Meine Liebe escrita por Blue Dammerung


Capítulo 1
Sono Qui Con Voi.


Notas iniciais do capítulo

"No fim destes dias encontrar você que me sorri, que me abre os braços, que me abençoa e passa a mão na minha cara marcada, na minha cabeça confusa, que me olha no olho e me permite mergulhar no fundo quente da curva do teu ombro. Mergulho no cheiro que não defino, você me embala dentro dos seus braços e você me beija e você me aperta e você me aquieta repetindo que está tudo bem, tudo, tudo bem."
Caio Fernando Abreu.



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Cheguei em casa, cansado, com consciência e corpo em frangalhos. O trabalho me desgastava, assim como aqueles ao meu redor. Apenas desperdício de tempo, a meu ver.

Joguei a maleta sobre o sofá e fui até meu quarto, ouvindo a secretária eletrônica anunciar que ninguém me deixara mensagens. Oh, surpresa.

Talvez fosse o medo que as pessoas tinham de mim. Talvez fosse sua timidez. Talvez fosse meu rosto marcado pela antipatia.

Ou talvez fosse eu, apenas eu, o grande erro de toda a história. Talvez fosse meu descaso, minha raiva, minha falta de pudor, sincero demais, que as assustava.

E talvez nada disso tivesse conserto. Ninguém falava mais que o trivial comigo, e até meus colegas de trabalho se dirigiam a mim com certa hesitação.

Mas eu não precisava deles. Ou achava que não precisava.

Pelo menos não até aquele rapaz de cabelos castanhos aparecer na minha porta, sorrindo, sempre sorrindo.

O recebi mal, com uma eterna carranca no rosto. Quem perturbava minha tão torturante solidão? Minha tão necessária punição por, afinal, ser quem eu era?

Mas ele não pareceu se importar, e sorriu, o que me deixou mortificado.

Como? Por quê? Por que ele não dava meia volta e saía marchando, chateado, como todos faziam? Por que era diferente? Viera, caíra do céu ou ascendera do Inferno apenas para perturbar minha “paz” que nada tinha de pacífica ou sequer confortadora?

Eu não sabia lidar com aquilo. Estava acostumado ao padrão de assustar e afastar, mas ele... não se perturbava, o que era um fato deveras perturbador para mim.

Maldito.

Pediu por uma informação, um telefone, sendo mais exato, do síndico do prédio onde morávamos. Era novo por ali, e seu apartamento estava com problemas.

O mandei embora, mas ele insistiu e pediu “por favor”. Era uma frase tão estranha, formada por uma combinação de letras tão esquecidas que mal as notei. As tinha esquecido completamente, inclusive seu significado.

Mas não. Decidi proteger meu castelo, erguer meus muros e cavar um foço. Tinha, precisava, deveria, mantê-lo afastado.

Fechei a porta, esperando espantá-lo, mas olhando pelo “olho-mágico” da porta, nada vi de diferente, apenas o mesmo rapaz sorrindo como quem não entende a piada, mas finge que entende.

Era retardado ou o que?

O deixei ali, esperando, temendo abrir a porta. Não deixaria que violasse minha tão sagrada solidão, onde me escondia de tudo e de todos.

Não, eu evitaria. Destruiria antes que qualquer coisa, qualquer ínfima ligação de contato, surgisse entre nós, porque, antes de tudo, eu sabia, sempre soube, no que aquilo iria dar. E não era algo que eu apreciasse.

Mas ele, como sempre, não deixou, e quando vi, já estávamos conversando no elevador. Se é que minhas respostas ignorantes podiam ser chamadas de “conversas”, em comparação as simpáticas palavras dele.

Sempre sorrindo, tão idiota que me fazia querer chorar. Fazia um mês que estava no apartamento, e quase sempre tinha visitas. Não que eu ficasse observando, de jeito nenhum. Só que ele e seus convidados falavam alto e rápido demais para passarem despercebidos por entre as finas paredes que nos dividiam.

Não demorou para que eu percebesse que era italiano, com aqueles cabelos castanhos claros e olhos de um verde oliva. Um italiano, total adorador de massas... Ou “pastas”, na língua deles.

E que vivia bem ao lado de um alemão tão antissocial que assustava. Ah, enorme era o desprezo, crescente, que eu sentia por aquele sorriso, tão inocente e tão divertido ao mesmo tempo. Idiota. Realmente idiota.

Mas, incrível, não importava quantas vezes eu o tratasse mal após ele apenas puxar assunto. Não importava quantas vezes eu recusasse, grosseiramente, seus convites para jantar (pasta...) em sua casa. Não importava o quão eu deixasse suficientemente claro meu desprezo...

Ele sempre falava comigo, sempre sorrindo, sempre simpático e divertido, social.

Totalmente meu oposto.

Parecia determinado, empenhado, a me fazer deixar meu castelo, a deixar minha solidão, triste, porém conhecida, para desbravar um ambiente totalmente novo, com pessoas que nunca vira na vida.

Claro que o evitei mais ainda (se é que era possível). Tranquei minha boca e tampei meus ouvidos, só não fechei meus olhos porque, enfim, precisava deles para trabalhar.

Mas, mesmo assim, ele continuou. Quando me via, sorria e começava a falar. Se era de manhã, ele falava sobre o que iria fazer. Se era noite, falava sobre o que tinha feito ou então perguntava sobre como tinha sido meu dia.

Eu tentei, juro que tentei, mantê-lo afastado de mim, para que nenhum de nós se machucasse, para que nenhum viesse a se apavorar com o que eu era.

Mas não consegui, falhei miseravelmente, e quando vi, já tinha respondido sua pergunta:

“Chato”.

Então, mais uma vez, como sempre, ele sorriu, e disse que eu deveria aproveitar meus dias, pois todos temos poucos, mesmo que sejam chatos.

Ah, então ele não era tão idiota assim... Ou o era e só pegara aquela frase de algum lugar. Continuamos a conversar, mesmo com minhas respostas sempre curtas.

Mas não notei quando comecei a me acostumar com sua presença, nem notei quando comecei a dar respostas maiores. Só sei que aconteceu, e algo dentro de mim se alegrava apenas em ver o sorriso dele.

Não que eu gostasse, claro que não, mas essa “coisa”, que talvez fosse a pedra chamada “coração”, dentro de mim, depois de tanto tempo “morta” e “fria”, estava começando a arder novamente.

Só pelo fato de vê-lo sorrindo todos os dias, por razões tão idiotas, começava a me perguntar se realmente a vida também não teria caminhos com flores, de vez em quando.

Me perguntei se toda aquela minha solidão imposta, se todo aquele medo de deixar o castelo e toda aquela ignorância eram coisas desnecessárias. Seriam?

E doeu, no fundo daquele órgão que eu acreditava estar morto, gelado e duro como pedra, meu coração, meu peito. Doeu porque, após tanto tempo no escuro, meus olhos finalmente viam a luz no fim do túnel, e doeram por não estarem acostumados a ela.

Da mesma forma era aquele sorriso, tão contagiante e bobo que, pouco a pouco, bem lentamente, estava me mudando, ruindo todos os muros e soterrando todos os fossos que cercavam meu castelo, deixando-me vulnerável, atingível.

Estávamos virando aquilo que jamais pensei que voltasse a ser: Amigos. Verdadeiros companheiros, e mesmo que eu detestasse a ideia, a cada dia, mesmo não demonstrando, ficava ansioso para revê-lo, para rever seus sorriso.

Porque, querendo ou não, era ele que estava curando minhas profundas e dolorosas feridas. Era ele que me colocava para frente, meu apoio, meu “amigo”, que me deixava satisfeito só em perguntar sobre meu dia e que realmente ouvia, atentamente, a minhas palavras.

Pois era ele, o único, que realmente sentiria minha falta se eu morresse de repente. O lugar para onde queria voltar, para apenas me sentir, após tanto tempo, “querido” e “amado” por outra pessoa.

Então soube que tinha medo muito medo. Medo de que ele descobrisse sobre o que tinha feito, ou pior, sobre quem eu era, o que eu era, pois sabia que isso o faria ir embora.

Para sempre.

E eu, por mais vergonha que sentisse em admitir, não queria deixá-lo ir.

Preferia afastá-lo para que ele jamais soubesse do que ele descobrir a verdade e se afastar de mim, achando-me um monstro, uma aberração da natureza, e não um ser humano, como eu próprio relutava em admitir. Preferia que ele sentisse minha ausência do que eu sentir a dele. Preferia que ele passasse o resto da vida se perguntando do que, um dia, tivesse a mínima pista do que eu fora obrigado a fazer.

E do que ainda hoje eu sentia culpa.

Só que nunca o destino está do meu lado, e, uma noite, ele veio até meu apartamento, já não sorrindo tanto como de costume.

Meu recém-acordado e degelado coração não gostou de sua expressão, meio preocupada, meio receosa. Seu sorriso agora desaparecera entre tanta agonia.

Ele pediu e eu o deixei entrar, sem perguntar o porquê de nada. Ele então olhou para mim e disse, usando, provavelmente, o tom mais sério que encontrara.

“Eu sei, Albriech”, falou, pronunciando meu nome estranhamente. Parecia ter passado horas praticando no espelho, apenas para falar aquela simples frase.

“O que você sabe, Valeriano?”,perguntei, sentindo sensações geldas na minha espinha. Seriam calafrios? Os tão famosos calafrios que todos sentiam quando tinham medo?

Eu estava com medo? De quê? De que ele descobrisse sobre meu tão obscuro passado? Ou de que ele me virasse as costas e fosse embora?

Desde o começo eu soube que com todos seria assim. Aproximação, apego, então vem a terrível descoberta e finalmente, o afastamento, onde sempre quem acabava em pedaços era eu, aquele que totalmente confiara e se apegara a outra pessoa.

Eu sabia, mas mesmo assim, deixei acontecer, tendo a mínima esperança de que ele fosse diferente, que fosse me compreender, que não me julgasse da mesma forma que todos ou outros.

Mas mesmo assim, eu sabia que aquela era uma esperança infundada e mentirosa. É claro que ele viera apenas passar na minha cara, para depois sair por aquela porta, sentindo raiva, medo ou até nojo de mim.

“Não precisa mais esconder”, ele falou, ainda num tom sério, mas eu queria escutar sua voz dizendo “aquelas” palavras que todos diziam.

“Esconder o quê?”

“Eu sei que não foi sua culpa.”

“O que não foi?”

“Eu não ligo. Você poderia ter feito mil vezes pior que eu ainda não ligaria. Somos amigos, lembra, Alby?”, ele falou, pronunciando aquele terrível apelido, mas que ignorei.

“Você sabe que eu posso fazer o mesmo com você, não sabe?”, falei, tentando, mais uma vez, afastá-lo.

“Mas não vai...”

“Por que não diz o que fiz logo? Quero ouvir você dizer, agora. Me diga que brilhante descoberta a meu respeito você fez, Valeriano”.

Ele pareceu pensar, sério, por uns instantes. Aquela postura não combinava com ele. Onde estava seu tão radiante sorriso?

“Eu sei que você matou... Sua mulher”.

Ah, então ele sabia... Onde teria encontrado aquelas informações? Mas por que algo em meu peito doeu tanto ao ver aquilo? Ao ouvir aquilo?

“Mas sei que, se você não a tivesse matado, os sequestradores teriam matado seu filho”, ele continuou, “sei que você se culpa, mas você teve que escolher o que achou a coisa certa a se fazer...”

Suas palavras estavam difíceis de decifrar, e então, eu não queria mais ouvi-las. Não queria mais ouvi-lo me acusando, me chamando de assassino ou psicopata, Porque, mesmo que eu já tivesse sobrevivido a muitos tombos, aquele, em especial, doeria muito mais.

Aquelas palavras me machucariam tanto que eu, provavelmente, nunca confiaria em ninguém novamente, Mas eu sempre soube disso, e no entanto, me arrisquei.

“Vá embora daqui”, falei, me virando. Não poderia, não aguentaria, encarar seus olhos se enxergasse um mínimo de acusação neles, algo que confirmasse seu desprezo por mim.

“Albriech, me escute.”

“Vá embora daqui!”, gritei, batendo com força na parede. Por que ele insistia em me torturar? Em me fazer reviver meu passado de forma tão dolorosa? Em me fazer voltar àquelas poucas horas onde tudo, tudo, tudo mais importante para mim fora destruído?

Foi então que senti algo envolver minha cintura. Abaixei os olhos. Eram... Braços? Senti sua cabeça se encostar em minhas costas. Eu estava sendo abraçado? Eu? Um assassino? Um psicopata? Aquele que merecia apenas o silêncio de todos e mais nada? Por quê? Por que ele estava fazendo aquilo?

“Eu perdoo você, Albriech Heinrich”, ele falou.

“Por quê?”, perguntei, confuso.

“Porque eu sei que não foi sua culpa, e sei que você jamais machucaria alguém sem motivo. Está tudo bem, sério, não precisa mais se esconder de nada. Deixe ir, você fez certo, a decisão que qualquer um teria tomado. Pode chorar se quiser, não vou contar a ninguém”, ele falou, e eu tinha certeza que estava sorrindo, mesmo estando de costas.

Senti... Alívio.

Minhas pernas perderam as forças e caí de joelhos, logo sentindo os braços dele me envolverem e deitarem minha cabeça em seu ombro.

Não era nada com segundas intenções, era apenas um humano confortando outro ser que nem imaginava ainda ser humano.

Ele apenas me dizia as palavras que sempre quis, mas nunca ouvi. Palavras de perdão, de calma, de conforto. Palavras tão necessitadas que logo fizeram meus olhos umedecerem, e então, lágrimas de anos de solidão e culpa caíam por meu rosto.

Ele era apenas um amigo acalentando, protegendo, guiando o outro. Porque ele sabia que ninguém poderia viver só, mas que eu tivera que aprender da pior maneira.

Mas agora estávamos ali, e ele curava todas os meus martírios enquanto acariciava meus cabelos, como uma mãe faz com um filho amado. Como um amante faz com o outro.

Lógico que, se fosse outra ocasião, eu teria estranhado e me afastado, como sempre fazia... Mas agora não.

Eu apenas queria sentir aquela sensação de ser querido, de ser “amado”, da forma que eu era, imperfeito como eu era. Errado como eu era.

Pois, da mesma forma que ele me “queria”, eu havia aprendido a “querê-lo” também. A gostar de sua presença e a aproveitar seu sorriso. Pois eu, acima de tudo, precisava dele para seguir em frente, mas a questão era...

Ele precisava de mim?


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Notas finais do capítulo

Uma rápida olhada nos personagens:
Albriech Heinrich>> Alemão, 31 anos, alto, loiro, tem olhos azuis, o típico estereótipo alemão mesmo.
Valeriano Virgílio>> Italiano, 27 anos, alegre, estatura mediana, olhos verde-oliva e cabelos castanho-claro. É tão alegre que dói a vista.
Bem, caro leitor, espero que tenha gostado *.*
Ah, e não esqueça de deixar uma review para que eu saiba o que você achou da minha primeira one-shot original *.*
KISSES!



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