Faz três anos. Três anos que ela partiu. Partiu sozinha e eu fiquei com uma companhia. Totalmente injusto. Uma pequena companhia, mas de grande importância. Uma parte dela se foi e a outra ficou aqui comigo. A nossa pequena Anne. Nossa. Olhei para a pequena que segurava minha mão. Tão parecida com a mãe. Tão parecida que chegava a me assustar. Cabelos castanhos e cacheados, os olhos castanhos e o sorriso dela. A única coisa que eu podia dizer que Anne tinha de mim, era o tom de pele. Pálida, mas isso a fazia ficar mais bonita ainda.

            Tinha a curiosidade da mãe, a teimosia do pai e o nosso jeito cabeça dura de ser. Uma perfeita combinação. Meus olhos voltaram para a lápide e vi as fotos dela. Era a mais animada de todo cemitério fúnebre.

            Tinha fotos fixas na pedra. Dela bebê, ela com a família, ela e o ‘mano’ dela, nossa e dela. Nosso casamento, ela grávida e nós três. Anne tinha apenas seis meses quando perdemos ela. Agora ela tem quatro.

            Parece que foi ontem que ela falou ‘sim’, e que na mesma hora falou que estava grávida e que era uma menina. Mas agora ela não falaria mais nada. Nenhum “eu te amo loiro” ou “durma bem pequena”, nunca mais. Ela não viu Anne dar os primeiros passos, nem dizer as primeiras palavras. Não viu Anne aprender a andar de bicicleta, nem gritar por causa dos pesadelos. Ela não saberia que a primeira palavra dela foi “rosa” e que a primeira pergunta dela foi “Pai, cadê a mamãe?”.

            Não agüentei. Eu sabia que nesta hora eu tinha que ser forte. Por ela, por nós. Comecei a chorar. Merlin, por que ela tinha que partir? Deixar a mim, a família, a nossa família? Rose, eu ti amo tanto! Senti uma mão apertar-me. As vezes eu perdia a cabeça e queria morrer, apenas para ficar ao lado dela. Mas então, a ficha caia e eu me lembrava por quem eu vivia. Pela dona daquela mão. Pela dona da outra parte do meu coração. Pela minha filha, nosso amor.

- Pai? – chamou-me Anne. Me virei para ela e vi aqueles olhos castanhos. Sorri. Elas eram as únicas que me faziam sorrir apenas com o olhar.

- Vamos. – disse me levantando e saindo dali com ela.

            Tinha um motivo para viver. Tinha por quem viver. Tinha ela. Minha Anne. Meu amor. Sorri. Rose sempre estará comigo e Anne é uma prova disso. Olhei para a lápide. Anne parou de andar e se virou também.

- Tchau mamãe. – disse ela acenando para o tumulo. Sorri.

            Ela estaria ali. Ela está comigo, conosco. A minha rosa. Minha morena. O meu amor.

FIM