Capítulo dez - Eu me odeio

"Os sonhos são ilustrações do livro

que sua alma está escrevendo sobre você."

(Marsha Norman)

            "Estava andando pela rua a passos lentos e meu semblante era de alegria. Algo que eu não estava acostumada  a fazer no momento. Passei pela avenida onde tinha a ponte.

            Meu pensamento pousou em uma casa, a do Matthew. Naquele momento ele apareceu fazendo meu coração martelar de um modo frenético e descontrolável dentro do meu peito. Sorriu ao me ver e minhas pernas bambearam com este ato. Os gestos a seguir foram vistos em câmera lenta, ele estava vindo em minha direção.

            Seu sorriso mudou ao ver que estavamos próximos de um modo perigoso. Suas mãos tocaram o meu rosto e nossas respirações estavam se mesclando quando os olhares se encontraram. Se afastamos ao ouvirmos sussurros, eram paparazzis.

            Não fiquei acanhada e sim indiferente ao notar os flashes. Uma música começou a ser tocada, "Missão impossível" para ser mais exata. Contudo as pessoas começaram a correr se afastando e juntamente com elas o cenário, sobrando apenas a escuridão..."

Acordei assustada,  mas a música ainda dava para ser ouvida. Ao olhar para o despertador notei que ainda eram 5:30. Que idiota me ligaria uma hora dessas?

- Alô. Respondi meio grogue pelo sono.           

- Alô, o que você faz acordada as 6:30 da manhã? Perguntou me assustando.

- Raissa, aqui são 5:30 ainda. Para que me acordou?

            Claro, a minha doce amiga ainda não se acostumou com o fuso horário. O casal optou por Fernando de Noronha ao escolher a viagem de lua de mel.

- Feliz aniversário.

            Estava berrando do outro lado do celular, agora mesmo que eu não conseguirei dormir.

- Obrigada, Raissa.

- De nada.

            Era a voz do meu irmão que estava do outro lado da linha.

- Acordou com o grito da Raissa, maninho?

- É, essa gralha não parava de gritar.

            Deu para ouvir a censura que ela deu no meu irmão ao perceber que estavam falando dela me fazendo rir.

- Feliz aniversário. Tenha um bom dia, Tchau.

            Escutei um "Não desliga, amorzinho" antes do telefone ficar mudo. Meu irmão sempre fora direto em suas ações não se importando com que os outros pensassem dele ou de seus atos. Era um pouco diferente de mim já que sempre se deu bem na escola e fazia amizades frequentemente.

            Vesti meu uniforme e fui em direção a cozinha aonde minha mãe estava acordada preparando o café.

- Filha?

- Sim mãe, sou eu. Disse ao bocejar.

- Feliz aniversário, meu bebê.

            Correu para me abraçar e me senti protegida novamente, era uma mulher linda com os seus olhos verdes e cabelos lisos aloirados, tão diferente de mim que tinha um traço tão normal.

- Obrigada.

            Minha mãe botou uma venda em meu olhos e pediu para não olhar antes de sua permissão. Alguns minutos se passaram e eu pude observar a surpresa, na minha frente havia um bolo de chocolate. Fiquei feliz ao notar o quão dificil e trabalhoso deveria ser ter feito isto para mim, fazia uns cinco anos  que eu não pude ter uma festa em minha comemoração mesmo sendo algo simples.

- Filha, desculpa não poder ter feito algo assim para você antes.

- Mãe, muito obrigado. Disse com um brilho nos olhos.

- Tudo para ver minha pequena feliz.

            Começou a chorar ao perceber a minha felicidade que a tanto não via. Comemos o bolo e rimos juntas ao lembrar das coisas que faziamos quando eu era pequena. Parti pensando em tudo que perdi sendo pessimista e que tudo o que eu precisava eu já tenho, a minha família.

 (...)

         Faltavam uma hora quando cheguei a escola que estava deserta já que nem os professores haviam chegado. Fui em direção a biblioteca onde uma mulher carrancuda estava no balcão.

- Senhora... Começei.

- Não da para atender agora, não está vendo que estou oculpada?

            Escorei-me no balcão para ver o que estava fazendo, além de mastigar chicletes a mulher estava conversando com um homem pelo orkut. Bela desculpa para dizer que estava oculpada.

- Da para largar desse computador e me entregar as chaves?

            Perguntei de maneira rude para mostrar que eu não estava orgulhosa de seu trabalho.

- Pega ai. Disse, ao pegar as chaves.

- Obrigada.

            Realmente eu não tenho sorte, devem ter percebido que todos os funcionários adoram me irritar - deve ser carma -  peguei o livro "fortaleza digital" e fui em direção a mesa.

            Faltavam 15 minutos para as aulas começarem quando um homem entrou na biblioteca chamando a atenção das universitários e fazendo me lembrar do sonho, mas quando ele estava indo em minha direção todas as mulheres começaram a me fuzilar com os olhos.

- Oi, feliz aniversário. Disse me abraçando.

- E-eu disse para você não me abraçar, Matthew. Estava corada.

- Por favor, só hoje que é seu aniversário.

            Não disse palavra alguma e fui ao seu encontro lhe abraçando, olhei em direção ao balcão e percebi que até a bibliotecária estava olhando de mal agrado para mim. Sentou-se ao meu lado e meu braço foi de encontro ao seu fazendo com que as lembranças do sonho voltassem com maior intensidade onde eu pudesse ouvir o som do meu coração batendo rapidamente pelo nervosismo.

            Senti algo em meu colo, mas não parei para ver já que estava entretida em ler o livro. Estava na parte em que Susan contava ao David sobre o código de Cesár. Senti algo em meu ombro, Matthew estava me cutucando.

- O que foi? Perguntei mal humorada.

- Se não desfazer essa cara, não falarei contigo.

            Dei um meio sorriso ao perceber que o sinal havia batido, mas ao sair da cadeira Matthew me puxou fazendo com que nossos corpos se chocassem e ao perceber que estava para cair me abraçou.

- Manu eu... é seu presente. Começou, ao pegar o objeto que havia caido no chão ao me levantar do lugar onde estava.

            Peguei a pequena caixa retangular que estava em sua mão. Jurei que Matthew ia me pedir em casamento quando ele se abaixou, mas ao se levantar pediu desculpas por estar amarrando o cardarço.

            Abri a caixinha e nele continha uma pulseira que parecia ser de ouro branco, peguei o objeto com cuidado e um sorriso escapou de meu lábios.

- Obrigado Matthew, é... muito linda.

- Não há de que, faria tudo de novo só para ver você feliz.

            Guardei a pulseira na caixa novamente e botei na mochila.

- Não vai usar Manu?

- Na hora do recreio. Disse rapidamente e corri para a minha sala, deixando-o plantando com um semblante confuso.

(...)

            A aula de inglês havia começado e tive que tirar os materiais, mas ao notar a caixa que continha a pulseira a deixei em cima da mesa para pegar o caderno. A loira da frente notou o presente e o olhou curiosa.

- Ganhou do seu namorado Manu?

- Capaz que ela iria ganhar presente de algum namorado Bianca, deve ter sido a mãe dela.

            Fabio respondeu por mim de forma sarcastica, deixando-me irritada.

- Ganhei hoje de um amigo por causa do meu aniversário.

            Por que fui abrir a boca? Me diz, por quê?

- A Manu está de aniversário galera. Confirmou a loira aos berros.

            Todo mundo começou a cantar a famosa música, mas a professora os fez repetir em uma versão americana me fazendo sentir mais constrangida. Depois de um grande tempo o sinal pode ser ouvido e todos foram para o recreio de mochila pois a próxima aula seria de educação fisica.

            Fui em direção a biblioteca, mas antes teria que passar no refeitório onde os alunos da minha classe começaram a jogar comida em mim, incluindo o resto dos estudantes que também participaram mesmo sem motivo.

            Meu corpo ficou todo melecado fazendo com que eu fosse ao banheiro. Ao me limpar começei a por a pulseira, mas de alguma forma ela quebrou. Sai do toalete as pressas disposta a concerta-lo de alguma forma,  como eu sou sortuda Matthew apareceu na porta e ao ver o objeto quebrado em minhas mãos seu sorriso mudou. Definitivamente, eu me odeio.