I Must Be Dreaming escrita por requiem
Notas iniciais do capítulo
Baseada na música I Must Be Dreaming, do Evanescence
"Fique aqui, meu bem, e não saia por nada, ok?"
Foi a última coisa que ouviu antes da porta do armário se fechar. Ele sabia que algo estava errado, mas não sabia dizer o quê. Via a preocupação nos olhos claros da mãe, e o abraço que ela lhe dera parecera uma despedida.
Ouviu a porta da frente se abrir e fechar com força, e a voz do pai gritando injúrias. Ouvia os soluços e o choro da mãe, enquanto ela tentava se fazer ouvir inutilmente, e ouviu o som do tapa que a calara.
Seus pais brigavam e ele sequer sabia o porquê. Não conseguia distinguir o que o pai falava em altos berros, muito menos o que a mãe soluçava em prantos. Mas, então, tudo silenciou.
Abriu uma pequena fresta na porta do ármario, tentando ver o que acontecera. O pai estava em pé, no meio da sala, a gravata frouxa e os cabelos desgrenhados. E aos seus pés estava estirado o corpo de sua mãe, os cabelos louros espalhados pelo chão, e uma mancha vermelha se alastrando pelo carpete. Caído ao lado do corpo, uma faca com a lâmina manchada de rubro.
O pequeno ofego do garoto não passou despercebido pelos ouvidos do pai. Os olhos negros voltaram-se para o armário e viram pela pequena fresta os olhos assustados do garoto.
Um arrepio correu a espinha do menino quando os olhos se encontraram. E quando o pai começou a se aproximar do seu refúgio, ele deu passos hesitantes para trás, sem quebrar o contato visual. Ao sentir as costas encostarem na parede, só pôde esperar pelo seu destino.
"Devo estar sonhando..."
~x~
Vira a mãe ser arrastada sem cuidados até os fundos da casa, e vira seu túmulo ser escavado entre as rosas que ela tanto cuidava. Enquanto cavava e destruía o trabalhoso jardim, o pai recitava as palavras do plano perfeito para se manter o segredo.
As mentiras saím fluentes dos lábios do pai, mas o menino não prestava a atenção devida. Resgatara uma das rosas arrancadas da terra e a analisava minuciosamente. E quando um espinho lhe perfurou o dedo, tudo que ele fez foi observar o líquido vermelho se acumular no ferimento.
Sua atenção voltou-se para o pai quando ouviu o barulho seco do corpo da mãe atingindo o fundo da cova. Ao pensar que nunca mais veria o olhar bondoso e o balançar dos cabelos louros, seus olhos encheram-se de lágrimas. Mas ele jamais verteu aquelas lágrimas.
~x~
"Mamãe viajou, mês que vem ela volta."
Ele era obrigado a dizer isso sempre que lhe perguntavam da mãe. E mesmo que ele tivesse a verdade nos olhos, ninguém nunca prestava atenção. E a presença do pai o impedia de contar a alguém.
Os dias viraram meses, e ninguém desconfiou. Talvez achassem que um homem com o seu pai jamais faria aquilo com a própria esposa. E o garoto, a única testemunha, se retraía cada vez mais no seu próprio mundo. E ele vivia dividido. Uma parte de si queria contar a todos a verdade, enquanto a outra temia a ira do pai.
"Todos vivem e todos morrem, mas isso não começa a justificá-lo."
"Talvez não tenha sido o que pareceu, não tenha sido o que você pensa. Talvez ela tenha merecido."
"É somente na sua mente, não na vida real."
"Você está sonhando."
E ele se isolou na própria mente, sempre discutindo em silêncio o que deveria fazer. Mas nunca chegara a uma conclusão, e permaneceu silencioso, não mais respondendo às perguntas que lhe faziam.
E só quando ele parou de ir às aulas sentiram algo de errado. Desconfiaram da ausência da mãe, e foram conflitar o pai sobre isso. E o garoto assistiu os restos de sua mãe serem resgatados e o pai ser levado embora.
Nem mesmo quando decidiram seu destino ele se manifestou. E foi para o lugar branco sem esboçar reação, preso em sua mente.
"Está tudo na sua mente."
"Não na vida real."
"Eu devo estar sonhando."
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