Alguma coisa estava errada. Decididamente tinha alguma coisa errada. Mas eu não queria pensar naquilo, não queria tentar entender. Tinha perdido minha namorada e meu melhor amigo, mas pelo jeito, tinha ganhado outras pessoas que me entendiam mais no momento. E pra mim, estava tudo bem continuar assim.

A semana que se passou foi o mais tranquilo possível. Eu e minha turma estávamos nos divertindo, treinando e consequêntemente, arrumando confusão. Quíron já não sabia mais o que fazer todas as vezes que alguém reclamava de nós.

Mas eu não precisava nem dizer que estava me divertindo, certo? Eram experiências totalmente novas as que eu estava vivenciando, me tornava mais alegre e mais desinibido à cada dia. Eu estava mudando rapidamente.

À véspera da festa no Chalé de Dionísio eu ainda não tinha descoberto o que tinha de errado entre Annabeth e Thalia, e a garota se recusava incrivelmente à me dizer qualquer coisa que ajudasse-nos a deduzir os motivos da briga. Parecia que a coisa era séria. Mas eu estava muito ocupado me rebelando pelo Acampamento para me concentrar naquilo.

Então, uma hora antes da festa, me vi mais uma vez entre Thalia e Clarisse se empertigando no espelho de corpo inteiro de meu quarto para passar seja lá o que fosse no rosto.

Elas estavam lindas novamente. Pareciam duas dançarinas burlescas, com aqueles vestidos cheios de plumas e brilhos. Eu estava fantasiado de ganster. O chapéu de lado e o charuto falso eu me sentia um verdadeiro vigarista. Aquele negócio todo de festas tinha se tornado divertido, era uma vida onde os problemas eram jogados para o alto e todo mundo dava prioridade para a diversão.

- Ok sereia, já arrumou o cabelo? - Thalia disse, terminando de passar o deliniador brilhante.

- Tá quase... - falei, passando mais gel no cabelo. - Silena sabe fazer isso melhor do que eu, aliás, onde ela está?

- No Chalé do Charles, é óbvio. - Clarisse falou, achando graça.

 - Então quer dizer que ela e o Beckendorf estão mesmo... Se engraçando? - perguntei, passando o pente mais uma vez pelo cabelo melecado de gel.

- Se engraçando é pouco. Acho até que eles já deram uns beijos, mas não rolou mais nada. Quer dizer, a garota tá de quatro por ele! - Thalia disse.

Nós rimos. Eu sabia o que ela sentia, na verdade, mas não ia comentar essa parte. Primeiro porque sempre que mencionavam Annabeth, eu e Thalia faziamos uma careta idêntica, e ela ficava distânte, imersa em pensamentos impenetráveis.

- Vamos então? - perguntou Clarisse, guardando o deliniador na minúscula bolsinha prateada.

- Vamos madames. - disse, tentando ao máximo ser galante.

Elas riram, se enlaçaram em mim cada uma em um braço e saímos do Chalé, com a espectativa no máximo.

Não me lembrava de ter estado em uma festa daquelas nunca. Em toda a minha vida, só tinha visto aquilo nos seriados de televisão, onde os vigaristas se escondiam em clubes secretos cheios de bebidas e garotas. Bom, o Sr. D. devia se orgulhar muito de seus filhos, porque eles tinham recriado aquele cenário sem o mínimo esforço.

O local inteiro estava imerso em fumaça, facilmente conseguida com gelo seco, tinha um palco enorme que ia da parede norte até metade do salão. Em volta estava cheio de mesas e cadeiras de couro vermelho, os lustres em cima das mesas soltavam uma luz avermelhada e bizarra e dríades passavam por todo o salão com bandeijas de drinks coloridos.

- Vocês tinham razão. As festas do Chalé de Dionísio... - falei, olhando para tudo com a boca aberta, parecendo um idiota.

- Não te disse? - uma voz às minhas costas perguntou.

Me virei e vi Chris Rodriguez com um terno risca de giz assim como o meu, ao lado de Silena - com um vestido de paêtes rosa choque - e Beckendorf. Travis e Connor estavam em uma mesa mais a frente com Pólux. Nos sentamos com eles.

- Eaí? - eles cumprimentarão em unissono.

- Aí, os caras estão bonitões... - falou Pólux, rindo abobado.

- iih... Achei que ia esperar a gente chegar pra começar a beber. - Clarisse falou, rolando os olhos.

- Não bebi Clarrr... Só estou feliz, porque essa vai ser a festa do ano. - ele disse, a voz arrastada.

- Porque? Que surpresas você tá preparando? - Silena perguntou excitada.

- Vocês vão ver. - ele disse, encerrando as perguntas.

Uma das Dríades veio até nós e despejou os copos em nossa frente. A música que envolvia o ambiente era sedutora e dava uma vontade imensa de sair procurando Annabeth e dizer que estava morrendo de saudades de sua boca. Mas eu não ia fazer isso. Ela era quem tinha terminado, e eu estava me agarrando a essa verdade com todas as forças que tinha.

Sacudi o conteúdo do copo. Era verde. Eu tinha certeza que tinha uma dose generosa de alcóol ali, e era exatamente disso que eu precisava, ou era exatamente isso o que meu corpo pedia naquele momento. Ele não hesitou em virar o líquido de origem duvidosa para dentro de seu corpo.

- Hey sereia, - Thalia sussurrou no meu ouvido, causando-me importunos arrepios. - Relaxa no alcóol. A gente já vai chegar no ápice da festa.

Eu ri baixinho, de modo que apenas nós dois ouvissemos, e sussurrei de volta em seu ouvido, sendo impregnado pelo cheiro de seu perfume.

- Eu sei me cuidar. E se quer saber, o ápice da festa a gente faz a qualquer momento.

 Foi a vez dela de rir. Pegou seu copo e bebericou sem muito interesse, olhando em volta. Eu fiz o mesmo. As pessoas estavam animadas, e se esforçavam o máximo para parecerem civilizadas. Mas depois de algum tempo com aquela galera, eu tinha aprendido a sempre entrar em algum lugar pensando "Que se dane!".

A música ainda tocava, e eu precisava me mexer, fazer qualquer coisa pra não me julgar inútil ali. Reparei de repente, que Annabeth estava sentada em uma mesa, cercada de lindas garotas. Ela vestia, um vestido de paête assim como Silena, mas o dela era prateado, e tinha uma saia mais cheia com plumas exageradas. Afinal, o tema era exagerado.

Mas não era quem estava chamando a minha atenção. Uma de suas irmãs, que eu não fazia ideia de quem era, me olhava descaradamente. Ela fugia completamente do tema proposto, usando um vestido preto tomara-que-caia que se fosse mais agarrado a faria perder o ar. Ela tinha os mesmos olhos cinzas que me perseguiam, mas tinha um rosto incrivelmente sedutor, os lábios contornados pelo batom vermelho pareciam me chamar.

- Percy, pára de olhar pra ela. - Thalia falou, rolando os olhos, como se eu fosse burro.

- Não quer dar esse gostinho pra ela, certo? Olha só, ela tá sorrindo e te olhando como se você não fosse nada. - Chris falou.

Me virei novamente e vi que ela sorria para mim. Mas não era um sorriso terno ou nada do tipo, ela sorria de um jeito... Vingativo. Franzi a testa. O que ela estava aprontando agora?

- Não estava olhando exatamente pra ela... Sabe a outra? A morena do lado dela? - expliquei irritado.

- Ah... A garota que está te secando descaradamente? - Clarisse perguntou, causando risadas à minha volta.

- Aquela mesma.

Nos viramos mais uma vez para analisar as garotas. Eu desviei os olhos de Annabeth e os direcionei para sua linda irmã. Ela sorriu mostrando os dentes brancos em contraste com o batom. E de repente, foi empurrada para o lado, para que um garoto sentasse.

E então, eu descobri o que o sorriso no rosto de Annabeth significava. O garoto - alto e forte - passou os braços por sua cintura, e beijou sua bochecha. Se qualquer pessoa tivesse feito isso com ela, levaria um soco bem dado na cara. Mas pelo jeito, os dois tinham alguma ligação.

Minhas entranhas se contorceram. Senti um calor que não tinha nada a ver com o clima se apossar de mim. Minha maior vontade era quebrar a cara daquele garoto, e bater nele até que ele se desfizesse no chão. Virei meu rosto para a mesa, tentando evitar os olhares incisivos que ela me lançava, e tomei um grande gole de minha bebida.

Os outros me olharam, visivelmente preocupados. Me irritei por ser alvo de pena. Mas como sempre, eu podia contar com Thalia para me surpreender.

- Porque não vai falar com ela? - A garota me perguntou, num tom despreocupado.

- Ficou maluca? Eu não vou...

- Não com a Annabeth! Com a irmã dela, Louise. É o nome da garota que estava te olhando.

Refleti por um momento. Se eu chegasse perto daqueles dois, não sabia se poderia ser racional. Mais a ideia de flertar com uma garota na frente de Annabeth, uma garota que ainda por cima era sua irmã... Aquilo provavelmete a faria parar com aquela farça.

Afinal, era óbvio que não estavam juntos! Ela nunca teria ficado com alguém tão rápido. Eu conhecia ela... Ou pensava que conhecia.

- Qual é a pior coisa que pode acontecer? - Thalia perguntou, sua voz meio rouca me induzindo a pensar o mesmo.

- Eu não tenho mesmo nada a perder... - murmurei comigo mesmo.

Matei a bebida de um gole só, e me levantei. Arrumei o blazer, e coloquei no rosto meu melhor sorriso. Meu andar era calmo e controlado, como o de uma cobra preparando o bote. Olhei diretamente para Annabeth enquanto caminhava.

"Vingança.", pensei. "Você vai entender o que é isso."

Então, quando estava tão próximo da mesa a ponto de todos os presentes me olharem com curiosidade, me virei para Louise, tirando o sorriso de satisfação do rosto de Annie, e o colocando no rosto de sua belíssima irmã.

- Louise, certo? - perguntei, uma voz cheia de mistério e atrativos saíndo de minha boca.

Ela deu uma risadinha surpresa e excitada.

- Sim... - disse, receosa mais radiante.

Dei um sorriso torto e entendi minha mão para ela. À essa hora, as pessoas da mesa não eram as únicas a me olhar, pensando que eu estivesse falando com Annabeth. Louise sorriu mais ainda, e pegou minha mão, sem nem ao menos olhar para sua irmã, que tinha a boca escancarada.

Peguei a bela dama pela mão e fui para a minha mesa. Meus amigos riam abertamente, olhando para nós. Olhei uma última vez para Annabeth, e vi que ela estava incrédula. Dei um sorriso confiante para ela, e me voltei para frente.

Nos sentamos lado à lado, ela surpresa por estar sentada com pessoas tão legais.

- Eai, Louise? - Thalia cumprimentou.

- Tudo bem? - sua voz soou feminina e poderosa. Gostei disso.

Ela se virou para mim, esperando que eu disse-se alguma coisa, e os outros retomaram suas conversas.

- Ok, vamos começar do começo. - falei, me sentindo tão confiante que era até assustador. - Percy Jackson.

Beijei sua mão num ato galante e ela riu novamente.

- Louise Keiton. - ela falou.

- Muito prazer.

Ela sorriu. Uma dríade passou na nossa mesa, e distribuiu mais uma rodada de drinks coloridos. Dessa vez, o conteúdo em meu copo era laranja. Dei um gole e fiquei feliz em constatar que realmente tinha o gosto da fruta, mascarando o alcóol.

- Você está linda, sabia? - falei.

Ela sorriu e bebericou seu copo.

- Obrigada Percy. - ela disse, chacoalhando o copo. - Você também esta... Maravilhoso. - ela disse, esquadrinhando meu corpo todo.

Não pude deixar de sorrir com isso. Aquela garota estava completamente louca por mim. Eu daria o que ela queria, ah, se daria.

- Então... Me fale de você. - disse, tentando ser simpático.

Ela rolou os olhos, e chegando mais perto de mim, sussurrou em meu ouvido, causando-me mais arrepios. As garotas tinham que parar de fazer isso.

- Vamos lá Perseu. Vamos direto ao assunto.

Umideci os lábios tentando conter uma risada. Aproveitando que ela estava tão perto, enlacei sua cintura, e chegando perigosamente perto de seus lábios vermelhos, sussurrei, provocando-a de volta:

- Se você quer assim, é assim que vai ser. Vai descobrir que sou muito obediente.

Ela riu baixinho e foi chegando mais perto de mim. Olhei sorrateiramente para Annie, e vi que ela nos fitava, os olhos apertados, uma mão no peito do garoto tentando afastá-lo. Sorriu satisfeito. "Touché", pensei antes de tomar os lábios de Louise.

Eram incrivelmente carnudos. E tinham um sabor surpreendentemente doce, mas pensando bem, devia ser o batom. Nossas linguas se entrelaçaram desejosas, e eu me lembrei de como era bom beijar alguém com tanto desejo, mas descobri como era fazer isso sem ser parado de repente.

Trouxe seu corpo para mais perto de mim, a fazendo arfar. Era a melhor sensação do mundo. Eu tinha até me esquecido de que estavamos sendo observados. Mas fomos acordados por uma voz que ecoou por todo o Chalé. Louise se soltou de mim, e riu tentando limpar seu batom da minha boca.

Pólux estava no palco, em meio aos aplausos. Thalia me olhou, se divertindo por me ver tão alienado.

- Como é que vão?! - Pólux perguntou, fazendo as pessoas aplaudirem mais. Ele riu. - Ok, ok. Como atração principal essa noite, vamos ter um pouquinho de música ao vivo. Se puderem vir pra pista de dança...

- Então é isso! - Silena falou, socando o ar.

Nós rimos. Eu peguei Louise pela mão e a levei para a pista, atrás de todos que já se levantavam. Pólux saiu do palco e desceu para ficar conosco. Piscou para mim, indicando Louise e eu pisquei de volta.

O palco foi tomado por um grupo de lindas garotas vestidas de couro. Elas foram ovacionadas pela platéia que estava inteira de pé. Eram com certeza filhas de Apolo pela perfeição. Elas tomaram os instrumentos e começaram a tocar em uma sincronia hipnotizante.

Era a melhor música ao vivo que eu já tinha escutado antes. Todos se precipitavam para o palco a fim de ter uma maior visibilidade, todos pulando e cantando alto com elas, mesmo que não fizesse a minima diferença, pois a guitarra mesclava qualquer som.

E ali, pulando junto com todos aqueles semideuses, eu peguei Louise mais uma vez pela cintura, e beijei-a, tentando realmente esquecer de todos os meus problemas naquelas belas curvas das quais eu abusava.