Moonlight escrita por nekohime_yami


Capítulo 1
Capítulo único




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Nas noites escuras, quando a Lua brilha alta no céu, as figuras de mantos e longos cabelos negros esvoaçando, com seus olhos de lobo brilhando na escuridão, rondam as florestas selvagens das montanhas do Wolverine como fantasmas.

São conhecidos como Wolverines, e não se sabe se a região lhes deu o nome ou se foi o contrário. Apesar de ninguém saber quem ou o que são, a gente das redondezas os respeita silenciosamente, recolhendo-se antes do sair da Lua e rezando em seu íntimo para que aqueles fantasmas da noite não lhes façam uma visita em seu eterno rondar pelas florestas do Wolverine.

Os habitantes da minúscula e quase totalmente isolada aldeia Moon Valley são diferentes das pessoas de outros lugares, e não costumam entrar em contato com estas além do estritamente necessário. Os Lunas, como são conhecidos, têm uma aparência mais selvagem, corpos delgados porém fortes e rostos belos de uma forma exótica, com olhos levemente puxados, em geral verdes, azuis ou dourados, como olhos de gato, orelhas levemente afiladas nas pontas, lábios cheios, rubros como que embebidos em sangue, e dentes brancos e afiados. Seus cabelos são lisos e finos, costumeiramente castanhos, cinzentos ou brancos, como pêlo de lobos. Aqueles que os vêm pela primeira vez ficam ao mesmo tempo chocados e maravilhados com suas exóticas beleza, sensualidade e leveza.

Ahren Wolfheart era diferente, mesmo dentre os Lunas. Fora encontrado ainda bebê às margens da aldeia e Vovó Kiba, a “bruxa” que vivia por ali desde tempos imemoriais (apesar de manter a mesma belíssima aparência de uma jovem de olhos verdes, cabelos prateados e curvas bastante acentuadas), o tomara para criar. Ahren tinha dezessete anos, longos cabelos lisos e negros, olhos amarelos como olhos de lobo, orelhas pontudas como os velhos elfos, pele clara como a Lua e traços mais suaves que os Lunas, o que de modo algum o tornava menos atraente, pelo contrário.  Sempre fora mais rápido, ágil, forte, instintivo, intuitivo e de mente e sentidos mais aguçados que os demais habitantes da aldeia, o que o excluíra de muitas brincadeiras e conversas. Mas ele não parecia incomodar-se com isto, tendo uma personalidade reservada e silenciosa, talvez fruto de sua convivência com a bela e misteriosa Vovó Kiba. Os dois juntos eram o mais belo e atraente mistério da por si só misteriosa Moon Valley.

Desde sua fundação, Moon Valley tem sido rondada de perto pelos Wolverines, um dos motivos pelos quais a aldeia não costuma receber muitos visitantes. Toda noite de Lua cheia é possível ouvir, somada aos uivos dos lobos selvagens, uma canção linda e arrepiante, cantada pelas vozes encantadas dos Wolverines. Nestas noites os Lunas recolhem-se mais cedo às suas casas, sonhando com Luas cheias e florestas verdes e selvagens.

Na casinha meio afastada onde Vovó Kiba vivia com Ahren as coisas eram bem diferentes. Nas noites de Lua cheia o rapaz ficava agitado, cada nota da canção dos Wolverines provocando uma nova onda de sensações que despertavam nele desejos que não entendia ao certo. Então ficava sentado à janela, olhando a Lua e ouvindo a canção encantada, deliciando-se com cada nova sensação que esta lhe provocava. Vovó Kiba, por sua vez, ficava como que alheia a tudo, mergulhada em lembranças tão antigas que nenhuma outra criatura viva além dela podia lembrar.

Ao nascer do Sol, quando este tomava da Lua o domínio dos céus e a canção dos Wolverines terminava, levando com ela sua magia e suas sensações, os Lunas acordavam de seus sonhos selvagens, Vovó Kiba estremecia e voltava à realidade e Ahren quedava-se onde estava, perdido, sem saber o que fazer agora que todas as sensações da canção encantada o haviam deixado.

Depois de uma destas noites mágicas, assim que Vovó Kiba acordara de suas lembranças, e enquanto Ahren se recuperava da perda das milhares de sensações, ela sentou-se ao lado deste, esperando que ele se recuperasse o suficiente para perceber a presença dela. Então Ahren estremeceu, e, percebendo a presença de Vovó Kiba a seu lado, virou-se para olhá-la com seus olhos de lobo. Sorriu.

- Bom dia.

- Bom dia. – respondeu ela, devolvendo o sorriso.

Quedaram-se os dois em silêncio, um olhando para o outro. Vovó Kiba parecia querer falar algo, mas não saber como começar. Ahren, percebendo isto, resolveu perguntar.

- Tem algo que queira me dizer?

Ao que ela baixou os olhos, como se em seu íntimo algo ainda relutasse a deixá-la responder. Então voltou a levantar os olhos, finalmente resolvendo-se.

- Sim. É algo que eu estava esperando o momento certo para contar. – olhou-o direto nos olhos – Acho que chegou a hora.

Ahren manteve o olhar dela, esperando-a continuar.

- Alguma vez você já se perguntou o porquê de eu, mesmo sendo mais velha que qualquer um, parecer mais jovem que a maioria?

Ele balançou a cabeça afirmativamente.

- O que você sabe sobre elfos?

- Bom, só que eles são muito bonitos, têm orelhas pontudas e não envelhecem... – parou, uma expressão de puro choque tomando conta de seu rosto. Vovó Kiba sorriu. – Você... – parecia incapaz de encontrar as palavras certas – Mas não é possível! Os elfos deixaram esta terra há muito tempo, não restou nenhum...!

Vovó Kiba sorriu, um sorriso de quem está à beira das lágrimas.

- Não restou nenhum... – a expressão em seu rosto era de partir o coração – Eu fui a única deixada para trás.

O choque no rosto de Ahren misturou-se à tristeza.

- Mas como...? Por quê?

- É uma longa história. – suspirou – Meu pai era Kael Tinúviel, o nome de minha mãe era Saphira. Vivíamos em paz, em nossas cidades nas florestas, antes de sermos forçados a ir embora. Na época eu tinha um amante, seu nome era Ahren Maglor. Nós nos amávamos e pretendíamos ter filhos no futuro. – lagrimas desceram pela face da elfa – Isso até o dia em que fomos atacados pelos humanos enlouquecidos pela vontade de matar. – enterrou os olhos nas mãos – Ahren foi morto bem na minha frente, e tivemos que fugir para os Portos... – à sua voz somou-se um tom agitado, como se revivesse aqueles momentos há muito esquecidos pelas efêmeras raças que agora habitavam aquela terra – Eu não conseguia parar de chorar... Tentei seguir a todos, mas me perdi em meio às florestas e me atrasei... Quando cheguei era tarde demais. Todos tinham ido embora. – parou de falar, respirando para acalmar-se – Não tinha mais para onde ir, então vim para cá, um dos poucos lugares onde não havia humanos.

- Desde então você mora aqui?

Vovó Kiba deu um sorriso triste, secando as lágrimas.

- Sim. – vendo a expressão triste no rosto de Ahren, sorriu tranqüilizadora. – Com o tempo, alguns humanos vieram.

- Foi o início de Moon Valley?

- Quase. – sorriu – Os humanos que vieram eram muito poucos para formar uma aldeia. O povo de Moon Valley é uma mistura desses humanos com os Wolverines.

- Os Lunas descendem dos Wolverines? – seu rosto expressava surpresa absoluta.

- Nunca se perguntou por que eles são tão diferentes dos outros humanos?

Ficaram em silêncio por algum tempo, até que uma pergunta, dentro das muitas que fervilhavam na mente de Ahren, subisse acima das outras e saísse boca afora.

- Afinal, o que são os Wolverines?

Uma pausa se seguiu, durante a qual um sorriso maroto espalhou-se pelos lábios de Vovó Kiba.

- Os Wolverines são uma raça antiga, só não tão antiga quanto os elfos. – pausou, mirando os olhos curiosos do rapaz – Na verdade eles são um cruzamento entre lobos e elfos.

Ahren franziu as sobrancelhas, sem entender.

- E como foi exatamente que isso aconteceu?

- Bom, os elfos vieram para cá e... – então ela compreendeu o sentido da pergunta, e começou a rir, uma risada clara e musical.

- O que foi? – surpreendera-se com a reação dela.

- Os lobos naquela época não eram como hoje em dia. Eles podiam tomar forma humana, e foi nessa forma que o cruzamento aconteceu.

- Os Wolverines já estavam aqui quando você chegou?

- Eles já estavam aqui desde muito antes de eu nascer. – sorriu – Creio que foram eles que nomearam a região, não o contrário.

- Como foi que eles escaparam do destino dos elfos?

- Os Wolverines sempre viveram nestas florestas. Não tinham cidades e não eram muitos. – sorriu – Os humanos simplesmente não conseguiram encontrá-los.

- Então como foi que os Lunas nasceram?

- Isso foi muito tempo depois. Os humanos que vieram depois eram pacíficos, e com o tempo os Wolverines sentiram-se seguros para se aproximarem, e chegaram até a ter filhos.

- Então por que os Lunas e os Wolverines voltaram a se afastar?

- Os Lunas eram muito... humanos. Os Wolverines não conseguiram ficar muito tempo entre eles. Tinham diferenças demais.

- Como eles são? Os Wolverines...

Vovó Kiba sorriu, como se achando graça na pergunta.

- Já se olhou no espelho?

- Mas o que isso tem...? – então compreensão expressou-se um seu rosto, misturando surpresa e choque – Eu sou um Wolverine? Mas então por quê...?

A elfa sorriu enigmática, retomando velhas lembranças.

- Os Wolverines têm vidas longas. Não tão longas quanto as dos elfos, porém muito mais longas que as dos humanos. – fez uma pausa, organizando os pensamentos – Quando cheguei aqui, há muito tempo atrás, encontrei-me com os Wolverines, que por algum tempo, até que eu me recuperasse e construísse esta casa, me acolheram entre eles. Conheci Maya, sua mãe, quando ela era apenas uma criança. – sorriu, imersa em lembranças felizes – Logo nos tornamos amigas, e dividíamos todos os nossos segredos. Vimos quando os humanos chegaram, e quando outros Wolverines sentiram-se atraídos e se relacionaram com eles. Vimos os Lunas surgirem, e Moon Valley ser construída. Toda noite, exceto na Lua cheia, quando os Wolverines cantam sua canção encantada, Maya vinha à minha casa e conversávamos até quase o amanhecer, quando Maya voltava para a floresta com os outros de sua raça. – suspirou – Há dezenove anos, Maya veio me contar que encontrara um companheiro entre os seus, e que pretendiam ter filhos. Dois anos depois, ela engravidou. Em nove meses nasceu um menino, que ela nomeou Ahren, a pedido meu. – olhou nos olhos do rapaz que a ouvia atentamente.

- Ela... não me quis? Por isso me abandonou?

- Não! Maya o amava, o queria mais que tudo nesse mundo, mas...

- Mas?

- Foi um acidente... – apoiou a cabeça nas mãos, sofrimento e tristeza estampados no rosto – Uma flecha envenenada acertou a ela e seu companheiro. Foram morrendo pouco a pouco, consumidos pela doença. Antes de morrer ela me deixou você, para que não me sentisse solitária sem ela... –fez uma pausa - Daí em diante você já conhece a história. – sorriu.

Ahren se manteve em silêncio, olhando nos olhos de Vovó Kiba como se esperasse ela dizer mais alguma coisa.

- Então, - suspirou – isso era tudo que eu tinha a lhe contar. – sorriu, olhando-o direto nos olhos – O que pretende fazer agora?

O rapaz levantou-se e se espreguiçou, como que acordando de uma bela noite de sono.

- O que mais poderia fazer? – olhou Vovó Kiba nos olhos e sorriu. – Vou fazer como minha mãe queria: ficar aqui e te fazer companhia.

Vovó Kiba explodiu então em outra de suas risadas claras e musicais, como o tilintar de sinos. Então parou, e sorriu.

- Sempre imprevisível, Ahren Wolfheart!

Deste dia em diante, ambos viveram juntos e felizes na cabana em Moon Valley, tiveram uma filha a que chamaram Yui e a linhagem continuou, sempre a fazer companhia à velha elfa, até o dia em que esta morreu.


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