Eu sinto como se estivesse sumindo aos poucos, mas isso não é mais nenhuma surpresa pra mim. Essa sensação não me deixa em paz desde que você se foi.

                Os fogos de artifício estouram no céu noturno, criando um espetáculo de cores vivas e esperança.

                Adeus ano velho, feliz ano novo.

                Mas é diferente pra mim. Felicidade é uma palavra desconhecida e inalcançável pra mim desde que você morreu.

                Agora, com a testa encostada na janela, e com as lágrimas descendo suavemente pelo meu rosto pálido. Eu começo a relembrar sua morte, como eu faço todos os dias.

                Lembro-me de que você estava procurando um livro na estante, O Apanhador no Campo de Centeio ¹, se minha memória não estiver me traindo. Depois de achar o que tanto queria naquele livro, você repentinamente levou as mãos ao pescoço e começou a tossir sangue. Eu gritava desesperadamente por socorro. Então você fechou os olhos e foi de encontro ao chão, sua respiração estava fraca, quase inexistente. Os vizinhos irromperam pela porta e correram para checar seu estado enquanto eu ligava, com dedos trêmulos, para a ambulância.

                A cada quilômetro que a ambulância percorria, seu coração ficava cada vez mais lento. Como se previsse sua própria morte, você segurou fracamente minha mãe e disse-me a frase que me remete para as lembranças daquele dia.

                “Almas gêmeas nunca morrem.”

                Você morreu alguns segundos depois.

                Ainda me lembro também, do trecho que você tanto procurava no livro.

         “Tomara que quando eu morrer de verdade alguém tenha a feliz idéia de me atirar num rio ou coisa parecida. Tudo, menos me enfiar numa porcaria de cemitério. Gente vindo todo domingo botar um ramo de flores em cima da barriga do infeliz, e toda essa baboseira. Quem é que quer flores depois de morto? Ninguém.” ²

                Akasuna no Sasori, morto em 18 de julho de 2010. Causa mortis: insuficiência respiratória.

                A partir daquele dia eu passei a dormir com os fantasmas todos os dias. Com os seus fantasmas, os fantasmas do nosso passado.

                Eu só preciso ouvir sua voz mais uma vez. Apenas mais uma vez eu quero encostar a cabeça em seu peito e chorar como uma criança abandonada.

                Todos estão lá fora agora, comemorando a felicidade trazida por mais um ano novo. Mas eu continuo sozinho.

                Talvez amanhã eu decida dar um tiro na minha própria cabeça, amarrar uma corda no pescoço ou engolir algum veneno ou pesticida. Não importa o método.

                Eu só sei que tenho que morrer logo, quanto antes melhor.

                Afinal de contas, você odeia esperar.

Soulmate, dry your eye

Alma gêmea, seque seu olho

‘Cause soulmates never die

Porque almas gêmeas nunca morrem