Moonlight escrita por Ukisame


Capítulo 1
Capítulo 1 - Através do vidro




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/12157/chapter/1

Fanfic Pós-Breaking Dawn

---------------------------------------------

Moonlight

Prefácio
Prendi a respiração e comecei a correr.
As árvores se tornaram apenas borrões na paisagem, e o fato de não conseguir sentir o cheiro do caminho tornava as coisas um pouco mais complicadas. Eu não conseguia cheirá-lo, mas conseguia ouvir claramente o barulho que suas patas faziam ao tocar as folhas no chão. Aquele som eu conhecia. Era um dos meus favoritos.
Pulei o pequeno riacho e pude ouvir o barulho das águas sendo espirradas atrás de mim. Ele estava perto, muito perto.
Quais os tipos de pensamentos que passam por sua mente quando seu inimigo natural está poucos metros de distância, sedento pelo sabor da sua pele?Eu não conseguia pensar em nenhum arrependimento. A única coisa que minha mente mostrava era um rosto moreno e sorridente, onde um par de olhos negros brilhavam como duas estrelas no céu. Fechei os olhos e pude ouvir claramente o barulho de sua risada, era a melhor música, a melhor melodia.
Abri meus olhos e parei. Meu perseguidor parou junto comigo e recuou quando eu me virei bruscamente. Eu menti. Eu tinha um arrependimento.


Capítulo 1 – Através do vidro

SE ALGUÉM TIVESSE ME DITO, que as habilidades familiares poderiam me trazer tantos problemas, eu certamente apontaria e faria minha melhor expressão sarcástica, antes de soltar a gargalhada mais alta possível. Não que a idéia não tenha passado pela minha mente, mas assim como minha realidade é viver o "impossível”, eu realmente achei que tudo não passava de preocupação inconsciente.
Não é fácil manter segredos quando você é uma Cullen.
Não quando seu pai pode ler sua mente e um de seus tios pode sentir as emoções por trás de uma mentira. E claro, o fato de que você mesma poder repassar informações apenas com um toque.
Pensar em passar um dia nessa situação é angustiante, agora imagine crescer com essa família. Faz pouco tempo que a verdade resolveu bater-me na face, provavelmente apareceu junto com a adolescência. Em quatro anos eu cresci o que um ser humano normal demoraria dezesseis anos. Segundo as previsões de meu avô Carlisle (eu sei, pra mim também é difícil ver um homem de cerca de vinte e três anos ser chamado de avô), eu devo atingir a maioridade em mais ou menos dois anos, ou seja, os hormônios e a rebeldia são duplicados, ou até mesmo triplicados no meu caso.

Por causa do meu crescimento, eu não pude freqüentar a escola, e provavelmente vou entrar na Faculdade sem nunca ter pisado em uma sala de aula. Isso é apenas um detalhe, já que desde que aprendi a ler eu tenho aulas em casa. Edward (chamá-lo pelo nome inconscientemente é algo que aprendi com Bella, digo, mãe!) e Carlisle são excelentes professores, e a habilidade especial que Edward tem deixa tudo mais simples, já que ele sabe quando eu entendi ou não algo que ele tenha explicado. Em relação aos estudos, eu estou bem encaminhada, herdando de Bella a aversão por Cálculo.

Os últimos quatro anos passaram rápido.
Pouca coisa relevante aconteceu após o encontro com os Volturi na clareira. Após aquele dia, só recebemos notícias da Itália dois anos depois. Uma carta formal para Carlisle, onde Aro pedia detalhes sobre o meu crescimento e uma foto que comprovasse. O relatório foi enviado, mas Bella se recusou a enviar uma foto, alegando que não queria nenhum dos Volturi tendo meu lindo rosto perto da cabeceira na cama (tenho de reconhecer que fiquei agradecida por isso, não gosto de imaginar em que mãos minha foto poderia parar, ugh!).
Com exceção dos Volturi, a vida continua a mesma.
A casa branca no meio da floresta continua no mesmo lugar, assim como a pequena casa em que moro com meus pais. Nenhum dos Cullen tem intenção de mudar-se, ao menos por enquanto. Alguns deles às vezes se ausentam, como Rosalie e Emmett que retornaram anteontem de uma visita a Grécia. A idéia de deixar Forks sempre fez com que um arrepio subisse pela minha espinha, e ultimamente além do arrepio, sinto uma espécie de pânico acompanhado de uma angústia.
Faz cerca de quatro meses desde que tive o primeiro sinal de pânico. A conversa trivial na sala de estar dos Cullen havia começado com um comentário de Bella, sobre o fato de ter encontrado Jéssica e Mike enquanto visitava Charlie. Os dois eram ex-alunos da mesma escola que ela, e eu já havia ouvido as histórias que Bella me contava sobre seus tempos de estudante. Talvez a única coisa que falte nos meus estudos são colegas de sala.

"Aposto que você precisou pegar os caquinhos do rosto de Mike Newton, Bella". Alice disse com uma risada que parecia música, mas Edward rosnou. "Da última vez que Mike te viu ele estava hiperventilando".

Não envelhecer é uma marca registrada da família, então é de conhecimento geral que algum dia teremos de deixar Forks. Mas esse pensamento eu evitava, e teria evitado e negado para mim mesma por muito mais tempo, se logo após aquele comentário, Alice não tivesse segurado o punhal e atingido diretamente no meu peito (metaforicamente, claro).

"Acha que conseguiremos ficar aqui por mais algum tempo? Quero dizer, oficialmente a Bella já estaria quase se formando."

"É verdade. Não poderemos usar por muito tempo a desculpa de que você ainda está em tratamento médico".

A voz de Carlisle parecia deixar a situação ainda pior.
Desviei os olhos e passei a encarar o crepúsculo através de uma das enormes paredes de vidro, começando a me sentir desconfortável. Senti uma mão pesada em meu ombro, mas não precisei virar o rosto para saber quem era. Estava claro em minha mente que eu não queria estar tendo aquela conversa.

"É melhor deixarmos essa conversa para outra hora". Edward apertou um pouco mais meu ombro, e eu engoli seco ao sentir vários pares de olhos em cima de mim. "Ainda mais porque temos companhia".

Uma onda de eletricidade correu por todo meu corpo, e eu estava na porta antes mesmo dela ser aberta. Assim que a companhia chegou, eu segurei em uma de suas mãos e o puxei para fora, esquecendo completamente a angústia que tinha sentido anteriormente, abrindo um largo sorriso enquanto nos afastávamos da casa em direção a floresta. Quando eu estava com ele, a habilidade de Jasper era totalmente desnecessária.

Após aquele dia, nenhuma conversa sobre deixar Forks era tida na minha frente. Claro que eu sabia que eu seria avisada quando o dia de ir embora chegasse, ou ao menos eu esperava ser avisada, mas o fato é que, depois daquela conversa eu entrei oficialmente em uma espécie de "carpe diem" com ele. O motivo principal de eu não querer deixar Forks morava há algumas milhas, em La Push. O motivo era enorme, literalmente falando. Eu pareço uma criança (acredito que tenha herdado de Bella a baixa estatura, mas ainda tenho esperança de que saio dos 160 centímetros) perto dos dois-metrôs-e-alguma-coisa dele. Mas o tamanho é totalmente irrelevante perto da maravilhosa cor de sua pele, que contrasta totalmente com o meu branco pálido. Seus olhos sempre brilhantes que ficam pequenos quando ele sorri largamente quando me vê, mostrando uma fileira de dentes perfeitos que se entreabrem para dar a mais gostosa das gargalhadas que eu já ouvi. Jacob. O meu Jake.
A melhor companhia para conversas, o melhor amigo para corridas, caminhadas e caçadas, o melhor.... namorado?Ugh!
Esse era o ponto crucial, e é exatamente nesse assunto que entra todo o problema das habilidades familiares.

Eu sempre soube que era Jake.
Lembro de ter ouvido sua voz antes mesmo de ter nascido, não lembro das palavras, mas conseguia distinguir duas vozes claramente: a de Bella e a dele. Quando meus olhos o viram pela primeira vez, eu soube, era ele. No começo eu não entendia porque eu não conseguia ficar longe dele, da sua pele, da sua presença, como se fosse um imã positivo quando eu era o imã negativo. Tudo era muito natural, e ele desde sempre era o meu Jacob, mesmo a explicação para isso só ter vindo algum tempo depois.
A explicação sobre a impressão não me surpreendeu, apenas fortificou uma certeza que eu já tinha. Edward não ficou feliz quando eu disse que já sabia, e que estava feliz com aquilo. Quando eu disse "se não for o Jake eu não quero", recebi um olhar feio e um rosnado como resposta. Jacob riu e encheu a conversa com comentários e piadas, e eu sabia que uma nova briga começaria. Bella apaziguou o ambiente alegando que Edward estava se precipitando, já que ainda havia anos até que chegasse o momento em que ambos deveriam começar a se preocupar. A conversa aconteceu anos atrás, mas a reação de Edward é a mesma, não importa o assunto, desde que o nome de Jacob seja mencionado.
Então, como eu digo a eles que chegou o momento que eles devem se preocupar? Que eu já não vejo Jake como somente meu melhor amigo?

Junte a festa de seus hormônios precoces com um pai vampiro, paranóico e que pode ler mentes, e você terá a mesma preocupação que eu tenho no momento. Desde que descobri esses novos sentimentos, manter minha mente vazia tem sido uma batalha diária. Não pensar em Jacob tem sido uma guerra... perdida... literalmente e diariamente.
Certos hábitos precisaram ser transformados.
Eu já não toco no rosto das pessoas com tanta freqüência, por exemplo. Meus sentimentos e emoções acabam misturando as imagens que eu quero mostrar, com aquelas que eu não quero, sem contar ainda aquelas que eu gostaria que acontecessem. Como eu disse, é uma batalha diária.
A mudança nesse hábito de inicio chamou atenção, principalmente de Bella, a pessoa que eu mais me comunicava através do toque. Senti uma pontada no peito ao ver os olhos desapontados que ela me mostrou, quando eu disse que não a tocaria, que preferiria contar o meu dia com Jacob através de palavras. Menti. E Jasper percebeu. E Edward também. Fiquei dois dias sem poder ver Jacob após o inicio do meu projeto-não-me-toque. Até hoje não sei se o castigo foi pela mentira, ou pelo fato de Edward ter percebido que eu não queria que Bella me visse forjando um tombo, simplesmente para ser carregada por Jake.

Na verdade, não existe razão real para esconder as imagens na minha mente, simplesmente porque não existe nada, absolutamente nada que não possa ser mostrado. As emoções confusas e os sentimentos são meus. Os hormônios em ebulição são meus, porque para o alvo de toda essa minha admiração, eu ainda estou na fase de ser como uma irmã e uma melhor amiga. E é exatamente nisso que consiste o meu projeto carpe diem com Jacob. Não sei exatamente quanto tempo ainda tenho em Forks, e não importa se serão mais cinco, dez, quinze ou vinte anos. Todo o tempo do mundo parece pouco quando eu penso o quanto quero ficar perto dele. A espera para o começo da tarde parece uma eternidade, mas o tempo que passamos juntos passa como se eu piscasse, e de repente escurecesse e ele tivesse de me levar de volta antes que Edward o caçasse pela floresta.
Hoje em especial, a eternidade parece estar andando em câmera lenta.

Abri pela segunda vez meu exemplar de Persuasion, para ter de fechá-lo também pela segunda vez. Não ousava encarar o relógio novamente para evitar a decepção de ver os ponteiros nos mesmos lugares. Recostei melhor a cabeça no fofo acento do sofá e fechei os olhos devagar. Tudo ao meu redor tornou-se extremamente alto: o barulho das páginas que eram viradas pelos dedos delgados de Alice, a ponta da caneta riscando o papel com algumas anotações de Carlisle, os passos pesados que subiam os degraus da varanda...

"Jake!"

Pulei do sofá e corri até a porta, ouvindo um resmungo baixo de Edward sobre "não precisar ficar tão eufórica por nada". Eu sabia que o motivo da repreensão não foi a maneira como eu praticamente voei até a porta, mas sim pelo fato dele já saber quem estava do outro lado.
Para minha não surpresa, mas alegria pessoal e incondicional, lá estava ele, com um dos braços apoiado em um dos lados da porta, os cabelos levemente molhados, jogados pelos ombros e os mesmos olhos negros e brilhantes. Porém, meu sorriso largo e acolhedor não estava ali. No lugar havia uma fina linha que entortava em um dos lados, o que me fez recuar um passo. Havia algo errado, eu podia sentir sem que ele tivesse dito uma palavra.

"Vem, Jake", fechei a porta atrás de mim enquanto com a outra mão o segurava pelo braço, fazendo com que ele me seguisse. Eu sabia que eles haviam me escutado, mas eu gostava de me iludir com o falso senso de privacidade.

"Nessie, eu não posso demorar."

Meu estômago afundou enquanto eu andava, e minha mão apertou o pulso dele inconscientemente em uma tentativa vã de fazê-lo ficar. Delicadamente senti a mão quente dele por cima da minha, segurando meus dedos e me fazendo parar. Eu havia começado a correr sem nem ter notado.

"Acho que nenhum deles vai ouvir", a voz de Jacob estava mais baixa, mas não havia a alegria de sempre em suas palavras.

"Eles sempre ouvem, não adianta", olhei envolta para não encará-lo novamente. O que quer que tenha acontecido havia arruinado totalmente meus planos. Eu podia sentir a frustração fazer com que meu rosto ficasse quente, e a última coisa que eu gostaria de ouvir era alguma piada engraçada sobre a facilidade que tenho em corar.

"Nessie..."

Duas mãos grandes e extremamente quentes seguraram meu rosto, fazendo com que fosse impossível desviar o olhar. Ele estava tão perto... tão alcançável que eu podia sentir sua respiração forte, enquanto seus olhos negros encaravam os meus sem hesitar. Minhas pernas pareciam ter criado raízes no chão, e minha mente parecia nublada e sem foco.

"Eu..."

"Eu sinto muito por hoje", as mãos se afrouxaram envolta do meu rosto, e Jacob voltou a ficar ereto, fazendo com que eu tivesse de inclinar a cabeça para vê-lo. "Houve um problema com o velho Billy e eu estou de enfermeiro por hoje."

"Seu pai está bem?"

De repente, toda a minha frustração parecia ter escorrido pelos poros do meu corpo. Minha voz havia saído mais alta do que eu esperava, e a preocupação que começava a pesar no meu peito não dava espaço para o arrependimento. Eu teria muito tempo depois para me chamar de egoísta.

"Ele está bem, ok?", novamente as mãos quentes tocaram meu corpo, dessa vez elas pousaram no meu ombro e eu senti novamente o estômago afundar. Como eu poderia me sentir desse jeito quando Billy estava doente?O que há de errado comigo?

"O que ele tem?"

"Gripe, eu acho. Mas ele não é jovem, então estamos cuidando disso."

"Estamos?"

"Eu tenho revezado com o bando, Quil e Embry estão com ele agora, eu precisava esticar as pernas e ver como você estava."

Se minha atenção não estivesse em outro lugar, eu provavelmente teria explodido quando uma de suas mãos tocou meu rosto, saindo de uma de minhas têmporas até o meu queixo. Mas a presença não muito longe dali me fez perder provavelmente o melhor momento do dia, o que não era uma grande novidade. Minha família era especialista em atrapalhar minhas investidas amorosas, mas os irmãos de Jacob conseguiam tal proeza com certa maestria, principalmente Leah.



De onde eu estava, não conseguia ver claramente o enorme lobo por causa das árvores, mas eu sabia que Leah deveria estar com Jacob, ela sempre estava com ele.

"Nessie...?", a mão virou meu rosto que havia se inclinado para além de suas costas, não me dando tempo de disfarçar minha expressão de desaprovação.

"Tudo bem, eu entendo, se você precisa ficar com Billy", menti. Entendi que ele precisava ficar com o pai, mas não conseguia pensar em uma explicação para Leah ter feito todo o caminho até aqui.

"Mesmo?". Havia descrença em sua voz, e uma certa surpresa que ele não conseguiu disfarçar."Uau, Ness, achei que tivesse de me desculpar de joelhos por furar com você, não que eu não sinta muito, acredite, eu sinto."

"Eu sei, Jake, mas você precisa cuidar do seu pai, se precisar de um médico ou qualquer coisa, você sabe onde encontrar".

"Obrigado, Nessie, prometo que amanhã venho mais cedo para passarmos mais tempo juntos", a voz de Jacob havia mudado, e eu podia notar a diferença entre suas atitudes e suas expressões. Ele realmente estava com medo que eu me zangasse.

"Cuide do Billy primeiro, se ele não melhorar fique com ele, não se preocupe comigo, ok? Se não puder vir amanhã é só telefonar". Mentir já estava se tornando um hábito quando o assunto era manter minhas prioridades. Eu não podia impor minhas vontades quando Billy estava precisando realmente de Jacob, mas eu não podia me enganar e dizer que tudo ficaria bem. Apenas a menção de não vê-lo no dia seguinte fez com que minha voz falhasse no final da frase, e novamente eu podia sentir o pânico dentro do peito ao pensar em ficar longe dele.

Minha covardia era maior que a vontade que eu tinha de encará-lo. Meus olhos vagavam pela grama embaixo de meus pés, então eu não pude ver que tipo de expressão ele fazia. Era melhor assim. Quanto menos eu o visse, menos tempo precisaria passar limpando a mente antes de entrar novamente em casa.

"Certo, mas da próxima vez vamos recuperar o tempo perdido".

Um par de braços longos e quentes me trouxeram para um abraço, acabando com a minha resistência. Afundei o rosto no peito dele, notando pela primeira vez que ele usava uma camiseta escura. Uma das regras de Edward, aliás, duas: Jacob só poderia me encontrar muito bem vestido, e era extremamente proibido que ele se destransformasse na minha frente. A segunda regra era praticamente uma lei, se Jacob a descumprisse, eu seria enviada no mesmo instante para alguma cidade do outro lado do mundo.

"Eu vou sentir sua falta, Jake", meus lábios mal se mexiam, mas eu tentava manter minha mente longe das paranóias de Edward.

"Eu estou sentindo sua falta, Nessie."

Sorri, apertando mais o abraço.
Eu podia sentir o calor do corpo dele, mais quente do que o de um ser humano comum, que fazia com que cada milímetro do meu corpo quisesse manter esse abraço para sempre. Sabia que ele teria de ir, mas enquanto ele não me afastasse, eu aproveitaria todos os segundos possíveis como se estivesse guardando para utilizá-los depois.
Que coisa incrível essa impressão.

O abraço durou mais do que eu esperava, e tenho certeza de que Jacob não teria afrouxado os braços, se um suspiro vindo de alguma parte da floresta, não o chamasse de volta a realidade. Gentilmente ele deu um passo para trás, ainda com o largo sorriso que ele sabia que eu adorava. Instantaneamente, minha mão direita segurou seu braço, e eu senti minha garganta se apertar. Meu rosto havia se tornado quente e eu tinha certeza de que ele havia percebido, principalmente pelo fato de sua expressão ter se tornado um tanto quanto divertida.

"Cuide-se, Ness", as palavras de despedida foram ditas em um tom descontraído, e eu fechei os olhos para sentir os lábios dele na minha testa, como ele sempre fazia quando ia embora.

Meus olhos se abriram em seguida, para ainda ver um leve aceno, enquanto Jacob desaparecia na floresta. Foram necessários alguns minutos até que eu pudesse fazer um reconhecimento de onde estava, percebendo que a grande casa branca não ficava tão longe, e que provavelmente a essa hora todos já sabiam o que havia acontecido.
Uma onda de arrependimento e frustração fez com que eu começasse a andar, querendo ficar o mais longe possível das tentativas de consolo de Bella, e o sorriso vitorioso que eu sabia que Edward colocaria em seu rosto perfeito quando eu abrisse a porta.

Pensei na possibilidade de retornar e pegar meu carro, o Volvo prateado, herdado diretamente de Edward, mas eu ainda não sabia dirigir muito bem, e meu professor particular hoje estaria como enfermeiro em La Push. Então não me restava nada a não ser utilizar minha outra natureza, que havia me dado uma velocidade incrível, o suficiente para que eu me afastasse para não ter meus pensamentos ouvidos.
Seguindo na direção contrária a que Jacob havia tomado, logo as árvores eram apenas figuras borradas na paisagem, e o vento parecia tocar delicadamente meu rosto, deixando meus cabelos longos para trás. A corrida teria durado mais um pouco, se em determinada parte do caminho, eu não tivesse de mudar de rota ao sentir o cheiro fresco de humanos. Não que isso fosse um problema, eu já havia aprendido a controlar bem esse meu lado, era fácil conviver com humanos, mas hoje eu simplesmente não queria ver ninguém. Nem humanos, nem vampiros...

O local escolhido para esconder minhas frustrações havia sido o tronco de uma grande macieira, grande o bastante para que eu pudesse me sentar confortavelmente em um dos lados que não batia Sol. A floresta estava silenciosa, exceto pelo barulho de alguns pássaros ao longe, e o vento que sacudia levemente algumas folhas. Era perfeito para o que eu pretendia fazer.
Com uma longa espreguiçada, recostei-me melhor no tronco da árvore e bocejei. Havia acordado cedo demais e a espera para ver Jake havia me deixado cansada.

Não sei dizer quanto tempo demorou para que eu dormisse, mas percebi logo que o que estava acontecendo era um sonho. Só poderia ser um sonho.
Primeiro, eu não estava na floresta. Estava sentada no confortável banco de couro do Volvo prateado. Segundo, eu não estava sozinha e remoendo frustrações por causa da espera perdida. Ao meu lado, com um largo e irresistível sorriso, Jacob dirigia o carro como se fossemos os donos da estrada.
Certo. Poderia não ser um sonho até ai, mas o que viria a seguir iria provar realmente que eu estava sonhando.
O velocímetro começou a diminuir, e aos poucos eu senti o carro parar. Jacob tinha um sorriso largo nos lábios, e ao virar-se na minha direção eu pude ver seus olhos. Eram os mesmos olhos negros, mas eles brilhavam mais dessa vez, e a maneira como ele me encarava fazia com que cada parte do meu corpo tremesse, como se respondesse àquele olhar.
Com uma das mãos ele segurou meu rosto, e eu pude sentir minhas bochechas queimando não somente por causa das mãos dele. Eu estava virada quase que totalmente em sua direção, enquanto minhas mãos apertavam o banco de couro com força, como se drenassem todo o meu nervosismo.
Eu sabia o que aconteceria ali, eu podia sentir em cada célula do meu corpo o quanto havia desejado por aquele momento, mesmo tendo consciência de que estava sonhando. Os lábios de Jacob se aproximavam devagar, diminuindo a distância entre os meus. Fechei meus olhos, era assim que eu sempre havia lido e visto nos filmes, e de olhos fechados eu poderia me surpreender e não ficar tão nervosa com a aproximação.
Mas eu não senti os lábios macios de Jacob nos meus. Ao invés disso, meus olhos se abriram quando meus ombros foram sacudidos, e meu nome foi chamado por uma voz que não era a doce e rouca voz de Jake.

Bella estava na minha frente, suas mãos geladas estavam no meu ombro, e seu rosto tinha uma expressão dolorida, como se ela estivesse com algum tipo de dor.
Demorei alguns segundos para que meu cérebro pudesse funcionar normalmente, e para que eu pudesse formular uma pergunta.

"Mãe?"

"Renesmee, você está bem?"

A voz de minha mãe estava mais pesada do que de costume, e a expressão de dor ainda cobria seus lindos traços.
Eu acenei com a cabeça, e ela suspirou, ficando de pé, mas sem tirar os olhos de mim mesmo enquanto eu levantava, mostrando que estava bem.

"Aconteceu alguma coisa?", arrisquei a pergunta. O que quer que tenha acontecido não poderia ser relacionado comigo. Eu havia passado a tarde dormindo...

Minha linha de pensamento parou.
Não precisei ouvir a resposta de Bella para entender o motivo da expressão em seu rosto. Ao olhar melhor onde estava, era bem fácil de entender. A floresta estava completamente escura, exceto alguns pontos que eram iluminados por uma fresta de lua, mas no geral, eu havia adormecido sem perder a noção da hora e esquecido de voltar para casa.
Um pedido de desculpas já estava se formando nos meus lábios, quando um dos braços de Bella me jogou para suas costas. Passei meus próprios braços envolta de seu pescoço e o apertei com força.

"Desculpe", falei baixo, afundando o rosto nos fofos cabelos castanhos de minha mãe, assim que ela começou a correr.

"Você sabe o quão preocupados ficamos? Renesmee, não se dorme no meio da floresta". A reprovação na voz de Bella soava como música. De certa forma as broncas dela nunca pareciam broncas de verdade.

"Eu sei, sinto muito, eu não vi que havia anoitecido."

"Edward estava quase incontrolável achando que você tinha ido até La Push fazer companhia para Jacob", havia uma certa ironia naquelas palavras.

"Eu nem pensei nisso", mordi meu lábio. Por que eu não me auto-convidei para fazer companhia?Tola.

"Eu sei que não", Bella riu, e eu pude sentir a risada ecoando por seu corpo, me fazendo rir também. Lidar com Bella era tão simples e natural.

A distância até a casa branca não era longa, mas eu podia sentir o cansaço, me acomodando melhor nas costas de Bella, fechando os olhos. Minutos depois ela havia parado, e eu só percebi que estava em casa, ao sentir que encostava em algo macio.
Abri meus olhos e encontrei o rosto sorridente e amável de Bella, que me colocava delicadamente no sofá.

"Você está cansada, querida."

"Eu estou bem", sorri como resposta, me sentando no sofá.

Talvez tivesse sido melhor se eu continuasse a dormir.
Eu mal havia sentado no sofá, e pude sentir a respiração pesada que vinha de alguma parte da sala. A voz de Carlisle era baixa demais para que eu pudesse ouvir, mas eu podia sentir que Jasper estava agindo no ambiente, devido a estranha calma e serenidade que eu começava a sentir.
Meus olhos se viraram devagar, procurando o motivo pelo qual Jasper estava usando seu dom, pois eu sabia que não poderia ser eu. No fundo eu sabia quem era, só queria ter certeza do óbvio.
Próximo ao piano, Edward andava de um lado para o outro. As mãos para trás em forma de punho, as narinas dilatadas e os olhos de topázio na minha direção, como se em algum momento ele pudesse simplesmente pular em cima de mim. Alice estava sentada ao lado de Jasper, no primeiro degrau da escada, e eu podia ouvir sua risada baixa. Ela estava se divertindo.

"E-eu sinto muito", abri a boca em busca de uma explicação, mas Edward ergueu uma das mãos me pedindo para parar. Eu estava perdida.

Bella que estava ao meu lado se pôs de pé, ficando entre o sofá e o alterado Edward, como que para garantir que nada pudesse acontecer.
Esme que estava ao lado de Carlisle, não muito longe de onde Edward marchava, me olhava com um meio sorriso como se pedisse desculpas.
Era a primeira vez que a raiva de Edward por algo que eu tivesse feito tinha aquele efeito. Não era agradável. Eu sentia vontade de ir até onde ele estava e abraçá-lo, mas eu temia que isso só piorasse a situação.

A menção a esse pensamento fez com que ele parasse.
Com um longo suspiro, e parecendo ter pegado todo o ar que havia na sala, Edward caminhou na direção do sofá, parando ao lado de Bella, fazendo com que eu recuasse.

"Renesmee...". Sua voz de veludo estava tensa, e eu podia sentir o barulho de seu maxilar trincando, assim que ele fechou os olhos como se estivesse escolhendo bem as palavras.

"Eu dormi, desculpe", as palavras saiam da minha boca às pressas. "Eu sei que não devo fazer isso, eu realmente sinto muito, pai".

Edward abriu os olhos, e eu pude respirar tranqüila ao ver que a raiva não estava tão presente. Eu podia vê-la ainda ali, mas não com tanta fúria e intensidade como segundos atrás.

"Acho melhor irmos para casa."

Bella sorriu para o restante dos Cullen e desejou um "boa noite" tímido, seguindo atrás de Edward que havia saído antes que eu pudesse perceber.
A risada de Alice havia se tornado mais alta, e um rosnado vindo de fora fez com que até Jasper e Emmett soltassem uma gargalhada.

Nunca o curto caminho até a casa de faz-de-conta pareceu tão longo.
Edward corria mais rápido do que nunca, e mesmo tentando manter o mesmo ritmo, logo tudo o que eu podia ver eram suas costas, cada vez mais longe.
Ao subir os pequenos degraus que levavam a entrada, meu coração parecia prestes a saltar pela boca, e eu temia o que me esperava assim que a porta fosse fechada. Bella estava na minha frente antes que Edward pudesse começar o discurso, que eu sabia que ele havia reservado especialmente para ser dito assim que estivéssemos longe dos olhares e ouvidos do restante da família.

"Edward, por favor, seja razoável", Bella estava séria, e eu suspeitava que ela sabia o que vinha pela frente. "Ela já se desculpou, nada aconteceu, nós já conversamos e está tudo bem".

"Tudo bem?Tudo... bem?". Uma mistura de ironia com descrença pintava a voz de Edward, enquanto seus olhos pareciam atravessar Bella. "Não está tudo bem. E... eu não quero pensar nisso."

Com um movimento rápido, Edward virou-se de costas e apoiou a mão em uma cadeira. Bella aproximou-se e pousou uma das mãos em seu ombro, fazendo com que ele olhasse para ela automaticamente.
Mas seus olhos não se encontraram. Em vez disso, eles vieram diretamente para mim, fazendo com que eu recuasse dois passos para trás, sentindo as pernas ficarem bambas.

"É melhor eu ligar para o Jake e avisar o que aconteceu, você o deixou preocupado, mocinha..."

Um rosnado profundo ecoou no peito de Edward ao ouvir o nome de Jacob, e Bella recuou.

"Francamente, Edward. Achei que esse assunto já havia sido resolvido. Você não pode ter essa reação toda vez que ouve o nome do Jacob, você sabe disso."

"Bella, por favor...", a voz de Edward era uma mistura de rosnados sussurrados.

"Não Edward, você está sendo ridículo. Ela passou a tarde dormindo, Jacob estava longe cuidando de Billy, não existe motivo para essa reação exagerada. Ele não está aqui."

"Bella..."

Houve uma pausa. Uma longa pausa.
Se eu não estivesse tão aterrorizada e amedrontada com o meu possível e potencial castigo, eu teria conseguido ler nas entrelinhas.
Edward só tinha aquele tipo de reação após vasculhar a mente de Jacob, que geralmente era infestada de comentários maldosos propositais, que faziam com que meu pai esquecesse momentaneamente que ele não podia machucar Jake.
Mas como Bella havia dito, eu havia passado a tarde sozinha...

"O problema não é o Jacob", Edward tinha a voz arrastada, e eu podia ouvir meu próprio coração batendo descompassado. Eu havia entendido. "O problema é ela."

Não foi preciso mais nenhum rosnado para que tudo ficasse claro.
A expressão de Bella havia endurecido, e os olhos de ambos pareciam iguais. Devagar, dei as costas, caminhando em direção ao meu quarto, sentindo os olhos ficarem úmidos e o caminho embaçado. O choro apareceu assim que eu fechei a porta. Era uma mistura de frustração, egoísmo e decepção.
Jacob não havia voltado. Ele estava cuidando de Billy em La Push, então tecnicamente não havia como Edward ler sua mente. Mas a minha, a minha conturbada e confusa mente estava aberta, completamente vulnerável.
Ao deitar na cama, fechei os olhos e tentei pensar em assuntos triviais, tentando afastar com todas as minhas forças o sonho que havia tido essa tarde, e que estava gritando em minha mente, desde o momento em que eu havia acordado na floresta.

Continua...


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!