão mesmo amanhã?

-Sim. –respondeu Daya –Para que possamos construir uma nova vida.

-Fico feliz em vê-los felizes. No final, tudo deu certo.

-No final tudo dá certo Jane.–falou sua irmã –Como nos contos que ouvíamos quando crianças, encontramos nossos príncipes e viveremos felizes para sempre.

Eles sorriram. Antony abraçou sua amada e saíram somente os dois para o jardim, fazendo planos para o futuro. Eles andaram até certo ponto, onde tulipas e diversas outras flores lhes tomavam a vista.

-Teremos um jardim com muitas flores, não é, meu amor?

-Claro, minha querida. Muito florido e com tudo aquilo que você desejar.

Antony viu uma árvore com lindas florzinhas cor-de-rosa e não pôde conter o desejo de colher uma para sua esposa.

-Espere aqui –ele pediu –Colherei uma para você.

Daya observou-o afastar-se em direção à árvore, mas logo se distraiu com uma borboleta que pousou perto dela. Lembrou da noite de natal em que ela revelou a Jane o seu desejo de metamorfosear-se em borboleta e não pôde deixar de rir.

-Vem, borboletinha! –ela esticou a mão para tocá-la e, quando estava quase conseguindo, um estrondo alto rompeu o ar. A borboleta voou e Daya levou a mão ao coração, de susto e temor.

-Antony! –ela gritou, com medo de virar.

Talvez aquele barulho fosse só o som de alguém caçando. Mas estava perto demais... Como Antony não respondeu, Daya se virou, temerosa. Ele não estava ali.

-Antony! –ela berrou em desespero, enquanto saía correndo na direção da árvore de florzinhas cor-de-rosa, que agora nem parecia tão bonita assim.

E lá estava ele. Estirado no chão e com o peito manchado de sangue. Seus olhos se abriram levemente quando ela se ajoelhou ao seu lado, banhada em lágrimas.

-Não chore –ele balbuciou –Viveremos felizes para sempre, lembra-se? Não importa aonde, estaremos sempre juntos. –ele forçou um sorriso –E felizes.

-Antony, não!

-Lembra daquele bilhete? “Eu quero estar contigo em todos os momentos da minha vida. Eu pretendo enfrentar o mundo para estar ao seu lado. Não imaginei que encontraria alguém que me completasse por inteiro, mas eu sinto que você e mais ninguém me completa. Eu te amo, Daya”, e é assim que eu me sinto. –ele segurou sua mão –Te amo além dessa vida –então olhou para um ponto além de Daya e disse:

-Isso não acabará com o nosso amor, e sim o fortalecerá. Espero que Deus o perdoe.

Daya se virou e viu o Sr. Lucas com uma arma de caça na mão. Sua expressão era fria e impiedosa.

-Não irá implorar para que não a mate também, Sra. Fadyen?

-Não. Tudo o que eu quero é a morte.

Ela olhou para Antony e viu que seus olhos já não brilhavam mais.

-Mate-me Sr. Lucas, por favor.

-Com todo o prazer.

Ele riu e apontou a arma para a garota, que nem ao menos gritou quando recebeu o tiro. O seu corpo caiu ao lado do de Antony, num molde perfeito, como se aquela fosse uma cena ensaiada. Mas não o era. Os dois amantes estavam mortos e juntos, realmente, para todo o sempre.

Jane, ouvindo tal estrondo, saiu correndo em direção ao jardim. Rafael a seguiu, só parando para pegar sua espingarda, que estava numa mesinha perto da porta. Quando lá chegaram, se depararam com Lucas, ainda segurando sua arma de caça na mão. Jane não pôde deixar de gritar, um grito doloroso, vindo do fundo de sua alma.

Lucas, que não os tinha visto chegar, virou-se de imediato com o grito de Jane e apontou-lhe a arma, prontificado a disparar.

Rafael, por sua vez, foi mais rápido, pondo-se logo na frente de sua mulher para que o tiro não a atingisse. Ambos os homens atiraram ao mesmo tempo. Jane não conseguia parar de gritar.

-Rafael, meu amor!

Mas ele estava bem, pelo menos estava vivo. O tiro pegara o seu braço, enquanto Lucas foi mortalmente atingido no coração.

-Chame o Walter –pediu Rafael –Ele cuidará de mim. Eu estou bem, vá ver sua irmã.

Jane obedeceu e chamou o mordomo. Enquanto este corria aflito em sua direção, ela se aproximou de Daya e Antony, pegando seus pulsos. Não tinham sinais de vida. Jane deitou-se inconsolável ao lado do casal e começou a soluçar. Quando deu por si, Helena estava abraçando-a, tentando aliviar sua dor.

-Sacrificaram-se tentando viver um amor verdadeiro. Isso é justo? Eu não sei, mas pelo menos agora eles poderão ser felizes sem ninguém para impedir.

Após tais palavras, ela fechou os olhos de Antony que ainda estavam abertos e deu um beijo de despedida em Daya. Observou os rostos dos dois e notou um leve sorriso esboçado na face de cada um. Eram sorrisos que transpareciam a alegria por poderem se amar eternamente.

Algumas horas depois, com o ferimento de Rafael devidamente tratado, eles partiram para que pudessem enterrar os corpos. Como Jane tinha o conhecimento da clareira, decidiu eternizar aquele local como santuário do amor dos dois. Levaram-lhes para tal lugar e, sob a única palmeira que lá se encontrava, selaram para sempre a união de Daya e Antony.

Após o enterro, o casal Harris foi à casa dos Foster, noticiando tal acontecimento. Todos se recusaram a aceitar o fato, ficando eternamente consternados, menos a Sra. Foster que, apesar da tristeza existente, continuou a considerá-los traidores e motivo de desgosto. Jane, abismada com tal ponto de vista, jurou que não mais em sua vida retornaria àquela casa.

Antes de entrar na carruagem, seus irmãos foram até ela e o mais velho perguntou:

-Minha irmã, você vai realmente nos abandonar? Não retornará aqui para visitar-nos?

-Ah, meu irmão, diante de tal situação não pretendo retornar, mas vocês poderão me visitar quando quiserem.

-Faremos isso –disse um dos gêmeos –Não quero ser indelicado, mas por um acaso você não engordou?

-Sim, eu engordei. Vocês serão titios.

-Isso é maravilhoso! Por que motivo não disse antes?

-Não quero que mamãe saiba. Ela é demasiadamente hipócrita para merecer tal notícia. –ela entrou na carruagem e acrescentou –Espero visitar-lhe quando forem casados e não pretendo esperar muito por isso, certo?

Os três consentiram e acenaram enquanto a carruagem partia.

As estações do ano se passaram rapidamente, o jardim dos Harris já não possuía as belas flores de primavera, pelo contrário, estava coberto pela neve do iniciante inverno. A fria tarde estava em seu cabo. O silêncio habitual da mansão foi cortado por um grito profundo de dor.

-Jane, acalme-se. Você consegue.

Ela ofegou deitada sobre a cama, e esticou sua mão para segurar o braço de seu esposo. Gritou novamente e apertou ainda mais Rafael que, de tão nervoso que estava, deixou pingar uma gota de suor de sua testa.

-O primeiro já está saindo –falou a parteira, tentando desempenhar o seu trabalho com êxito.

Jane gritou novamente, mas seu grito não teve forças perto do choro daquela criança.

-É uma menina! –anunciou Helena, que estava ajudando a parteira.

-Uma menina –suspirou Jane –Mas ainda há mais um. Não sei se vou suportar.

-Vai sim amor. –incentivou Rafael –Você é forte e vai conseguir.

Mais alguns minutos se passaram. Jane tentou recobrar o fôlego e logo reiniciou seu trabalho de parto.

A noite chegou depressa. Todo o sofrimento se passara e o casal Harris estava em seu quarto com os seus filhos no colo. O segundo bebê havia sido um menino, que estava agora confortavelmente aninhado nos braços de Rafael. Enquanto observava a criança, ele lembrou:

-Eles ainda não têm nome.

Jane suspirou e disse:

-Um dia Daya me falou que se viesse a ter filhos eles se chamariam Luisa e Edmond. Penso que poderíamos fazer algumas modificações.

Ele olhou para a pequena criança em seu colo e sussurrou

–Pequeno Edmundo.

O bebê abriu os olhos e Rafael sorriu.

-Eloísa –disse Jane para sua pequena –Assim nós homenagearemos Daya e Antony pelos filhos que eles não puderam ter.

   Rafael sorriu novamente e beijou a testa de sua esposa. Colocou os pequenos no berço e apagou a luz. Enquanto deitavam em sua cama sentiram um vento frio percorrer-lhe o corpo. Olharam simultaneamente na direção da janela, onde podiam juram que viam Daya e Antony, de mãos dadas, sorrindo para eles.

Rafael olhou para Jane e, sem nada dizer, beijou delicadamente a sua boca.

Não importa de qual forma: o amor, independente de onde, é visto como o primeiro e último sentimento existente. Seja na guerra ou na paz, sempre nascerá uma árvore para reestruturar o que se foi perdido em vida, mas que continua vivo na morte. Sempre terá alguém para narrar histórias de amores proibidos, ou não necessariamente alguém. Esse narrador pode ser apenas uma palmeira, que observa, de seu canto da clareira, tudo o que acontece ao seu redor. Desde a exploração dos senhores até o amor dos pássaros em seus


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