Imperfeição escrita por GabrielleBriant


Capítulo 5
O Destino Não Dá Ouvidos Aos Irmãos Mais Velhos




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V

O DESTINO NÃO DÁ OUVIDOS AOS IRMÃOS MAIS VELHOS

ROSALIE

Terça-feira, 27 de agosto de 1935.

- ...pistão, cambota e, ligando os dois, a biela. Certo? – Mordi o lábio inferior e olhei para Edward.

Lentamente – provavelmente para me torturar – Edward olhou para cada uma das peças do motor que eu acabara de desmontar.

- Sim, Rose. Tudo certo.

Sorri, fazendo um ruidinho satisfeito. Eu finalmente conseguira memorizar o nome de todas as pecinhas do motor.

O meu intenso treinamento mecânico havia começado há cinco dias. Contrariando às minhas próprias expectativas, aprender a mecânica envolvida no funcionamento dos carros era bem interessante. Eu finalmente entendia porque Edward passava tanto tempo na oficina – mexer em carros era uma verdadeira terapia, que lhe distraía do tédio da eternidade.

E Esme e Carlisle estavam satisfeitos. Como eu finalmente havia encontrado algo em comum com Edward, nós vínhamos passando muito tempo juntos. Em cinco dias, eu havia me aproximado muito mais dele do que nos dois anos anteriores... acho que foi apenas então que nós, de fato, Edward e eu passamos a agir como irmãos.

O ônus disso tudo: Esme voltou a ter esperança de que um dia Edward e eu acabaríamos formando um casal. Ela não fazia por mal, na verdade... Esme apenas era uma romântica incorrigível. Ela até tentava disfarçar – pelo menos para mim, já que ninguém consegue esconder nada de Edward – mas ela era sincera e óbvia demais...

- Esme está vindo – Edward sibilou, antes de eu captar os passos cadenciados que apenas podiam ser da minha mãe adotiva.

- Ugh! Vá para o outro lado da garagem, Edward, antes que ela comece a preparar o nosso casamento!

Edward deu um meio sorriso e rapidamente se encaminhou para a esteira que estava a nossa esquerda. Assim que ele sentou-se nela, a porta da garagem se abriu.

- Boa tarde!

- Oi, Esme – respondi, enquanto começava a remontar as pecinhas do motor.

- Sabe, eu fico muito feliz que vocês estejam passando tanto tempo juntos... Mas estou começando a sentir falta dos dois! Quem sabe eu não começo a sujar as minhas mãos de graxa, também...

Edward sorriu, levantando-se da esteira e se aproximando da nossa mãe.

- Suas mãos já são sujas de terra, Esme. Quem cuidaria do jardim?

- Pode deixar – eu disse – que assim que eu aprender um pouco mais sobre carros, começarei a ter aulas de jardinagem com você!

Esme me olhou maternalmente, com uma expressão de alívio em seu rosto.

E ela tinha toda razão de estar aliviada. Em cinco dias, eu mudei da água para o vinho. Eu não mais me escondia no meu quarto, não evitava contato com a minha família... Estava falante, sorridente e, de fato, feliz. E me ver assim era o sonho de Esme – como seria o sonho de qualquer mãe.

Eu ainda suspeito que ela talvez achasse que a minha felicidade tinha algo a ver com um súbito interesse em Edward. E, à época, eu gostava de pensar que a minha transformação se dava à mudança no estilo de vida – como os meus instintos vampiros estavam quase totalmente sob controle, eu finalmente podia ficar na companhia de pessoas vivas.

Ficar em contato com humanos, de fato, foi bom para mim. Mas iniciar uma amizade com Emmett McCarty, o garoto que tanto me lembrava o pequeno Henry, era o que estava me realmente mudando tanto!

Ao pensar em Emmett, senti o olhar de Edward sob mim. Havia certo semblante reprovador, embora eu não soubesse bem o motivo.

- Rosalie, você está falando sério? Jardinagem? – Esme riu-se. – Olhe, eu vou entender isso como uma promessa... e ela será cobrada! Bem, eu tenho que ir ao mercado; fazer algumas compras, manter as aparências... Volto em uma hora.

O mercado... Emmett lhe dissera que trabalhava lá.

Sem sequer pensar no que estava fazendo, eu disse:

- Eu vou com você! – Esme e Edward ergueram uma sobrancelha. – Eu apenas fui à cidade uma vez, e foi muito rapidamente! Talvez nós possamos passear um pouco, Esme.

Ela sorriu inocentemente.

- Será ótimo!

- Perfeito! Eu vou tomar um banho!

Eu subi quase correndo, e logo estava limpa, sem nenhum traço de graxa em minhas mãos, e com as minhas gotinhas de perfume francês no pescoço e colo. Decidi usar os meus cabelos soltos, para deixar o meu visual conservador um pouco mais atual: uma camisa branca quase totalmente abotoada e uma saia longa. Coloquei um colar grande, chamativo, que combinava com os meus sapatos e bolsa. Por fim, como o dia estava aparentemente quente, passei ruge em minhas bochechas.

Olhei-me no espelho e, satisfeita, deixei o meu quarto para encontrar Esme na sala, já me esperando.

- Como estou? – perguntei, embora já soubesse da resposta.

- Você está linda, meu bem!

Sorri.

- Vamos?

Esme limitou-se a se levantar e nós duas começamos a nos encaminhar para a garagem. Foi com uma surpresa imensa que encontrei Edward sentando no banco de frente do DeSoto, já com a chave na ignição.

- Você tem razão, Rosalie. Acho que o dia pede por um passeio na cidade!

Abri e fechei a boca, enquanto entrava no carro.

O que você está fazendo?

Edward apenas me olhou de relance, aparentemente sem querer que Esme percebesse que a nossa pequena conversa mental tinha se iniciado.

Por que você vai?

- Por que não? – Esme o olhou com curiosidade. Edward apenas deu de ombros. – Rosalie perguntou por que eu estava dirigindo, já que ela precisa treinar.

- Ah... Você dirige na volta, querida.

Obriguei-me a sorrir.

Você nunca vai à cidade! Você não o fazia em Rochester, não o fazia em Syracuse! Por que decidiu fazer aqui?

Ele me olhou novamente – um olhar que indubitavelmente me dizia que logo conversaríamos.

Mas, claro, eu não demorei muito a descobrir do que se tratava.

No dia em que Emmett fora nos visitar, eu praticamente tive que expulsar Edward através dos meus pensamentos, apenas para ter um pouco de paz, sem a sua irritante interrupção. Eu não sei qual o problema que ele tinha em me ver fazer um amigo! – Ele bufou assim que eu pensei isso e as suas mãos trancaram-se violentamente no volante.

- Você está bem, Edward?

- Sim, Esme. Não se preocupe.

Assim que chegamos à cidade, ele estacionou na frente da clínica de Carlisle e deixou Esme descer; mas não saiu e nem me deixou sair. Assim que Esme estava numa distância segura, ele olhou para o banco de trás com os olhos cerrados.

- O que você quer com isso tudo, Rosalie?

Eu bufei.

- Eu não sei do que você está falando, Edward. Podemos fazer feira, por favor?

- Você veio até aqui apenas para ver Emmett McCarty. Por quê?

Desviei o meu olhar.

- Eu gosto dele! – Respondi sinceramente. – Eu quero ser amiga dele.

Edward bufou.

- Não, Rosalie! Nós não podemos nos apegar! A ninguém!

- Carlisle e Esme dizem que querem nos ver interagindo com humanos! Quando eu era viva, eu tinha milhões de amigos, Edward! Eu sinto falta disso! Eu acho revigorante, estar perto de pessoas de verdade!

- De pessoas, Rosalie? Você consegue sequer dizer o nome dos outros amigos de Emmett McCarty? Você os conheceu na sexta!

Mordi o lábio inferior. Não, eu não conseguia me lembrar de nenhum – exceto por Louise, que era a namorada de Emmett... E, mesmo assim, eu não conseguia lembrar o sobrenome dela.

- Pace, Rosalie! Louise e William Pace! O apelido dele é Bill! E o outro garoto é Andrew Turner!

- Eu lembraria!

- Não, Rosalie, você não conseguiria lembrar. Por que você só se importou com Emmett McCarty!

Bufei, cruzando os braços infantilmente.

- Eu... eu me senti ligada a ele – Verbalizei o que Edward já sabia.

- E ele se sentiu ligado a você, Rose. Por isso que estou preocupado.

- Oh. – Edward deu um meio sorriso. – Mas eu apenas quero estar perto dele, Edward. Eu não quero tê-lo. Eu não o quero para mim.

Edward me olhou por um tempo, lendo a minha mente. Ele tinha todos os motivos do mundo para achar que eu mentia, mas, naquele momento, eu havia sido total e completamente sincera. O olhar dele logo passou de acusador para complacente.

- E ele também não quer você. Mas vocês acabaram de se conhecer, Rosalie. E se isso crescer? E se você se... apaixonar?

Desviei o meu olhar novamente, sentindo o meu coração morto pesar. Lembranças da minha vida voltaram num caleidoscópio de terror e, pela minha visão periférica, eu podia ver a expressão de Edward mudar.

- Eu não estou pronta para me apaixonar por ninguém, Edward – Disse, a minha voz rouca e carregada de mágoa. – Eu não quero ter nenhum homem em minha vida.

- Desculpe-me. Eu não queria que você se lembrasse... de tudo.

- Eu sei.

Edward suspirou.

- E se ele se apaixonar, Rose?

O meu olhar lentamente ergueu-se para Edward.

- Ele não vai.

- Você está dizendo que é impossível que um homem se apaixone por Rosalie Hale? – Edward rolou os olhos. – Você o machucaria, Rosalie. Você quer isso? Machucá-lo?

Mordi o meu lábio inferior, sabendo que Edward estava certo. Não era vaidade, era um fato: todos os homens que cruzaram o meu caminho desde que eu tinha quatorze anos de idade se apaixonaram por mim. Emmett era simples demais, e eu era diferente demais... Ele se apaixonaria.

E não seria correspondido.

Edward tinha razão.

- Tudo bem.

- Você promete?

- Sim. Mas eu quero falar com ele agora.

Edward me olhou de uma maneira desconfiada, como se tivesse a mais absoluta certeza que a minha promessa nada significava. No entanto, no momento eu realmente tinha toda a intenção de seguir os conselhos dele. Apesar de ser irritante, Edward me queria o bem. Eu tenho certeza disso.

Edward deu um meio-sorriso e me deixou sair do carro. Senti-me nervosa quando comecei fazer o caminho para o mercadinho onde Emmett trabalhava... mas, ao entrar, me frustrei: atrás do balcão não estava o belo rapaz de cabelos cacheados, mas um velho barrigudo de aparência suja.

- Bom tarde! – Ele disse, aparentemente feliz por nos ver. – Posso ajudar?

O meu desejo foi de perguntar por Emmett, mas, como Edward estava por perto, achei melhor apenas fazer a feira e começar a pensar que o destino estava corroborando os conselhos do meu irmão.

Naturalmente, eu estava errada.

XxXxXxX

O sol começava a se pôr quando eu decidi que não queria mais ficar em casa. Esme e Carlisle ainda não tinham chegado, de forma que eu tinha que dividir o ambiente com Edward. Não que estivéssemos juntos – ele estava na sala lendo, a julgar pelo barulho ocasional de páginas sendo viradas, enquanto eu reorganizava os meus livros por ordem alfabética de autores.

Fazia alguns dias que eu não caçava e a queimação em minha garganta estava começando a ficar incômoda, então coloquei as roupas que não atrapalhavam os meus movimentos – calça, botas de couro e mantive a camisa de botões. Finalmente perdendo a minha preguiça, deixei os meus livros e desci as escadas.

Vou caçar. Acompanha-me?

- Não, obrigado – Edward respondeu. – Eu cacei ontem.

Dei de ombros e saí pela porta dos fundos. Eu ainda não tinha saído por aquela parte da casa, e realmente era muito bonita: Esme havia organizado um pequeno jardim no campo e colocado uma churrasqueira e mesas, deixando tudo pronto para se fazer uma boa festa. E, ao longe, havia o lago, que parecia tão convidativo...

Rapidamente fiz o meu caminho para a floresta atrás do lago e comecei a correr, à procura de algum animal do qual eu pudesse me alimentar – se possível, um predador. Realmente estava cansada de alces.

Acho que corri durante uns dez minutos antes de captar alguns batimentos cardíacos... mas o cheiro não era de lobos ou leões da montanha; era cheiro de sangue humano. A minha garganta pareceu ser inundada em lava e eu tive de me controlar para suprimir o instinto de continuar a caçada. Franzi o cenho e me aproximei um pouco, procurando ouvir além dos corações: havia o barulho de uma cachoeira, e risos, e...

Eu parei de respirar: havia a voz de Emmett.

Imediatamente esqueci-me da minha sede e do que eu estava fazendo naquela floresta. Esqueci também o que prometi a Edward há algumas horas e segui as vozes. Espiei dentre as árvores.

Era uma grande cachoeira, linda. Andrew estava embaixo dela, divertindo-se na água gelada. Nadando contra a correnteza estava William, e Louise estava sentada numa pedra na margem esquerda do rio, ao lado de Emmett – ao olhar para Emmett, eu senti a minha boca secar e eu aqueci por dentro. Os cachinhos molhados lhe caíam no rosto e o sorriso fazia as covinha ficarem ainda mais proeminentes... mas não tinha nada de inocente naquela imagem. Emmett não vestia nada além de uma calça... A água escorrendo o seu torso deixava os seus músculos com uma aparência ainda mais bem-definida. Os braços dele eram fortes, o que combinava com o peito e o abdômen bem dividido. Vi-me sem fôlego... Emmett era lindo!

Não pude me conter e, sorrindo dei alguns passos em direção ao grupo. Irritei-me ao perceber que não foi Emmett quem me viu, mas Andrew.

- Olha quem está aqui! – Ele sorriu, saltando da cachoeira para o rio e nadando rapidamente para onde eu estava. – Rosalie Hale!

- Oi – Disse timidamente, certificando-me de não olhar para Emmett, já que a sua namorada estava ao lado dele. Pela minha visão periférica, no entanto, percebi Emmett deslizar da rocha onde ele estava sentado e entrar no rio. Olhei enquanto os seus braços fortes remavam para perto de mim.

- Rosalie – Emmett disse, sorrindo. – O que você está fazendo aqui?

Eu me abaixei, ficando um pouco mais no nível dele. Ele ficou de pé, descobrindo-se da água da cintura para cima – as gotas de água passearam livremente pelos músculos do seu peito e deslizaram pelos sulcos do seu abdômen, até serem paradas pela barra da calça jeans.

- Eu estava... conhecendo o local. Estou andando desde a lagoa.

Emmett franziu o cenho.

- Não é perigoso? Quer dizer, você não está armada!

Rolei os olhos... como se eu precisasse de armas para enfrentar qualquer coisa!

- Eu não tenho medo.

- Você não conhece as coisas por aqui – Falou Louise, ainda sentada na pedra. Prestei atenção nela pela primeira vez: ela usava uma camisa que poderia caber três dela dentro; imaginei que fosse de Emmett. Estava molhada, de forma que o tecido colava no corpo dela. De baixo, dava para enxergar uma roupa de banho negra. Como eu suspeitava, o corpo dela não tinha nenhum atrativo. – As matas são muito perigosas, Rosalie... Você sabia que tem leões da montanha por aqui? E ursos, embora sejam difíceis de achar nessa região.

Contive o meu impulso de rolar os olhos novamente – se ao menos ela soubesse que eu adoraria encontrar um leão da montanha... Ainda assim, tive a impressão que a aparente preocupação dela era uma coisa boa; ela não devia ter ciúmes de minha quase amizade com Emmett.

- Além disso – William continuou – Se você se perder, ninguém mais lhe acha...

Eu sorri.

- Eu jamais me perdi em Nova York; não são algumas árvores que vão ficar em meu caminho. Além disso, eu não vou ficar trancada em minha casa o dia inteiro! Comecei a entrar pela mata, e decidi explorar um pouco mais. Se visse algum animal, subiria numa arvore; se me perdesse, era só caminhar para o leste que chegaria à minha casa ou à estrada. É como eu disse: eu não tenho medo.

Emmett saiu da água. Percebi os poros dele se eriçarem assim que um vento bateu em nós. Ele deveria estar com muito frio.

- Quando você quiser sair – ele disse baixinho – é só falar conosco. É mais seguro. Eu vou ficar mais tranqüilo.

Senti-me aquecer novamente.

- Obrigada – respondi timidamente.

Emmett abriu mais um dos seus sorrisos e a sua mão tocou a minha pela primeira vez – foi quase como se eu tivesse levado um choque elétrico quando as nossas peles se tocaram. Ele deveria estar frio, pois a temperatura da pele dele era quase a mesma da minha.

- Vem para a água?

Suspirei, olhando para a minha roupa. A blusa branca não parecia ser a melhor opção para entrar na água.

- Erm... eu estou com um pouco de frio, na verdade...

- Vem, Rosalie! – Andrew disse. – A água está até quentinha!

- É, Rosalie – Louise disse, sorrindo – Vem!

A minha mente disse que não. Mas o que escapou pelos meus lábios foi algo diferente:

- Deixe-me tirar as botas!

XxXxXxX


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