Em um belo dia na base do Shinsengumi, uma unidade policial que servia ao Shogunato, as pétalas de cerejeiras caiam ao chão formando uma espécie de tapete cor-de-rosa, o sol brilhava intensamente e os pássaros cantavam como de costume. Tudo parecia normal. Tão normal, que chegava a ser entediante. O dia estava sendo tão tranquilo que não havia uma missão sequer para ser cumprida ou nenhuma outra atividade mais “satisfatória’’ para os integrantes das dez divisões que perambulavam pelo local, alguns inclusive a esmo. Uns resolveram patrulhar os arredores, outros aproveitaram para ver certas pessoas ou, simplesmente, beber.

No interior da base, em uma das salas, que davam para um lindo jardim com um pequeno lago de carpas, Shinpachi Nagakura, Heisuke Toudou e Sanosuke Harada, capitães da 2ª, 8ª e 10ª divisões respectivamente, jogavam conversa fora e comiam ao mesmo tempo, quando surgiu um assunto que era interessante demais para passar batido.

— Eu nunca, mas nunca na minha vida, vi o Hajime-kun rir! – Disse Heisuke, enquanto engolia os restos do peixe que comia.

— Ele parece feito de gelo! É frio como inverno! – Brincou Shinpachi, dando um gole rápido em seu sake.

— Eu também nunca o vi perder a compostura ou mesmo ficar sem graça, em nenhuma situação. – Completou Sano.

— Devíamos apostar isso! – Nagakura bateu no chão, animando-se com a idéia. – Bebida de graça esta noite no restaurante da Minako-san para quem conseguir fazê-lo tirar aquela expressão do rosto!

Antes que qualquer um dos três presentes falasse algo, ouviram uma voz no corredor se pronunciando.

— Eu aceito o desafio! – Disse o penetra dono da voz, mostrando ser Souji Okita ostentando um sorriso distinto em sua face.

— Apostado! Vamos ver quem consegue esse feito histórico! Ha,ha,ha!— Shinpachi estava crente que fosse impossível, mas ao mesmo tempo acreditava que tinha uma chance.

Sendo assim, resolveu ser o primeiro a tentar.

Procuraram o companheiro pela base, até o encontrarem sentado ao pé de uma das árvores de cerejeira, tomando chá como condiziam seus hábitos.

— Vocês vão ver! Eu vou ganhar rapidinho! Ninguém resiste à piadas! – O jovem alto, de olhos azuis e cabelos escuros espetados, foi em direção ao capitão da 3ª divisão, deixando os outros três escondidos atrás de um arbusto.

— E aí, Saitou?! – Chegou espalhafatoso.

— O que foi? – Respondeu o mais baixo, irritado pela interrupção inesperada.

— Já ouviu essa piada? – Perguntou Shinpachi, sorridente.

— Eu não gosto de piadas. 

— ... Ah, mas essa é boa! Você vai gostar!

— Duvido muito. – Disse friamente.

— Err...

Encararam-se por uns segundos e Shinpachi se deu por vencido. Diante daquele rosto inexpressivo, a única coisa que conseguiu fazer foi esquecer-se da piada e acabar com a chance de beber de graça.

— Esquece, vou deixar você quietinho aí tomando chá... – Nagakura deu meia volta e foi-se embora.

— Ele é a frieza encarnada! Nem senso de humor deve ter! “Não gosto de piadas’’. Poxa, todo mundo gosta de piadas! Como é que alguém assim pode viver?! – Ele reclamava, inconformado pelo “triste” fato de que existiam pessoas que não gostavam de piadas, principalmente as suas, no mundo.

— Minha vez! – Disse Heisuke, empolgado com a sua tentativa de ganhar alguma coisa gratuita na vida.

O mais novo de todos os espadachins do Shinsengumi se aproximava, sorrateiramente, ou pelo menos assim acreditava, por de trás da árvore a qual Saitou estava encostado, ainda tomando seu precioso chá. Heisuke se preparou para dar o bote em sua potencial presa. Dera um salto e tentou fazer o maior barulho possível, afim de que Hajime derramasse o líquido em si próprio, levando um susto. Infelizmente para o pequeno de cabelos compridos, o mais alto não teve reação alguma.

— Hajime-kun, você não se assustou?!

— Deu para ouvir seus passos. – Respondeu voltando a bebida quente.

— ... Droga! Terei que treinar mais! – Retornou revoltado com a falha técnica.

Restaram Harada e Okita. Heisuke resolveu ir comer em algum lugar, outra vez, já que não suportou ouvir os deboches de Shinpachi, deixando-os com a próxima tentativa.

Sanosuke tentou algo arriscado, mas quem sabe daria certo? Se pôs em frente a Saitou, lhe deu um peteleco na testa, e sorridente, ainda fez um cafuné no mais baixo

— Saitou-chan! — Disse animado, na esperança de que o amigo ficasse sem jeito.

— ... Harada, você está bêbado? – Perguntou Hajime, com cara de poucos amigos, claramente odiando estar sendo quase sufocado pelos músculos do outro.

— ... Hã?... Aah, talvez eu esteja! Ha,ha,ha! Eu bebi mesmo mais cedo! – Disfarçou rapidamente e, como Nagakura e Toudou, deu meia volta desistindo.

— Eu disse! Ele é frio como o gelo! Frio!

— Calminha, Shinpachi! Vocês todos fizeram coisas previsíveis demais, ao menos para alguém como o Hajime-kun. He,he. — Okita ria dos amigos e tinha certeza de que seria o grande vencedor da aposta. – Podem ir se preparando, por que eu vou ganhar essa!

— E como você pretende fazer isso, Souji? – Indagou Harada.

— Vocês vão ver.

— Então anda logo! Quero ver o que você fará! – Shinpachi ainda não superara a perda da bebida de graça e ainda mais o fato de ter tido suas piadas "censuradas" por Saitou.

— Você está levando isso muito a sério, Shinpa.

— Cala a boca, Sano!

— Esquentadinho, você...

Lá estava a pobre vítima do desafio. Tentando dormir ao pé da árvore que tanto adorava. Saitou possuía a pele branca como a neve e olhos azuis bastante profundos, talvez isso contribuísse para a aparência "gelada" que diziam que ele tinha. Como Okita costumava fazer missões e patrulhar junto com ele algumas vezes, não seria tão difícil chegar perto.

— Com sono, Hajime-kun? Não dormiu bem?

— Souji... – Ele abriu os olhos, lentamente. Mais uma vez estava sendo perturbado. – O que você quer? Contar piadas? Bagunçar meu cabelo? Me dar um susto? Se for isso, pode desistir. Seu planou foi descoberto.

— Ah, mas eu não vim fazer isso.

— Hmm...

— Hajime-kun, por que você nunca sorri? Digo, está sempre com essa cara séria, parece uma pedra. Não muda. – O mais alto deu um leve sorriso para o outro.

— E por que se importa tanto com isso?

— Somos amigos, não somos?

— Somos. Eu acho... – Saitou ficou pensativo e se distraiu. Momento que Okita estava esperando.

O rapaz de cabelos castanhos se aproximou lentamente do rosto do outro e encostara seus lábios nos do menor, fazendo este mudar as feições da face rapidamente. Hajime estava corado, com os olhos arregalados e em estado de choque. Estava sem reação alguma, nem sequer havia feito algo para impedir o outro de parar o beijo. Após cinco segundos, Okita disse:

— Então, sorria ao menos para mim.

Hajime não respondeu, mas mostrou um tímido sorriso.

Souji ganhou a aposta. Naquela noite, estava bastante satisfeito. Não só por ter bebido sem pagar nada, mas também por ter sido o único que conseguira fazer com que o implacável Hajime Saitou sorrisse de verdade.