This Christmas escrita por Venus Noir


Capítulo 1
Único


Notas iniciais do capítulo

Taí, gents :D
Boa leitura.



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  Vento. Meu cabelo não parava de obstruir minha visão, mas eu não tinha tempo de afastá-lo dos olhos. Frio. A roupa do corpo era tudo o que eu tinha. Medo. Medo do que poderia acontecer se eu parasse de correr. Tristeza. Eu estava sozinha, completamente sem ninguém. Para sempre sozinha.

  E eu corria. Se eu parasse, talvez nem estivesse mais me lembrando de tudo isso. Minha vida dependia de minhas pernas, e minhas pernas não agüentavam mais. Eu precisava parar por mim mesma, antes que minhas pernas fraquejassem e fizessem isso por mim.

  O motivo de tudo isso fora tão estúpido, mas tão necessário. Se eu contasse que era dona de uma importante grife de jóias brasileira, vocês acreditariam? É, nem eu acreditaria em mim. Mas é tudo verdade. Meu império era avaliado em 1 bilhão de dólares, havia lojas da minha grife em diversos países do mundo, todas as celebridades de alto nível e até mesmo a nobreza inglesa faziam parte da minha clientela. Eu tinha o mundo nas mãos. Uma conta bancária invejável e as melhores coisas do mundo.

  Mesmo assim não eram tudo flores. O meio pelo qual conseguia os materiais para a venda era completamente antiético, em pleno século vinte e um. Como eu poderia imaginar? Estava completamente cega, só tinha olhos para o dinheiro. Grande parte das jóias eram valiosos diamantes de sangue vindos diretamente do continente africano, por intermédio de uma frota de escravos. Não disse que era errado? Mas eu nem ligava. Só me preocupei de verdade ao ver o que estava fazendo nesse exato momento. Fugindo da polícia.

  Eu não podia contar com ajuda de ninguém. Eu não tinha ninguém. Depois que meu negócio estourou, pouco a pouco minha família começou a me evitar, a perder o contato comigo. Até que me esqueceram de vez. Pedir ajuda nessa situação não contava como uma opção. Sabia que a resposta seria um não – se houvesse resposta. Eu sentia falta da minha família, não sabem como me fazia mal.

  Aquele dia era dia 24 de dezembro, o dia em que as famílias se reúnem para celebrar o Natal, ceiar, trocar presentes e demonstrarem o amor que sentem uns pelos outros. Se eu tivesse alguém com quem fazer isso, podem apostar que eu faria. Se eu pudesse parar e pensar, claro. Tudo bem, eu poderia ter apenas respondido a um processo e fechar o meu negócio, mas não... eu tive que piorar tudo! Fui me meter a roubar e formar uma quadrilha para sustentar a rede de lojas, e todos os meus problemas aumentaram. Naquela época eu estava na minha casa de praia na Flórida, quando a polícia bateu à minha porta. O que qualquer pessoa desesperada faz nessa hora? É claro que não abre a porta. Foge para o lugar mais longe possível. Foi o que eu fiz.

  Um lugar muito longe, praticamente do outro lado do mundo. Tá, estou exagerando.

  Seoul, a capital da Coréia do Sul, foi a primeira coisa que pensei. É claro que uma ocidental em terras coreanas seria como um gato em meio a um bando de cachorros. Totalmente indefeso. Mas só pensei na burrada que fiz depois que a fiz. “Paciência”, pensei. Que paciência que nada! A notícia já tinha se espalhado pelos jornais do mundo e em todos os sites de fofoca podia-se ver a minha foto. Eu estava numa fria. Literalmente. Estando no hemisfério norte, em pleno mês de dezembro, o frio era inevitável. Frio e neve, para completar a minha decadência. Estando com simples sapatos de tecido, era a mesma sensação de estar descalça. Meus pés iam cair, com certeza, deviam estar roxos e congelados. A roupa laranja de presidiária era tudo o que eu tinha, tive que disfarçá-la com um cobertor de lã. Minhas madeixas louras voavam enquanto eu corria. Durante minha curta estadia na prisão, não freqüentei um bom cabeleireiro. Meu cabelo cresceu tanto que quase estava na altura da minha cintura, obviamente estava com as pontas ressecadas e um tanto quanto desarrumado.

  Mas, chega de falar da minha aparência deplorável. Ok, não sei como lembrei de tudo isso naquele momento, mas dizem que lembramos dos acontecimentos de nossa vida minutos antes da morte. É como um flashback. Portanto pensei que ia morrer, claro, começaram a disparar tiros, não sei como nenhum me acertou. Para verem a gravidade da situação, toda a polícia sul-coreana com o auxílio de militares internacionais corriam atrás de mim. Literalmente, o BOPE sul-coreano. Carros, tanques, helicópteros, eu me sentia uma assassina. Na verdade, eu era. A assassina da minha própria existência.

  Como eu amaldiçoava Seoul por ter prédio, prédio, prédio, um do lado do outro! Se fosse no Brasil, provavelmente uma favela e suas ruelas estreitas me esconderiam e salvariam minha vida temporariamente. Mas é só falar que pá! Algo acontece a salva a sua vida. E não foi um beco entre um restaurante e uma loja de calçados? Para me ajudar mais ainda, olhei rapidamente para trás e vi um bolo de policiais se atrapalhando enquanto corriam. Tropeçavam uns nos outros, foi divertido vê-los caindo e ficando para trás. Depois que adentrei o beco, vi que haviam duas portas que davam acesso aos respectivos estabelecimentos. A porta para a loja de calçados estava trancada e protegida por um portão de grade. A porta para o restaurante não tinha grade, e experimentei girar sua maçaneta. Estava aberta. Vi minha salvação por detrás daquela porta, e tudo o que fiz foi entrar e fechar a porta o mais rápido possível, sem fazer muito barulho. Sentei-me no chão, deslizando o corpo encostado na porta. Passei as mãos pelo rosto e pelos cabelos. Mesmo com um frio abaixo de zero grau, eu suava e minhas maçãs do rosto estavam ardentes, eu podia sentir. Só então me dei conta de onde eu estava, precisamente.

  Olhei ao meu redor. Balcões, mesas, tábuas, talheres, panelas pelas paredes. Facões. Engoli em seco ao ver o reflexo da lua – cuja luz atravessava as janelas do local - em suas lâminas. Deviam ser afiadas. Então liguei os pontos e raciocinei. Era a cozinha do restaurante. Suspirei de alívio ao ver porções de vegetais e diversas massas cruas em alguns balcões. Devia haver carne nos refrigeradores. A tentação de pegar alguma coisa para degustar era grande. Mas eu pensei que, estando enrolada até o pescoço, ser acusada ainda de ladra de comida seria o fim da picada. Só de estar a salvo da polícia já me deixava tranqüila.

  Minha tranqüilidade não durou muito tempo. Voltando á realidade, eu estava na cozinha de um restaurante, não na minha casa ou na casa de algum conhecido. Eu era uma foragida me escondendo em um estabelecimento público, provavelmente temida pela população e por qualquer indivíduo que tivesse acesso às notícias do mundo. Foi aí que vi uma luz se acender em outra sala, mais adiante, pela porta da cozinha. Fiquei com medo de ser o dono do restaurante ou algum funcionário que me reconhecesse e quisesse me denunciar por invasão e me entregar nos braços da polícia. É, aí sim eu achava que tudo estava perdido. Mas não, não estava. Tenho uma sorte muito grande. Uma senhora idosa adentrara a cozinha, acendera a luz e seus pequenos olhos se fixaram em mim. Tinha os cabelos muito brancos, a pele enrugada devido à idade, era baixinha e vestia um quimono rosa-melancia com detalhes em branco. Parecia ser uma senhora conservadora. Ela permaneceu em silêncio por um tempo, certamente percebeu que eu não era coreana, muito menos oriental. Talvez estivesse muda por não saber como falar comigo. Mas, sendo uma pessoa muito culta – e isso eu era – em meus bons tempos tive aulas de inglês, alemão, mandarim básico e coreano básico. Eu não era totalmente incomunicável.

- Eu... – comecei, em coreano – Eu preciso de ajuda.

  A senhora me encarou, depois deu uma risada. Foi pavoroso, diante daquele momento, eu não havia escutado um único som que fosse sinônimo de felicidade. Mas ela me olhou com ternura, estendendo a pequena mão a mim. Com sua ajuda me levantei, tirando o cobertor de lã dos ombros.

- Você está com problemas, não é mesmo? – a senhora falou, em mandarim.

  Então ela não era coreana... mas não me prejudicava, continuei a me comunicar com ela, em mandarim. Tive que ser sincera, inventar uma história acabaria ainda mais comigo. Contei de tudo, desde o auge até o apogeu dos meus negócios. Contei como eu fui parar da fama para a lama. E ela me ouviu. Me ouviu atentamente sem me repreender ou me expulsar. Foi tão bom falar com alguém que me compreendesse. Alguém com um coração bom, que visse que o que eu precisava não era uma lição de moral, mas sim, um pouco de carinho e conforto. A senhora me fez tirar aquela roupa laranja e me deu roupas novas para usar. Assim como o dela, um quimono bem conservador, azul-turquesa com flores azul-petróleo estampadas. Foi um tanto quanto difícil vestir aquilo, mas o tecido e o revestimento eram tão bons, me mantinham tão quentinha. Viu que eu estava fraca e que há muitos dias não comia. Me serviu um chá quente e uma generosa tigela de yakisoba cheio de frango, carne de vaca, vegetais e um molho grosso que dava sustância à refeição. Meus olhos chegaram a lacrimejar ao ver aquela comida sendo oferecida para mim. Eu não sabia manusear os hashis com a mesma habilidade que os clientes do restaurante, obviamente, então a senhora me forneceu talheres. E comi. Comi como se fosse a última refeição da minha vida. E como fiquei satisfeita!

  Implorei para lavar a louça e organizar as coisas que haviam sido usadas no preparo do yakisoba. Eu não deixaria a minha anfitriã fazer o serviço pesado.

- Obrigada. – agradeci, sendo o mais sincera possível – Além de me acolher aqui, tem alguma coisa que eu possa fazer para retribuir a sua gentileza?

- Bem... – ela pensou, levando a mão ao queixo e olhando para o ar – Receber um pouco de ajuda para preparar a ceia de Natal seria bom. – ela sorriu, divertida.

- Faço qualquer coisa. Não sou muito experiente na cozinha, mas diga o que eu faço e eu farei. – respondi, propondo a mim mesma ser obediente àquele anjo que havia salvado minha vida.

- Só tem que ter disposição para preparar muita comida. Meu filho inventou de trazer catorze amigos para a ceia desse Natal!

  Espera. Vamos rever os fatos, porque seria coincidência demais ou sorte demais para isso acontecer. Eu estava em Seoul, num restaurante chinês, cuja dona era chinesa e seu filho tinha catorze amigos. Total, quinze. Sendo que todos não seriam chineses – supondo – e pelo menos um deles era, eu precisava vê-los para crer. Era estranho e animador, ao mesmo tempo.

- Está certo. – assenti – Mas... escute, pode me dizer o nome do seu filho? Não se preocupe, eu não vou fazê-lo de refém nem nada...

  Ela riu, e falou.

- Ah menina, você está realmente enrolada. Só vamos manter esse segredinho entre nós, os meninos podem se assustar. – sugeriu – Os amigos dele chamam-no de Hankyung, mas seu nome mesmo é Geng. Han Geng.

  Mesmo estando alimentada e aquecida, senti as pernas fraquejarem e um súbito desejo de gritar. Diante de tudo o que eu estava passando, eu ia comemorar a véspera do Natal fazendo uma ceia para os integrantes do Super Junior? Eu os conhecia, e era muito fã deles, mas isso era a última coisa que eu esperava que aconteceria com uma pessoa como eu. Estar tão perto assim deles chegava a me assustar, mais que a sensação de ser uma foragida.

  Foi o que me motivou a cozinhar feito uma louca, dar o melhor de mim para fazer dos pratos o mais saborosos possível, sem um único defeito. Se eu já tinha feito tantas coisas erradas na vida, pelo menos fazer um jantar para os rapazes seria minha boa ação do Natal. Ajudei a mãe de Han Geng a fazer uma ceia para dezessete pessoas. Sim, dezessete. A senhora insistiu que eu passasse a noite com eles, visto que eu estava sozinha e desprotegida. Foi a primeira vez que eu senti que viveria um momento em família. Desde que meus familiares começaram a se afastar de mim, passei a comemorar essas datas festivas sozinha. E depois de ter perdido tudo, passei por muitas dificuldades, inclusive fome. Eu era apenas uma menina sem ceia de Natal. Uma coisa tão banal, mas que naquela hora, significava muito para mim.

  Assim que toda aquela comida ficou pronta, a senhora pediu que eu ajudasse a levar os pratos para a casa dela – que ficava no andar de cima do restaurante. Foi de lá que ouvi muitas vozes masculinas e algum movimento de pés caminhando. À medida que subia os degraus, meu coração disparava. Eu já havia me esquecido da minha condição. Eu só queria vivenciar aquele momento, me deleitar com cada pequeno detalhe visto naquela noite maravilhosa. Que ironia, há poucas horas era o pior dia da minha vida, e naquele momento era o melhor dia da minha vida.

  Abri a porta, e quase caí para trás, levando a pobre mãe de Han Geng junto. Os quinze estavam lá. Os quinze. Vi um por um, como se não acreditasse que aquilo era possível. Tive que continuar a andar, afinal, eu tinha dois pratos quentes nas mãos, precisava soltá-los. E todos olharam para mim. Que vergonha gigante! Eu queria desaparecer, virar uma mosquinha. Mas continuei, fui até a mesa e soltei um prato de arroz bem branco e uma enorme tigela de dokbokki com ramen. Para uma cozinheira chinesa, a mãe de Han Geng fazia ótimos pratos coreanos. Mas também foram dispostos na mesa pratos de frango xadrez e rolinhos primavera. Enquanto arrumava os pratos, os hashis e os copos, ouvi cochichos, vindos dos rapazes. Obviamente, se perguntando sobre mim. Uma estranha na ceia de Natal deles.

- Desde quando as funcionárias ficaram tão... loiras?

- Mas você viu o tom de pele dessa garota? Parece que toma sol!

- Ela não deve ser daqui vejam que ela tem olhos azuis e cabelos louros naturais.

  Falem mal, mas falem de mim. Sempre foi o meu lema. Mas naquela hora, me deu vontade de abrir a boca e me pronunciar. Qual o problema de eu ser loira de olhos azuis?! Muito mais sedutor que as garotas daqui, todas iguais, com o mesmo tom de pele, mesma cara e mesmo cabelo.

- Desculpem, oppas, mas não seria melhor falar na minha cara?

  Me encararam. Todos. Se entreolharam. Até que Han Geng decidiu se aproximar de mim e da mãe e começou a tirar satisfações.

- Para começo de conversa, quem é você?

  Eu não sabia o que responder. Eu sabia como responder, mas não sabia o quê. Por sorte, fui salva pela imaginação fértil de minha protetora.

- Ela é uma estudante estrangeira que está passando necessidade. Vamos, meu filho, ela só vai jantar e depois vai embora. Não é, querida?

- É. – concordei, sem hesitar – Eu não vou incomodar.

  Um silêncio constrangedor se formou novamente. E me assustei imensamente com um berro dado por DongHae.

- Ai que divertido! Uma ocidental conosco! Diga, de onde você é?

- Eu... eu... – era melhor eu ser sincera, disse a verdade – Minha cidade natal é no Brasil... mas eu estava morando há pouco tempo nos Estados Unidos.

- Brasil? Que legal! É realmente longe daqui... porque você escolheu passar o Natal nesse frio ao invés de passar num calor gostoso? Que eu saiba, é verão nessa época do ano, no hemisfério sul...

  Na verdade eu não tinha escolhido, era minha única opção.

- Eu queria uma experiência diferente. – sorri torto.

- Qual o seu nome? Você parece tão legal! Vai sentar ao meu lado na mesa, já decidi isso. – Zhou Mi se aproximou correndo de mim.

  Que sonho! O próprio Mi em pessoa me convidando para sentar ao seu lado? Agora eu poderia morrer feliz, nem me importava mais com nada. Ele gostou de mim. Ele gostou de mim!

- Ah... eu, eu, eu... afinal, qual o meu nome mesmo?! – tremi e gaguejei enquanto ele segurava minha mão.

- Que bonitinho! Está envergonhada! Você sabe quem somos, não é? – perguntou.

- Como poderia não saber, Mi? – ele se surpreendeu ao ouvir seu nome sem nem mesmo ter se apresentado a mim – Está sendo o momento mais feliz da minha vida.

  Subitamente me atirei nele. O abracei, como se o conhecesse há tempos. Senti que ele retribuiu o abraço, apesar de um pouco receoso.

- Então... seu nome?

- Eu me chamo Hannah.

- Ai que engraçado! Dá para formar uma dupla com o Geng! Hannah e Hannie! – riu escandalosamente, mostrando aquele sorriso lindo dele.

- Bom, no meu país, chamariam isso de dupla sertaneja...

- Hum, o que é isso?

- Não tente entender. Nem eu entendo como isso faz sucesso. Agora vamos comer, eu não tive todo esse trabalho para a comida esfriar!

  Todos me olharam, depois olharam para os pratos.

- Você fez isso sozinha? – KyuHyun mexia em seu prato, como se analisasse a louça.

- Óbvio que não! Eu ajudei a mãe do Han Geng, mas tive um trabalhão. Podem comer, acho que fiz direitinho.

  Todos nos sentamos, nos ajeitando em nossos devidos lugares. Nossa atenção foi chamada pela minha anfitriã.

- Vamos agradecer por tudo o que temos, antes de cair de boca.

- Mamãe! Que palavreado é esse? – Han Geng repreendeu a mãe.

  Eu ri. Parecia um adolescente com vergonha da mãe.

- Mas é verdade! Está certo. SiWon, querido, quer começar?

- Claro, noona. – levantou-se – Vamos agradecer a Deus por tudo o que temos, tudo o que fazemos e por tudo que Ele nos dá.

  Iniciou uma reza, com os olhos fechados. Todos acompanhavam, enquanto eu, de olhos abertos, analisava a fisionomia de cada um à mesa. LeeTeuk, HeeChul, Han Geng, YeSung, Kang-In, SungMin, ShinDong, DongHae, EunHyuk, SiWon, RyeoWook, KiBum, KyuHyun, Zhou Mi e Henry. Todos tão reais, tão simplesmente perto de mim, qualquer fã se mataria para estar no meu lugar. E eu me senti não à vontade ali, que era como se eu sempre tivesse convivido com eles. Me faziam sentir alguém querida, alguém amada. Depois dos agradecimentos, todos começaram a comer. Faziam perguntas o tempo todo, entre uma porção de comida e outra, entre um gole e uma mordida. Eu as respondia, na medida do possível. Sendo guiada pelos olhares atentos da mãe de Han Geng, eu sabia o que eu podia ou não falar.

  Após a comida, serviram champagne e vinho tinto. Algo muito perigoso para uma pessoa como eu, já que eu gostava de vinho nas ocasiões especiais. Mas é certo quando dizem que o álcool leva as pessoas a falarem mais do que deviam. Esta tentação eu não consegui resistir, e tudo o que desejei foi que eu não falasse nada que me comprometesse. E acompanhei os rapazes na primeira taça. Depois me servi da segunda. Da terceira, e quando ia me servir da quarta, EunHyuk chamou minha atenção, com olhos assustados.

- Nossa, para uma garota... jovem, você bebe muito! Não é melhor parar?

- Eu... eu... eu sou uma borboleta, eu preciso de combustível, onde está Papai Noel que não me trouxe o Mi embrulhado de presente?! Tive que parar na Coréia do Sul para buscar o meu presente... hic – solucei.

  Ok, tudo o que eu falava eram bobagens de bêbada, que arrancavam risadas de todos. Zhou Mi percebeu que eu tinha uma certa... adoração por ele, então não parou de conversar comigo um minuto sequer. Ficou tipo meu BFF. Isso era um sonho se realizando, palavra nenhuma poderia descrever como eu me sentia. E a sobremesa foi servida. Um pouco de glicose melhoraria o meu estado de pinguça. Comemos, e finalizamos a ceia com muitas risadas. O ambiente estava literalmente, familiar.

  Depois de levar toda a louça para a cozinha do restaurante e retornar a casa, os rapazes disseram que iriam trocar presentes entre si. Um tipo de amigo secreto, que eles não chamavam assim. Era tão adorável vê-los rindo, se abraçando, se emocionando com seus presentes, era como se eu estivesse assistindo a um vídeo desses no Youtube, só que tinha uma diferença. Era ao vivo e a cores. Em carne e osso. Muita carne em uns, muito osso em outros. Mas guardei esse pensamento para mim. Após o último presente entregue, as conversas cessaram e o barulho de papel de presente também. Tornaram a me olhar. Que coisa! Me incomodava um pouco aqueles quinze pares de olhos puxados me olhando tão fixamente. LeeTeuk se levantou da poltrona onde estava sentado e falou, em voz alta.

- Bom, sabemos que você não é da família, não é uma amiga, muito menos uma conhecida, nem sequer é daqui. – ok, obrigada por me desmoralizar, Teukie – Mas... sentimos que gosta mesmo de nós, e ajudar a preparar uma ceia tão grande, ajudar a mãe de Hankyung e nos tratar com tanto carinho nos fez pensar que... tínhamos que dar algum presente para você. Todos merecem algo na noite de Natal.

  Ah, eu queria chorar. Eu estava realmente emocionada, eles queriam me presentear! Eu sentia que não merecia qualquer coisa que viesse deles, mas se eu recusasse, poderiam desconfiar. E nisso eu não podia me arriscar.

- Oh, oppas, não precisava...  – fiz um charme – Eu só quis agradar meus ídolos.

  Como atriz eu me saía muito bem. Falando sério. Mas eles insistiram, e um por um, vieram me entregar alguma coisa. Como eu havia surgido do nada, era óbvio que não tiveram tempo de comprar algo, e me deram objetos que diziam ser importantes para eles, e que seria importante para mim. Ô se seria! Ter objetos vindos diretamente deles era um privilégio único. Desde doces cartas com poemas, alguns com letras de músicas, até enfeites de cabelo improvisados, brincos e adereços de roupa. Eu sentia que queria levar tudo aquilo para o meu caixão, me enterrem com tudo aquilo, por favor.

  Zhou Mi foi o último, e parecia não ter nada em mãos. Eu não me importava muito de não receber nada dele, apenas tê-lo conhecido foi o maior presente de Natal que eu poderia ter ganho. Mas ele se levantou e veio até mim.

- Bem, eu não tinha idéia do que te dar de presente, praticamente não te conheço, Hannah, mas acho que isso aqui – levou as mãos ao pescoço e tirou de lá uma corrente de prata com um pingente de ideograma em mandarim feito de ouro branco – É importante pra mim, e do jeito que sinto, será importante para você. Guarde, e assim como se lembrará de mim, eu me lembrarei de você.

  Meus olhos estavam tão inchados e cheios de lágrimas que quase sumiram e estaria apta a fazer cover do Henry e seus olhos miudinhos. Queria abraçá-lo, queria abraçar um por um. Mas como todo sonho tem um fim, e, infelizmente, não é real, não pude fazê-lo.

- Ah, Mi, eu...

  Um barulho forte interrompeu minha fala. Meu coração disparou. Dessa vez era de medo, eu havia esquecido que eu simplesmente não deveria estar ali, desfrutando de uma ceia com os integrantes do Super Junior – e a mãe de um deles - , eu deveria estar me escondendo da polícia. E isso eu tinha esquecido de fazer. Um barulho mais forte ainda. Alguma coisa caiu, parecia um objeto pesado. Então pensei que a porta poderia ter sido arrombada. Oh, não! Eu iria causar problemas a eles! Se eu não fugisse dali. Tarde demais, Hannah. Só a grande quantidade de policiais armados adentrando a sala, completamente decorada com motivos natalinos. Minha felicidade toda sumiu, se desintegrou, evaporou. De volta à realidade, ou eu me entregava, ou continuava a fugir. Eu tinha todos os meus “presentes” em mãos  - e a corrente no pescoço – e meu medo maior era de que tudo fosse confiscado pela polícia, e eu nunca mais visse aqueles objetos.

- Desculpem. – disse, em meio ao silêncio – Ou melhor... sorry, sorry.

  Dei alguns passos para trás. Os policiais me mandaram ficar parada, mas eu continuei a me aproximar da parede, conseqüentemente da janela. E presenciei outra cena que achei que nunca veria.

- Não! Não façam nada com ela! Por que estão atrás dela?! – SungMin se pôs a minha frente, de braços estendidos.

- Não atirem! Se tiverem que atirar, terão que passar sobre o meu cadáver! – RyeoWook se pôs ao lado de SungMin, fazendo o mesmo.

  Eu não sabia como me sentir, só que estava grata por tudo o que eestavam me fazendo. Tudo.

- Meninos, não. Saiam daí, não quero ver vocês estirados no chão. – falei, calmamente.

- Não, você não pode ser uma criminosa, não pode! Uma pessoa tão boa não seria capaz de fazer esse mal todo! – DongHae também incorporou a “barreira” – Você já teria feito algum mal a nós, se fosse dessa laia.

- Cuidado! – foi a única coisa que eu disse.

  Os policiais nem ligaram, e simplesmente atiraram. Atiraram na perna de DongHae, no ombro de RyeoWook e no braço de SungMin. Vê-los caindo no chão, como se estivessem prestes a morrer, foi pior do que qualquer coisa nesse mundo. Estava na hora de fugir. Eu queria ajudá-los, me desculpar com eles, mas não dava. Queria dizer adeus, mas aquela palavra me doía muito.

- Obrigada! – disse já de costas, e pulei até a janela, fechada.

  Quebrei o vidro, claro, protegendo bem o rosto. E lá me fui pelo telhado, uma brasileira num quimono chinês segurando presentes coreanos e direção a outro rumo incerto. Nada mais importava. Eu só era uma menina sem ceia e sem família, tudo o que fiz a mais se justificava por isso. Realizou meu desejo, aquele Natal nunca seria esquecido. Eu estava certa que seria meu último Natal, que eu provavelmente seria pega pela polícia, presa, torturada e morta. Mas eu havia participado da ceia de Natal do Super Junior. Nada mais importava. Só o que fiz foi correr, por tantos quilômetros até que meus pés ao agüentassem mais até o aeroporto de Seoul. De lá, inventei um plano de último hora, e acabei embarcando em um avião de carga para o Brasil. Remexendo o conteúdo pude ver que eram CDs, DVDs e objetos de girl bands e boy bands coreanas. Ri. Eu vi essas coisas direto da fonte. Dormi, não pretendendo acordar, mas pretendendo sonhar. Retornar àquele sonho maravilhoso que fora aquela noite de Natal.

xXxXx

[DOIS MESES DEPOIS]

  Uma carta chegava à casa de Han Geng, sendo recebida por sua mãe. A mãe, risonha, chama o filho, e pede que não a leia ainda. Disse para lê-la na companhia dos catorze amigos. E ele o fez. Lágrimas. Onde será que a pequena garota brasileira de quimono havia se metido?

“Eu não lavei a louça, meninos! Perdoem-me!”


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Notas finais do capítulo

GF7YAYFA7YFHOAS tragédia, mwahahahahahahaha
Assim, estou pensando em fazer uma série com essa one. Sabe, fazer outra oneshot com essa mesma história, só que do ponto de vista do divo Mi, que mesmo eu não querendo centrar muito nele, acabou que foi ele que se manifestou mais HDIAFHYFIYA
Que acham? Beijosss :*****
Amo vocêsss :D