Fly Away From Here escrita por FullMetal Chibi


Capítulo 1
One Shot




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Fly away from here.

            Estella era uma garota muito bonita. Tinha cabelos castanhos claro e curtos, brilhantes; olhos verdes como o oceano. A pele pálida a entregava uma aparência quase fantasmagórica; mas isso a deixava diferente. Ela tinha uma beleza exótica. Meiga, delicada, divertida, alegre. As melhores características eram encontradas nela; e possuía apenas um defeito.

Estella tinha problemas de saúde.

            Quase diariamente ia para o hospital; por uma falha respiratória ou algo assim. Saía ilesa; sempre. E ela só tinha 14 anos. Ainda estudava em um colégio no interior de São Paulo, com seus amigos e inimigos, como uma pessoa normal. Não tinha muitos amigos, já havia decidido que não iria ter amizades até morrer. Não queria ser lembrada. Não queria que os outros sofressem.

            Por este motivo, era a pessoa mais isolada do colégio. Menos por ele.

            Matthew era seu amigo de infância. Os cabelos são, eram e sempre serão castanhos e rebeldes; e os olhos azuis. Sabia de todos os seus problemas, sabia de todas as dificuldades que encontraria, sabia do que poderia acontecer. Mas ele simplesmente não a deixava. Diversas vezes Matthew salvou sua vida. Carregou-a para o hospital inúmeras vezes, jamais a abandonou na vida. Jamais.

            Ele estava vindo a buscar no hospital, ela esperava na porta do mesmo. Estava sentada no chão, vestindo a calça jeans e a camiseta branca que sempre usava. Era seu estilo de roupa. Fechava os olhos para sentir o vento bater em seu rosto, e depois os abria levemente para procurar por Matt. Repetiu diversas vezes, antes que ele pudesse chegar.

            - Stell! Tudo bem, aí? Não aconteceu nada?

            - Não, estou inteira. – ela sorriu, tranqüilizando-o. – Foi como exame de rotina.

            - Pra você! Quer me matar de susto? – Ele a ajudou a levantar; e ela se emburrou com o comentário.

            - Devia saber disso, já. Sabe que eu vou morrer. – murmurou, fazendo biquinho.

            - Mas eu vou cuidar de você até lá! – e tocou sua testa com o dedo indicador – Venha, vamos pra casa.

            Os pais de Estella e Matthew haviam morrido fazia muito tempo; desde então eles viviam juntos. Ao contrário de várias pessoas, eles tinham respeito um pelo outro; portanto não haviam cometido nenhum ato pervertido. Viviam da herança deixada pelos pais de Matthew, já que eles eram ricos. Tomavam o cuidado de não gastar muito, por ser tudo que eles tinham.

            A casa era repleta de remédios, completamente limpa e organizada. Tudo devia estar bonito, para que Estella conseguisse encontrar todos os seus remédios; e outras coisas. Matthew tomava esse cuidado por ela, organizando todos em ordem alfabética. Mas ela também zelava por ele. Não era muito carente, nem muito carinhosa, tentava ser o mais fria possível; para que ele sofresse menos. Mesmo que isso acabasse se tornando um fardo para ele.

            Foi em um domingo que tudo começou a dar errado. Estavam sentados no sofá, assistindo a um filme. Estella acabou deitando no colo de Matthew e dormindo. Ele acariciava sua cabeça e enrolava seus cabelos; nem se importava mais com a televisão. Os olhos da garota abriram-se lentamente, e seu rosto tornou-se rubro quando ela notou onde estava. Pulou para fora do sofá muito rapidamente; sentiu o mundo girar e caiu no chão. Sua última visão foi os olhos de Matthew, e seu toque a segurando.

Domingo.

            Já haviam a levado para o hospital; respirava por aparelhos. Seu edema pulmonar tinha piorado bruscamente, portanto ela ficaria em coma por tempo indeterminado. O quarto do hospital era memorável; 18. O dia em que ela nascera. Ele adentrou o recinto; e chocou-se com a cena. Não queria vê-la naquele estado. Sentou-se na poltrona ao lado da cama, e segurou a mão de Estella.

            - É… oi. Bom… se puder me escutar, me escute. – estava nervoso. Iria falar com alguém em coma. – Espero que melhore, sabe? Vou vir te visitar todos os dias. E trazer flores… Está vendo aquele vaso? Ah! Esquece. Todos os dias irei colocar uma nova flor para você. A sua preferida é jasmim, certo? E… melhore logo, ouviu bem? Ou vou te perseguir. – ele forçou uma risadinha. – T… Tenho que ir. Lembra-se; escola? Queria que você não tivesse freqüentado aquele lugar horrível. Ninguém falava com você, apesar de ser a melhor pessoa desse mundo. Me… me desculpe por isso, viu? É tudo culpa minha… É tudo… - ele se esforçava para conter as lágrimas. Levantou-se subitamente, empurrando a poltrona para trás. – Amanhã eu volto, certo? – e saiu.

Segunda-feira.

            Novamente, Matthew estava na porta do quarto, segurando uma jasmim branca como a neve.  Sustentava um sorriso um tanto quanto bobo, enquanto voltava a se sentar na poltrona. Passou a mão sobre o cabelo, e deu uma risadinha.

            - Sabe, é irônico. Agora, todos na escola estão preocupados com você. Me perguntaram várias coisas; eu só disse que você estava doente e não podia ir pra aula. Você consegue que as pessoas se preocupem com você mesmo sendo fria. Por isso que eu gosto de você, sabe? As pessoas gostam de você pelo que você é. Não pelo que você tem. Então… o que acha de melhorar, para que assim possamos construir um futuro diferente? Tudo vai melhorar, Estella. Tudo. - Ele passou a mão sobre o rosto da garota; seus olhos continuavam fechados. Ela não deu nenhum sinal de vida. – Agora tenho que ir… De novo. É melhor que você não se vá. – piscou forte; e saiu do quarto correndo.

Terça-feira.

            Desta vez, diferente de todas as outras vezes, o mundo tinha caído. Chovia como jamais tinha chovido antes. As ruas estavam alagadas, e o rio ameaçava transbordar. Ele torceu as roupas no corpo mesmo, e adentrou o quarto ainda pingando. Ficou em pé, pelo medo de molhar algo além do chão. Já tinha colocado a jasmim nova no vaso.

            - Oi, de novo. Hum… Eu acho que desta vez vou passar a noite aqui. Na minha mochila há uma roupa seca; e eu não estou com a mínima vontade de ir pra casa debaixo dessa chuva. Lembra quando éramos pequenos? Quando chovia, e você ia para o meu quarto chorando e com medo. Eu sempre te acolhi, lembra? Você passava a noite comigo. Desses dias eu nunca vou esquecer, desde aquele tempo eu já cuidava de você. Não pense que agora será diferente. – lágrimas começaram a escorrer pelo rosto de Matthew, e ele tremia freneticamente. Sua voz estava embargada e lacrimosa, por entre alguns soluços, conseguiu continuar. – Não me abandone agora. Não agora, Estella. Tudo estava melhorando, sabe. Eu ia… ia… ia falar o quanto te amo, o que eu faria caso você… mas… - Caiu no chão de joelhos, e escondeu o rosto com os braços. – Não… me deixe…

            As lágrimas de sofrimento escorriam pelo rosto dele, e se misturavam com as gotas de chuva que persistiam em seu corpo, e no chão. Ele sentia a garganta formar um nó, e começou a socar o chão com força.

            - Por que eu não fui mais rápido? Eu sou um idiota, não sou? EU SOU UM IDIOTA! Cada palavra o fazia bater o chão com mais intensidade. Quanto mais lágrimas escorriam pelo rosto, menos ele socava o chão. E novamente, ele estava soluçando, com os braços escondendo o rosto. Mas seu punho sangrava.

Quarta-feira.

            Era a sua segunda vez no hospital; aquele dia; já que passou a noite ali. Seus olhos estavam inchados e vermelhos, além das olheiras que davam uma aparência assustadora à ele.

            - Quase não me deixaram entrar. – disse, enquanto colocava uma nova jasmim no vaso. – Me disseram que um de seus médicos viria falar comigo hoje. Espero que compreenda. – sentou-se ao pé da cama de Estella, e ficou a observando.

            - Senhor Matthew? – um homem de jaleco branco tinha acabado de abrir a porta, e viu Matt sentado aos pés dela. Os cabelos grisalhos e a postura indicavam que ele era experiente.

            - Sim, sou eu. – postou-se em pé imediatamente.

            - Oh, por favor. Não quero que seja formal quando estou prestes a te pedir algo assim. Sente-se.

            Ele obedeceu imediatamente. Observava o médico com interesse.

            - Sinto lhe informar que teremos de desligar os aparelhos da senhorita Estella.

            Inicialmente, ele não teve nenhuma reação. Ao menos, era o que parecia. O seu choque, toda a sua vida com ela, passaram diante de seus olhos. Não podia acreditar que a matariam assim, sem mais nem menos. Segurando a vontade de chorar, levantou-se, irritado.

            - ISSO É UM ABSURDO! NÃO PODEM! NÃO VÃO FAZER ISSO COM ELA!

            Descontrolado, Matt foi se aproximando do médico, deixando o mesmo amedrontado.

            - SEGURANÇA!

            - VOCÊS NÃO VÃO MATÁ-LA! NÃO PODEM! NÃO VOU DEIXAR!

            Os dois braços do garoto foram imobilizados por dois homens altos, vestidos inteiramente de preto.

            - Por favor, nos acompanhe.

            - NÃO! ESTELLA! NÃO!

            - Colabore, por favor. Não queremos o machucar.

            - EU VOU VOLTAR AMANHÃ, ESTELLA! ESTEJA AÍ PARA ME RECEBER! ESTEJA…

            Os gritos do garoto ecoavam pelos corredores do hospital. Ele foi arrastado para for a, e dentro de 10 minutos, foi levado para casa.

Quinta-feira.

            As flores caíram no chão em um baque surdo, assim como as lágrimas que escorriam pelo rosto de Matthew. Ela estava morta. Os olhos marejados estavam em um estado de choque, de puro terror. Seus lábios formaram um sorriso maníaco e sinistro, que desviava algumas das lágrimas.

            - Ela... ela... me... ela.... abandonou...

            Abaixou o corpo, ficando na posta dos pés, tocando com os joelhos a testa. E gritou. Alguns médicos, visitantes, pacientes, todos vieram ver o que tinha acontecido. Matthew gritava freneticamente, e segurava a cabeça com as mãos, a pressionando.

            - NÃO! NÃAAAAAO! ESTELLA! NÃO!

            Chorava desesperadamente, levantou-se de súbito e foi até o corpo inerte da garota.

            - ESTELLA, ACORDE! ACORDE! TEMOS AULA AMANHÃ, PRECISAMOS IR PRA AULA... TEM A PROVA! TEMOS QUE IR! ACORDE, ESTELLA... ACORDE!!!

            Agarrou os ombros da garota e começou a sacudi-la, esperando que talvez ela acordasse. Ele só tinha que insistir.

            - ACORDE! ESTELLA.... acorde.... a....c....... – e voltou a chorar, e gritar. Não tinha mais controle sobre seu corpo, não tinha mais controle sobre suas ações.

            - Senhor Matthew... Sinto... – Ele agarrou o médico pelo colarinho da camiseta, e encacou-o nos olhos.

            - Traga-a de volta. Você a matou, você deve trazê-la de volta....

            - Sinto muito, mas...

            - TRAGA ESTELLA DE VOLTA!

            Jogou o médico contra o chão, e começou a chutar tudo que tinha em seu alcance.

            - A CULPA É DE VOCÊS! VOCÊS A MATARAM! TRAGAM ELA AGORA!

            - Senhor, por favor, acalme-se.

            Ele sentiu uma picada no braço; tinham aplicado uma injeção nele. Desmaiou; adormecendo imediatamente.

Sexta-feira.

            Estava sozinho no quarto. Os olhos que sempre foram vivos e coloridos agora estavam escuros e sem brilho. Observava desanimado o horizonte. Não fazia muito tempo que tinha acordado; ainda em choque pela morte de Estella. Como eles puderam fazer isso? Ele a amava. Isso era o suficiente para que ela não pudesse ir. Levantou-se da cama e abriu a janela, sentando-se no parapeito da mesma. Eles deviam colocar grades nas janelas.

            - Lembra, Estella? Lembra do dia em que você quis aprender a voar? Subiu o telhado da sua casa e quase pulou. Sorte que eu estava lá para te impedir, não é? Mas aí eu fiquei com essa dúvida. E se nós sabemos voar? Só não conseguimos porque não tentamos? Eu devia tentar. Fazer esse favor por você. Voar para bem longe desse lugar, dessas pessoas. Nada mais será o mesmo sem você. Eu vou passar os dias sozinhos, vou ficar no colégio com aquelas pessoas que você odeia, as tardes passarão mais devagar, os anos serão tristes, a vida será vazia. Eu simplesmente não consigo viver sem você. Sem o seu sorriso perfeito, sem seus olhos verdes, sem seu toque; sua pele macia, sua delicadeza, sua formalidade, sua fofura. Venha. Vamos voar, Estella. Vamos voar para longe daqui.


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Notas finais do capítulo

É só isso, meus leitores. Reviews, por favor, quero saber se gostaram ou não. Beijinhos and cupcakes. *: