Os Pássaros não Voam escrita por Eica


Capítulo 15
Capítulo 15


Notas iniciais do capítulo

Agradecimentos especiais a todos os leitores que acompanharam a fic durante estes meses de postagens demoradas. Meus sinceros agradecimentos a todos vocês.
A fanfic chega ao seu fim neste último capítulo, por isso é aqui que me despeço com muitas lágrimas nos olhos.
Até!



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O mundo, que antes estava silencioso, agora tocava uma música mortificante. Jodi bem que pediu, bem que implorou para voltar para casa, para ter notícias de Tomas, no entanto seu tio não o deixou.

- Quero falar com Ivete! Quero saber o que aconteceu! – pediu ele, de olhos molhados.

- De que adianta agora? Deixe que eu falo com o seu pai.

- Por que eu não posso? – disse, aumentando o tom de voz.

- Está muito abalado. Deixe que eu falo.

            Neste dia, Jodi não chegou a ir ao médico. Seu tio não o levou. Deixou que ele ficasse em casa. O psicológico do menino estava super abalado. Nunca Jodi chorou tanto em sua vida. Deitado em sua cama, relembrou de momentos com Tomas e isto fê-lo chorar ainda mais. Agora Jodi sentia-se incompleto. Arrancaram uma parte do seu coração. A dor era pior por não poder voltar para casa para ter respostas. Queria ter certeza de que se tratava de Tomas. Queria ter certeza de que havia mesmo morrido. No entanto, de que adiantaria ter todas as respostas se jamais acreditará nelas?

Para ele a morte de Tomas era mentira. Com sua morte, sua esperança morreu. A bem da verdade é que não havia mais vida em Jodi. Sua alma estava partida. Foi quebrada da maneira mais cruel.

Passado o primeiro dia da notícia, o rapaz não dormiu um minuto. No dia seguinte a este, também não dormiu e nem comeu. No terceiro dia, seu tio entrou em seu quarto e disse:

- Conversei com o seu pai. Ele e sua mãe foram ao IML para reconhecer o corpo de Tomas.

            Jodi, que estava deitado em sua cama, virou o rosto para fitar o tio. Seus olhos conservavam-se vermelhos e inchados. Foi deixado sozinho. Ele ficou em seu quarto depois que o tio saiu para trabalhar. Fechou os olhos e lutou contra a alma inquieta.

- JODI!

            O rapaz abriu os olhos e virou o rosto de leve.

- JODI!

            Jodi levantou o tronco e ficou quieto. O grito se repetiu. Por um momento, o rapaz achou que estivesse delirando. Com bastante esforço saiu de cima da cama e sentou na cadeira de rodas. Quando saia do quarto, ouviu novamente chamarei seu nome. Girou as rodas da cadeira com pressa. Atravessou o corredor e chegou à sala.

- JODI! ESTÁ AÍ? – ouviu-se a voz.

            O rapaz abriu a porta e quase desmaiou quando viu quem estava na calçada. Não conseguiu segurar o choro. Atrás do portão estava um jovem vestido de jeans e uma camisa branca. Os pés estavam nus. Os cabelos longos e castanhos estavam totalmente bagunçados.

- Não... Acredito... – disse Jodi, enxugando as lágrimas.

- Fiz você esperar muito? – disse Tomas. – Desculpe se demorei. Aconteceram tantas coisas...

            Jodi foi até o portão e, como um desesperado, agarrou a camisa de Tomas. O rapaz teve que agachar em frente a ele e, depois de tanto tempo, seus lábios se tocaram. Jodi deu milhares de beijos em Tomas. Beijou-o nas bochechas, nos lábios, na testa... Em todos os lugares que conseguiu.

- Achei que estivesse morto! – disse o menor, chorando. – Eu vi na televisão que acharam seu corpo... Eles acharam...

- Que?

- Tinha sua mochila, seus documentos...

- Fui roubado quando vinha pra cá.

            De repente aquela dor no peito de Jodi desapareceu completamente e um alívio e alegria tomaram conta de sua alma.

- Vi seu tio sair com o carro. Tive que esperar um momento pra poder te chamar. Você está bem?

- Agora sim! Agora sim!

            Tocaram um no rosto do outro e se beijaram de novo.

- Pode abrir o portão?

- Não tenho a chave. – respondeu Jodi.

            Tomas afastou-se de Jodi e analisou o portão. Ele não era alto e seu design era reto, sem pontas, curvas ou distâncias muito estreitas. Depois de um tempinho, o rapaz subiu o portão e conseguiu passar para o outro lado. Após saltar para a garagem, Jodi agarrou-o num abraço apertadíssimo. Beijou-o mais do que na primeira vez.

- Por que está tremendo? – perguntou Tomas, pegando na mão de Jodi.

- Estou muito feliz. – disse Jodi, dando um lindo sorriso.

            Recebeu um beijo carinhoso de Tomas, depois entrou na sala com ele.

- Estou morrendo de fome. Há algo que eu possa comer?

            Jodi levou-o para a cozinha. Abriu a geladeira e encontrou um pote com arroz e outro com feijão.

- Esquente isso no microondas.

            Tomas encontrou pratos e talheres no armário. Pegou um prato e um garfo. Jodi também tirou da geladeira um pedaço de torta e uma garrafa de refrigerante.

- Quando te roubaram... – perguntou Jodi, de repente. – Não te fizeram mal, fizeram? Bateram em você ou...

- Nada. Não fizeram nada. Tive sorte, eu acho. Mas fiquei sem dinheiro.

            Após esquentar a comida, Tomas sentou-se na mesa da cozinha para comer. Jodi ficou do seu lado afagando seus cabelos. De repente, o mais novo chorou.

- Não fique assim. – disse o mais velho. – Estou aqui, não?

- Eu sei. É por isso que estou chorando. Não acreditei quando disseram que estava morto e não consigo acreditar que está aqui porque é bom demais!

            Tomas sorriu. Jodi tentou controlar o coração e deixou que Tomas comesse em paz. Mais tarde, depois da refeição, Tomas andou pela casa com Jodi.

- Seu tio vai demorar muito?

- Foi trabalhar. Vai chegar tarde.

            Uma pausa.

- Fale pra mim: como vamos sair daqui?

            Tomas olhou para ele.

- Só precisaremos da chave do portão. O resto já está resolvido.

- Como? – indagou o outro, sentindo grande ansiedade e alívio.

- Não sabe se seu tio tem uma cópia da chave?

- Não sei, mas não custa nada procurar.

            Foram para o quarto do tio de Jodi. Sem fazer bagunça, vasculharam nas gavetas do guarda-roupa, das cômodas, dos criados-mudos. Nada. Nenhuma chave.

- E agora? – indagou Jodi.

            Tomas não respondeu. Refletiu.

- Se não acharmos uma chave, terei que arrombar o cadeado. Só assim pra podermos sair.

            Naquele momento, Jodi analisou Tomas.

- Que foi? – perguntou o mais velho.

- Você está todo sujo.

- E mal cheiroso também. Eu sei. – sorriu de lado. – A única vez em que tomei banho durante a viagem até aqui foi quando levei chuva.

            Jodi riu. Chamou Tomas para acompanhá-lo. Levou-o ao banheiro. Fechou a porta depois de o rapaz entrar.

- Aproveite para tomar banho. – disse, com um sorriso. – Prometo não olhar.

            Tomas permaneceu parado por um momento, olhando aquele rosto lindo. Depois despiu a camisa. Em seguida despiu o jeans. Depois a cueca. Foi para trás do Box e ligou o chuveiro. A água estava na temperatura certa. Como o Box era de vidro pontilhado, Jodi pôde ver as curvas de Tomas.

- Não vai se importar de ficar nu até sua roupa ser lavada, não é? – disse Jodi, sorrindo.

            Tomas abriu a porta do Box e lançou um olhar que fez Jodi rir. Depois que tomou banho, abriu o Box e recebeu uma toalha de Jodi. Se secou e enrolou a toalha na cintura. Saiu do banheiro e acompanhou Jodi até a área de serviço. Ali o rapaz colocou a roupa do outro para lavar.

- Vai dar tempo de secar? – perguntou Tomas.

- Meu tio tem secadora.

- Oh.

            Dali foram para o quarto de Jodi. Tomas sentou-se na beirada da cama e Jodi ficou de frente para ele.

- O que tem feito aqui?

- Nada. Eu só pensava em você.

            Se encararam. Tomas inclinou o corpo e beijou Jodi. O mais velho deitou o rapaz na cama e depois descansou a cabeça em seu ombro. Jodi acariciou sua nuca e permaneceram abraçados durante o final da tarde.

            Antes das sete, Tomas já estava vestido novamente. Agora suas roupas cheiravam a amaciante. Tornou a deitar com Jodi na cama. Houve um momento em que Jodi ouviu barulho do outro lado da porta.

- Acho que meu tio voltou.

            Tomas foi rápido: saltou de cima da cama e foi para baixo dela. O tio de Jodi apareceu dois minutos depois.

- Tudo bem?

- Tudo.

- Farei a janta. Está com fome?

- Estou. – mentiu o rapaz.

            O homem deu-lhe um sorriso e saiu do quarto fechando a porta.

- Vai agüentar ficar aí embaixo? – disse Jodi, baixinho.

- Andei quilômetros por você. Ficar debaixo de uma cama não é nada pra mim.

            Jodi adorou a resposta e alargou mais o sorriso.

            Mais tarde, quando o tio terminou de fazer a janta, Jodi pediu que ele trouxesse sua comida no quarto. No momento em que ficou sozinho, Tomas saiu debaixo da cama e pegou o prato do rapaz.

- Não vai comer mesmo?- perguntou.

- Não, pode comer.

            De madrugada, Jodi não conseguiu dormir por causa da felicidade. Contudo, permitiu que Tomas – deitado do seu lado na cama – descansasse tudo o que não pôde descansar em sua viagem.

            No dia seguinte, depois que seu tio foi ao trabalho, ele e Tomas fizeram suas malas. Depois Tomas fez uma estranha ligação que deixou Jodi muito curioso. Em seguida procuraram por algo forte e pesado para arrombar o cadeado. No quintal da casa, Tomas encontrou um martelo pesado e uma chave de fenda. Com isso, conseguiu abrir o cadeado dando-lhe uma pancada bem firme. Jodi colocou uma das suas malas – a pequena – sobre seu colo e a outra Tomas carregou nas costas. Atravessaram o portão da casa e se foram.

- E agora?

- Sabe o caminho para a rodoviária? – indagou Tomas, quando estavam na esquina.

- Faz tempo que não venho a esta cidade, mas acho que me lembro sim.

            Naquele instante, um carro parou em frente aos rapazes e um homem saiu de dentro do automóvel.

- Jodi? Para onde está indo?

            Era o amigo de seu tio.

- Por favor, não nos impeça! – pediu Jodi, sentindo um pouco de apreensão.

            O homem encarou Tomas. Depois olhou para o outro rapaz.

- Está fugindo da casa de seu tio?

- Vamos indo, Tom. – pediu o rapaz.

            No momento em que Tomas moveu a cadeira de rodas, o homem a sua frente os parou.

- Diga-me, Jodi. Falei que pode confiar em mim. Para onde estão indo? Talvez eu possa ajudar.

- Desculpe, mas como posso confiar em você? – disse Jodi.

            Após uma pausa, o homem respondeu:

- Digamos que não somos tão diferentes.

            Jodi analisou o homem e sua expressão. Não sabia se podia confiar nele. Já Tomas, disse que precisavam chegar à rodoviária, e ainda ameaçou o homem para que não fizesse mal a Jodi. Para alívio dos rapazes, Roberto levou-os exatamente à rodoviária e ajudou Tomas a tirar a cadeira de rodas de Jodi do porta-malas.

- Não conte ao meu pai e nem ao meu tio que nos trouxe para cá. – pediu Jodi.

            Roberto olhou para ele e disse:

- Te garanto que não vou dizer. Boa sorte aos dois.

- Obrigado. – disseram os meninos.

            Com as malas nas mãos, Tomas e Jodi ficaram na calçada e se despediram de Roberto.

- Quem estamos esperando? – perguntou Jodi, quando já estava sozinho com Tomas.

            Antes que Tomas pudesse responder, uma caminhonete vermelha apareceu na rua buzinando e parou em frente aos meninos.

- Quem é?

- A irmã de Ivete. – disse Tomas, sorrindo. - Clarice.

            A mulher, de cabelos cacheados e um tanto cheinha, saiu de dentro da caminhonete e abraçou os dois rapazes.

- Que bom que conseguiu encontrar Jodi. Você é Jodi? Como está? Está tudo bem?

- Sim, está.

            Um homem de bigode – e tão gordo quanto Clarice – também desceu da caminhonete e se apresentou como Rogério. Cumprimentou os dois rapazes e convidou-os a subir na caminhonete. Tomas ajudou Jodi a se sentar na caçamba e desmontou sua cadeira. Depois ele subiu na caminhonete recolhendo as malas que Rogério lhe passou.

            A viagem iniciou-se. Jodi só tranqüilizou-se completamente quando eles saíram da cidade.

- Para onde estamos indo? – perguntou a Tomas.

- Para a fazenda de Clarice. Ficaremos lá.

- Hm.

            O menor sorriu de repente. Olhou para Tomas com ternura e beijou-lhe. Em seguida olhou para o céu azul. As nuvens estavam bem altas hoje. Tal como seu espírito em elevação. A paisagem ao redor deles já se tornara campesino. Os campos verdes ladeavam a estrada. Há poucos metros deles um grupo de centenas de pássaros levantou vôo ao mesmo tempo e voou na mesma direção em que a caminhonete seguia. Jodi sentiu imensa liberdade. Apreciou a vista e ficou extremamente feliz. Naquele momento, ele não teve dúvidas: os pássaros podem voar.


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