Durante longos dias, Ryutaro se permitiu ficar recluso, organizando o que ele conseguia lembrar, o que ele sentia e como as coisas seriam doravante. Reaproximando-se dos pais, ele buscara compensar todo o tempo perdido com bobagens cotidianas. Não houvera progresso quanto às memórias - ele parara de sonhar com o passado e tampouco se sentia disposto a forçar seu cérebro com essas coisas, já que a situação era muito mais ampla e não havia muito tempo de tranquilidade para ele se situar.
Jogado em sua cama, com um mangá em mãos, o ruivinho ouve seu celular tocar, e percebe que era Yosuke quem o ligava. Seu coração dispara. Desde aquela noite da discussão com Aiya, os dois não se encontravam, o que talvez tenha sido bom parar acalmar os ânimos.
- Yosuke!
- Ahn, desculpe ligar tão de repente...
- Não tem problema. Eu queria falar com você de qualquer forma.
- Lembrou-se de mais alguma coisa? - O tom de voz do outro pareceu ter ganhado uma nova perspectiva.
- Eu quero falar com você sobre isso... Mas pessoalmente.
- Sem problemas! Quando e onde?
- Acha que consegue ir até o bosque agora?
- Claro! Eu quero muito te ver!
- Então é isso. Te vejo lá, sim?
- Conte comigo.
Ryutaro veste uma roupa normal e finalmente sai do quarto, passando pelos pais com tamanha velocidade que não pôde ser parado. Ele sentia um misto de bons sentimentos e uma felicidade muito diferente. Iria reencontrar aquele por quem nutria algo muito valioso.
O bosque nunca estivera tão bonito. O vento tranquilo causava movimentos leves nas árvores, cujas folhas verdes se submetiam ao balançar dos galhos. A terra fofa comportava uma grama que parecia cintilar muito mais do que nos outros dias em que Ryutaro estivera lá. E, acima de tudo, Yosuke nunca estivera tão atraente, tão amável.
- Ryucchan!
Os dois se vêem, acelerando o passo para selar o momento com um abraço apertado, como se um não quisesse permitir a partida do outro. Sem se afastarem muito, seus olhares se cruzam no ar, e então o moreno se pergunta se poderia beijar os lábios doces do pequeno. Mas a iniciativa surpreendentemente parte deste. Com os braços envolvendo o pescoço do maior, Ryutaro podia sentir o calor do corpo dele. O sentimento adocicava aquele beijo de forma adorável e eles se sentiam plenos de alegria somente por estarem juntos.
"Eu queria muito falar com você assim, de perto", o ruivinho sussurra, com o rosto repousado sobre o peito do outro, que o segurava ainda com um abraço urgente, nervoso.
- As suas... Ahn, as suas memórias... Voltaram?
- Me perdoe, Yosuke-kun... Eu não as recuperei ainda...
- A-ah... - O outro se entristece, sem saber como seriam as coisas daquele momento em diante. - E o que isso quer dizer? O que será de nós dois?
Neste momento, o menor segura as mãos frias do outro, olhando profundamente em seus olhos que emanavam grandes questionamentos. Não foi preciso muito tempo para ele retomar a fala.
- Não tenho muita esperança de que eu lembre de tudo. Mas o que eu realmente vim dizer é que isso tudo não importa.
- ... O que?
- Não importa se eu vou lembrar o que passamos juntos. Não podemos ficar presos a um passado que pode não retornar à minha mente, não acha?
- Eu não sei onde você quer chegar com isso.
- Não se preocupe. Vou esclarecer: deixemos isso em segundo plano, Yosuke-kun. O que é realmente relevante é o que temos agora. O que temos certeza que existe em nós dois. Tudo acontece por um motivo, não é? Nosso encontro, meu acidente, nosso reencontro. E ainda assim estamos aqui. Juntos. E pra mim, isso é o que realmente vale. Não vamos nos preocupar em recuperar as memórias - nós vamos construir novas. Se você estiver disposto, eu prometo que daqui em diante teremos lembranças melhores e, se por acaso eu me lembrar de mais alguma coisa, que seja. É o presente que nos interessa agora, ok? E então? O que me diz? Você aceita?
Yosuke contempla a expressão determinada do outro, que tinha os olhos
cintilantes por lágrimas que teimavam em querer sair. De todas as formas de se reconciliar com Ryutaro que ele havia imaginado e planejado, essa superara com facilidade. Ele não sabia o que responder. Se estava disposto a reconstruir um relacionamento com o ruivo? Sim. Sim. Mil vezes sim.
- Shimizu Ryutaro, seu idiota! Não era preciso nem ao menos perguntar! É claro que eu quero! É o que eu mais quero! Desde que eu possa estar com você.
- Você foi, é e sempre será, a minha memória mais amada. E eu sei que passaremos por qualquer tipo de situação se continuarmos um ao lado do outro!
- Eu amo você, sabia?
- Eu também te amo, Yosuke-kun.
Eles se permitem mais um beijo apaixonado. E não havia um só pedaço de paisagem ao redor que não estivesse ofuscado pela felicidade que emanavam - o pior já passara.
E os dias mais felizes da vida deles estavam apenas... Recomeçando.