Broken - do Outro Lado do Espelho escrita por Skyloft


Capítulo 1
Capitulo único.


Notas iniciais do capítulo

Ler ao som de Broken - Seether ou The Little things give you away - Linkin Park



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           Naquela noite, enquanto meus pais estavam fora,por acidente eu

explodi minha casa. O gás ligado, esquecido por mim, fez tudo ir pelos ares,

incluindo a mim. O cigarro foi o detonador de toda a bomba, e, as chamas,

foram os monstros que comeram meu corpo e alma. Não... talvez apenas o

corpo, minha alma ainda está viva, afinal, se não estivesse, por quê eu

estaria aqui?

                                   Broken - Do Outro Lado do Espelho.

            Os carros passavam barulhentos pela rua, sem nunca cessarem. Pessoas

andavam apressadamente pela calçada, algumas sem destino, outras em direção

à morte. Contudo, ele continuava ali parado, olhando para a vitrine da loja

de roupas. Não que ele estivesse interessado nelas, ele apenas apreciava

observar seu reflexo no vidro. Os cabelos pretos, a pele mais branca que o

normal. Seus olhos estavam inchados e havia ganhado olheiras profundas. Não

parecia com aquele Gerard que eu conhecia.

            Parado logo atrás dele, estava eu. Um ser baixo, cabelos também

pretos e algumas tatuagens, olhando para ele, esperando que se virasse e,

talvez, percebesse minha presença, mesmo sabendo que era impossível já que

eu estava morto a algumas semanas.

            Não entendia o que acontecera. Minha casa foi queimada comigo

dentro, como eu podia estar ali? Eu sei que não havia sido um sonho. A dor

do fogo consumindo minha pele fora real de mais, meus gritos de dor enquanto

ia, pouco a pouco, perdendo a consciência por inalar a fumaça negra das

chamas, foram reais de mais. Pareceram anos aqueles minutos de tortura, como

se aquilo fosse o inferno, mas aquele tempo era o suficiente para que eu

lembrasse de toda a minha vida. Dizem que antes da morte, um filme sobre nós

mesmos passa em nossa mente, e isso é realmente a verdade e, quando vi este

filme, desejei não morrer. Desejei com todas as minhas forças continuar

vivo, porque queria continuar ao lado dele, o centro de minhas memórias.

            Sou como uma assombração, um fantasma, vagando solitário por um

mundo cheio de pessoas para as quais eu sou invisível. Mesmo que eu sorria,

elas não percebem. Mesmo que eu chore, elas não ouvem meus soluços. Mesmo

que eu grite com toda a minha força, elas não me dão atenção.

            Não ligo tanto para elas, penso mais nele, sozinho nesse mundo

solitário, sem minha presença para ajuda-lo. Por isso, desde que me dei

conta estar nesse mundo vazio, eu continuo o seguindo, para todo lugar.

            Olho para seu rosto: os olhos brilhantes encheram-se de lágrimas

mais uma vez. Desde que me vera naquele caixão, ficou assim, todo choroso.

Esta cena sempre se repete, pelo menos umas 5 vezes ao dia.

            -Frank... - ouço meu nome ser sussurrado por seus lábios vermelhos e

finos. Sua voz chorosa e melancólica me fazendo querer toca-lo. Abracei suas

costas, deitando minha cabeça em suas costas. Por mais que eu sentisse seu

calor, ele não sentia minha presença. Mas eu não me importo, portanto que

estejamos juntos.

            Nosso abraço é interrompido por ele, que resolve se mexer dali.

Limpa as lágrimas não percebidas por ninguém além de mim, na manga de sua

blusa e vira-se, começando a caminhar. Seus pés o guiam para casa, onde sua

família parecia preocupar-se com seu estado.

            Ao entrar, depara-se com sua mãe que, notando a triste expressão do

filho, lhe da um abraço confortante. Não muito tempo depois, ele se dirige

ao banheiro e eu, continuo o seguindo.

            Sento-me no vazo enquanto ele tira sua roupa e entra em baixo do

chuveiro. Presto atenção em cada detalhe seu, mesmo que não seja a primeira

vez que vejo assim. O local enchesse de vapor e logo o espelho torna-se

fosco, não mostrando o reflexo de nada em sua superfície. Pouco tempo

depois, Gerard já havia terminado seu banho.

            Assim como ele fez em frente a vitrine da loja, ele fazia em frente

ao espelho. Colocou uma de suas mãos molhadas na superfície do objeto,

provavelmente com a intenção de limpa-lo, porém não o fez, apenas deixou sua

mão ali parada. Como que por instinto, uma de minhas mãos colocou-se por

sobre a sua e, quando fui tira-la, por acidente esbarrei no espelho,

desembassando uma pequena parte sua. Gerard nem notou o fato. Estava ocupado

o bastante pensando, porém eu havia descoberto algo novo.

            Eu queria me comunicar com ele. Sentia essa vontade desde que me

havia descoberto morto, mas nunca achei um modo. Tentava mexer objetos e

derruba-los mas por algum motivo, eles não se moviam. Mesmo que eu

conseguisse tocar e sentir, até mesmo mover os cabelos suaves de Gerard, o

mesmo não acontecia com objetos. Tentar escrever uma carta com uma caneta

então, era impossível. Contudo, eu nunca havia pensado em escrever no

espelho, usando o vapor a meu favor. Aquele era o momento, era minha chance

de dizer que eu estava ali, que sempre estive durante todo o tempo.

            Toquei o espelho frio, e deslizei meus dedos suavemente, formando

letras. No primeiro momento Gerard não notou, mas ao ver aquilo sofreu tanto

choque que seus olhos arregalaram-se assustados e seu primeiro reflexo foi

se afastar em direção a parede, onde se encostou e ficou observando,

atentamente.

            -"Não tenha medo" - escrevi no inicio - "Sou eu, seu eterno Frank."

            Ele parecia não acreditar no que via. Balançou a cabeça, esfregou os

olhos e então, notando que enxergava direito, pareceu perder o receio e

voltou a se aproximar do espelho.

            -F-Frank? - Sua voz soou confusa - É você?

            -"Sim".

            Seus olhos arregalaram-se novamente. O que surgiu em seguida foi um

sorriso doce em seus lábios.

            -Frank! Estou com saudades, onde você está?

            -"Bem aqui, ao seu lado. Mas você parece não poder me ver".

            Gerard balançou a cabeça de um lado para o outro, me procurando. Foi

inútil, mesmo que seus olhos pousassem varias vezes sobre mim, eles nunca

conseguiam me achar. Logo eles encheram-se de lágrimas novamente.

            -Droga! Por que não consigo te ver?!

            -"Porque estou morto".

            O espaço no espelho já começava a acabar, mas como uma luz, uma

idéia surgiu em minha mente. Se eu estava morto mas continuava ali, talvez

se ele morresse, poderíamos nos encontrar. Novamente meus dedos formaram uma

frase.

            -"Venha até mim. Vamos ficar juntos pela eternidade."

            Ele mais uma vez surpreendeu-se.

            -Como? - Perguntou decidido.

            -"... pule do lugar mais alto que conseguir pensar. Voe pra mim".

            Estava acabado o espaço no espelho, e, junto com ele, algo a mais

estava se acabando: toda aquela tortura.

            Gerard saiu do banheiro, vestiu sua roupa mais bonita,pegou um papel

e uma caneta. Escreveu uma carta para a família, dizendo que os amava, mas

que estava indo ser feliz com aquele que havia partido. A dobrou  e deixou

em cima da cama. Saiu de casa após abraçar a todos, que pareceram confusos.

Caminhamos pela rua, em direção a um velho prédio que já havia sido

abandonado a alguns anos. Ele era bem alto, uns quinze andares. Quinze

andares que seriam o ultimo obstáculo para nosso encontro. Todas as escadas

que subimos pareciam intermináveis, como se quisessem nos atrasar, porém, nada

conseguiria parar Gerard agora que ele estava decidido a se encontrar

comigo.

            O terraço era grande. Gerard andou apressadamente por ele e parou no

para-peito, olhando para baixo. Pareceu sentir um certo medo. Eu o abracei.

Gostaria de empurra-lo, para que tudo fosse mais rápido, mas não tinha como.

Senti o vento soprar bagunçando meu cabelo e o dele. Me posicionei ao seu

lado e ajeitei uma mecha de cabelo por entre suas orelhas. Ele riu, como se

soubesse que era eu ali. Foi aí que o tempo pareceu parar: de sua boca

saíram sussurros, seus braços esticaram-se, suas pernas se movimentaram. Uma

pomba voou por ali no instante em que ele pulou. Em questão de segundos, ele

estava morto, pronto para me encontrar.

            Foi o que pensei. Porém... ele nunca chegou.

            “-Eu te amo...”

            Li certa vez que quando uma pessoa morre e outra entra em depressão,

pode ser que esta pessoa morta continue no mundo dos vivos, espreitando

aquele que fora deixado. Por causa deste fantasma, o depressivo acaba

tentando se matar. Quando falha, tenta de novo, e falhando novamente, acaba

enlouquecendo. Porém, se o fantasma se vai, a pessoa se recupera, entendendo

a situação e a superando, continuando a viver. Creio que sou um desses

fantasmas, que sugam a vida daquele que ama. Foi minha culpa. Tudo havia

sido minha culpa, desde minha morte até a morte de Gerard. Talvez eu seja

maligno, por ter-lhe dado aquela idéia ou talvez eu apenas queria realmente

que ficássemos juntos. Mas de uma coisa eu tenho certeza: estou destinado a

continuar vendo sem ser visto porque desde o começo minha alma não tinha um

lugar para ir além de aqui, o purgatório.


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Notas finais do capítulo

;-;