Inner Outer Space escrita por matt


Capítulo 29
Fim


Notas iniciais do capítulo

"De que adiantou tudo aquilo, então?"



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                ...

                ...

                ...

                ... Quê?

                Preciso de tempo pra processar isso que está acontecendo agora. Kasumi... louca... Neth... desesperado... A... sobrecarregada... Eu... completamente sem reação.

                Todos nós vamos morrer.

                A Terra estava salva, mas minha reação humana inferior e egoísta a um evento tão absurdo, repentino e desesperador não me permitia pensar nisso. Teria caído de joelhos se A não estivesse prendendo meus braços. Meus olhos estavam sem foco. Minha mente também. Os ruídos da discussão entre irmãos, que começou mais uma vez, quase não passou pelos meus ouvidos.

                - O que houve com você, Jyhl?? – Neth perguntou baixo, com uma perceptível cólera em sua voz – Você... Minha irmã, do mesmo nível de superioridade que eu... Por quê...? Por que você sacrificaria toda informação de um universo? Por que você apagaria sem nenhuma hesitação registros de pontos remotos de galáxias distantes que levamos séculos para descobrir? Por que você destruiria o que é mais importante para todos nós?!!

                Kasumi o encarava, decidida. Já não estava mais presa pelo olhar do outro.

                - Matt poderia te perguntar a mesma coisa em relação à Terra, irmão.

                O alienígena emudeceu.

                - É muita presunção sua dizer que só o que está aqui é o que importa para o universo... – ela continuou – Por mais informados que estejamos, nós ainda não conhecemos os seus limites. Não exploramos nem um décimo do que pode existir. Ainda assim, o que nós conseguimos descobrir foi, sim, valioso. Mas por que, então, nós não guardamos tudo o que descobrimos? Você mesmo fez questão de destruir não apenas informações, mas planetas inteiros, porque eles “não nos pareceram úteis”. O que nós podemos dizer que é realmente útil, Neth? Somos apenas mais dois seres no infinito, que têm seus próprios pensamentos e ideais. Porém, mesmo que estes sejam os mais desenvolvidos que conhecemos, isso nunca nos daria o direito de interferir na existência de outros seres de maneira tão seletiva. Cada espécie tem o direito de coexistir com outras, superiores ou não. Se você quer eliminar os mais fracos, você só está nos rebaixando a seres realmente primitivos, perseguindo suas presas para conseguir alimento. Aliás, nem alimento nós temos, nesse caso, já que você simplesmente os elimina. Já pensou por esse lado, irmãozinho?

                Eu prestava atenção ao discurso de Kasumi, apesar do meu estado de choque. Neth, ainda contendo sua raiva, ouvia cada palavra como se fosse uma pontada no estômago.

                - O que eu estou fazendo aqui... – finalizou – não é pior do que o que você faria com a Terra se eu não o tivesse impedido. Você sacrificaria toda a VIDA da Terra; apagaria sem nenhuma hesitação VESTÍGIOS da existência do planeta; destruiria não só o que é importante, mas tudo o que “é”. Eu não posso mais permitir que você faça isso, Neth.

                - Senhor...  – disse A, alheia à discussão – O nível de energia da estrela está cada vez maior! O tempo estimado para consumir a barreira desta sala é de cinco minutos!

                - Você está sendo hipócrita agora, irmã... – Neth evitou desviar sua atenção – Ao destruir esta base, aniquilará com ela incontáveis seres de diferentes espécies acolhidas de todo o universo. Não se importa com a vida deles, também?

                - Você acha mesmo que eu sou igual a você nesse aspecto? – seu tom era sério, mas ela conseguia debochar dele ainda assim – Eu avisei a todos os outros seres do C.E.M. para fugir enquanto Matt estava “recolhendo a memória da Ana”. O sistema de comunicação em massa via eletromagnetismo do SPIPA veio bem a calhar ali. Neste momento, nós quatr... Nós três somos as únicas formas de vida em toda a base.

                - Jyhl... – Neth não mudava sua expressão – Você teve inúmeras oportunidades de me impedir, mas não o fez. Então, por que agora? Por que foi esse terráqueo que a fez mudar de ideia?

                - Porque os sentimentos que eu adquiri por ele me fizeram perceber o quanto cada parte ínfima do universo é importante, irmão. Porque os desejos dele e de todos os terráqueos, de todos os outros seres, agora importam para mim.

                Ela se virou, olhando para mim com ternura:

                – Porque agora, para mim, você é o ser mais importante do universo, Me-kun.

                De repente, meu desespero absoluto deu lugar a uma estranha tranquilidade. O olhar de Kasumi transmitia toda a paz de que eu precisava. Eu desconsiderei o fato de que eu poderia morrer ali, consumido por uma estrela recém-nascida, junto com todas as informações de uma parte desenvolvida do universo. Se ela estivesse ali comigo, eu não me importaria.

                No entanto, eu acho que fiquei realmente em paz porque passei a acreditar que ela simplesmente não deixaria isso acontecer.

                Kasumi se aproximou lentamente de mim, como que se preparando para me abraçar. Chegou a contornar meu pescoço com os braços. Porém, seu alvo real era A, que ainda me segurava por trás. Com um toque rápido em sua testa, a andróide me largou e caiu desacordada no chão.

                - ...Você podia desativá-la assim desde o começo? – perguntei.

                - Eu não a desativei, isso é apenas temporário! Vamos, Me-kun, rápido! – segurou minha mão, me puxando para fora da grande sala.

                - Jyhl!! – Neth gritou, ainda no mesmo canto – Onde você pensa que vai?

                - “Ora”, não é óbvio, irmãozinho? Vou salvar o Matt!

                - O que te faz pensar que eu permitirei? Eu não concordei com...

                - Neth, cala a boca!! – gritei, ao que os dois olharam para mim perplexos, Kasumi prendendo o riso – Sua irmã é muito forte e bem mais esperta que você! Aja como o perdedor que você é!

                - Ora, seu verme insolente... – ele começou, vindo em nossa direção, mas foi interrompido pela irmã, que o paralisou num estado semelhante ao que ela mesma se encontrava há pouco tempo.

                - Sinto dizer, irmão, mas ele tem razão. Você perdeu.

                Ela o soltou, fazendo-o cair sentado no carpete que cobria o chão.

                - Agora por favor... – ela deixou sua forma natural prateada, voltando ao familiar cabelo ruivo, uniforme escolar e feições terráqueas – Pare de agir como um idiota e me deixe fazer o que eu quero, tá?

                - Jyhl... – pela primeira vez, Neth ficou sem palavras.

                - ...Anda, Me-kun! – Kasumi exclamou, me puxando mais uma vez, agora para cima do disco que usamos para chegar à sala – Se A estava certa, nós só temos mais alguns minutos até que a barreira do C.E.M. não aguente mais o calor.

                O corredor metálico se movia ao nosso redor. Neth já não podia mais ser visto.

                - E como nós vamos sair daqui tão rápido? – eu já estava em plena consciência, apesar dos recentes choques – Não foi em “alguns minutos” que nós subimos até esse andar...

                - Sim, o elevador não era tão rápido assim – ela disse, enquanto o fim do corredor se aproximava – Mas nós temos uma alternativa muito simples.

                - ...Qual?

                Ela correu para a parede transparente do elevador, no final do corredor. Dali, olhou para baixo. Cheguei perto dela, imaginando quais seriam suas intenções.

                - Ahn, isso é mais alto do que eu imaginei... – disse, enquanto colocava as mãos na parede. Seu olhar perdeu o foco mais uma vez.

                - Ah, não, não me diga que você vai sumir com essa parede e nós vamos...

                - Claro que não, Me-kun! – seus olhos voltaram ao normal.

                - Ah, ufa...

                - Não dá pra “sumir” com a parede, então eu fiz uma pequena escultura de vidro com ela! – e exibiu uma construção disforme, que logo em seguida atirou para fora do elevador – Mas nós vamos pular, sim!

                Antes que eu pudesse protestar, ela me puxou para fora do elevador.

                E caímos.

                - Weeee!! – Kasumi gritava, enquanto sentia o vento passar por seu rosto.

                - Wee, o caramba! A gente vai se espatifar no chão!

                - Ah, Me-kun, você não consegue deixar de ser chato por um instante? A gente ainda tá longe, aproveite a queda!

                “Eu sempre quis pular de paraquedas, mas isto é ridículo.”

                Como eu consegui pensar isso em queda livre, não faço ideia. Mas olhei para Kasumi, que ria. Aquilo, mais uma vez, me deixou relativamente calmo.

                - Vem comigo! – ela gritou, enquanto voava em minha direção e me levava para cima. Estranhei imensamente quando ela o fez, mas então me lembrei da turbina que ela tinha nas costas. Eu realmente não tinha motivos pra me desesperar na queda, afinal.

                Voamos em um loop, para depois chegarmos perto da forma vermelha no centro do grande cilindro. Era indescritivelmente maior do que parecia vista do elevador. E por incrível que pareça, aquilo era mesmo líquido. Um líquido vermelho-metálico disforme flutuando no meio de um hall gigantesco sendo tocado por mim e por uma alienígena risonha que voa. Não podia ser mais aleatório.

                Mas foi o momento mais divertido que nós tivemos.

                - Vamos descer logo, Me-kun, estamos sem tempo.

                - Ok.

                Kasumi forçou a turbina a nos impulsionar para baixo. Chegamos ao chão em alguns segundos, quando ela virou para cima a fim de evitar o choque. Aterrissamos suavemente. Aquele hall vazio era particularmente assustador, agora que eu parava pra analisar.

                - Agora... por ali – ela indicou a porta que dava para o hangar. Era o mesmo por onde chegamos à base. Inclusive, a nave que ela criou ainda estava lá. Eu não tinha visto o ambiente completo quando chegamos, mas a saída era aberta para o espaço, protegida apenas por uma espécie de campo de força.

                - Nós vamos voltar para a Terra pela mesma nave, Kasumi?

                - ... – ela olhava em silêncio para a nave.

                - Kasumi?

                - Ah! É, sim, na mesma nave...

                - O que foi?

                - Nada não, Me-kun, eu estou bem. Vamos.

                Estava estampado na cara dela que ela não estava bem. Mas não havia nada que eu pudesse fazer ali. Ou se havia, não tínhamos tempo pra isso. Uma estrela estava prestes a consumir a base, afinal.

                A escada se abriu da nave quando nos aproximamos. Kasumi ia subindo na frente, com um sorriso forçado, quando eu perguntei:

                - Você está triste por deixar seu irmão aí, não é?

                Ela parou.

                - Na verdade, Me-kun... Eu estou relutante pelo que eu sei que ele vai fazer agora.

                - Ele vai...?

                De repente, Kasumi jogou-se ao chão, bem à minha frente.

                - Kasumi!!! – corri para socorrê-la – O que foi isso?!

                - Foi ele... – indicou com a cabeça a porta de entrada do hangar. Neth estava ali, com a mão estendida na direção da irmã.

                - !*¬$&#&¢*¬#@! – ele exclamou, na própria língua. Parecia estar fora de si, e não trajava o SPIPA sobre a cabeça.

                - Solta ela, seu desgraçado!! – corri na direção dele, sem pensar. Ele me parou no meio do caminho, com a mesma força que usou contra Kasumi.

                - ##$%$!! #$*£¨$#@!!! – olhava para mim, com evidente desprezo e fúria. Enquanto se aproximava, eu imaginei que estivesse perto de morrer. Eu não podia fazer nada contra a força daquele ser.

                - ###¬££££££!!! – outra voz veio do outro lado. Era Kasumi, que estendeu sua mão para o irmão. Este caiu no chão e ali ficou, enquanto a força que agia sobre mim desapareceu.

                - Me-kun!! – ela gritou, com a mão ainda estendida – Venha pra nave, rápido!!

                Corri para onde estávamos antes. Ela segurava o irmão com uma força tremenda. Era visível, já que ela ofegava.

                - Kasumi! Você está se desgastando com isso! Vamos embora logo! – exclamei, me preparando para subir as escadas.

                - Eu... não posso, Me-kun.

                - ...O quê?

                - Neth ainda não aceitou que as nossas espécies... Que nós fiquemos juntos. Ele quer te matar a qualquer custo, já que me convencer não é possível. Eu preciso segurá-lo aqui. Se eu não o fizer, ele vai destruir a nave com você dentro!

                - Não, você não pode ficar! A base vai ser destruída!

                - Eu sei... Mas é como eu te disse, Me-kun...

                Ela momentaneamente se desprendeu da força que exercia e se aproximou de mim.

                - Você é o ser mais importante do universo pra mim. Então você é minha prioridade.

                Ela terminou com um beijo. O beijo mais triste que eu já recebi, e ao mesmo tempo, o mais emocionante. Um beijo de despedida. Seus braços passaram uma última vez pelo meu pescoço, me envolvendo num abraço.

                Então era isso...? Ela sabia que isso ia acontecer desde o começo?

                - Kasumi... Não... Isso, não...!

                - Eu vou conversar com ele enquanto estivermos vivos, e o farei entender...

                - Pra quê?! Você precisa viver também!!

                - Sobreviva, ok?...

                - Não, eu não quero!! Não sem você...!!

                - Eu te amo...

                - Não, Kasumi, por favor!! Eu morro com você!!! Não me deixe sozinho, por favor!!!!!

                Ela sorriu.

                Eu chorei.

                Um flash saiu de seus olhos.

                Neth começou a se levantar.

                Eu comecei a andar.

 

                Kasumi ficou.

 

                A nave decolou.

                Ainda pude ver, pela janela, a estrela que nascia no lugar do Centro de Entendimento Máximo. A nebulosa que cobria o lugar. O espaço.

                Eu não desmaiei. Fui apenas obrigado a aguentar a despedida.

                Mas o efeito terminou.

                E eu me desesperei.

                E sofri.

                E sofrerei ainda mais.

                A Terra estava intacta.

                As pessoas estavam vivas.

                Mas Kasumi não estava mais lá.

                De que adiantou tudo aquilo, então?

                De que adiantou, se ela sabia que não teria mais sentido pra mim?

                KZM-8230147J...

                Jyhl...

                ...Kasumi...          

 

 

 

                ...Por quê?

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


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Notas finais do capítulo

Enfim, um capítulo... Que pode significar a minha morte ._.
Mas por favor, não me matem! IOS ainda não acabou! É sério! X_X
Aguentem um pouco mais, e eu tento fazer valer a pena...

Desculpem a demora, e desculpem o capítulo também. Eu realmente odiei escrever o final dele... Mas era o que tinha que acontecer. Ainda tem história, tá? ç_ç