-Acho que não. . . Ele tem ir para algum lugar, ele não precisa de tratamento especial. Então ele pode ficar pelo campo de Asfódelos. –Eu e Demitri caminhamos para dentro do salão.

-Oi, pai!Lady Perséfone. – fez uma reverência solene

-Bom dia, senhor Hades, Lady Perséfone. – disse imitando o gesto de Demitri.

-Olá, meu filho e. . . .- Deus dos mortos me encarou.

-Clarissa, filha de Ártemis – disse, o menos nervosa possível, já que minhas mãos tremiam, olhava o tempo todo para o corpo no ombro de Demitri.

-Ah, sim!Minha. . . Sobrinha neta, o que a traz ao meu reino? – perguntou, com a mão no queixo.

-Eu desejo devolver uma alma ao seu devido corpo.

-E como pretende fazê-lo, minha cara?

-Com uma de suas chaves. – disse, lhe mostrando o objeto.

-Muito bem. O corpo é esse, certo? –disse apontando para Bernardo no ombro de seu filho. - E a alma?

-Bom, ele morreu agora há pouco. Não sei onde sua alma está agora – disse, já estava quase chorando, de novo.

-Maravilha. . .Qual o nome da alma?- disse Hades, impaciente.

-Bernardo, filho de Apolo – disse a beira das lágrimas. Respirei fundo.

-Oh, mas que coincidência. Bernardo, sua amiga veio te busca!- disse Hades para a alma que tinha se mantido quieta. Olhei para ela e vi Bernardo, pelo menos a alma dele, translúcida. Encaramos-nos e eu corri até ele.           

-Bernardo! – disse sem saber o que fazer, eu não podia tocá-lo. Meus olhos passearam por sua alma eu não consegui fazer nada, só encará-lo bem de perto.

-Clarissa, você morreu também?- disse ele, com semblante triste.

-Não!Eu vou Fazer você voltar a viver ok?–Disse olhando nos seus olhos sem órbitas.

-Bom querida. Eu vou precisar da chave, do corpo e da alma. Mortais não podem ver o procedimento por ser um tanto. . .forte. Filho e só deixar o corpo aqui, alma, fique parada ao lado do seu corpo. E vocês dois fora!- disse nos apontando o corredor.

-Venham queridos. Vocês vão conhecer meu jardim- disse Perséfone ao meu lado.

Ela nos conduziu até o tal jardim, era lindo contrastando com o local horrível onde estávamos perto de uma praia com areia negra.

-Você é filha de Ártemis, certo? – disse a deusa.

-Sim e eu quero dizer uma coisa que eu sempre tive vontade dizer depois de ouvir sua história. – disse, tentando me distrair.

-Sim?

- Você é uma das minhas deusas favoritas e eu tenho muita pena de você por causa da maldita romã. – disse com toda a sinceridade.

-Ah, muito obrigada. Você se parece muito com minha irmã, se você não estivesse com esse daí e não estivesse chorando, eu diria que você era ela. - estava entretida em cheirar as flores de seu jardim, flores que eu nunca vi na vida e algumas conhecidas que eu não sabia como podiam florescer neste lugar funesto.

-Elas acalmam, não é? – disse ela sentando ao meu lado no meio das flores –Minhas melhores amigas, esta aqui eu criei para sua mãe- disse apontando para uma flor com formato de tulipa, mas era um pouco mais aberta parecendo uma rosa e era prateada, parecia brilhar. Fiquei a admirando por bastante tempo, senti sua textura macia, a flor realmente lembrava minha mãe.

         Então eu escutei um grito, seguido de outro e mais outro, vários gritos que sobreporam todos os outros que vinham do campo de punição.

-Ai, deuses!- disse, deitando no chão. Minhas lágrimas prontas para sair.

-Calma, ele vai ficar bem. Ninguém se lembra da dor quando ressuscita, eu acho. Hades não ressuscita muitas pessoas. – outro grito.

-Ah, agora eu fiquei mais calma – disse com sarcasmo. Os gritos pareciam mais torturados.

-Pois deveria, Hades em matéria de almas é expert. O máximo que pode acontecer é ele não voltar e continuar morto. – isso foi a gota. Virei meu rosto para a terra e desabei a chorar.

-Isso realmente é animador!- disse aos prantos.

Eu não conseguiria viver com isso, com quem eu iria discutir coisas bobas? Quem eu iria abraçar a noite? Quem me guiaria pelo acampamento? Quem iria ser bondoso o bastante para perdoar todos os meus xingamentos, maldições e pragas? Lembrei do dia que eu o mandei ao tártaro, estremeci com a ironia. Agora tudo o que eu queria era sentir seu calor de filho de Apolo, provar seus lábios de novo, sentir seu cheiro, e saber como ficaram as coisas sem mim no acampamento durante a missão. Durante as horas que fiquei no submundo, esses eram os meus desejos mais profundos.

        Eu acabei adormecendo, não sei como, mas adormeci. Pareceram poucos minutos quando acordei, mas não abri os olhos, continuei parada, com medo do que poderia ver se levantasse. Hades poderia estar segurando um corpo inerte com uma cara indiferente, dar de ombros e dizer um simples ”não deu” e me fazer desmoronar. Não queria ver o resultado se este fosse negativo.

      Mas tinha alguém afagando minha cabeça, que me desviou desses pensamentos. Perséfone, pensei, devia estar ali por um bom tempo. Pelo o que percebi minha cabeça não estava mais apoiada no chão. Abri os olhos e escutei uma risadinha, senti alguém me dar um beijo na testa.

- Oi, dorminhoca – Escutei a voz que eu mais almejava escutar todo este tempo, sentei de pressa e vi Bernardo sorrindo, alma e corpo vivo naquela criatura divina. O abracei com força, deitamos na grama com o impulso. Beijei varias vezes de seu pescoço ao seu ombro, sentindo seu cheiro como tanto queria.

-A senhorita me deixou louco de preocupação. – disse ele, não nos soltávamos um minuto sequer.

- Digo o mesmo do senhor, você por acaso é maluco? Ficar viajando sozinho por ai. . . –disse o abraçando mais forte, se isso era possível.

-Louco?Acho que só se por você – disse me dando um beijo. Minha vida pareceu completa depois disso.