“Você os ajudou a me matar

Isso é tudo que eu desejo dizer

Você não me emociona mais

Tudo que você faz agora é ficar no meu caminho”

Telespectador. Agora eu via tudo como se estivesse assistindo televisão. À minha volta, várias pessoas: todos mortos por Kira. Aquele era o nada. Eu olhava os rostos das pessoas e via o desespero: não conseguiam acreditar que ficariam ali para sempre. Eu via pessoas culpadas de crimes e algumas outras inocentes, que não mereciam aquilo de forma alguma. Não sei se poderia me categorizar nesse estado, afinal, eu havia o perseguido. De alguma forma, eu merecia aquilo. Parei de olhar para os rostos das pessoas à minha volta e olhei para a “tela” que me mostrava ele. Eu observava seus passos 24h por dia, todos os dias, desde a minha morte. De início, eu me sentia mal por não poder estar lá com ele, mas com o tempo, me acostumei. Afinal, eu era apenas um telespectador naquela situação.

“Tudo que eles dizem me faz sentir como se eu tivesse ileso

Eu perdi tudo que eu ganhei

Tudo que eles dizem me faz sentir

Terrivelmente triste e sozinho”

Você, sentado em um carro, chegando a um galpão. Era aquilo que eu via. Você olhava pela janela, procurando algo. Perdido em seus pensamentos. Quando o carro para, você volta à realidade e sai dele. Passou as mãos pelo cabelo umas duas vezes. Dou uma leve risada ao me lembrar que você costumava fazer isso quando estava irritado.

– Ainda observando o que não pode alcançar, Lawliet? – Mihael perguntou ironicamente, se pondo ao meu lado.

– Resolveu assistir também? – Perguntei como resposta. Mello não era a pessoa mais fácil e doce de conversar com, então eu o tratava da mesma forma que ele me tratava.

– Não somos muito diferentes, L. – Ele falou, irritado – Ambos perdemos. Para Light. Kira. – Ele falou o nome de Light cuspindo veneno. – Eu perdi, L. Me apaixonei pelo meu rival. Envolvi-me demais. E você não foi diferente de mim. Estamos no mesmo barco, Lawliet. – Ele falou e saiu andando.

Suas palavras me cortaram profundamente. Ele tinha razão. Eu havia perdido.

“Eu escrevi uma música pra nós, você não estava cantando junto

Mas eu espero que você sinta minha falta também

Eu segurei por muito tempo, fiz tudo errado

Mas eu espero que você esteja sentindo a minha falta como eu sinto a sua”

Encostei a mão na “tela”. Era gelada e dura como vidro, mas era mais resistente. Não quebrava, não importa o que você fizesse. Eu já havia batido contra a tela, mas nunca havia conseguido quebrá-la. Eu voltei a prestar atenção no que acontecia e percebi que Light finalmente assumira que ele era Kira. Olhei para traz e vi Soichiro abaixar a cabeça, escondendo o choro. Imagino a decepção que ele sentiu...

Voltei a olhar para a tela, captando cada momento. Ele estava encurralado. Agora sim seria preso. Mas era aquilo que eu realmente queria que acontecesse? Algum tempo depois e... Tiros. Quando vejo Light no chão, ensangüentado, meu coração dói. Apesar de todos estarmos mortos e sem nenhum órgão funcionando, ainda sentíamos. Pus a mão no meu peito. Como eu queria encontrar com ele, abraçá-lo... Como sinto a falta dele.

“Eu não deveria dizer, eu mudei

Eu não deveria dizer, eu estou quase bem,

Ou que você já não me sente,

Ou não está mais no meu caminho”

Respirei fundo. Eu não me podia sentir afetado por ele estar sofrendo. Abaixei a cabeça e senti a raiva subindo. Eu sabia por que não me devia sentir afetado por ele. Eu sabia muito bem. Eu nunca o teria. Não importa o quanto eu gritasse. Ou quanto eu me importasse. Eu havia aceitado aquilo. Nossos destinos haviam se cruzado apenas uma vez, e nunca mais. Fechei minha mão e dei um soco forte na tela, descontando minha raiva. Eu tinha que aceitar aquilo. Jamais poderia fazer tudo o que eu queria com Light após a minha morte. Eu jamais poderia pegá-lo em meus braços como sonhava fazer, ou beijá-lo e tocá-lo da mesma forma que Misa Amane fazia. Olhei para a tela e vi que Light corria pela cidade. Entrou em um galpão vazio e tentou subir as escadas, mas parou no meio dela. Deitou-se e respirava com dificuldade. Ele estava morrendo. Olhei para outro canto da tela e vi que Ryuk havia escrito seu nome no caderno. Olhei novamente para Light e vi que ele sussurrava um nome. “Ryuzaki”.

“Eu não estou tão orgulhoso pra admitir pra você agora

Que eu continuo simplesmente um caco

Eu pretendo não fingir até o fim”

Eu tinha que ir até lá. Fechei meus olhos e imaginei como se estivesse lá, com ele. Imaginei seu rosto, seus olhos, sua boca, seu nariz, o contorno de sua face... Quando abri meus olhos, o vi. Ele olhava para mim, ele podia me ver. Consegui ver um quase sorriso sendo formado em seu rosto. Eu fiquei encarando-o durante algum tempo, apenas examinando seus olhos. Ele estava feliz por me ver. Quando tentei dar um passo para frente, o que eu via se desfez. De repente, estava no nada de novo. Aquela havia sido apenas uma ilusão. Levantei minha cabeça, que estava baixa, e vi a última cena de vida de Light: a última batida de seu coração. Logo após, o silêncio.

Virei-me de costas à tela e comecei a andar na direção oposta. Enquanto as maiorias das pessoas que estavam no nada comemoravam, gritando, cantando. A morte de Kira... A vitória dos que morreram pelo caderno. Eu havia sido morto pelo caderno. Apesar disso, não me parecia uma vitória. Aquilo me parecia mais uma derrota. As lágrimas já desciam fartas pelos meus olhos.

– L! – Uma voz me chamou. Dentre os gritos de todos que estavam lá, aquela voz se destacou. Meu coração parecia ter criado vida.

“Eu escrevi uma música pra nós, você não estava cantando junto

Mas eu espero que você esteja sentindo a minha falta também

Eu segurei por muito tempo, fiz tudo errado”

– Li-light? – Eu gaguejei, enquanto ele corria até mim. De repente, todos os meus motivos de odiá-lo foram por água abaixo. E eu havia me esquecido de tudo o que havia passado sem ele.

– L. – Light falou, diminuindo a aceleração até chegar a mim.

Quando estávamos à 1m de distância do outro, ele voltou a andar na minha direção, como se não acreditasse no que estava vendo. Estando mais próximos, ele tocou o meu rosto. Como eu seria falta daquele toque. Afagou a minha bochecha carinhosamente enquanto enxugava uma lágrima que descia.

– Me desculpe, L. – Ele encostou nossas testas e segurou meu queixo com a sua mão que estava em minha bochecha. – Não acredito que eu te matei. E-eu não deveria ter feito isso com você. Eu merecia morrer em seu lugar. M-me desculpe...

– Isso não importa agora. Na verdade, isso não importa mais. – Falei, colocando minhas mãos ao lado de seu pescoço. Senti sua mão me segurando pela cintura, consumindo o resto de espaço que sobrava entre nossos corpos. – Esqueça-se de tudo, Light. Aliás, esqueça até mesmo dos meus outros nomes. Apenas me chame... de Lawliet. – Suspirei. – Senti falta do seu toque.

– Pois eu... Bem, senti falta de uma coisa que não pude ter. Até agora.

Ao falar isso, senti sua mão que estava em meu rosto deslizar rapidamente até a minha nuca e me puxar o rosto para frente. Nossas bocas haviam apenas de chocado, de início, até que dei passagem para que as nossas línguas também se tocassem. Agora eu sabia do que ele estava falando. Sentir falta de algo que nunca teve. Pela segunda vez, senti como se meu coração estivesse batendo. Quando quebramos o beijo, não afastamos nem um milímetro um do outro. Ainda mantinha meus olhos fechados, apenas apreciando aquele momento. Eu ainda sentia as lágrimas, mas não eram mais de tristeza.

– Ah, Lawliet... Amo-te. – Falou ele num suspiro. Sorri involuntariamente, sentindo vibrações pelo meu corpo todo.

– Você não tem idéia de como esperei para ouvir isso, Light... – Sussurrei em seu ouvido. – Também amo-te.

Ele sorriu e juntamos nossos lábios novamente. Agora pertencíamos um ao outro... Para sempre.

“Eu espero que você esteja sentindo a minha falta como eu sinto a sua.”