Hidden escrita por jduarte


Capítulo 49
Refugiada


Notas iniciais do capítulo

Bônus!!!



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- Isso é maneiro! – exclamei abrindo e fechando a mão, para tentar eliminar o formigamento.

- Estamos livres? – perguntei.

- Sim. Estão.

- Meninos, vão se deitar um pouco, mas não deixe que ninguém os veja... azuis. Cuidado! – disse beijando o topo da cabeça dos dois e os liberando.

   Quando eles saíram, sentei-me na mesa de King e fiquei balançando as pernas.

- Posso te contar um segredo? – perguntei.

   Ele se aproximou.

- Acho que estou apaixonada. – disse.

   King se iluminou.

- Sério? Ah, que lindo! Que poder ele têm? – perguntou ele.

   Fiquei encabulada enquanto tentava abrir a boca para argumentar que ele não era um mutante.

- Você sabe que não pode se relacionar com um humano, não é? – perguntou novamente, preocupado.

- Sim, mas não consegui evitar... Aconteceu! – defendi-me.

- Ah, meus botões! Diz que isso é besteira!

- Não e, não!

   King parecia resistir ao impulso de bater a cabeça na parede.

- Vocês já se... Você sabe... – ele tentava perguntar, e fazia um biquinho ridículo.

- O que?

- Já se beijaram? – perguntou finalmente irritado.

- Não!

- Ótimo! – exclamou jogando as mãos pro ar.

- Qual é o problema? – perguntei.

- Se você o beijar, pode colocar a vida de ambos em risco. – murmurou se aproximou de mim.

- Isso é mentira!

- Gostaria de fazer um experimento com ele? – perguntou King.

- Não!

- Sua saliva, ou melhor, a nossa saliva, contém um ácido que pode corroer os órgãos vitais do humano.

- Quer dizer que posso matá-lo?

   Ele disse que sim.

   Senti meus olhos realmente ficarem cheios d’água.

- Quer dizer que não temos futuro?

- Não. Sinto muito.

   Assenti tristemente, colocando a cabeça nas mãos, e deixando algumas lágrimas silenciosas escorrerem por meu braço.

- Posso pelo menos ficar aqui até meu rosto passar de balão a uva-passa? – perguntei.

- Claro. Sem problemas. Vou buscar uma água, e já volto.

   Assenti novamente, e desejei, pela primeira vez em minha vida, ser humana.

   Nossa como eu tinha inveja das meninas que o podem beijar. Ele deve ter beijado várias! Várias atiradas que podem enfiar a língua na garganta dele sem que façam o morrer por corrosão de órgãos! Filhas-da-mãe, todas elas!

- Nossa isso tá parecendo uma das peças de Shakespeare. Só que você não morre no final! – disse King tentado me botar para cima.

   Funguei pegando a água, e virando toda na boca.

- Ei, trate de se animar, devem ter muitos garotos mutantes que dão de dez a zero nele.

- Mas... – funguei interrompendo meu longo e filosófico discurso. – Você não entende, não é? Quando não tô com ele, parte da minha alma fica podre, parece não existir. Não quero um dez na minha vida, quero Bernardo.

   King estava pasmo.

- Ele é a única pessoa que sinto que posso contar tudo, e que não vai vazar pelas orelhas. Quero ficar com uma pessoa que me ama, e que eu ame de volta. Meu coração só palpita quando eu o vejo, e não quando eu vejo George Clooney ou Brad Pitt. É por ele que eu levanto todos os dias, e enfrento mais um dia.

- Acho que você ainda não entendeu. Você pode matá-lo, Camila, isso é impossível.

   Suspirei.

- É a mesma coisa que um gato namorar um peixe ou um rato! É a Lei da Sobrevivência. O gato come o rato e o peixe. É impossível!

   Funguei novamente.

- Você conseguiu King. Tirou a única coisa que me importava e que me deixava feliz.

- Não fui eu. Foi você. Ninguém mandou você se apaixonar pelo que não pode ter! – exclamou King furioso.

   Limpei as lágrimas que caiam em minha boca, e beijei sua bochecha.

- Vou indo.

- Como? – perguntou segurando meu braço.

- Esqueceu que eu sou uma droga de um mutante? – rebati saindo dali, e indo procurar Bernardo.

   No meio do caminho, encontrei Norbert.

- Oi! O que faz aqui? – perguntou ele.

- Gostaria de falar com Bernardo. – respondi fria e seca.

   Ele se assustou.

- Ok, pedra, eu te levo até ele, quando ele voltar da reunião. – disse Norb.

- Não, preciso falar com ele agora! – exclamei.

- Sinto muito, não tenho autorização para interromper uma reunião, Camila.

   Revirei os olhos e uma idéia pintou em minha cabeça.

- Onde é o quarto dele? – perguntei.

- Sério? Não posso!

- Por favor. Só vou deixar um pequeno bilhete! – implorei.

- Camila...

- Se quiser fico até de joelhos! – tentei, preparando para abaixar.

   Ele pegou em meu braço, arrastando-me para uma porta.

- Ainda vou perder meu emprego por sua causa! – exclamou baixo, olhando para mim com uma cara assassina.

   Devo pedir desculpas? Não.

- É aqui. Mais alguma coisa que eu tenha que me suicidar? – perguntou ele cruzando os braços, deixando a mão esquerda à mostra, e também um brilho em seu penúltimo dedo chamar minha atenção.

- É casado? – perguntei.

- Sim. Agora, ande logo! – disse ele empurrando-me para dentro do quarto.

   Quando entrei no quarto, o cheiro masculino ainda reinava naquele lugar. O cheiro dele. Decidi vasculhar suas coisas. Acabei pegando uma de suas blusas e sentando na escrivaninha, pegando uma caneta e papel.

   Com grande pesar, comecei a escrever.

   Bem, provavelmente estarei bem longe quando ler isso, mas quero que saiba que sempre estará em meu coração, para onde quer que eu vá. Esteja eu no Sul, ou no Norte, sempre carregarei a lembrança de seu sorriso gravada em minha mente. Saiba que fiz isso por uma questão de vida ou morte. Nunca daríamos certo, e sabe disso. Bem, eu amei saber que nesse tempo que fiquei aqui, tive alguém legal para dividir todo o tipo de memória. Seja ela boa ou ruim. Esse dia estava lembrando-me de como meu coração bateu rápido quando vi seu rosto pela primeira vez. Não vou dizer aquela frase: “Você já está em meu coração”, pois é típica de quem não tem o que dizer. Estou sem tempo, e por isso não quero escrever uma bíblia.

   Acho que tudo o que eu havia para falar já lhe disse, então... acho que é só isso. Descobri uma coisa que me deixou triste, e por isso tive de partir. Isso não é vida para mim. Não sou prisioneira de ninguém e por isso prometi a mim mesma que, quando encontrar Shenid na rua, o farei sofrer tanto, que ele vai implorar para morrer. Mas eu não deveria estar dizendo isso, e sim como você é perfeito. Perfeito para outra, e não para mim. Você não me merece, eu sou muito ruim.

   Te amo demais, meu anjo, mas quero seguir minha vida sem ser um peso para ninguém.

Com amor,

Camila Willis Schmidt

   Devo dizer que, após escrever, deixei algumas lágrimas mancharem o papel sem querer, e quase pensei em refazer, mas percebi que estávamos sem tempo, e que, portanto, iríamos partir logo.

- Acabou? – perguntou Norbert.

- Sim. – respondi saindo, e escondendo a camiseta nas costas.

- Preciso ir cuidar dos novos, então... – disse ele quando estávamos no hall de entrada. A porta estava aberta, e eu contemplei os campos. Olá campo, olá liberdade!

- Ok. Eu vou descansar um pouco – disse eu.

- Ótimo. – Norbert disse antes de sair.

   Andei bem devagar até chegar a meu quarto, e quando entrei, percebi um cheiro estranho no ar. Um cheiro humano.

- Rubens? Lonlye? – perguntei abrindo a porta com certa brutalidade.

- Estou com fome. – disse Lonlye.

- Eu também. Pode fazer aquela sua panqueca para nós? – perguntou meu irmão.

   Sorri. Nenhum dos dois havia percebido que eu tinha chorado.

- Claro. Será bom materializar algo.

   Poucos segundos depois, e as panquecas se encontravam em suas camas.

- Obrigado, mana! – sussurrou Rubens.

- Obrigado, man... Mila. – Lonlye se desconcertou quando foi repetir o que Rubens havia dito.

   Sorri mais uma vez, acariciando seus cabelos.

- Pode me chamar de “mana”, Lonlye. Não tem problema. – disse eu dando uma mordida em sua panqueca.

   Ele riu.

   Deitei em minha cama, e prensei a camiseta contra meu rosto.

- Partimos às onze. – avisei, mas sabia que era inútil querer respostas de pessoas com a boca empanturradas de panqueca.

   Fui até o banheiro apertado e pequeno e vesti a blusa que havia pegado de Bernardo, e vesti uma calça de plush preta que tinha ali.

- Mila, nós vamos dormir um pouco, tudo bem? – perguntou Rubens.

- Tá. – respondi.

   Prendi o cabelo com um elástico que achei no chão, e voltei ao quarto. Ambos dormiam em cima do prato. Tirei a louça e a coloquei no chão, deixando as camas mais livres.

   Deite-me novamente na cama, e fechei os olhos.


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Notas finais do capítulo

Continua????