Sobrado Azul escrita por Chiisana Hana


Capítulo 29
Capítulo XXIX




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Os personagens de Saint Seiya pertencem ao tio Kurumada e é ele quem enche os bolsinhos. Todos os outros personagens são meus e eu não ganho nenhum centavo com eles.

 

SOBRADO AZUL

Chiisana Hana

Capítulo XXIX

 

Em Asgard, Hyoga e Shiryu acordam dispostos a trabalhar o dia inteiro na papelada dos novos contratos, já que terminando no menor tempo possível poderiam aproveitar melhor os dias de viagem que restavam. Para não acordar Shunrei, os dois reúnem-se no quarto do russo e, cada um com seu notebook, começam a trabalhar. Com um fone de ouvido para auxiliá-lo, Shiryu redige os contratos com o governo de Asgard, e Hyoga prepara aqueles que assinarão com Alberich. Enquanto o fazem, confabulam sobre a possibilidade de abrir uma filial do escritório no país pois acreditam que, sendo o escritório da Coroa, teriam credibilidade o bastante para conseguirem muitos clientes em pouco tempo.

— Mas acho difícil alguém do escritório topar vir para organizar isso – observa Shiryu, enumerando mentalmente todos os advogados que trabalham lá, a maioria desde a época de Siegfried. – É uma mudança bem drástica... Além disso, temos que estudar a legislação local para sabermos quais as condições para esse colega vir advogar aqui. Pode levar tempo até ele conseguir...

— Verdade – Hyoga concorda. – Mas tem outra solução rápida e prática. Contratamos alguém daqui mesmo, já pronto para atuar imediatamente, e mandamos alguém de confiança só para coordenar a instalação do escritório. Até sei quem poderia vir... O Isaak. Lembra dele?

— Sim, claro – Shiryu responde, lembrando-se do rapaz que foi colega de faculdade dos dois. – Era um cara na dele, tranquilo... Gosto da ideia, mas será que ele topa?

— Encontrei-o dia desses e ele me contou que divide uma pequena sala com mais dois colegas. Está na luta, como nós estaríamos se não fosse o grande escritório do Siegfried cair no seu colo. O Isaak não é casado, não tem filhos... Acho que seria uma boa oportunidade para ele.

— Ótimo. Faça o convite. Se ele topar, eu estou de acordo.

— Fechado! Quem diria que a gente estaria fazendo planos para uma filial, hein?!

— Essa vida dá muitas voltas… – Shiryu diz pensativo. – E eu nem estou conseguindo absorver direito a velocidade das coisas, mas vamos em frente, vamos fazer isso dar certo!

— É bom ver essa mudança de espírito, Shiryu – comenta o russo, sorrindo satisfeito. – Ontem você estava muito reticente, hoje mudou…

Shiryu sorri serenamente. Não se sente verdadeiramente mudado, ainda tem medo do que virá pela frente, mas está se esforçando para encarar tudo de modo positivo.

— Shunrei me fez virar a chave… – ele diz. – O mérito é todo dela.

— Santa Shunrei operando milagres mais uma vez! – brinca Hyoga, arrancando uma gargalhada do amigo.

— Pois é, mas agora vamos voltar ao trabalho, por que se continuarmos conversando, não vamos terminar a tempo de aproveitar a viagem!

No quarto ao lado, Shunrei desperta e encontra um recado gravado pelo marido no celular, avisando-a de que estaria trabalhando no quarto de Hyoga.

Com Shiryu ocupado, ela resolve explorar o palácio, dentro dos limites permitidos pela boa educação, e acaba passando por uma sala onde Hilda e Emmeline estão brincando.

— Bom dia, senhora – ela cumprimenta, curvando-se respeitosamente, parada à porta, esperando autorização para adentrar no cômodo. Ainda não sabe bem como se portar diante de sua antiga patroa que agora é uma princesa, por isso acha melhor ser cautelosa.

Hilda a cumprimenta de volta.

— Vem brincar também, tia! – Emmeline chama, puxando Shunrei para dentro.

A chinesa senta-se no chão com as duas, observando a sala, que é ampla e luminosa, tem uma grande estante de brinquedos encostada em uma das paredes e muitas almofadas no chão. No centro, uma grande casa de bonecas da qual Shunrei se lembra bem, pois era o brinquedo favorito de Emmeline no Japão.

— Como passaram a noite? – Hilda pergunta. – Ficaram confortáveis?

— Ah, muito! – Shunrei responde. Espera não corar ao lembrar que fez com o marido mais do que dormir. – O quarto é maravilhoso. Está tudo perfeito. Estou muito grata por tudo, senhora, pela viagem, a hospedagem, mas principalmente pela confiança do senhor Siegfried em Shiryu desde o começo, quando entregou o escritório a ele, até essa imensa oportunidade de agora.

— Sieg acredita muito em Shiryu – Hilda diz, pensativa. – Em parte porque eu também acredito. Não era justo relegá-lo a uma aposentadoria por invalidez depois do acidente. Ele já provou que continua perfeitamente capaz apesar da perda da visão.

— Ele não vai decepcioná-los – Shunrei garante. – O escritório está indo muito bem e sei que ele fará o melhor pelos interesses de Asgard no Japão.

— Sei disso, Shunrei – Hilda responde.

— E quero que saiba que isso é muito mais do que um trabalho que vai nos trazer muito dinheiro. É uma chance de buscarmos tratamento para a visão de Shiryu. Os médicos que consultamos até agora disseram que não tem chance de ele voltar a enxergar, mas eu não perdi a esperança e luto todos os dias para que ele também não perca. Shiryu tende a ser negativo, sabe? Mas isso já está mudando.  

— Tudo está escrito, Shunrei… – Hilda diz, pensativa. – O acidente, a perda da visão, vocês cruzarem nosso caminho, tudo isso estava escrito. Se estiver escrito que ele vai voltar a enxergar, ele vai. Veja a minha própria vida. Fiz de tudo para fugir disso aqui. – Ela abre os braços, mostrando que se refere ao palácio. – Mudei para o Japão a fim de ficar bem longe da realeza, para levar uma vida normal com meu Siegfried. Para o Japão!! O meu tio, que era o regente na época, nos ajudou e tivemos algumas facilidades para ir. Fizemos faculdade lá, Siegfried tornou-se advogado e eu juíza, como você bem sabe. Mas o destino nos trouxe de volta. Percorremos um caminho mais longo, mas acabamos no lugar onde devíamos estar desde o começo.

— Eu também acredito muito nisso, senhora – Shunrei afirma serenamente. – Tenho certeza de que não foi obra do acaso ter passado tudo o que passei. Foi o destino me levando exatamente para onde eu devia estar.

— Vocês vão ficar só falando? – Emmeline pergunta, emburrada. – Eu quero brincar!

— Não seja mal-educada, querida – Hilda diz, em tom baixo mas firme. – A mamãe está conversando. Espere um pouco e já vamos brincar.

Emmeline faz um bico de insatisfação e volta às bonecas resmungando.

— Não estou fazendo nada, posso ficar com ela – Shunrei se oferece.

— Não precisa. Você é nossa convidada, não é mais nossa babá. E eu preciso mesmo passar mais tempo com ela agora que o irmão vai chegar. Emmeline diz que está amando a ideia, que está empolgada para me ajudar, mas já vejo sinais de ciúme…

— É normal... Mas ela é uma boa menina, logo vai compreender que há lugar para os dois.

— Assim espero. Por que não faz um passeio pela cidade, Shunrei? O tempo hoje está muito bom. Não vou precisar do meu motorista  hoje, então ele pode levá-la e trazê-la de volta.

— Acho que vou aceitar a oferta... Os rapazes ainda devem demorar no trabalho e eu estou mesmo querendo comprar umas coisinhas para levar. Ir às compras não é exatamente o passeio favorito de Shiryu...

— De nenhum homem! – Hilda ri, pensando no marido. –Então vá! Faça um bom passeio!

Empolgada, Shunrei concorda e se despede de Hilda e Emmeline. Depois, passa no quarto, pega a bolsa e um agasalho. Por fim, vai até o quarto de Hyoga para avisar a Shiryu que vai sair.

Em frente ao palácio, o motorista de Hilda já está de prontidão. O rapaz a leva até o centro comercial da cidade e gentilmente se oferece para esperar, mas Shunrei recusa. Além de não querer abusar, deseja fazer o trajeto de volta numa das charmosas charretes de aluguel.

Caminhando pelas ruas, Shunrei nota que é possível distinguir claramente os locais dos turistas. As pessoas com agasalhos modernos, de nylon colorido, como ela em seu abrigo fúcsia, são os turistas. Já os locais, parecem à vontade em seus trajes que lembravam figurinos saídos de um filme medieval: casacos de pele, botas de couro, vestidos de lã longos e com mangas pesadas, roupas com aparência natural e artesanal, com pouco ou nenhum material sintético.

Ela circula pelas pequenas lojinhas que oferecem um pouco de tudo: vestuário, calçados, joias, artesanato, flores. Entra numa das lojinhas e compra três bolsas de tecido bordadas com flores para Mino, Eiri e Saori. Para a loira, compra também uma manta branca bordada com arabescos para o bebê. Para os rapazes, compra camisetas com o brasão de Asgard, incluindo uma para Shiryu. Mais adiante, ela entra em outra loja e compra tigelinhas de uma delicada louça azul para levar para casa. Quando termina suas comprinhas, Shunrei almoça em um simpático restaurante e dá mais uma volta pela rua para fazer a digestão. Antes de ir embora, compra uma caixa de doces tradicionais de Asgard e acaba não resistindo a um vestido no estilo tradicional do lugar, porém leve e de mangas curtas, mais apropriado para a primavera que se aproximava do que para o inverno que chegava ao fim. É uma peça de linho tingido de vermelho, certamente com algum corante natural, ajustável na cintura com cordões de algodão cruzados. Ela prova o modelo. Não sabe bem onde usará um traje assim, mas se sente bonita nele e resolve levar. Além disso, acha que será uma boa experiência sensorial para Shiryu “ver” o estilo tradicional do lugar, sentir o tecido usado na peça, desatar os cordões...

Shunrei dá um sorrisinho malicioso e, para encerrar o passeio, pega uma das charretes e retorna ao palácio. Depois de deixar as sacolas de compras no quarto, ela vai ver se Shiryu e Hyoga ainda estão trabalhando e encontra os dois conversando animadamente.

— Terminaram? – Shunrei pergunta, cumprimentando o marido com um beijinho na testa.

— O que planejamos para hoje, sim – Shiryu responde. – Amanhã vamos finalizar o que ficou faltando. Você comprou muita coisa, amor? Não está gastando por conta desse contrato, está? 

— Não se preocupe! Eu não exagerei. Foram só uns presentinhos. Até parece que não me conhece! Sempre fui uma esposa controlada!

— Relaxa, Shiryu – ri Hyoga. – Vamos ficar ricos!

— Eu só conto com dinheiro quando ele está na mão – justifica Shiryu. – Mas agora chega de trabalho, vamos todos descansar e aproveitar a viagem, né?

— Eu vou sair para praticar snowboard— Hyoga diz. – Estava aqui tentando convencer Shiryu a ir também.

— E eu estava dizendo que, caso ele não tenha percebido, sou cego.

— Ah, vocês podiam descer a montanha de trenó! Vamos lá! Vai ser divertido! Estamos em Asgard, no fim do inverno!! Vamos aproveitar a neve!

— Não – Shiryu se apressa em negar. – De jeito nenhum. Não quero correr nenhum risco desnecessário.

— Eu também prefiro ficar bem segura aqui no palácio – concorda Shunrei. Até acha que seria divertido descer de trenó, mas tem outros planos para a noite.

— Está certo – Hyoga diz. – Fiquem aqui seguros, porque eu vou brincar ali na neve!

— Tome cuidado! – recomenda Shiryu, levantando-se da poltrona. – A Eiri não vai gostar se o marido voltar machucado.

— Pode deixar, eu vou tomar muito cuidado, papai!

Shiryu e Shunrei voltam ao quarto onde estão hospedados.

— Vocês almoçaram? – ela pergunta, guiando ele até uma poltrona, na qual ele senta. – Vocês acabam esquecendo quando começam a trabalhar assim...

— Sim, fizemos uma pausa e almoçamos, não se preocupe. E você?

Ela se senta no colo dele e responde:

— Almocei em um restaurante ótimo, fiz um passeio muito agradável, mas sei que você teve um longo dia de trabalho – ela murmura, deslizando a mão para dentro da camisa dele. – Agora merece relaxar.

— Merecemos – ele afirma num sussurro sensual, e dá um longo e delicioso beijo na esposa, que se move sobre ele de modo provocante.

Shiryu logo fica pronto para ela, mas está disposto a prolongar ao máximo as preliminares e repetir a experiência da noite anterior. Continua a beijá-la e acariciá-la, agora por baixo da roupa, até a mão deslizar para dentro da calcinha e sentir a umidade que aflora ali. Quando os dedos tocam o ponto mais sensível, ela se move, intensificando a pressão ao mesmo tempo em que apalpa o membro ereto dele. Logo se afastam por alguns instantes para se livrarem das roupas que são um estorvo nesse momento. Finalmente despidos, ela ajoelha-se no chão e dedica-se ao prazer dele. Depois, invertem as posições. Agora é ela quem está sentada na poltrona, as pernas afastadas, ansiando por ele, e Shiryu de joelhos no chão, de frente para ela. Ele primeiro sente com as mãos, depois aproxima o rosto, toca a fenda úmida com a língua, arrancando dela um gemido alto ao tocar-lhe o ponto mais sensível.

— Isso com certeza é muito melhor do que brincar na neve – ela diz, entre gemidos de prazer, sentindo o calor alastrando-se pelo corpo como fogo.

— Com certeza – ele concorda, e devota-se a ela até o ápice.

—-----S------A------

Enquanto o casal se diverte no quarto, Hyoga chega à estação de esportes. Ao sopé da montanha coberta de neve, ele acha até bom não estar com Eiri porque ela certamente tentaria persuadi-lo a desistir da descida, mesmo ele tendo experiência no esporte. Sempre que podia, frequentava estações no inverno japonês para esquiar e praticar snowboard.

Depois de alugar o equipamento necessário, Hyoga sobe a montanha de teleférico. No topo, respira fundo o ar gelado várias vezes e começa a descer. Vai aproveitando a descida, o vento gelado no rosto e a incrível sensação de liberdade. Sente-se eufórico com a velocidade que aumenta e começa a arriscar algumas manobras simples. Logo se sente seguro para arriscar movimentos aéreos mais difíceis e ao ver um montículo de neve, calcula que é o ideal para dar impulso e decolar. Ele busca o ângulo certo, sobe a rampa natural formada pela neve e decola alto, girando no ar em torno de si mesmo e pousando perfeitamente.

— Isso! – ele grita, eufórico. – Perfeito!
Ele continua descendo, à procura de outro montículo ideal para dar impulso, mas começa a sentir dificuldade para controlar a prancha e desviar dos obstáculos que surgem.

Hyoga tenta manter a calma, procura se estabilizar, entretanto bate numa pedra oculta pela neve e cai violentamente, rolando sem controle montanha abaixo. Tudo que ele vê através dos óculos de proteção é um borrão indefinido. Ele procura algo onde se segurar, mas não há nada, as mãos se fecham no vazio repetidamente. Uma pequena avalanche vai se formando atrás dele, mas ela cresce e avança até engoli-lo e levá-lo consigo. Engolfado pela neve, Hyoga pensa na mãe, em Eiri, no filho prestes a nascer... e só pede a Deus para sair vivo daquela montanha.

—-------S---------A---------

Tóquio, Japão.

O orfanato Filhos das Estrelas está todo decorado para a festa de quatro anos de Penélope. Por ser uma noite fria de fim de inverno, a festinha se restringe ao ambiente interno. É uma comemoração pequena, apenas para as crianças de lá, a família e uns poucos amigos. Radamanthys queria uma festa maior, em casa, enquanto Pandora queria fazer algo pequeno na escola, mas Penélope insistiu em comemorar no orfanato e, com o apoio de Ikki, os dois acabaram cedendo. Ao invés de presentes para ela, pediram doações para a instituição.

Penélope brincava com as outras crianças quando vê Ikki chegar com Mino e Eiri.

— Pai Ikki! – ela grita e corre até os dois.

— Oi, minha filhota! – Ikki exclama, agarrando a menina e erguendo-a no ar bem alto.

— Tia Mino! – ela exclama, ao ser colocada no chão.

— Oi, querida – Mino cumprimenta e abraça a menina. – Feliz Aniversário! Que festa mais linda!

— Eu que escolhi tudo, tudinho!

Ikki dá uma boa olhada na decoração cheia de caveirinhas coloridas e tule preto e rosa, mesmo tecido da saia que Penélope usa.

— Praticamente um Halloween em fevereiro, Pepê… – ele diz. – Mas está lindo, filha.

Os órfãos logo cercam Mino e Eiri, enchendo-as de abraços. Radamanthys e Pandora também se aproximam para receber os convidados. A alemã traz Apollo nos braços e o marido, um copo de uísque.

— E aí, Azulão? — Radamanthys cumprimenta Ikki com um aperto de mão forte.

— Fala, Taturana, seu bebum! – Ikki retruca. – Já começou?

— Você sabe, sempre preciso abastecer o tanque com um bom scotch.

Eu sou mais da cerveja.

— Então aproveita porque o freezer tá cheio. Aliás, me lembre de levar embora se sobrar… Imagina se fica aí e os guris começam a beber… Vai dar merda.

— Esses dois... – Pandora comenta com Mino e Eiri, rindo deles.

— Não sei quem é o pior… Mino acrescenta, ainda cercada pelas crianças.

Ela e Eiri cumprimentam um por um, perguntando como estão, se estão gostando de Seika e da nova monitora. A resposta não muda muito de um para o outro: gostamos delas, mas sentimos falta de você e da tia Eiri.

Mino tenta se manter firme, não quer chorar na frente deles, mas seu coração vai ficando ainda mais apertado a cada resposta.

“Queria poder ficar com todos eles…”, ela pensa, enquanto é praticamente arrastada pelas crianças. “Queria mesmo que fosse possível...”

Ikki conversa com Radamanthys e, embora pareça descontraído, está atento à cena e nota o olhar de Mino. Sabe exatamente no que ela está pensando...

— Você tem que fazer alguma coisa – Eiri sussurra para ele, e vai atrás da amiga.

— Ah, o Seiya pediu desculpas – Ikki diz a Pandora e Radamanthys, deixando temporariamente de lado o problema de Mino e o recado enigmático de Eiri. – Ele não virá porque a Saori não está muito bem ou algo assim. Traduzindo: eles não queriam vir. Hyoga e Shiryu viajaram a trabalho, como vocês já sabem.

— Tudo bem – diz Pandora.

O casal leva Ikki até a mesa onde estão os outros adultos, incluindo os pais e os irmãos de Radamanthys. Pandora está prestes a perguntar a Ikki se Shun viria quando ele entra no salão.

— Sozinho... – ela comenta baixinho. – Que estranho...

— Boa tarde, pessoal – ele cumprimenta ao se aproximar da mesa. – Desculpem o atraso.

— Onde você estava? – Ikki pergunta.

— Isso importa, mano? – Shun retruca. – Cheguei a tempo, não?

— E a June? – Pandora pergunta preocupada, pois esperava que chegassem juntos.

— Não sei se ela vem... – Shun responde. – Nós tivemos uns problemas...

— Que tipo de problemas? – Ikki pergunta.

— Não seja indiscreto, irmão – Shun responde, e acena para Pepê, que vem correndo receber o tio. – Feliz Aniversário, meu amorzinho! – ele diz, enquanto abraça e beija a sobrinha.

— Tá bom, tio. Não precisa tanto beijo!

— Precisa, sim!! – Shun ri e dá mais beijos nela.

— Para, tio! – ela pede e sai correndo na primeira oportunidade.

— Não vai mesmo contar o que houve com a June? – Ikki insiste.

— Não – Shun responde serenamente. – Vou curtir o aniversário da minha sobrinha sem pensar na June e é só.

— Bom, espero que consiga porque ela acabou de chegar...

Shun se vira e a vê passar por eles sem sequer olhar, indo direto até Pandora e Radamanthys. Mesmo arrasada, ela decidiu não perder o aniversário da afilhada por causa de Shun. Então engoliu o choro, refez a maquiagem, colocou seu vestido mais decotado e foi.

— Pensei que você nem vinha! – Pandora diz, abraçando-a e a puxa para longe da mesa. – Estava aqui esperando você me ligar para dizer o que tá rolando porque o Shun chegou sozinho e falou que vocês tiveram “problemas”…

— Nem me fale desse babaca! – June interrompe. – Depois eu explico tudo, prometo, mas agora não, por favor.

— Está bem, me conte quando puder. Só tente não matar ele durante a festa da Penélope porque seu olhar quando passou por ele foi de dar medo.

— Ele já está morto pra mim.

— Ih, então o negócio foi sério… Bom, agora que você finalmente chegou, vamos cantar logo o “Parabéns” e servir o bolo.

Pandora chama os convidados para se reunirem ao redor da mesa, enquanto Mino e Eiri ajudam Seika a organizar as crianças. Ao som da musiquinha tradicional, Pepê sopra suas quatro velinhas, enquanto Radamanthys fotografa tudo.

Com a ajuda da mãe, a aniversariante distribui mochilinhas com brindes e doces, tudo muito caprichado como ela exigiu. Depois, Seika pacientemente faz as crianças se sentarem para esperar o bolo ser servido.

— Ela é incrível, né? – Ikki pergunta a Mino, olhando orgulhoso para sua Penélope. – Ela me disse que queria fazer a festa aqui para compartilhar tudo que ela tem a sorte de ter com quem não tem nada.

— Ela é – Mino concorda, pensando naqueles vinte órfãos. Conhece cada um, cada trejeito, do que gostam, do que não gostam, sabe quem é bom na escola, quem come direito, quem dá trabalho para comer…

“Coisa de mãe”, ela completa em pensamento, sentindo uma pontada dolorosa no peito, o que a leva à constatação de que nunca irá conseguir se desvincular como Eiri.

Ao longo da festa, enquanto as crianças se enchem de bolo e docinhos, as mulheres acabam se agrupando numa mesa e os homens em outra. Radamanthys, o pai, o irmão, Ikki e Shun divertem-se falando bobagens e tomando muita cerveja. Shun vira um copo atrás do outro, o que começa a preocupar Ikki.

— Você está bebendo demais – ele diz ao irmão mais novo a certa altura, quando já tinha perdido a conta de quantas cervejas ele tomou.

— Que nada! – Shun retruca. – Nem comecei!

— Você tá enchendo a cara por causa da June?

— Eu só tô curtindo! Relaxa!

— Não é possível. Você não é meu irmão, é um clone malfeito que substituiu ele. Meu irmão nunca foi de beber desse jeito…

— Deixa o cara, Ikki – Radamanthys diz, rindo. – Se ele ficar bêbado, está seguro aqui. A gente coloca ele para dormir nos colchõezinhos com as crianças.

— Acontece que eu não vou dormir porque depois da festa vou sair pra dançar! – Shun anuncia, tomando mais um gole de cerveja.

— Como é? – Ikki indaga, incrédulo. – Que novidade é essa? Vai sair pra dançar coisa nenhuma. Vai para casa dormir e curar essa bebedeira!

— Não vou, não! Para com isso, Ikki. Faz tempo que deixei de ser criança.

— Então vá, vá dançar, faça alguma merda e venha chorando atrás de mim...

— E quando foi que eu fiz isso? A última vez eu devia ter uns oito anos…

— Você que sabe… – Ikki diz.

— Exatamente! – Shun responde e vira mais um copo.

Na outra mesa, Pandora não se aguenta de curiosidade. Queria falar com June a sós, mas a companhia de Mino, Eiri, Mnemosyne e Seika impedem-na de entrar no assunto. Ela aproveita quando Apollo começa a chorar e sai um pouco de perto, arrastando June consigo.

— Agora conta! – ela instiga quando estão em um espaço reservado. – Eu não aguento mais!

June respira bem fundo e começa:

— Você acredita que o filho da mãe veio com uma conversa mole de que está cansado, que não vai mais ser psicólogo, e principalmente, que não quer casar?

— Bom, isso meio que já estava na cara… Ele ainda é meio crianção, June.

— Não estava na minha cara, não! Eu pensei que estávamos a um passo do altar!

Pandora evita repetir que isso também estava na cara e prossegue:

— Aí vocês brigaram e terminaram?

— Sei lá! Só sei que me subiu um ódio quando ele falou um monte de merda e terminou com um “não é culpa sua”… Quis matar ele, mas mandei sumir da minha frente e só voltar quando souber o que quer.

— Poxa, ele também não ajuda... Disse a pior coisa a que se pode dizer numa hora dessas… “Não é culpa sua”... Dãaaaaa! Mas June, acho que você estava mesmo precisando dar uma renovada… experimentar outras coisas… Você namorava o Shun desde novinha e, pelo que me contou, estava tudo muito morno…

June não nega.

— Ultimamente, sim… Mas é que eu amo o filho da mãe… e, sinceramente, não acho que me enganei todos esses anos… acho que ele me ama… ele disse que me ama! Acho que só está… confuso...

— Ai, ai… O ódio já está passando, Ju? Você já está até defendendo ele!

— Não, não e não! No momento estou com ódio dele e é esse ódio que me aquece e permite que eu use esse vestido em pleno inverno. Depois da festa, vou ferver por aí! Vou me agarrar com o cara mais gato que aparecer.

— É o melhor que você faz! Vai que você acha um melhor e esquece o Shun.

— Não é assim… é bem mais complicado que isso… mas hoje eu quero é me divertir!

— Tem todo o meu apoio. Tem uma boate nova que está fazendo sucesso, você viu os anúncios?

— Sim, acho que vou pra lá. Deve estar cheia de gatos.

— O irmão do Rada disse que queria conhecer… – Pandora diz, com um sorrisinho cheio de intenções implícitas.

— Quê? Você tá insinuando que eu… e ele…?

— Por que não? Ele é gato, é solteiro e está te comendo com os olhos desde que você chegou.

— Hum… até que não é má ideia… – June diz, pensando no rapaz.

Ao voltar para a sala, ela deliberadamente passa bem perto dele e pega uma cerveja. Depois, continua prestando atenção nele e vê que Pandora tinha razão. Ele está claramente interessado nela. June observa que Shun também percebeu isso, o que a atiça ainda mais. Quando Belerophonte se aproxima convidando-a para ir a outro lugar, June não pensa duas vezes e aceita.

Um pouco mais tarde, Shun também se despede dos demais convidados.

— Você vai para casa? – Ikki pergunta a ele, mas seu tom é quase uma ordem.

— Não. Eu já falei que vou sair… E não se preocupe. Você não vai ter que me buscar na delegacia, no hospital, ou sei lá onde você acha que vou parar. Eu sei me virar.

Depois de se despedir da sobrinha, Shun chama um táxi e segue para a nova boate badalada cujos anúncios estão pela cidade inteira. Até onde lembrava, nunca tinha ido a uma, não fazia muito seu estilo, mas hoje estava com vontade de experimentar algo novo e não havia nada que o impedisse. Lá dentro, com a música alta e as luzes piscando freneticamente, ele se sente livre e começa a se mover no ritmo da música eletrônica. Sente que estava precisando disso, de libertar o corpo, soltar as amarras, resetar o jogo e recomeçar.

Ele não percebe que June e Belerophonte estão no bar, mas ela logo nota Shun na pista.

“Ele veio para o mesmo lugar?!”, ela pensa. “Não podia ser melhor! Tomara que veja aqui com o irmão do Rada e morra de ciúmes.”

Ela joga ainda mais charme para Belerophonte, que se sente autorizado a investir e rapidamente a conversa evolui para um beijo. E mais outro. Porém, ele percebe algo.

— Você não tira os olhos do seu ex – ele diz entre um beijo e outro.

— Só estou vendo o papel ridículo que ele está fazendo... Ele não sabe dançar.

— Sei… É que você ainda parece bastante interessada nele.

June tem vontade de gritar. É tão óbvio assim?

— Que seja… – ela responde e beija novamente Belerophonte para tentar esquecer a presença de Shun.

Acontece que Belerophonte não está disposto exatamente a isso...

— Podíamos nos divertir... nós três – ele sugere.

— Quê? Eu, você e ele? – ela retruca, tentando parecer indignada, sem querer admitir que, no fundo, considera interessante a ideia.

— Por que não?

— Pelo amor de Deus! O que você fuma? Você está bem louco!

— Por que? Somos todos adultos… Se tiver consentimento dos três, não vejo problema.

— Melhor não! – June responde.

Quer sair correndo, se afastar de Belerophonte, voltar para casa, encher a cara  e chorar até o dia amanhecer, mas ao mesmo tempo quer pagar para ver aonde isso vai dar.

— Vamos ficar numa boa, certo? – ela diz. – Eu vou retocar a maquiagem e já volto.

Belerophonte aceita sem questionar, principalmente porque sente que ela está inclinada a ceder. Assim que June se afasta, Shun sai da pista e se aproxima dele.

— Eu entendo o que ela está fazendo… – diz o mais novo dos irmãos Amamiya. – Não vou dizer que estou gostando, mas se é o que ela quer… eu entendo. Apenas seja gentil com ela porque eu estou de olho.

— Não acho que ela esteja exatamente afim de gentileza… – Belerophonte diz, com um sorrisinho malicioso. – Muito pelo contrário.

Shun dá de ombros.

— Que seja, desde que você não faça nada que ela não queira…

Belerophonte acha engraçado esse modo de Shun ver as coisas e resolve contar o que realmente espera dessa noite.

— Sabe, eu sugeri a ela que podíamos ir nós três para um lugar mais tranquilo… Eu, você e ela… Tenho certeza que seria divertido.

Shun pensa se o que está nas entrelinhas dessa frase é realmente o que ele está entendendo.

— Um lugar mais tranquilo? – ele indaga, para ganhar tempo para pensar.

— É… um lugar mais reservado, sem essa música tão alta… Onde nós três poderíamos ficar à vontade e fazer o que der na telha, sabe?

— E o que foi que ela disse sobre isso?

— Tentou parecer indignada. Mas não foi convincente.

— Eu topo – ele resolve aceitar. Melhor estar junto para garantir que June fique segura e não faça nenhum tipo de loucura. – Se ela topar, eu topo.

Quando volta do banheiro, June custa a acreditar que Belerophonte e Shun conversam. Ela avalia a linguagem corporal dos dois, procurando algum sinal de animosidade, mas os dois parecem tranquilos.

— Meu Deus! – ela exclama, pensando se deve se aproximar ou sair correndo. – Será que esse inglês filho da puta fez aquela proposta suja ao Shun?!

A tentação é maior que o pudor, a raiva e o autocontrole, por isso ela resolve se aproximar.

— Sobre aquilo que eu propus… – Belerophonte começa antes mesmo de June dizer qualquer coisa.

— Eu topo se você topar – Shun completa, olhando para ela.

June não crê no que está ouvindo.

— Você é um pervertido maluco – ela diz, apontando para Belerophonte. Depois aponta para Shun. – E você está bêbado!

— Eu conheço você – Shun declara. – Sei que você quer... Que está tentada… E você nunca me disse, mas eu sempre soube que as coisas entre nós não eram exatamente como você gostaria… Eu sabia quando você fingia...

— Para com isso! – June grita. – Não vou ficar discutindo esses assuntos íntimos na frente de um estranho!

— Bom, se vocês resolverem, estarei esperando lá fora – Belerophonte diz, sorrindo triunfante, pois sabe muito bem qual seria a resposta dos dois. – E não se preocupem com a conta, vou pagar.

— Vamos tentar… – Shun fala para June quando Belerophonte se afasta. – Pode ser bom para nós… Pode ser um recomeço. E não quero você saindo sozinha com esse cara. Se eu estiver junto, vai ser mais seguro… Não vou deixar ele fazer nada que você não queira.

— Eu vou para a minha casa!! – ela grita novamente e sai pisando duro.

Shun vai atrás dela. Do lado de fora da boate, os dois veem Belerophonte  esperando, parado em frente a seu carro.

— Me fala que você realmente não quer e eu não vou insistir – Shun diz. – E vou deixá-la em casa, só para garantir que você vai ficar segura. Mas, se você só estiver com medo, saiba que eu vou estar lá…

— Por que diabos você está tão preocupado com a minha segurança?

— Por que amo você, ora essa.

— Ama? Mesmo depois de tudo que me disse hoje?

— Eu disse coisas duras… mas nunca disse que não amava você.

— Você quer isso? – ela pergunta, pensando que não foi à toa eles terem a ideia de ir à mesma boate. Se conhecem bem demais, por isso ele sabe que ela está morrendo de vontade e de medo ao mesmo tempo.. – Quer ir? Quer ver ele comigo?

— Eu quero participar...

— Então vamos – ela diz, dá a mão para Shun e os dois caminham em direção ao carro de Belerophonte.

Continua...

 


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Notas finais do capítulo

Eu volteeeei!

Até que estava conseguindo escrever com regularidade em janeiro e feveiro, mas março chegou e bagunçou tudo, fiquei doente, tive que trocar minha medicação do diabetes e acabei passando mal algumas semanas... Agora parece que as coisas estão entrando nos eixos novamente...

Está aí o cap novo! Finalmente decidi coisas sobre Shun e June nesse cap... só não xinguem muito! kkkkk

Como essa fic já tem onze anos, resolvi reescrever os primeiros capítulos. Devo postar o primeiro reescrito ainda hoje, , mas vai ser um processo lento, bem lento, muito lento mesmo...

Agora a fic que está mais atrasada é "Esperando o Fim" e pelo que me lembro deixei bastante coisa escrita, por isso acho que o capítulo não vai demorar. Talvez saia ainda no feriadão.

É isso!

Boa Páscoa, pessoal!

Chii



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