O Dia que não Terminou escrita por Lara Boger


Capítulo 8
Seja como for


Notas iniciais do capítulo

Último chapie. Fim do meu devaneio.



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Embora eu tente negar e esquecer, lembro todos os dias que o mal está em mim.”

Masoquismo? Não, realidade. Pura e simplesmente. Apenas realidade. Não é uma questão de maltratar a si mesmo e sim de aceitar o inegável. O mal era parte de si.

Não apenas de si. De todo mundo. Apenas o vivenciou com mais intensidade.

Trini lhe dizia isso todos os dias. As vezes ela percebia que Tommy hesitava, e se condenava. Ela dizia que o mal era parte de todos, inclusive de si mesma.

Tommy mal podia acreditar, porque Trini era um anjo. Aos seus olhos, intocada pela maldade humana, mas sua aparência a fazia parecer mais frágil do que realmente era, escondendo a realidade.

Trini era uma guerreira. Em todos os sentidos. Tinha coragem o suficiente para ser invejada, inclusive por Tommy. Tinha leveza suficiente para recordar e esquecer.

Como ela conseguia ser tão perfeita?”

Como pude ser tão burro?”

Sim. Era um burro. Ela sempre esteve ali ao seu lado. E ele sempre a amara. Sempre soube disso, desde o primeiro momento que a vira pela primeira vez. Trini era o caminho certo. Sempre fora, mas ele seguira o caminho errado, envolvendo-se com pessoas legais, mas que pouco ofereciam o que buscava. Na verdade, tudo o que queria vinha apenas de Trini. Um carinho desinteressado, palavras sábias sem serem banais....

Perfeição? Estaria Tommy idealizando a mulher perfeita nos moldes de sua melhor amiga?

Será que aquilo não era amor de verdade? Estaria ele apenas sonhando com alguém que se parecesse com ela? Com alguém que o compreendesse? Era uma perspectiva que quase o apavorava, pois dissera isso para si mesmo durante anos, enquanto se envolvera com outras garotas. Meninas mais populares: uma ginasta, a melhor amiga de Trini, e depois Kat, uma bailarina. Depois delas, casinhos esporádicos, garotas que os amigos lhe empurravam. Mas nunca teve quem realmente queria. Trini tinha ido embora ,para a Suíça, participar de conferências de paz. Não pretendia voltar. Construíra uma vida para si. Sem Tommy. E ele nunca lhe dissera que a queria.

Queria Trini, e não uma das populares. Não por afirmação de homem, e sim por ter mais certeza a cada dia, que a amava. Ela não saia de seus pensamentos. Não achava que isso fosse coisa para se declarar por cartas, e então esperava, sonhando com sua volta. Planejando cada palavra a ser dita quando a visse.

Tommy lhe diria as palavras. Ela aceitaria, e viveriam juntos. Felizes como sonhou durante anos.

Mas isso não aconteceria mais. Trini estava muito longe agora. inalcançável. Não havia mais um oceano que os separasse. Havia a vida. Ela morrera. Um acidente. Nenhuma chance.

O nunca era pior que qualquer distância. Era irremediável. As últimas imagens que teve dela, de seu funeral faziam questão de lembrar isso.

Ainda era capaz de sentir o cheiro do incenso e lembrar-se dos mantras entoados em sua memória, sua curta vida. Lembrava-se dos rostos tristes ao seu redor. Lembrava de seu próprio entorpecimento, de sua própria tristeza.

Tommy sabia que tinha de se conformar e esquecer, mas era impossível. Ela estava em seus pensamentos, atitudes, gestos e palavras. Todos os dias, todas as horas. Sonhava acordado com a jovem de cabelos quase azuis e olhos de gata. Chorava pela distância, pelo que nunca acontecera, pelo que nunca foi dito e pelos sonhos não realizados.

Sua culpa, apenas sua culpa.

Disso, não conseguia esquecer.

Queria ir para junto dela, acabar com tudo e corrigir seu erro. Mas não era capaz disso. Algo sempre acontecia no último momento. Telefone tocando, amigos apertando a campainha... a perda de coragem na última hora. A voz dela lhe recriminando por pensar dessa forma.

- Não faça isso. Não seja precipitado. Você tem toda uma vida pela frente.

Mas o que talvez Trini não soubesse, é que não havia mais vida para Tommy. Desde a sua partida, desde sua morte. Ele respirava, se alimentava... mas a esmo.

Sua única forma de vida, seria partindo para ir atrás daquela que lhe tirava o sono. Ainda que ela estivesse longe demais. Não importava.

Para o amor, nada importava. Nunca se sacrificara por alguém. E se fosse por Trini, certamente valeria a pena.

Não foi preciso mais do que raciocínio frio para levantar-se e sair do apartamento, subindo até o último andar. Apenas ergueu-se, no parapeito, equilibrando-se, sentindo o vento frio da noite em seu rosto. Uma sensação boa correndo por seu corpo, uma estranha alegria pelo que ia fazer.

- Por você, meu amor.

Palavras sussurradas para o vento antes da atitude derradeira. A queda livre. A morte libertadora. O ato que o levaria para os braços de sua amada.

Não houve dor. Apenas memórias. Havia apenas o rosto belo da garota oriental cujos cabelos azuis e olhos de gata lhe tiraram todo o sono e sanidade. Apenas o sorriso inocente e os braços abertos, esperando para acolhê-lo.

Apenas o seu amor por ela, tão grande que era infinito.

Um abraço, surpreendentemente quente o embalou ao fim de uma vida inútil, levando-o para o início de uma nova jornada, com a certeza de que, agora sim, tudo teria um sentido, por que, aquilo que chamavam de morte, era somente a realização de um sonho.

Trini em seus braços. Um sonho doce e, agora, sem fim.

 

The end


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Notas finais do capítulo

Último chapie de uma história insana. O que achou? Mereço review?



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