- Yaxley? Malfoy?

         Lucius ergueu o rosto de seu caldeirão ao ser chamado e encontrou um tristonho professor Slughorn o encarando.

         - Eu só queria dar os meus pêsames, rapazes, pelo garoto Grimshaw. Sei que ele era muito amigo de vocês e lamento muito sua perda. Merlin sabe como ele era um desastre em poções, o pobrezinho, mas tão cheio de vida... E com apenas dezesseis anos...

         - Obrigado professor – disse Liam, também erguendo os olhos para o professor e dando-lhe um sorriso cordial – Seu consolo é muito importante nesse momento.

         Lucius se desligou da conversa naquele momento. Sabia que Liam não precisava de consolo algum, e sabia que considerava a morte de Mark Grimshaw merecida. Desde que a família de Mark se tornou cada vez mais ativa a favor das causas trouxas, vários sonserinos passaram a tratá-lo diferente. Liam foi um deles – afastou-se cada vez mais do até então grande amigo. E Lucius fez o mesmo.

         O rapaz se amaldiçoava por causa disso. Como pôde ter sido tão covarde a ponto negar-se a Mark no momento em que ele mais precisava de alguém ao seu lado? Mas agora, arrepender-se não ajudaria em nada. Arrepender-se não iria proteger as outras pessoas que Lucius amava.

         O que ele poderia fazer agora é ter certeza que não cometeria o mesmo erro duas vezes.

***

         Tarde da noite, na sala comunal da Sonserina, Lucius fora o único aluno a não ir se deitar. Sentado em um dos sofás, ele observava, estático, a lareira, perdido em pensamentos. Mal percebeu quando outra pessoa apareceu e aproximou-se dele.

         - De novo aqui Lucius?

         O rapaz virou-se surpreso e encontrou Narcissa, já de camisola. Ela hesitou por um momento antes de sentar-se ao lado do rapaz.

         - Cissy... – Lucius murmurou. Passou os braços em volta da garota para trazê-la para perto. Narcissa deixou-se guiar pelo namorado, deitando-se com cuidado sobre ele, aprumando a cabeça em seu peito. Passaram um longo tempo assim, Lucius apenas esperando que a sensação o acalmasse. Não aconteceu.

         E a garota notou.

         - Você ainda está triste por causa do Mark, não está? - murmurou a bruxa.

         Lucius não respondeu. Narcissa tomou isso como um sim e resolveu não insistir na pergunta. Sabia muito bem dizer quando seu namorado estava bem ou não, e não precisava que ele lhe dissesse isso. Eles ficaram quietos por um tempo.

         - Você sabe como Mark morreu, não sabe, Cissy? - perguntou o garoto, subitamente.

         Foi a vez da garota ficar muda.

         - Sabe? - repetiu Lucius.

         - O Lorde das Trevas - susurrou Narcissa.

         - Sim - confirmou o rapaz - E sabe por quê?

         - Não. - admitiu ela.

         - Não... - repetiu Lucius - é claro que não. Quer saber realmente o que aconteceu?

         Narcissa murmurou um 'sim', enquanto algumas lágrimas começaram a brotar em seus olhos. Lucius sabia que ela estava com um pouco de medo, afinal, o que um garoto como o Mark poderia ter feito para ser morto por Voldemort?

         - Mark Grimshaw não fez absolutamente nada. Os pais deles que fizeram.

         "Você sabe que os Grimshaw não são uma grande ou poderosa família bruxa, mas são bem tradicionais, e, portanto, comensais em potencial. Há tempos que o Lorde das Trevas tem interesse nessa família, mas nunca houve interesse por parte deles. Muito pelo contrário, na verdade. O senhor e a senhora Grimshaw sempre foram extremamente defensores dos trouxas, mas nada muito preocupante. Não até esses dias. Há algum tempo, alguns comensais tiveram a missão de... 'Interrogar' Faris Holland e a família. Aquele nascido trouxa que trabalha no Departamento de Execução das Leis da Magia, sabe? Enfim, o cara sozinho conseguiu deter os comensais no Ministério. Mas é claro, era uma questão de tempo até os comensais se reorganizarem e planejarem uma abordagem na casa dele. Só que ao chegarem lá, não havia ninguém. Por um bom tempo acreditou-se que o cara estava foragido, mas uma visita do Lorde à casa dos Grimshaw mostrou o contrário. Ele fora lá apenas para refazer a proposta de aliança, quando descobriu que havia mais gente na casa. Os Holland estavam escondidos no porão da casa e... bom, foram mortos na hora. Todos."

         Narcissa se encolheu um pouco no colo de Lucius, as lágrimas já rolando por seu rosto. Não era difícil imaginar o que Voldemort faria em seguida.

         - Por um momento - continuou o rapaz - Nada passou na cabeça do Lorde das Trevas a não ser matar o senhor e a senhora Grimshaw também. Mas depois ele resolveu dar-lhes outra punição. Se eles morressem, não sofreriam, não pagariam o preço de terem ajudado uma família trouxa.

         "Então ele resolveu poupá-los - após uma longa sessão com a maldição Cruciatus, obviamente - e levar o que eles mais amavam nesse mundo: o filho. Foi no feriado do Natal, Mark estava em casa, dormindo. O Lorde das Trevas trouxe-o para a sala e matou-o na frente dos pais."

         O final da história foi abafado por um soluço de Narcissa. Agora ela chorava febrilmente, assustada com o que acabara de ouvir. Lucius abraçou-a com força. Gostaria de poder poupar a garota de tudo isso. Mas exatamente por querer poupá-la que ele precisava contar o que estava acontecendo.

         E precisava contar a medida que havia tomado para protegê-los de tudo isso.

         - E vai ficar pior - comentou Lucius - Agora o Lorde das Trevas está mais desconfiado. Qualquer puro-sangue que não o apóie é considerado um Grimshaw em potencial. A morte deles deixou as famílias bruxas assustadas. A coisa está ficando realmente perigosa.

         - Mas nada vai acontecer conosco – babulciou Narcissa, tentando se recompor - Você é um Malfoy. Eu sou uma Black. Não há nada em nossas famílias que ele não admire...

         - Assim como ele admirava os Grimshaw. Ninguém está seguro agora, Cissy.

         - Por Merlin! - a garota ergueu a voz, levantando-se - Se nós não estamos seguros, sendo quem somos, quem estará?

         - Os Comensais - disse Lucius, erguendo-se também.

         - Então vou lembrá-lo Lucius, que há comensais na minha família. Minha irmã, Bellatrix, por exemplo.

         - E sua outra irmã namora um sangue-ruim. Há uma expectativa em você Cissy, pois suas irmãs tomaram decisões completamente diferentes. Espera-se que uma hora você tome partido a favor de uma delas.

         - E se eu não quiser? E se eu amar as duas, independente de suas escolhas? - Narcissa ergueu a voz, as lágrimas voltando a aparecer em seu rosto.

         - Ah claro, você ama as duas! O Lorde das Trevas vai com certeza compreender isso! Amor! - debochou Lucius.

         - O que você espera que eu faça?! - exaltou-se a garota, se agarrando as vestes do bruxo, forçando-o a encará-la.

         - O que eu espero? - repetiu o rapaz, desviando o olhar. Ele inspirou profundamente. Estava na hora da garota saber. - Que você compreenda o que eu vou lhe mostrar agora. Por favor.

         Ao dizer isso, Lucius se desvencilhou de Narcissa e levou a mão direita em direção à manga esquerda de suas vestes. A bruxa deu um passo para trás, horrorizada.

         - Não... – disse a garota.

         - Me desculpe Cissy. - sussurrou o rapaz, atordoado - Eu precisava fazer isso.

         Quando Lucius arregaçou a manga do braço esquerdo, Narcissa empalideceu e caiu de joelhos, tremendo violentamente. Perdeu as forças para chorar, berrar, sair correndo. Apenas ficou encarando o rosto do namorado, desolada.

         Ali, contrastando-se com a pele branca de Lucius, havia uma tatuagem vermelho-vivo de um crânio e uma serpente. Pulsando, como se estivesse viva.

         A Marca Negra.

         - Eu fiz isso para garantir que nada pudesse nos atingir. - murmurou o rapaz - Fiz isso por nós. Fiz isso por você.