Sobrado Azul escrita por Chiisana Hana


Capítulo 5
Capítulo V




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Os personagens de Saint Seiya pertencem ao tio Kurumada e é ele quem enche os bolsinhos. Todos os outros personagens são criações minhas, eu não ganho nenhum centavo com eles, mas morro de ciúmes.

Sobrado Azul

Chiisana Hana

Beta-reader: Nina Neviani

Capítulo V

– Nenhum bicho me mordeu, seu retardado – Ikki brada, em resposta a Seiya, que estranha seu comportamento.

– Parece que seu amigo é um tanto nervosinho – Radamanthys diz a Seiya, sorrindo meio de lado.

– Ô se é! – concorda Seiya, rindo displicentemente, ainda sem entender o que estava acontecendo entre Ikki e o rapaz de sobrancelhas grossas. – Ele vive estressado. Mas nós já nos acostumamos.

– Bom, deixa eu apresentar a Shunrei – Eiri diz, cortando a conversa antes que a rusga entre Radamanthys e Ikki recomece. – Shunrei, esta é a senhorita Kido.

– Muito prazer – Saori diz, aproximando-se de Shunrei, que se levanta para cumprimentá-la.

– Igualmente – a chinesa sorri e cumprimenta Saori. – Muito obrigada pelos presentes que me mandou, eu nem sei como agradecer.

– Não há de quê. Vejo que ficou feliz, isso já é o suficiente.

– Hummm... sei. Você não costumava ser assim – Ikki alfineta a milionária. – Na infância, achava que todos os órfãos do mundo eram seus escravos.

– Isso é você que está dizendo, Amamiya – ela retruca calmamente.

– Já chega, Ikki – Shiryu murmura para o amigo. – Hoje você está ultrapassando qualquer limite.

– Só por que eu digo a verdade?

Eiri olha para Ikki com cara de poucos amigos e continua a apresentar Shunrei aos que ainda não a conhecem.

– Shunrei, esta é a Minu, minha colega lá no orfanato. Somos monitoras, tomamos conta dos pequeninos.

– Prazer, Shunrei – Minu diz, bastante sorridente, estendendo a mão para a chinesa.

– Igualmente – Shunrei diz, apertando a mão de Minu. – Eu adoraria conhecer o orfanato.

– Ah, sim. Vamos marcar um dia para você ir lá! Vai ser ótimo! – anima-se Eiri.

– Claro! Vamos sim! – Minu concorda.

– Agora deixa eu apresentar minha amiga Pandora e o namorado dela, Radamanthys – June diz. O casal esboça sorrisos. – Este é Shun, meu namorado, que você já conhece por foto. O de cabelo azul é o irmão dele. Aqueles são Shiryu, Hyoga e Seiya, que moram com os dois. A Eiri é namorada do Hyoga e a Saori namora o Seiya. Minu é uma amiga nossa. E por fim, Shunrei, que foi morar na casa do Shun nesse fim de semana.

– Prazer em conhecê-los – Pandora diz. Radamanthys apenas sorri e acena discretamente.

– Apresentações feitas, agora vamos encher a pança! – brada Seiya. – Garçom, traz mais torrada enquanto o almoço não chega!

– Hyoguinha, você se incomoda de mudar de lugar com a Shunrei? – Eiri pede. Assim podemos conversar melhor.

– Claro que não, amor – ele diz, levantando-se da cadeira. Shun pensa em gritar "Não! Deixa ela do lado do Shiryu!", mas se contém ao pensar que isso ia dar muita bandeira. Assim, Hyoga senta ao lado de Shiryu e Shunrei vai para o lugar dele, ficando entre Saori e Eiri, e de frente para Radamanthys.

– Ai, não, não vou ficar aqui no meio das moças! – Seiya diz, levantando-se da cabeceira da mesa. – Vamos arrumar isso!

– Ok, amor. Eu vou para a cabeceira – oferece-se Saori. – Eiri vem para o meu lugar, Shunrei vai para o dela e você fica lá do lado do Hyoga. Está melhor assim?

– Bem melhor! – ele diz, acomodando-se na cadeira.

– Então, Shunrei, como é morar no sobrado? – Eiri pergunta.

– É ótimo. Os rapazes me tratam muito bem!

– Até o grosso do Amamiya azul? – Minu pergunta.

– Amamiya azul? – questiona Shunrei.

– É, o Ikki. O Shun é o Amamiya verde e ele o azul! É que você não chegou a ver, mas antigamente o Shun pintava o cabelo de verde – Eiri explica.

– Ah, está bem. Bom, até o Amamiya azul me trata bem. Ele não fala muito, mas também não me trata mal.

– E o Seiya está se comportando? – Saori pergunta. – Eu o amo demais, mas tenho que admitir que às vezes ele pode ser inconveniente.

– Ele é engraçado. Parece que pra ele nunca tem tempo ruim – Shunrei diz.

– Isso é verdade – concorda Saori. – Ele está sempre alegre. É a coisa que eu mais admiro nele. Sabe, ele tem uma irmã desaparecida. Nós já fizemos de tudo para encontrá-la. Até detetive eu já contratei, mas nem sinal dela. Isso o magoa muito, mas mesmo assim ele se mantém alegre.

– Isso é realmente admirável. Eu queria ser assim – Shunrei diz. – Mas é difícil manter-se sempre alegre, ainda mais quando alguém que amamos não está mais conosco. Sinto muita falta do meu avô.

– Eu sei exatamente o que você sente, Shunrei – Saori diz com uma expressão muito séria no rosto. – Também perdi meu avô. Mas não vamos falar de coisas tristes. Seiya disse que você é amiga do Shun!

– Sim, é verdade. Ficamos amigos no primeiro dia de aula. Engraçado o destino, né? Se eu não tivesse conhecido Shun, não teria ido parar no sobrado. Nem sei o que seria de mim.

– Agora me conta uma coisa... – Eiri sussurra. – Hyoga disse que foi o dono do quartinho onde você morava que fez essa marca roxa no seu rosto.

– É. Foi ele... – ela admite, um tanto embaraçada.

– E é verdade que o Shiryu ficou irado, saiu de casa cantando pneu, deu uma surra no cara que bateu em você? – Saori questiona.

– Não sei se foi bem assim. Eles não me contaram direito, mas parece que o Shiryu bateu nele, sim...

– Nossaaa! Estou chocada – admira-se Minu. – Conheço o Shiryu desde a infância e ele nunca levantou um dedo para bater em ninguém. Sempre foi a calma em pessoa. Você mexeu com ele, hein?

– Imagina... – Shunrei diz, e cora. É interessante pensar que mexe com o belo rapaz, mas ela duvida que seja isso mesmo. No fundo, acha que ele apenas se revoltou contra a atitude violenta de seu antigo senhorio.

– Olha, a Minu tem razão – Saori concorda. – Ele sempre foi muito calmo e discreto. Nunca pensei que fosse capaz de dar uma surra em alguém. E de repente ele sai no meio da noite para bater em um cara que ele nunca viu. Acho que ele se apaixonou por você.

– Não, gente. Imagina! Foi só uma gentileza – Shunrei diz nervosa, com a face queimando de vergonha.

– E você? Gostou dele? – Minu pergunta, sorrindo marota.

– Eu? – Shunrei se surpreende com a pergunta. "O que eu digo?", ela pensa. E recomeça a falar de modo confuso. – Eu... bom... eu... ele... ele... é... ele é muito bonito, muito gentil... eu... eu gosto de ficar perto dele... mas... mas... mas... nós nos conhecemos há pouco tempo... e...

– Gosta sim! – Eiri interrompe. – Para ter ficado nervosa desse jeito, só pode ter gostado dele também.

– Eu concordo! – Minu diz. – Ele é um bom rapaz, é bonito, tem juízo e é solteiro. Acho que vocês formariam um belo casal. Vou torcer para que dê certo!

– É, ele é tudo isso que Minu falou e é também muito sozinho e melancólico – Saori diz. – Ele é muito fechado no mundinho dele. Só estuda e trabalha, diverte-se muito pouco. Só costuma sair nesses almoços de domingo. Apaixonar-se vai fazer muito bem para ele.

A cada frase Shunrei ruboriza ainda mais. Já tem certeza de que se apaixonou pelo rapaz, mas acha muito cedo para pensar que ele sente o mesmo. Ela permanece em silêncio, enquanto as meninas continuam comentando sobre o comportamento inesperado de Shiryu.

Enquanto isso, Pandora e June também fofocam.

– Pand, quando é que você e o Rada começaram a namorar? – June pergunta aos sussurros. – Não estou acreditando.

– Assim que sentamos à mesa... – Pandora sussurra de volta. – Mas não espalha.

– Eu bem que estava achando estranho – June continua. – Lá na Alemanha ele vivia correndo atrás de você e você nem ligava.

– É. Eu inventei isso porque o insolente de cabelo azul está dando em cima de mim.

– Ah... está explicado. Já conhece o Ikki...

– Infelizmente.

Radamanthys, que fingia estar entediado, ouve toda a conversa com atenção.

"Então é isso", ele pensa. "O Smurf lutador de vale-tudo está afim dela. Bom saber. Agora é que eu vou partir com tudo para cima. Perdeu, arara azul."

E, na cabeceira da mesa, os rapazes tentam entender a troca de farpas entre Ikki e o namorado da amiga de June.

– O que foi essa confusão, Ikki? – Shiryu pergunta.

– Que confusão? Estava conversando civilizadamente com o criador de taturana.

– Civilizadamente? – Hyoga questiona. – Eu vi a hora de vocês se atracarem no meio do restaurante.

– Hyoga tem razão – Shun concorda. – Acabamos de conhecer o rapaz e você já começou a implicar com ele.

– Epa! Que parte da história eu perdi? – pergunta Seiya.

– Bom, Seiya, Ikki e o namorado da amiga de June tiveram uma pequena discussão... – Shiryu explica.

– Ah, que droga! Eu sempre chego quando a diversão acaba!

– Não sei por que tanto escândalo. Não aconteceu nada – Ikki diz, impaciente. – Eu nem bati nele. Ainda.

– É, e tomara que as coisas continuem calmas – Shiryu diz. – Você sabe que um verdadeiro atleta precisa de autocontrole.

– Não me venha com blá blá blá, Shiryu.

Os pratos que eles pediram começam a chegar e Seiya comemora.

– O almoço! Ebaa! – ele diz, ao ver o garçom se aproximar.

– Vamos tentar comer em paz, não é, Ikki? – Shiryu pergunta, enfatizando a palavra "paz".

– Se a taturana não me provocar...

Tudo corre na maior tranqüilidade durante a refeição, mas logo depois a confusão recomeça.

– Bom, gente, vou ter que sair – Shun avisa. – O trabalho me chama

– Eu vou com você, meu amor – June também diz. – Preciso mesmo ir ao shopping.

– Nós também já vamos – Pandora diz, puxando Radamanthys pelo braço. – Erh... com quem devemos deixar nossa parte da conta?

– Não precisa. Você foram convidados – Shiryu manifesta-se.

– Como não precisa? Não vou pagar para o criador de taturana, não! – Ikki diz, mas se arrepende logo em seguida. "Droga! Depois dessa ela vai achar que eu sou avarento... Mas o que está dito, está dito. Agora dane-se."

– Não estamos pedindo para você pagar, Harry Potter bombado – Radamanthys diz, e joga sobre a mesa um pequeno maço de dinheiro suficiente para pagar a conta inteira e ainda sobrar. – Fique com o troco para consertar sua vassoura.

Ikki levanta-se da mesa de chofre, derrubando a cadeira com grande estardalhaço, o que chama a atenção das outras pessoas que almoçam no restaurante.

– Faço questão de devolver o troco – ele diz. – Vamos lá fora, seu Rada-tosco, que eu vou lhe mostrar como se mata uma taturana.

– Só se for agora, azulão – Radamanthys retruca. – Vai ser um prazer quebrar seus ossos.

– Chega, Rada. Vamos embora – Pandora diz irritada, puxando o "namorado" para longe da mesa.

– Eu vou, mas só porque você está pedindo – ele diz, olhando para a moça.

– Você não sabe como me deixa feliz com isso – ela murmura. – Agora vamos, por favor.

A alemã despede-se rapidamente do pessoal e agradece pelo almoço. Entretanto, antes de deixar o restaurante, Radamanthys olha para a mesa e diz:

– Me aguarde, azulão.

– Estou esperando, taturana – Ikki responde.

Depois que o casal sai, os rapazes olham para Ikki censurando-o.

– Senta, Ikki. Que vexame, hein? – censura Shun.

– Você não tem que ir trabalhar? – Ikki retruca. – Já passou da hora, moleque!

– É melhor ir mesmo – ele diz. – Você é um caso perdido. Vem, June.

Shun sai com a namorada, balançando a cabeça em reprovação à conduta de Ikki.

No lado feminino da mesa, a moças comentam a cena com empolgação.

– O que foi isso? Que explosão de testosterona! – Eiri comenta. – Mas que masculinidade desses dois!

– Explosão de grosseria, você quer dizer – Minu corrige, sem querer admitir que tinha achado sexy a postura de Ikki.

– É, eles foram bem rudes – Shunrei concorda.

– Também não achei graça nesse comportamento – Saori diz.

– Bom, tecnicamente eu também não – diz Eiri. – Eu morreria de vergonha se o Hyoga andasse por aí discutindo, soltando impropérios, mas temos que admitir que foi uma coisa muito máscula.

– É, foi – Minu admite a contragosto. – O Ikki é muito másculo.

– Aaaaaah! Admitiu! – Eiri ri da amiga, e sussurra: – Todo mundo já sabe que você gosta dele.

– Gosto coisa nenhuma! – ela retruca irritada, mas também em voz baixa.

– Gosta sim! – Saori e Eiri dizem juntas, e todas riem da careta que Minu faz.

Enquanto isso, no lado masculino da mesa, Radamanthys ainda é o assunto...

– Pelo menos o criador de taturana serviu para pagar a conta – vangloria-se Ikki, contando o dinheiro que Radamanthys jogou sobre a mesa.

– Não serviu, não – Shiryu corrige. – Nós vamos tirar a parte deles e devolver o resto na primeira oportunidade.

– E por que motivo faríamos isso? – Ikki indaga.

– Porque é o certo.

– Que certo o quê? Vamos economizar nosso dinheiro! Põe na conta da taturana patinadora!

– Nada disso!

– Shiryu tem razão – concorda Hyoga. – Vamos devolver.

– Eu estou com o Ikki! – Seiya também toma partido. – Não vamos devolver nada!

– Vamos, sim! – Shiryu diz. – E não se fala mais nisso. Eu não vou compactuar com essa palhaçada!

– Shiryu, você é o cara mais pé-no-saco que existe – Ikki diz, levantando-se e abrindo a carteira. – Toma a minha parte. Quem for de carona comigo que se apresse, tô saltando fora.

– Eu e Eiri não vamos – Hyoga diz. – Prometi levá-la ao cinema.

– Então tchau para vocês – ele diz e sai. Minu o observa de soslaio quando ele passa, mas ele nem percebe.

– Vamos também, não é? – Shiryu pergunta, e Hyoga prontamente tira a carteira do bolso para pagar sua parte e a da namorada. Seiya fica olhando para os dois. Shiryu diz: – Passa a grana, Seiya.

– Aaaaaah! Tem muito dinheiro do Rada aí. Não pode botar na conta dele?

– Não – Hyoga e Shiryu respondem juntos.

– Saco. Eu estou quebrado, gente.

– Não tem conversa. Pode passar a grana – Shiryu diz.

– Ikki tem razão. Você é chato, Shiryu.

– É por isso que ele cuida das contas da casa – Hyoga explica. – Se fosse você, já estaríamos sem luz e sem água. – Hyoga explica.

– Sem luz não porque aí como eu ia jogar vídeo game? – retruca Seiya, tirando a carteira do bolso.

Rindo, Shiryu e Hyoga levantam e vão pagar a conta. Seiya vai logo atrás deles.

– Vamos, meninas? – Hyoga pergunta ao retornar à mesa com Shiryu e Seiya.

– Ah, já? Estava tão boa a conversa! – lamenta-se Eiri.

– Por que não continuam lá em casa? – sugere Shiryu.

– Você não queria ir ao cinema? – Hyoga pergunta a Eiri.

– Podemos ir na próxima semana. Você vai ficar triste?

– Não. Por mim, tudo bem.

– Então vamos todos para o sobrado! – Shiryu alegra-se. – Quem vai comigo? Shunrei?

– Claro – ela assente, sem corar como de costume.

– Eu e Eiri também – Hyoga diz. – Não confio no Seiya dirigindo.

– Belo amigo você é, hein, Hyoga? – reclama Seiya.

– Estou pensando na segurança da minha namorada. Você é um caos ao volante.

– Nisso eu tenho que concordar, Hyoga – Minu diz. – Quando vínhamos para cá, ele fez um curva tão bem que subiu na calçada...

– Foi só uma distração! – justifica-se Seiya.

– É na distração que os acidentes acontecem, Seiya – Shiryu diz, e conclui: – Preste mais atenção quando estiver dirigindo.

– Falou o Sr. Certinho! – zomba Seiya. – Vamos embora, Sassá! Só você confia em mim!

– Confio porque é o jeito... – ela diz, fazendo um bico de insatisfação.

– Saori!

– Desculpa...

Enquanto isso, no Jaguar negro de Radamanthys, ele e Pandora conversam.

– Adorei quando você disse que éramos namorados – ele diz, enquanto dirige o esportivo.

– É? – ela se faz de desentendida.

– É. Você sabe que eu a amo – ele pára o carro de súbito.

– Rada, eu adoro você. Você é um grande amigo, mas eu só inventei aquilo para tirar aquele imbecil da minha cola.

– Eu sei, mas vamos tentar, Pand – ele diz, desvencilhando-se do cinto de segurança e aproximando-se dela. – Eu sei que posso fazê-la feliz.

O inglês acaricia a face da moça.

– Rada... – ela murmura, afastando o rosto. – Foi uma brincadeira.

– Vamos levá-la a sério, Pand. Ou quer que o otário azulado continue dando em cima de você?

– Eu não quero nem uma coisa nem a outra. Me deixa em casa, por favor.

– Está bem – ele diz, e recoloca o cinto de segurança. Sua vontade é esmurrar o painel do carro, mas ao invés disso, ele dá a partida novamente e sai.

Ao chegar no apartamento dela, num bairro nobre da cidade, Pandora desce do carro e mal olha para o rapaz.

– Até outro dia – ela diz.

– Não vai me dar nem um beijo? – ele indaga, tentando forçar um tom de brincadeira. –Você é minha namorada, ainda que de mentira.

– Não insista, Rada.

– O.k. – ele diz, e sai cantando pneu. Logo está na porta de casa. Mora no quarteirão seguinte, numa casa de estilo inglês que destoa de todas as outras da rua. Guarda o carro e, ao entrar em casa, é recebido por seu mordomo.

– Deseja alguma coisa, senhor? – diz um homúnculo de aparência pouco agradável.

– Desejo que suma pelas próximas horas, Zelos – ele responde e vai para o quarto sem sequer olhar para o mordomo.

"Como é que uma criatura nasce só uma vez e nasce tão feia?" pensa Radamanthys, enquanto entra no quarto, liga o som e põe para tocar um cd de heavy metal num volume que ensurdeceria qualquer pessoa normal.

–S -A -S -A -S -A -S -A -

Depois de ter dado várias voltas pela cidade, Ikki para na academia onde treina. Lá, ele veste o calção de luta e se aquece para começar treinar.

– Quem é a vítima de hoje? – ele pergunta, esfregando os punhos.

– Nossa, quanta raiva! – outro rapaz de cabelos azuis exclama, subindo no ringue.

– Olá, Milo. Você vai ser minha vítima de hoje?

– Seria capaz de bater pra valer no seu patrão e treinador?

– Seria – ele responde resoluto.

– Assim que se fala. Não pode se intimidar. Mas eu tenho amor à minha vida, não vou ser sua vítima. Ainda mais porque hoje você parece mais furioso que o normal.

– Estou mesmo.

– O que foi?

– Foi uma taturana incômoda que atravessou o meu caminho.

– Taturana? – ri o rapaz. – Essa é boa!

– Não vale a pena falar nesse bicho.

– Ok. Vou chamar um dos moleques novatos. Ensine-o a sofrer.

– Pode deixar. Eu sou bom nisso.

–S -A -S -A -S -A -S -A -

No shopping onde trabalha, Shun assume seu posto de caixa do café. June está sentada no balcão, perto dele.

– Seu irmão está cada dia mais intragável – ela diz, tomando um capuccino.

– É o jeitão dele. Mas admito que hoje ele estava fora de si.

– Ele gosta da Pand, por isso implicou com o Radamanthys – ela diz, como se fosse a coisa mais óbvia do mundo.

– Acha mesmo que é isso?

– Está na cara.

– Ah, se ela já não fosse comprometida, seria bom que namorassem. Talvez assim o humor dele melhorasse um pouco.

– Ela não namora o Rada.

– Como assim?

– Ela inventou isso para o seu irmão não pegar no pé dela.

– Nem imaginava.

– Sabe o que eu acho? Que ela também gosta dele.

– Então, torno a dizer: seria bom que namorassem. Ikki precisa de alguém.

– É, também acho que seria bom. O Rada é chato – ela faz uma pausa. – Bom, seu irmão também é chato, mas é seu irmão.

– É – ele admite rindo. – O Ikki às vezes é muito chato.

– Shun, sabe a Shunrei?

– Que tem ela?

– Ela não olhou nenhuma vez para você durante o almoço.

– Eu disse que seu ciúme não tinha fundamento.

– Desculpa, amor. Você sabe que eu sou mesmo ciumenta. Fiquei louca com essa história de você levá-la para morar no sobrado. Mas prestei atenção nela hoje. Parece uma boa pessoa. E percebi que volta e meia ela olha para o Shiryu.

– Isso é verdade!

– Acho que formariam um bom casal se seu amigo não tivesse uma ligeira fama de gay.

– Gay? Desde quando Shiryu é gay?

– Ah, o pessoal comenta. Ninguém nunca o viu com mulher.

– E nem com homem, né, June?

– Ah, mas aí é mais complicado, tem o preconceito...

– Ele não é gay, June.

– Uma colega minha disse que tentou beijá-lo na última calourada e ele a rejeitou. Ela é a menina mais bonita da turma, depois de mim, claro. Nenhum homem recusaria um beijo dela.

– June, foi um sacrifício convencer Shiryu a ir para aquela calourada. Ele devia estar de mau humor.

– Eu tenho lá minhas dúvidas, mas se você diz... O caso é que eu gostei da Shunrei. Não vou mais implicar com ela.

– Assim que se fala, Ju! – Shun exclama satisfeito.

– Agora me deixa ir embora, senão sua patroa vai vir aqui lhe dar uma bela bronca – ela diz, pagando o cappuccino.

– Nada disso, eu coloco na minha conta – ele diz, recusando o dinheiro.

– Não precisa, fofo – ela insiste. – Te amo.

– Também te amo. Quando eu chegar do trabalho, ligo pra você.

– Tá bom. Até mais tarde.

–S -A -S -A -S -A -S -A -

Assim que entra, Seiya tem uma ideia.

– Vamos jogar WAR? – ele propõe.

– Estamos em sete, Seiya – Hyoga diz. – O jogo é para seis.

– Um fica de fora – Seiya sugere. – O que perder sai e na rodada seguinte o que estava fora entra no lugar dele.

– Seiya, WAR com seis demora um século – Shiryu diz.

– Eu não sei jogar, gente – Shunrei diz. – Vou ficar só olhando, e num outro dia eu jogo também.

– Aê! Problema resolvido! Vou lá catar o jogo – berra Seiya, já subindo a escada em busca do jogo.

– Tem certeza de que não quer? – Shiryu pergunta a Shunrei. – Eu jogo isso direto. Já sei tudo de cor, não faço questão de jogar.

– Tenho sim, Shiryu. Eu realmente nem sei do que se trata.

– Bom, é um tabuleiro com um mapa-múndi. E tem umas caixinhas com pastilhinhas coloridas que são os exércitos. Cada um pega um objetivo e vamos lutando com os dados para dominar os territórios do adversário. Ganha quem cumprir seu objetivo.

– Entendi quase nada – ela diz, sorrindo timidamente.

– Vendo a coisa você aprende melhor! – Shiryu diz.

– Aqui, galera! Vermelho é meu! – Seiya grita descendo a escada.

– Fico com os azuis! – Hyoga brada.

– Branco! – Saori diz.

– O preto é meu! – escolhe Shiryu.

– Amarelo, né? Adoro os carocinhos de milho! – Eiri diz.

– Só me sobraram os verdes! – lamenta-se Minu. – Não gosto deles. Eu queria os azuis.

– Peguei primeiro, Minu! – vangloria-se Hyoga.

O pessoal senta-se à mesa, organiza as peças e o jogo começa. Sentada ao lado de Shiryu, Shunrei observa cada movimento dos exércitos no tabuleiro. Uma hora depois, restam apenas exércitos azuis, pretos e verdes.

– Sempre me tiram do jogo num instante – lamenta-se Saori, já sentada no sofá, com a cabeça encostada no ombro de Seiya.

– Me tiraram também, amoreco.

– Assim não tem graça – ela diz. – Toda vez ficam só Shiryu, Hyoga e Ikki.

– Dessa vez a Minu entrou no lugar do azulão – Eiri diz, brincando de empilhar suas pecinhas.

– Entrei, e entrei para arrasar – Minu diz. – Sinto muito, rapazes, mas eu ganhei! – ela exclama, mostrando seu objetivo cumprido.

– Aíííííí! É o poder femininoooooooooooooooooo! – Eiri grita, abraçando a amiga!

– Vamos de novo? – sugere Minu.

– Ah, não, estou cansado – nega-se Hyoga.

– Está cansado porque perdeu, né, amor? – Eiri provoca o namorado.

– Pelo menos fiquei até o final – ele retruca.

– Também cansei, gente – Shiryu diz, e volta-se para Shunrei. – Gostou?

– É divertido – ela diz. – Acho que na próxima vez já dá para jogar.

– Deu fome, não deu, gente? – pergunta Seiya.

– Deu mesmo – concorda Shiryu.

– Eu posso preparar alguma coisa... – oferece-se Shunrei.

– Não precisa, querida – Saori diz, sacando o celular da bolsa. – O que vai ser hoje? Pizza? Hambúrguer?

– Pizzaaaaaaaaaa! – todos gritam juntos.

– Certo, certo. O de sempre. Nem sei por que ainda pergunto. Deixem-me ver se lembro. Uma de calabresa, uma de atum e uma de frango com requeijão... e a nossa nova amiga, do que gosta?

– Ah, eu como um pedacinho de qualquer uma. Não se preocupe comigo – Shunrei diz.

– Nada disso! Escolha uma que você goste.

– Não precisa mesmo, Saori. Eu como qualquer uma.

– Nós vamos escolher para você! Depois não reclama – Seiya diz.

– Gente, não precisa!

– Pede uma quatro queijos especialmente para a Shunrei – sugere o rapaz. – Obviamente ela não vai comer uma sozinha, então eu devoro o resto!

Todos riem da gulodice do rapaz. Enquanto isso, Saori telefona para a pizzaria e faz o pedido.

– Enquanto não vem – Saori diz –, posso dar uma olhada no quarto dela? Seiya disse que é minúsculo!

– Ah, o quarto dela! – exclama Shiryu, batendo com a palma da mão na testa.

– O que foi? – Hyoga e Seiya perguntam juntos.

– Não terminei de montar os móveis! Ikki foi me ajudar e só aparafusou umas tábuas da cama dela.

– Ih, caraca! – Seiya diz.

– Gente, eu vou lá terminar, com licença – ele diz, correndo para o quartinho.

– E eu vou ver que raio de quartinho é esse – Saori diz, seguindo Shiryu. Todo mundo faz o mesmo. – Seiya não me deixou comprar um guarda-roupa porque disse que não cabia.

Shiryu coloca dentro do quarto as tábuas que Ikki começara a aparafusar, liberando o caminho. Saori vai até a porta.

– Gente! Isso não pode ser chamado de quarto! É no máximo uma caixa de fósforos. E não tem nem janela! Como é que a menina vai dormir aqui?

– Não se preocupe, senhorita Saori – Shunrei diz. – Está ótimo.

– Ai, Shunrei, tadinha de você. Temos que arranjar pelo menos um ventilador.

– Juro que está ótimo – ela diz, aproximando-se da porta e olhando para dentro. – Não era para eu olhar antes de ficar pronto, mas...

– Está lindo, não está? – Shiryu pergunta.

– Sim! – ela diz, boquiaberta e com os olhos marejados.

– Foi idéia do Shun pintar a árvore e colar as flores na parede. Ele disse que esse azul estava masculino demais para um quarto de moça.

– Ficou lindo! – ela exclama. Era um cômodo realmente pequeno, mas tinha ficado limpo, bonito e aconchegante.

– Que bom que gostou – diz Shiryu. – Mais um pouco e eu termino de montar sua cama.

– Obrigada – ela diz, olhando para ele enternecida.

– De nada – ele diz, e corresponde ao olhar.

Minu, Eiri e Saori percebem a troca de olhares e puxam Seiya e Hyoga para a sala, enquanto Shunrei fica observando Shiryu montar sua nova cama.

– Hoje você vai ter sua cama de volta – ela diz.

– Eu não estava preocupado com isso, Shunrei – ele retruca, aparafusando a outra lateral da cama.

– Eu sei, mas eu estava me sentindo mal por fazer você dormir num colchão.

– Não estava ruim, mas vai ser legal você ter seu cantinho.

– É. Vai ser quase como estar em casa de novo – ela diz com pesar, lembrando-se do avô.

– Fico feliz que se sinta assim. O que achou do almoço?

– Ah, eu adorei! E adorei conhecer as meninas! – ela diz entusiasmada, os olhos brilhando de alegria.

– Elas são boas garotas – ele diz, e concentra-se no encaixe das peças da cama.

Nesse ínterim, a campainha toca. De onde estão, os dois ouvem Seiya gritar "as pizzas!". Shunrei faz menção de ir para a sala. Shiryu, entretanto, continua montando a cama.

– Não vai? – ela pergunta.

– Assim que eu terminar.

– Não vou deixar você comer a pizza fria por causa da minha cama! – ela diz, e segura uma mão dele. – Vamos!

– Está bem – ele concorda, e se levanta. – Depois termino.

Os dois chegam à sala de mãos dadas, fato que não escapa do olhar atento das moças, mas que sequer é notado por Seiya e Hyoga. Todos se fartam de pizza e refrigerante.

– Acho que eu nunca comi tanto na minha vida! – Shunrei diz.

– Acostume-se! Esses rapazes comem demais! – Saori diz. – Bom, agora tenho de ir. Muita coisa para estudar, sabe?

– Eu levo você, amoreco!

– Nada disso. Quando você vai, eu acabo não estudando nada. Me dá a chave da caminhonete que eu mesma vou dirigindo.

Seiya pega a chave sobre a mesa.

– Toma – diz, e entrega a ela.

– Obrigada, amor – ela agradece, e dá um beijo nele.

– Saori, eu e Minu podemos ir com você? – Eiri pergunta.

– Claro! O orfanato é meu caminho mesmo.

– Já vai, meu amor? – Hyoga pergunta, segurando a namorada pela cintura.

– Já, querido. Eu e Minu temos que arrumar as mochilas dos pequenos, ajeitar o lanche de amanhã. Sabe como é, não?

– Claro – ele diz e a beija. – Eu te amo.

– Também te amo, meu lindo.

– Depois do estágio, passo lá no orfanato para vê-la.

– Vou esperar – Eiri diz. – Tchau, gente. Shunrei, adorei conhecê-la!

– Eu também adorei! – Minu diz.

– E eu concordo com as duas! – diz Saori.

– Eu também adorei vocês três! – a chinesinha diz, sorridente.

As três saem da casa acompanhadas pelos demais. Saori entra na caminhonete. Eiri e Minu fazem o mesmo. Elas acenam para o pessoal no sobrado. Em seguida, Saori dá a partida e elas se vão.

Shiryu volta ao quartinho para terminar de montar a cama de Shunrei. Seiya senta-se no sofá e joga vídeo game sozinho. Hyoga pega o laptop e vai ler as notícias do dia na internet. Shunrei sobe para o quarto de Shiryu e põe-se a estudar um pouco. Mais tarde, Shiryu vai até ela.

– Está tudo pronto – ele anuncia.

– Ah, que bom! – ela comemora. – Obrigada!

– De nada. Não vai ficar agradecendo de cinco em cinco minutos, vai?

– Vou tentar não fazê-lo. Me ajuda a levar minhas coisas para lá?

– Claro – ele diz, pegando a mala dela.

Os dois descem as escadas e vão até o quarto que fora útil para guardar tralhas, mas que agora pertence a Shunrei.

– Ai, que lindo meu quartinho! – ela diz ao entrar lá. Emocionada, as lágrimas escorrem pela sua face.

– É apertadinho, mas ficou bom, não? – ele pergunta, colocando a mala num cantinho ao lado da cama.

– Ficou lindo!

– Se quiser ajuda para arrumar as coisas, estarei lá em cima.

– Não precisa. Você já fez tanto por mim. Vá descansar agora.

– Fiz de boa vontade. E não precisa agradecer mais uma vez.

Ele a olha ternamente.

– Mesmo assim, obrigada. – ela diz, retribuindo o olhar terno do rapaz, ainda com lágrimas escorrendo pela face.

– E não chore – ele diz. – Gosto de vê-la feliz.

Shiryu pousa a mão direita no rosto dela suavemente, enxugando as lágrimas. Shunrei sorri e então os dois se abraçam. Ao encostar a cabeça no peito dele, ela sente os batimentos acelerados do coração do rapaz, tão acelerados quanto o dela mesma. Afastam-se sorrindo. Sem dizer mais nada, ele a deixa sozinha no novo quarto. Shunrei detém-se a arrumar suas roupas na cômoda nova, mas o pensamento continua em Shiryu.

"Eu acho que ele também gosta de mim..." ela pensa. "O coração dele estava batendo tão rápido! Ai, meu Deus! Eu gosto tanto dele!"

No andar de cima, deitado em sua cama, ele também pensa na mocinha.

"Ela mexe tanto comigo...", pensa o rapaz. "Eu nunca senti nada parecido com isso, com essa vontade que eu tenho de ficar perto dela todo o tempo. E ela me faz sorrir. É, ela me faz sorrir."

Seiya entra no quarto e depara-se com Shiryu sorrindo aparentemente sem motivo.

– Que sorriso bobo. O que deu em você? – ele pergunta intrigado.

– Quer mesmo saber? – Shiryu indaga, sentando-se cama.

Continua...


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Notas finais do capítulo

Aí, gente!Excepcionalmente, capítulo de Sobrado Azul fora da época. Eu me empolguei e escrevi logo tudo. Agora não faço idéia de quando vai ter outro! Pode ser semana que vem, pode ser mês que vem... Deus é quem sabe!Beijo pra todo mundo!Chiisana Hana



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