Naruto deixou que a adrenalina se espalhasse por seu corpo. Viu os dois grupos se aproximaram da diretora Tsunade lentamente, andando a passos firmes e decididos. Não pareciam ter medo de suspensões ou expulsões. Sequer demonstravam embaraço pelo atraso, nem se importavam com a mudança repentina no comportamento dos demais alunos. A falta de reação da diretora seria cômica, se tivesse demorado mais alguns segundos. Quando Gaara e Sasuke, acompanhados de seus seguidores aproximaram-se dela, Tsunade foi de encontro a eles, tentando espelhar a mesma firmeza que eles demonstravam.

— O que pensam que estão fazendo? — perguntou, irritada, encarando o os alunos.

— Não se mete nisso, diretora — disse Gaara.

— Como é? — retrucou Tsunade. — Com quem pensa que está falando?

Os alunos, acomodados nas arquibancadas, não sabia o que estava acontecendo ali. Naruto levantou de onde estava e sem se dar conta do que estava fazendo, foi se aproximando de onde a diretora estava conversando com os brigões.

— Naruto… — chamou Shikamaru, em vão.

Naruto não saberia explicar, se lhe perguntassem, mas ele estava com uma sensação estranha. Não era ruim, como costumava ser quando pensava em ir para a escola e encontrar um dos dois líderes dos Populares ou dos Impopulares. Se houvesse uma palavra que se aproximasse daquela sensação, seria, talvez, contentamento. Ao contrário de todos ali, de Tsunade, de Shikamaru, e dos outros membros do jornal, ele sabia que Gaara e Sasuke estariam naquele campo. Pareceria algo como um golpe de sorte em um jogo de azar, mas para ele significava muito mais.

Significava que ele ainda conhecia aqueles dois garotos. Significava que eles não haviam mudado tanto com o passar dos anos, quanto queriam que as pessoas acreditassem.

Poder lembrar de Gaara como o garoto tímido e excluído…

Ter a oportunidade de rever o Sasuke assustado e solitário…

Eram coisas das quais Naruto não abriria mão jamais. Há muito tempo aqueles garotos tinham se transformado em seus inimigos, era verdade. Garotos que ele tinha aprendido a temer, sim. Mas que de certa forma… uma forma estranha e difícil de explicar… jamais havia conseguido odiar.

Naruto queria saber o porquê, mas não se permitia pensar sobre isso.

O menino olhou para o rosto de Gaara. O ruivo estava diferente do que era anos antes. Não apenas por ter crescido muitos centímetros. Nem por estar mais forte que a maioria dos alunos da Escola Secundária de Konoha. A mudança de Gaara se encontrava em seu rosto. Muito mais maduro e sério. Não havia vestígio daquela timidez, da dificuldade em falar com as pessoas ou mesmo da insegurança constante.

Sasuke também havia mudado. Reparando em seu rosto, Naruto percebeu que era tão sério quanto o de Gaara, os dois pareciam ter crescido da mesma maneira, pois ele estava alto e forte. Não tanto quanto o ruivo a seu lado, mas o suficiente para enfrenta-lo. Havia coragem em suas ações agora, desafio em sua voz e superioridade em seu olhar.

Ambos haviam evoluído e se tornado capazes de cumprir com suas palavras, independente das consequências. Apesar da rivalidade que alimentavam, a verdade era que eles eram extremamente parecidos. E, embora devessem saber disso, não tinham plena consciência do quanto. Estavam de lados opostos, com os mesmos objetivos. Disputavam as mesmas coisas, por vezes com os mesmos métodos e pelos mesmos motivos. Seriam uma parceria invencível, se as coisas tivessem acontecido de forma diferente.

Quando chegaram juntos ao campo, Naruto teve a breve impressão de que estava do mesmo lado dessa vez, como se o adversário a ser vencido fosse a diretora e os alunos, que agora cantavam palavras contrários às que ressoavam minutos antes. No entanto, Gaara e Sasuke eram inimigos, que se conheciam muito bem e que se odiavam. Se combatiam e se completavam. Se repeliam e se admiravam. Perto deles, dos Populares e dos Impopulares, fazer parte de um grupo pequeno e insignificante como Os Outros era coisa de criança. Uma infantilidade passageira, que talvez já tivesse passado da hora de acabar.

Como um bando de desajustados poderia ser capaz de ameaçar a aura de liderança daqueles dois garotos? Não era apenas uma questão de popularidade, ou de brutalidade. O que estava em jogo era saber lidar com as pessoas, com aquela massa instável de alunos, sem precisar, de fato, ter contato com ela.

A maioria daqueles alunos nunca sequer havia falado com Gaara ou com Sasuke. Apenas a fama deles era suficiente para que os outros alunos quisessem escolher um lado e se juntar a eles sem esperar nada em troca, além de um pouco de vida social naquela escola. Sobrevivência.

Naruto sabia, embora jamais admitisse em voz alta, que aqueles garotos eram verdadeiramente os donos da escola. Não por serem os valentões ou por serem o centro das atenções, mas por serem inalcançáveis. E era isso que lhes dava a capacidade de liderar.

— Acorda, Uzumaki — Naruto levou um susto com a chegada de Shino.

— Onde você estava? — perguntou, parando e olhando para o garoto.

— Fui resolver uma coisa — respondeu Shino, evasivo.

Naruto o encarou. Mais uma vez, como sempre acontecia quando pensava em Shino, teve a sensação de que aquele garoto havia nascido, sim, para mandar, para ser chefe. Mas não para ser líder.

— Eles são bem instáveis, não acha? — perguntou Shino, ignorando a cena que se passava diante deles e olhando ao redor.

— Eles quem? — perguntou Naruto, impaciente.

— Os alunos! — disse Shino, como se fosse óbvio. — Uma hora estão xingando, na outra estão enlouquecidos na torcida.

Naruto não respondeu.

— Há cinco minutos, não importava se seria um ou outro o vencedor — continuou Shino, absorto. — Agora, olha para eles. Não acha isso estranho?

Naruto bufou.

— Acho muitas coisas estranhas, chefe — ironizou a última palavra, pensando nas coisas que tinham acabado de passar por sua mente. — Tem uma porção de coisas que não entendo sobre essa escola — disse, olhando para Shino. — Uma delas é como o nosso corpo docente deixou isso tudo acontecer?

Shino olhou na direção da diretora Tsunade e ponderou um momento.

— Talvez ela acredite que eles possam ser “recuperados”.

— Como assim?

— Ela é pedagoga há mais de vinte anos — explicou Shino. — Deve ter visto dezenas de garotos como eles. Famílias desestruturadas, históricos complicados… Ela sabe de onde eles vêm e o porquê dessa briga ter começado.

Shino olhava-o de um jeito estranho, enquanto dizia essas coisas. Naruto tentou parecer indiferente, mas o outro garoto demonstrava saber mais do que estava colocando em palavras.

— Nós é que não podemos nos dar ao luxo de esperar para ver se ela está certa — continuou Shino. — Veja tudo o que eles fizeram. Eles não têm receio de pisar nos outros, humilhar e agredir quem não se encaixa nos moldes deles — Shino olhou para Gaara e Sasuke. — Eu não gosto deles.

Ao dizer isso, Shino se afastou de Naruto, dando as costas para a cena que se seguiu. Um grito coletivo veio da arquibancada. Quando Naruto se virou para o centro do campo novamente, a tempo de ver quando os professores tentaram barrar a passagem dos alunos. Ao aproximar-se de Sasuke, no entanto, o professor Kakashi levou um soco que o deixou momentaneamente atordoado.

— Merda! — exclamou Naruto.