Crônicas Saxônicas Dois escrita por Didi8Dedos


Capítulo 1
INVERNO DE 894 DC - HARALDR HÁRFAGRISER




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Ter vinte e cinco filhos era uma coisa normal, assim como ter o preferido dentre eles. Mas para ter vinte e cinco filhos de seis mulheres diferentes era preciso ter riquezas. O primeiro rei da Noruega, Haraldr Hárfagriser, era um homem rico, era um homem poderoso e seus filhos o amavam, mesmo alguns estando em segundo plano. Eu não conheci Haraldr Cabelo Belo, como era chamado, mas conheci três de seus filhos, e aquele a quem mais amava, o mais terrível de todos, diziam, era a sua imagem em perfeição.

Vou começar a história da metade, porque se eu explanar sobre toda vida de Haraldr se tornaria maçante, apesar de ele ter participado de algumas das batalhas mais sangrentas de que já ouvi falar. Depois disso, basta que eu fale que ele foi um homem bom para seu povo, foi um conquistador e um mantenedor da Noruega para os noruegueses. Também ajudou os dinamarqueses a encontrar novos lares e riquezas, e é por esse caminho que enveredo, porque diz respeito à Inglaterra, à Nortúmbria e à Irlanda, onde passei a maior parte da vida lutando. Haraldr, como já disse, tinha 25 filhos, dentre os quais, quatro eram mulheres. Metade de seus filhos reinava os pequenos reinos entorno da Noruega e mantinham o grande estado em paz. A outra metade servia a ele como comandantes ou servia a outros senhores noruegueses. Alguns desses senhores tinham amizade com senhores dinamarqueses e juntos saíam em busca de novos prados, encontrando-os nas costas da Irlanda e da Nortúmbria.

Dos 25 filhos de Haraldr, somente a dois ele dispensava atenção contínua. Haraldr amava derradeiramente a Eirik, o louro, tão belo, alto e forte quanto o pai, filho único da terceira esposa de Haraldr, a quem este era devotado e apaixonado. Eirik era ambicioso e um guerreiro formidável, um grande senhor de terras e o braço direito do pai. Haraldr amava também Kaetilla, a filha mais nova de sua quinta mulher, que nascera num dia negro e sombrio, debaixo de forte chuva, porque sua mulher havia saído para a campinha em busca de ervas para o outro filho que estava doente. No meio do caminho, um lobo apareceu, assustando a mulher, fazendo-a dar a luz no meio do nada. A criança nasceu escura como a noite, mas sobreviveu. Para muitos foi um mau agouro, mas Haraldr se encantara com a beleza da menina, muito diferente dos padrões habituais do local. E conforme a menina crescia mais bela ficava. Ela tinha a pele alva e os cabelos negros como a noite; olhos brilhantes e profundos, igualmente negros, que pareciam enfeitiçar quem os mirasse por muito tempo.

Dos filhos também, aquele com quem Haraldr menos se importava, que era quase sempre desprezado, era Haakon OBom, como os cristãos o chamavam.

É aqui que começa esta história.

Em 887, os noruegueses tinham se unido aos dinamarqueses para atacarem Wessex pelo sudoeste, conseguindo conquistar grande área saxônica, em especial, fazer fugir o rei Alfredo de Wessex, que afundou nos pântanos adentro em busca de um refúgio inatingível. Eu conhecia a fúria dos dinamarqueses, e tinha ouvido falar que os noruegueses eram tão furiosos e selvagens quanto eles. Ubba, o maior e mais poderoso dinamarquês que já existiu - e a quem matei por uma sorte do destino, ele escorregou nas tripas de um dos seus no campo de batalha e então eu lhe desferi o golpe mortal -, era um filho da mãe gigante, raivoso e matador de ingleses, apesar de supersticioso e cauteloso.

Agora surgiam histórias sobre um guerreiro ainda mais sanguinário, um norueguês, que carregava no peito e no escudo o desenho bem delineado de uma raposa à espreita. Enquanto Alfredo construía, em segredo, um forte próximo ao rio, soldados ingleses afirmaram ter visto o tal norueguês girando seu machado sobre a cabeça, instigando outros a atacarem. Mas com a fuga e a calmaria vinham histórias fantásticas de guerra sobre o inimigo, e talvez muitas delas nem fossem verdadeiras.

Estávamos em Wintaceaster, o forte para a família real foi bem construído, mas se os pagãos quisessem atacar, e atacassem com bastante homens e com esperteza, venceriam. Apesar de não gostar de Alfredo, eu tinha plena ciência de que ele era suficientemente inteligente para derrotar qualquer um que se pusesse em seu caminho, se tivesse homens para isso.

Eu estava constantemente em campo, vigiando, espionando os dinamarqueses. Antigos aliados de meu antigo senhor, Ragnar Ragnarson, um dinamarquês que me adotou quando eu era apenas um menino, estavam nas colinas, eu reconhecia seus brasões, e se eles soubessem que eu estava ali, com toda certeza teriam vindo até mim. Uns gostariam que eu lutasse ao lado deles, mas outros, outros iriam querer a minha pele, ou pior, a minha cabeça.

Eu nasci Uhtred Uhtredson de Bebbangurg, vivi Uhtred Ragnarson da Dinamarca e agora era Uhtred, a putinha de Alfredo de Wessex, porque eu estava ligado a ele por uma dívida. Por duas, na verdade, uma dívida de terras e outra de palavras, pois quando chegamos ao pântano com um punhado de homens, jurei protegê-lo e ele sabia que eu juraria, porque eu era orgulhoso e beligerante, como nenhum outro era. Alfredo não gostava de mim, não era devoto como deveria ser, mas precisava de mim, eu era um guerreiro, um guerreiro sanguinário que o defenderia, agora pelo juramento, até a minha morte.

Era o dia mais frio daquele inverno quando vi pela primeira vez o estandarte de uma raposa branca sobre um fundo vermelho. Tremulava logo acima da colina e parecia tão limpo quanto novo.


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